Gustavo
Corção
Cheguei a uma conclusão aterradora: a
quase totalidade do mundo que se diz católico ainda não percebeu claramente,
dolorosamente e irreversivelmente que existam duas Igrejas com a mesma
denominação e com a mesma hierarquia: uma que é Una, intransigente, e outra que
é pluralista, múltipla e que, para começar quer envolver a Católica,
enrolando-se em torno dela como mata-pau em torno da árvore, cuja seiva deseja
absorver; uma que é dogmática e crê firmemente que “passará o céu e a terra,
mas as palavras de Jesus não passarão”, e outra, ao contrário, que é
progressista, evolucionista, e cuja hierarquia não terá melhor profissão de fé
do que a declaração feita na reunião de Itaici por Dom Clemente José Carlos
Isnard, Presidente da Comissão Nacional de Liturgia da CNBB: “... não é missão
da Comissão Nacional da Liturgia reprimir quaisquer abusos; mas é missão desta
entidade incitar e encorajar abusos, ainda que esses abusos cheguem à
profanação do Corpo de Deus”. Perdão! O vezo do professor levou-me a dizer com mais
clareza exatamente o mesmo que Dom Clemente disse com outras palavras,
apresso-me a retificar a citação transcrevendo rigorosamente o que Dom Clemente
diz no SEDOC de abril de 75, pág. 978: “ julgo, porém, de meu dever repetir
mais uma vez que os abusos em matéria litúrgica não podem ser medidos com a
mesma escala. Há transgressões da disciplina vigente que embora ilícitas, estão
na linha duma evolução facilmente previsível e que em pouco tempo poderão estar
sancionadas por uma legislação proveniente de autoridade competente”.
Damos nós um
exemplo: "a comunhão na mão". Até poucos anos atrás era um abuso
praticado por vários membros da Outra Igreja, com a intenção de bem marcar uma
nova e desembaraçada atitude do crente diante da Hóstia consagrada, isto é, o
Santíssimo Sacramento do altar que, além de conferir a graça, contém o autor da
graça.
Se essa evoluída
atitude não é a de um acintoso desrespeito que a minha Igreja (a Católica, una,
santa, etc.) chama de sacrilégio e profanação, só pode ser a de uma simples e
translúcida falta de fé na presença real. Ora, quem de tal modo publica essa
falta de fé está exatamente no caso dos discípulos de Jesus (Jo.,6,67). Já não
são católicos.
Isto era assim:
mas agora as autoridade da Outra Igreja, a da CNL da CNBB, acabam de declarar
que aquele abuso se tornou evolução que eles facilmente previam e agora
aprovaram.
Quando ouvi na
missa do Corpo de Deus, especialmente escolhida, delicadamente aprazada, o
pobre padre anunciar palavras emanadas de um "bispo" chamado Castro
Pinto, que anunciavam a oficialização da comunhão na mão, senti-me esbofeteado
por Satanás. E então compreendo que aquela missa reformada é uma invenção que
permite a Bispos da Outra ditarem regras à Igreja de Cristo: sim, inventada,
composta, reformada, especialmente para tornar confuso, ambíguo,
insuportavelmente misturados dois credos inconciliáveis. Tive uma pena enorme
de toda aquela pobre gente que cumpria um mandamento da Igreja numa arapuca
comandada pela Outra.
Estão ali,
sentados ou de pé, apatetados, desinformados, desdoutrinados, a perder dia a
dia a fé na Presença Real de Jesus. Estão ali os pobres incautos que vagamente
querem ser católicos, a ouvir instruções emanadas do bispo Castro Pinto que
anos atrás festejou, contra a vontade de seu superior, o 450º centenário da
Reforma luterana. Amanhã começarão nas diversas dioceses as comunhões que
levarão o Corpo de Deus até a macumba, para alegria dos abades beneditinos que
já acharam certo enquadramento das feitiçarias na Regra de São Bento. Hipocritamente
as autoridades fingiram proteger o uso ainda mais profano das hóstias
consagradas, recomendando que sejam consumidas no ato. Mas quem poderá evitar
as fáceis escamoteações? Aliás, essa nova profanação da hóstia levada para
todos os usos imagináveis já não está na linha de uma evolução facilmente
previsível?
Há pessoas que
julgam resolver muito santamente o problema cruzando os braços e abrindo a
boca: resolvem o seu caso pessoal, mas entram no carnaval de Satanás,
misturam-se com os que vão evoluir, e recebem a santa comunhão do mesmo padre
que acaba de profanar o Corpo de Deus com permissão do Sr. Castro Pinto, bispo
da Outra igreja. Ou de Autoridade mais alta que pretende ser ao mesmo tempo
autoridade legítima da Igreja Católica e da Outra. Para mim tornou-se
refulgentemente claro que não devo mais entrar nas igrejas em que se pratica
essa nova maneira de desrespeitar o sacramento do altar. Compreendi com uma dor
lancinante que a nova missa não é apenas uma liturgia achatada ou mutilada: é
realmente, como se vê! uma oportunidade de deixar os católicos à mercê de
autoridades anticatólicas. A evidência se impõe: é uma ocasião de pecado para
os advertidos. Há trinta anos caminho procurando acertar os passos pela
presença de Jesus. Não sei como fazer para conseguir receber o Santíssimo
Sacramento do Altar em templos em que a Santa Hóstia esteja fora do alcance da
CNL da CNBB e das autoridades que julgam possível servir à Igreja e à
anti-Igreja.
Não posso,
evidentemente, ir todos os dias a Petrópolis, Mariana, Campos ou Porto Alegre
ou outra diocese onde, com a Graça de Deus, os Excelentíssimos Senhores Bispos
resistiram e proibiram o novo abuso contra a fé na Presença Real e onde todos
os católicos esperam que, com especial auxílio de Nossa Senhora de Fátima e de
Nossa Senhora Aparecida, esses bispos católicos resistam e permaneçam fiéis a
Jesus e repilam energicamente a regra de evolução publicada em Itaici por D.
Clemente; e assim, não podendo evidentemente colher esses frutos tão esparsos,
só vejo uma saída para não me deixar levar pelos que se afastam de Jesus, na
prática de tantos desrespeitos: pedir a Deus que me abrevie os dias que uma
saúde ainda sólida ameaça de um incompreensível prolongamento.
O Globo, 5-6-75
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