15/07/2013

Maçonismo e Naturalismo - Partes I e II

A maçonaria não é somente uma sociedade que possui adeptos; ela é também um símbolo de doutrinas, que seus adeptos se esforçam por fazer prevalecer a todo preço na esfera social. É à essas doutrinas maçônicas, às mil influências que tentam fazê-las prevalecer, à aplicação variada que fazem dessas doutrinas na vida pública, e, em nossos dias, até na vida privada, que damos o nome de maçonismo. 

Qual é, contudo, e daremos isso agora, o conceito, a ideia fundamental do maçonismo?

O Papa responde, em sua magistral encíclica Humanum genus, nesses termos, que precisam e definem claramente toda a questão: "Os maçons se propõem, e todos seus
esforços tendem a esse fim, destruir completamente toda disciplina religiosa e social nascida das instituições cristãs, e a substituição delas por um novo estado de coisas de acordo com suas ideias, das quais os princípios e as leis fundamentais são tiradas do naturalismo".

Nos termos desta definição, o maçonismo é, portanto, apenas o naturalismo.

O que é o naturalismo?

Essa palavra carrega em si mesma seu significado, e sua etimologia fornece sua mais clara definição. O naturalismo é a negação, ou, ao menos, a exclusão da ordem sobrenatural cristã. 

O naturalismo é, assim, um anticristianismo completo e perfeito.

Adentremos aqui em algumas explicações.

Toda a ordem cristã está fundamentada sobre o dogma da queda original do homem e sobre o de sua reabilitação pela Encarnação do Filho único de Deus. O homem natural é, portanto, o homem de pecado, que não tem nenhum meio, nem para ser convenientemente bom sobre a terra, nem para chegar ao seu fim último ao deixar esta vida. Para ser convenientemente bom e alcançar seu fim último, o homem deve ser, não o homem natural que caiu, mas o homem sobrenaturalizado que Jesus Cristo revelou e sustenta por sua graça. Para falar mais claramente, não basta hoje ao homem ser o homem da criação, ele deve ser outro, o homem da redenção. A existência do homem não lhe confere sua completa perfeição, é preciso ainda que ele seja cristão. É sobre os princípios da verdade eterna, pressentidos um dia pela própria filosofia humana, mas iluminados somente pela revelação divina, que está fundamentado o catolicismo, e é destes mesmos princípios que ele tira logicamente todas as suas consequências.

O naturalismo parte de princípios radicalmente opostos. Segundo ele, o homem não caiu, e, por consequência, não necessita de reabilitação. Se houve um Deus criador, o naturalismo não está convencido disso; mas, em troca, ele sabe pertinentemente que não houve Redentor. Jesus Cristo foi, portanto, um homem puro, e a Igreja é uma pura ilusão. O ser racional é perfeito, e, para chegar a todos os seus fins, mesmo ao seu fim último, ele não necessita de nenhum socorro que esteja fora do conhecimento e do alcance do naturalismo. O homem tem, portanto, em si mesmo, todos os meios próprios para obter esses fins, e eles lhe bastam absolutamente; ele sabe tudo o que lhe é necessário saber, porque sua razão está em toda sua integridade; ele observa tudo o que lhe convém, porque sua vontade não foi enfraquecida; ele ultrapassa todas as resistências que o apetite ou a paixão opõem à lei moral, porque seu livre arbítrio não sofreu nenhum atentado. E como o homem se basta em tudo a si mesmo, assim a sociedade se basta da mesma forma, porque, em sua razão, ela está perfeitamente esclarecida e possui a onisciência; em sua vontade, ela está perfeitamente sã e não tem nenhuma tendência ao mal; em seu livre arbítrio, ela não tem de forma alguma que resistir às más inclinações e aos instintos perversos. E, portanto, de toda esta ordem sobrenatural que o cristianismo proclama como auxiliar indispensável da natureza enferma e decaída, ele não considera Jesus Cristo como o autor, o conservador e o consumador desta ordem sobrenatural; nem a organização especial do sobrenatural, que se chama Igreja católica; e enfim, nem este ser supremo, misterioso, que se chama Deus, que é a última negação lógica do naturalismo.

