A
primeira questão a ser introduzida na história do mundo e a qual
nos trouxe tanta dor e inimizade foi: "POR QUE?".
Satanás
foi o primeiro a levantar essa questão... "Mas por que Deus
proibiu-lhes de comer do fruto de todas as árvores do Jardim?"
(cf. Gn 3,1). Desde aquele dia até hoje nossas pobres mentes já
formularam muitos "por quês", mas nenhum tanto quanto
esse: "Por que existe a dor no mundo? Por que as pessoas tem que
sofrer tanto? Por que a alegria é tão pouca e o sofrimento tanto?"
Esse
problema da dor tem um símbolo e o símbolo é a cruz. Mas por que
seria a cruz o símbolo perfeito do sofrimento? Porque ela é feita
de duas barras: uma horizontal e outra vertical. A barra horizontal é
a barra da morte... é como a linha da morte nos
eletro-encefalogramas: reta, prostrada. A barra vertical é a barra
da vida: erecta, de pé, inclinada para o alto. O cruzamento de uma
barra sobre a outra significa a contradição entre a vida e a morte,
entre a alegria e o sofrimento, sorriso e lágrimas, prazer e dor,
nossa vontade e a vontade de Deus.
O
único modo de se fazer uma cruz é sobrepor a barra da alegria sobre
a barra do sofrimento. Em outras palavras: nossa vontade é a barra
horizontal, enquanto a vontade de Deus é a barra vertical, na medida
em que nós sobrepomos nossos desejos e nossas vontades contra a
vontade de Deus, formamos assim uma cruz. Desse modo, a cruz se torna
o símbolo da dor e do sofrimento.
Todavia,
se a cruz é o símbolo perfeito do problema da dor, o Crucifixo
então é a sua solução. A diferença entre a cruz e o Crucifixo é
Cristo. Uma vez que Nosso Senhor, que é por si só o Amor, sobe na
cruz, Ele nos revela como o amor pode ser transformado pelo amor num
alegre sacrifício, como aqueles que semeiam em lágrimas podem
colher com alegria, como aqueles que choram podem ser confortados,
como aqueles que sofrem com Ele podem também reinar com Ele e como
aqueles que carregam suas cruzes por uma breve Sexta Feira da Paixão
possuirão a felicidade por um eterno Domingo de Ressurreição. O
Amor é o ponto de intersecção onde a barra horizontal da morte e a
barra vertical da vida reconciliam-se na doutrina de que toda a vida
vem através da morte.
É
aqui que a solução de Nosso Senhor se diferencia de todas as outras
soluções para o problema da dor... até mesmo daquelas
pseudo-soluções que se mascaram sob o nome de "cristãs".
O mundo tenta resolver o problema da dor de duas maneiras: ou
negando-o ou tentanto torná-lo insolúvel. O problema da dor é
negado por um peculiar processo de auto-hipnotismo que costuma
inculcar nas pessoas a idéia de que a dor é imaginária. Tenta-se
torná-lo insolúvel através de uma tentativa de fuga e por essa
razão o homem moderno sente que é melhor pecar do que sofrer. Nosso
Senhor, ao contrário, não nega a dor e nem tenta escapar dela. Ele
a encara e ao agir assim Ele nos prova que o sofrimento não é
alheio nem mesmo ao Deus que se fez homem.
Vemos
assim que a dor desempenha um papel definitivo na vida. É sem dúvida
um fato marcante que nossas sensibilidades são mais desenvolvidas
para a dor do que para o prazer e nossa capacidade de sofrer excede
nossa capacidade de alegrarmo-nos. O prazer cresce até chegar a um
ponto de saciedade e nós sentimos que se passasse daquele ponto se
tornaria uma verdadeira tortura. A dor, ao contrário, continua
crescendo e crescendo mesmo quando já choramos "o bastante".
Ela atinge um ponto em que nós sentimos que não poderíamos mais
suportar e ela vai se descarregando até matar.
Eu
penso que o motivo pelo qual nós possuímos mais capacidade para a
dor do que para o prazer é porque talvez Deus pretendia que aqueles
que levam uma vida moral correta deveriam beber até a última gota
do cálice da amargura aqui nesse mundo porque no Céu não existe
mais amargor. Por outro lado aqueles que são moralmente bons nunca
gozam o máximo do prazer aqui embaixo porque sabem que uma
felicidade muito maior os aguarda no Céu. Mas deixando de lado as
conjecturas, seja lá qual for a razão, a verdade que permanece é
que na cruz Nosso Senhor demonstra um tipo de Amor que não pode
tomar outra forma quando é contraposto ao mal, senão a forma de
dor.
Para
vencer o mal com o bem, uma pessoa deve sofrer injustamente. A lição
do Crucifixo então é que a dor nunca pode ser separada ou isolada
do amor. O Crucifixo não significa dor; significa sacrifício. Em
outras palavras, ele nos diz em primeiro lugar que dor é sacrifício
sem amor e em segundo, que sacrifício é dor com amor.
Primeiro,
dor é sacrifício sem amor. A Crucifixão não é a glorificação
da dor pela dor. A atitude cristã da mortificação algumas vezes é
mal interpretada como sendo uma idealização da dor... como se nos
tornássemos mais agradáveis a Deus quando sofremos do que quando
nos alegramos.
Não!
