Há uma história conectada com a férula
Scorzelli, a da cruz de Albert Servaes (1883-1966). Servaes tinha feito, em
1919, quatorze desenhos em carvão sobre papel branco que
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Crucificação, da via-sacra de Servaes, 1919 |
representam as
estações da Via Crucis impregnados de um forte pathos e uma deformação
constante dos corpos em sua expressão de dor extrema. Este é um claro exemplo
de "expressionismo" aplicado ao sagrado.
Servaes é um dos artistas da Escola de Laethem, que se caracteriza por
uma busca agressiva de um primitivismo "exótico" na escola de
Laethem-Saint-Martin, em Flandes. O grupo Laethem, dos quais o expoente mais
conhecido é Gustave de Smet, partiu de uma crítica ao Impressionismo, que
sentia como demasiado próxima a sensibilidade positivista e incapazes de captar
os contrastes e ebulições no caminho da Primeira Guerra Mundial.
O expressionismo do grupo Laethem se converteu assim numa rebelião
contra as folhas de estilo, delicadas da língua francesa, através do
descobrimento de uma realidade trágica na qual o artista é o intérprete.
A rebelião social e individual do artista, no caso de Laethem também ao
mercantilismo típico dos círculos expressionistas em Paris.
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Férula de Scorzelli. |
A condenação da Via Crucis de Servaes por parte do Santo Ofício, depois
da aprovação direta do Papa Bento XV, é um documento chave, já que não é uma
simples condenação de um trabalho específico, senão a proibição de um estilo
completo ou escola de arte: Albert de Servaes apresentou a mão de Jesus como
uma garra...
Decreto que CONDENA as imagens sagradas de uma ESCOLA PICTÓRICA (publicado em
30 de março de 1921 pelo Santo Ofício).
Os eminentíssimos e reverendíssimos senhores cardeais reunidos com os
inquisidores gerais em matéria de fé e moral, em sessão ordinária celebrada na
segunda-feira, 23 de fevereiro de 1921, publicamente declararam censuradas as
imagens sagradas da nova escola pictória que se exibe no folheto intitulado A
Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo de Cyril Vershaeve (imagens compostas por
Albert Servaes. Bruxelas e Paris. Librairie National d'art e d'histoire et G.
van Oest e editores, 1920), pela prescrição do cânon 1399, n.º 12, que as
proibe pela lei e portanto devem ser retiradas imediatamente de igrejas,
oratórios etc. e em todo lugar que forem expostas. Na quinta-feira seguinte, 24
do mesmo mês e ano, Sua Santidade, o Papa Bento XV, na Audiência CONSEJEROS,
aprovou a resolução que se lhe havia mostrado, e ordenou-lhes que a partir
desta, ficasse estabelecido e confirmado.
Dado em Roma, em
São Pedro, escritório de imprensa, 30 de março de 1921.
DECRETUM DAMNANTUR
SACRAE IMAGINES
CUIUSDAM NOVAE
SCHOLAE PICTORICAE
Emi ac Rmi Domini Cardinales in rebus fidei et
morum Inquisitores Generales, in ordinario consessu habito feria iv, die 23
februarii 1921, publice declarandum censuerunt: Imagines sacras
cuiusdam novae scholae pictoricae, quarum specimen exhibetur in opusculo
cui titulus: La Passion de Notre-Seigneur Jésus-Christ par Cyril Verschaeve
(ornée de compositions d'Albert Servaes. Bruxelles et Paris. Librairie Natio-
nale d'art et d'histoire G. van Oest et Ci e Editeurs, 1920), ad praescriptum
canonis 1399, n. 12,prohiberi ipso iure, ideoque statim removendas esse ab
Ecclesiis, Oratoriis, etc., in quibus forte expositae inveniantur. Et
insequenti feria v, die 24 eiusdem mensis et anni, Sanctissimus D. N.
Benedictus divina Providentia Papa XV, in solita audientia R. P. D. Assessori
S. Officii impertita, relatam sibi Emorum Patrum resolutionem approbavit,
mandans ad quos spectat ut eam servent et servare faciant. Datum Romae, ex
aedibus S. Officii, die 30 martii 1921. A. Castellano, Supremae S. C. S. Off.
Notarius.
A condenação de toda uma "nova escola de pintura" é singular
quando lida à luz das mudanças que se introduziram no enfoque da arte da Igreja
coma Sacrosanctum Concilium, em 1963. O anúncio da ausência de
"estilos próprios da Igreja" em S.C. 123, já que pode ser
questionável, sublinha, contudo, que a Igreja recusou certos estilos em
oposição à fé e a tradição. E o caso do expressionismo belga realista, emblemático
neste sentido.
A férula Scorzelli não é mais do que a repetição
daquele expressionismo. E "a vinganza de Servaes proclamou-se ao mundo em
1965".
Certamente, a férula existiu por muitos anos, de alguma maneira perdeu
seu significado original no imaginário coletivo e adotou o aspecto de um
símbolo do pontificado de João Paulo II. Contudo, deve-se notar que o Papa
Francisco escolheu um anel que pertencia ao arcebispo Pasquale Macchi,
ex-secretário do Papa Paulo VI.
É um fato curioso que este anel tenha sido testemunha de uma saída
repentina do sarcófago de outro cardeal mumificado: o cardeal Re. Ele, que foi
prefeito da Congregação para os Bispos, sem ter sido nem bispo diocesano,
sequer pároco, sugeriu ao Papa Francisco a escolha deste anel. Bergoglio e ele
o escolheram devido a sua dimensão estética estar estreitamente relacionada com
a época paulino. Época de subversão estética dirigida por Lercaros, Francias e Fallanis.
Período iconoclasta por excelência.
É muita conversa na cabeça do povo,assim a pessoa fica dividida,não sabe quem tá certo quem tá errado,affff
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