Deum time, et mandata
eius observa: hoc est enim omnis homo — “Teme a Deus e observa os seus
mandamentos; porque isto é o tudo do homem” (Eccles. 12, 13).
Sumário. Não temos
nascido, nem devemos viver para gozarmos, para nos fazermos ricos e potentes,
senão unicamente para amarmos a Deus e nos salvarmos para sempre. Todavia, este
grande fim da nossa existência é o mais descuidado pelos homens, que em tudo pensam
exceto na salvação da alma. Nós ao menos não sejamos tão insensatos e
consideremos seriamente que tudo que se faz, se diz ou se pensa contra a
vontade de Deus, é perdido e perdido para sempre.
I. Considera, minha alma, que o teu ser
é um dom de Deus, que sem mérito algum da tua parte te criou à sua imagem. No
santo Batismo adotou-te por filho; amou-te com um amor mais que paternal, e
deu-te a existência, a fim de que O ames e sirvas nesta terra, para depois
gozares com Ele no paraíso. Portanto, não nasceste, nem deves viver para
gozares, para te fazeres rico e poderoso, para comeres, beberes e dormires,
como os irracionais; mas unicamente para amares o teu Deus e te salvares para
sempre. O Senhor deu-te o uso das coisas criadas, a fim de que te sirvam para
atingir o teu grande fim. — Ai de mim, que em tudo tenho pensado exceto no meu
fim! Ó meu Pai celestial, pelo amor de Jesus Cristo, fazei que eu comece uma
vida nova, toda santa e toda conforme à vossa divina vontade.
Considera também que na hora da morte
terás veementes remorsos, por não te teres aplicado ao serviço de Deus. Qual
será a tua aflição se no fim de teus dias perceberes que nessa hora não te
resta de todas as riquezas, dignidades, glórias e prazeres senão um punhado de
pó. Pasmarás que por coisas vãs e por ninharias perdeste a graça de Deus e a
tua alma, sem poderes reparar o mal feito. Não haverá mais tempo para entrares
no bom caminho. Ó desespero! Ó tormento! Verás então quanto vale o tempo; mas
será tarde. Quererás comprá-lo pelo preço do teu sangue, mas ser-te-á
impossível. Ó dia de amargura para quem não serviu e amou o seu Deus.
II. Considera quanto é descurado o
último fim do homem. Pensa-se em aumento de riquezas, em banquetes, em festas,
em passatempos. E ninguém se importa com o serviço de Deus, nem com a salvação
da alma! O destino eterno é tido por uma bagatela e assim a maior parte dos
Cristãos vai a caminho do inferno banqueteando-se, cantando e dormindo! Oxalá
compreendessem o que quer dizer: inferno!
Ó homem, afadigas-te tanto para tua
condenação e nada queres fazer para a tua salvação. Estava para morrer o
secretário de um rei de Inglaterra e ao expirar disse: Desgraçado de mim! Tenho
enchido tanto papel para escrever as cartas do meu senhor e não enchi uma única
folha para me lembrar dos meus pecados e fazer uma boa confissão! Filipe III,
rei de Espanha, disse na hora de sua morte: Ah! Antes houvera servido a Deus
num deserto, do que sido rei!
Mas para que servirão naquela hora os
gemidos e as lamentações? Servirão para maior desesperação. Aprende ao menos à
custa de outros, a viveres solícito de tua salvação, se não quiseres cair no
mesmo desespero. E lembra-te de que tudo o que fizeres, pensares ou disseres
contrário à vontade de Deus, está perdido para a tua alma. Ânimo! Já é tempo de
mudares de vida. Ou queres por ventura a hora da morte para te desiludir?
Quando estiveres às portas da eternidade, como que suspenso sobre o abismo do
inferno, quando não houver mais tempo para reparar o erro? — Ó meu Deus,
perdoai-me. Amo-Vos sobre todas as coisas. Detesto os meus pecados mais do que
qualquer outro mal. Maria, minha esperança, rogai a Jesus por mim. (II 473.)
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações:
Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento
até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 138 - 140)
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