A dor em si mesma não possui nenhuma influência santificante! O
efeito natural da dor é nos individualizar, centralizar nossos
pensamentos em nós mesmos e fazer de nossa enfermidade o pretexto
pra tudo quanto é conforto e atenção. Todas as aflições do
corpo, tais como penitências e mortificações em si mesmo não
tendem tornar o homem melhor. Aliás, frequentemente tornam o homem
pior. Quando a dor é divorciada do amor ela leva o homem a desejar
que os outros estejam como ele está, ela o torna cruel, cheio de
ódio, amargura. Quando a dor não é santificada, ela deixa
cicatrizes, queima todas as mais finas sensibilidades da alma
deixando-a brutalmente desfigurada. Dor como simples dor então não
é um ideal: torna-se uma maldição quando é separada do amor, pois
ao invés de tornar uma alma melhor a torna pior.
Agora
contemplemos o outro lado da figura. A dor não é pra ser negada e
nem pra fugirmos dela. É pra ser encarada com amor e vivida como
sacrifício. Analise sua própria experiência e verá que muitas
vezes seu coração e mente lhe dizem que o amor é capaz de superar
de algum modo seus sentimentos naturais acerca da dor, que algumas
coisas que poderiam parecer dolorosas tornam-se alegria quando você
percebe que podem beneficiar o próximo.
Em
outras palavras, o amor pode transformar a dor em sacrifício
agradável, o que é sempre uma alegria. Se você perde por exemplo,
uma certa quantidade de dinheiro, tal perda não poderia ser aliviada
pela compreensão de que talvez aquele dinheiro foi encontrado por
uma pobre alma que tinha mais necessidade do que você? Se sua cabeça
está latejando de dor e seu corpo extenuado por uma noite de vigília
ao lado da cama de seu filho doente, não seria essa dor aliviada
pelo pensamento de que foi através desse amor e devoção que aquela
criança conseguiu superar a enfermidade? Você jamais poderia ter
sentido aquela alegria e nem ter tido a mínima idéia do tamanho do
seu amor se você tivesse se negado a fazer aquele sacrifício. E se
o seu amor não estivesse presente, então aquele sacrifício teria
sido apenas dor, incômodo e aborrecimento.
A
verdade gradualmente emerge quando percebemos que a nossa profunda
felicidade consiste no sentimento de que o bem ou benefício do
próximo foi conquistado através do nosso sacrifício. O motivo por
que a dor é amarga é porque não temos ninguém para amar e por
quem nós deveríamos sofrer. O amor é a única força do mundo que
pode tornar a dor suportável e a faz mais do que suportável ao
transformá-la na alegria do sacrifício.
Agora,
se a escória da dor pode ser transformada no ouro do sacrifício
pela alquimia do amor, então daí se segue que nosso amor se torna
mais profundo, a sensação de dor diminui e cresce nossa alegria no
sacrifício. Mas não podemos esquecer que não existe amor maior do
que o amor Daquele que entregou Sua própria vida por Seus amigos.
Portanto, quanto mais intensamente nós amarmos os Seus santos
propósitos, quanto mais zelosos formos por Seu Reino, quanto mais
devotados formos pela maior Glória de Nosso Senhor e Salvador, mais
nos alegraremos em qualquer sacrifício que possa trazer uma só alma
para seu Sacratíssimo Coração. Tal é o motivo pelo qual São
Paulo se gloriava em suas enfermidades e alegrias e que os Apóstolos
se alegravam quando podiam sofrer por Jesus por quem eles tanto
amavam.
Não
é de se admirar que os maiores santos sempre disseram que a melhor e
maior das graças que Deus havia concedido-lhes era o mesmo
privilégio concedido ao seu Divino Filho: ser usado e sacrifícado
por uma causa mais elevada. Nada poderia dar-lhes maior satisfação
do que renovar a vida de Cristo em suas próprias vidas, cobrir seus
corpos com os mesmos sofrimentos sofridos por Cristo em Sua dolorosa
Paixão. O mundo tenta eliminar a dor. O Crucifixo a transforma
através do amor recordando-nos que a dor vem do pecado enquanto o
sacrifício vem do amor e que não há nada mais nobre do que o
sacrifício.
O
Mundo não pode dispensar o Cristo em Sua Cruz. Eis o motivo porque o
mundo é triste: por que se esqueceram de Cristo e da Sua Paixão. E
quanto desperdício de dor há neste mundo! Quantas cabeças que
padecem dos mais diversos tipos de dor sem jamais terem se unido à
Cabeça coroada de espinhos pela Redenção do mundo; quantos pés
latejam de dor sem jamais terem se aliviado pelo amor Daquele cujos
pés subiram descalços a colina do Calvário; quantos corpos feridos
existem que não conhecem o amor de Cristo por eles. Esses não
conhecem o amor que pode aliviar suas dores. Quantos corações que
sofrem e padecem porque não possuem aquele amor do Sacratíssimo
Coração; quantas almas que só conseguem enxergar a cruz ao invés
do Crucifixo! Almas que possuem dor sem sacrifício, almas que nunca
aprendem que é pela falta de amor que a dor cresce, almas que perdem
a alegria do sacrifício porque não sabem o que é amar. Oh! Quão
doce é o sacrifício daqueles que sofrem porque amam o Amor que
sacrificou-se por eles numa cruz. Apenas para essas almas é possível
compreender os santos propósitos de Deus, apenas aqueles que
caminham pela noite escura são capazes de contemplar as estrelas.
Link
para a postagem: http://agnusdei.50webs.com/div300.htm
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