"Ut appropinquavit (Iesus) videns civitatem, flevit super illam – “Quando (Jesus) chegou perto, ao ver a cidade chorou sobre ela” (Lc 19, 41)"
Sumário. Infeliz da
alma que se obstina no pecado ou na tibieza. Adiando a sua conversão de dia
para dia, achar-se-á na hora da morte, assim como Jerusalém, cercada de
inimigos, que serão os remorsos da consciência, os assaltos dos demônios e os
receios da condenação eterna. Desta sorte a sua ruína será quase certa e
irreparável. Meu irmão, para que não te suceda tamanha desgraça, reconhece
agora o tempo da visitação amorosa do Senhor e obedece prontamente a seu
convite. Quem sabe se não é este o último?
I. Refere São Lucas que:
“quando Jesus chegou perto de Jerusalém, ao ver a
cidade chorou sobre ela e disse: Ah! se ao menos neste dia, que agora te é
dado, conhecesses ainda tu o que pode trazer-te a paz! Mas por ora tudo está
encoberto a teus olhos. Porque virão dias para ti, em que os teus inimigos te
cercarão de trincheiras, e te sitiarão, e te apertarão por todos os lados. E te
derribarão por terra a ti e a teus filhos, e não deixarão em ti pedra sobre
pedra, porquanto não conheceste o tempo da tua visitação: Eo quod non
cognoveris tempus visitationis tuae“.
Sob a figura da Jerusalém
material, os Santos Padres veem a alma do pecador obstinado ou ainda a alma do
que é tíbio. Estas almas descuidadas, semelhantes aos desgraçados habitantes
daquela cidade infeliz, desprezam o tempo da visitação do Senhor e se obstinam
em não quererem obedecer à voz de Deus, que por meio dos superiores, dos
diretores espirituais ou das inspirações interiores os excita a emendarem a sua
vida desregrada.
Os desgraçados! O Redentor tem muita razão em derramar
por causa deles lágrimas copiosas, porque mais cedo ou mais tarde lhes tocará a
mesma sorte da ímpia cidade de Jerusalém: Circumdabunt te inimici tui
vallo (1) – “Os teus inimigos te cercarão de trincheiras”. Eles vão adiando
a sua conversão de dia para dia, e afinal, na hora da morte, ver-se-ão cercados
pelos seus inimigos, isso é, pelos remorsos da consciência, pelos assaltos dos
demônios e pelos receios da condenação eterna, de tal forma que a sua ruina
será quase certa e irreparável. Infeliz, pois, de quem se obstina no pecado ou
na tibieza.
II. Meu irmão, afim de que na
hora da morte não te suceda tamanha desgraça, reconhece agora o tempo da
visitação amorosa do Senhor e obedece de pronto ao seu convite. Quem sabe se a
leitura desta meditação não é para ti a última. Quero supor que estejas na
graça de Deus; porém, olha que não sejas do número daqueles tíbios, que pelas
suas negligências habituais causam a Deus tão grande náusea que começa a
vomitá-los de sua boca. Quia tepidus es, neque frigidus, neque calidus,
incipiam te evomere ex ore meo (2) – “Já que és tíbio, e não frio nem quente,
começarei a vomitar-te de minha boca”.
Meu amabilíssimo Jesus, não quero
esperar até a hora da morte para recorrer a Vós, meu Bem infinito. Reconheço
que pela minha tibieza mereci ser abandonado de Vós, privado de vossa luz e
desamparado de vossa graça. Mas ao ver que hoje me visitais tão amorosamente,
mostrando-me as lágrimas que derramais sobre a minha ruína eterna; ao ouvir
também a vossa voz, que por meio desta meditação de novo me convida ao vosso
amor, não quero desanimar e volto arrependido a lançar-me em vossos braços
paternais.
Perdoai-me, ó Senhor, já que
abomino e detesto, acima de todos os males, as ofensas, quer grandes quer
pequenas, que Vos fiz. Antes tivesse eu morrido mil vezes do que cometê-las.
Proponho para o futuro amar-Vos sempre de todo o coração e cumprir em todas as
coisas a vossa santíssima vontade. Dai-me a santa perseverança.
– “Rogo-Vos, ó Senhor, que
os ouvidos de vossa misericórdia estejam sempre abertos às minhas preces; e,
para que me possais conceder sempre o que Vos peço, fazei que eu só peça o que
for do vosso agrado.” (3)
Suplico-Vos esta graça pelos vossos merecimentos e
pela intercessão da minha querida Mãe, Maria.
Referências:
(1) Lc 19, 43
(2) Ap 3, 15
(3) Or. Dom. curr.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de.
Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da
Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder
& Cia, 1921, p. 285-287)
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