Eis, levemente esboçado, em seus traços principais, esse sistema anticristão, do qual é fácil agora distinguir, à primeira vista, os fundamentos absurdos. Mesmo não levando em conta o que a revelação ensina de Jesus Cristo, apoiada sobre todos os seus poderosos motivos de credibilidade, a ideia que o naturalismo se faz do homem e da sociedade, é uma ideia evidentemente falsa. Segundo ele, o homem é perfeito, a sociedade é perfeita; eles encontram em si mesmos tudo o que lhes é necessário, e não precisam de nada que lhes seja superior. Eis aqui um erro grosseiro, contra o qual protestam a experiência e o bom senso de todos os séculos. O homem é fraco, cego, miserável; de si mesmo, ele está inclinado ao mal, seu livre arbítrio está continuamente em luta com os instintos perversos, aos quais ele não resistiria sem a graça de Deus. Ele precisa, portanto, de uma luz superior para conhecer, de uma força superior para agir, de um socorro superior para não ser continuamente vencido. Ele não é um ser perfeito, ele é uma ruína miserável de algo que um dia teve sua perfeição, e que, depois, teve a necessidade de ser restaurada a grandes custos. Ele nasceu chorando, e ele só pode ser bom lutando e triunfando sobre si mesmo; mais ainda, mesmo para morrer, ele precisa que alguém o ajude. E a sociedade? A sociedade, reunião de homens, é, como toda coleção, de mesma natureza que suas partes: ela é imperfeita, decaída, pautada ao mal, só conseguindo viver graças à repressão e ao freio que ela se impõe; o que é, por si, o sinal de uma muito escassa perfeição.

Eis, portanto, como, fundamentado sobre essas bases mentirosas, o naturalismo completo é uma pura mentira. E, contudo, o naturalismo ou o maçonismo é o grande sistema teórico e prático do mundo atual!

O maçonismo não difere do naturalismo; e o naturalismo, como vimos no parágrafo precedente, é a negação da queda original do homem, de sua reabilitação por Jesus Cristo, e, consequentemente, dos direitos individuais e sociais deste sobre a criatura que ele resgatou. O maçonismo não é, portanto, assim como pensam alguns, o ateísmo puro, ainda que, por uma consequência lógica, ele conduza até aí; ele não é da mesma forma nem a demagogia nem o socialismo, ainda que, por sua tendência natural, ele conduz infalivelmente a sociedade a estes extremos. Ele não é nada de tudo isso. O maçonismo se esforça para se manter na esfera habitada pelos conservadores honestos e sábios ao seu modo: ele quer que a sociedade repouse sobre seus fundamentos; ele é partidário da ordem, da equidade, do respeito mútuo entre as classes e os interesses; só que, ele quer tudo isso sem Jesus Cristo, sem o cristianismo, completamente fora da atmosfera cristã. Eis um problema difícil, bem mais, insolúvel, porque, desde que a revelação cristã se cumpriu, é impossível se subtrair dela sem cair no abismo da mais horrível anarquia individual e social. As coisas não são mais hoje o que elas eram antes da vinda de Jesus Cristo. A sociedade, ou os indivíduos que não têm sido cristãos, podem muito bem se manter em um certo estado de honestidade natural, da qual a história nos oferece alguns raros exemplos; mas a sociedade ou os indivíduos que conheceram Cristo e o negaram em seguida não podem, por um justo castigo do Céu e em virtude das leis inflexíveis da lógica, evitar cair nos abismos profundos da mais abjeta impiedade, do mais repugnante satanismo. É isso o que a história ensina e o que a experiência de cada dia demonstra. E a razão disso é fácil de entender. Aquele que não conheceu Jesus Cristo e que não tem nenhuma ideia de sua revelação, pode não ser cristão; o que é um mal considerável, mas não o pior de todos os males. Mas ter conhecido Cristo e sua revelação e apostatar em seguida, isso não é nada menos do que o anticristianismo deliberado e voluntário. Há entre estes dois estados a mesma diferença que entre a simples ignorância de uma verdade e a guerra aberta e declarada contra esta mesma verdade.

Tal é a situação hoje da maçonaria, ou melhor, do maçonismo. Seu objetivo é a organização de uma ordem social sem Cristo; mas, pela força das circunstâncias, ela se vê na obrigação de organizar uma ordem social contra Cristo. Ela gostaria simplesmente de uma sociedade não cristã, ao modo de certos povos da antiguidade; mas ela alcançou por isso mesmo uma sociedade anticristã ou satânica. Para falar mais claramente, o naturalismo pôde, um dia, não ser outra coisa senão a ausência mais ou menos culpável do sobrenaturalismo; hoje, pela força das coisas, o naturalismo só pode ser o anticristianismo.

O Papa, em sua célebre encíclica Humanum genus, percorreu as diversas esferas da ordem social onde o maçonismo, hoje dominante, deixa entrever mais claramente sua influência naturalista ou anticristã. Em sua sequência, e sob a luz de seus doutos ensinamentos, esperamos colocar estas verdades ao alcance daqueles que nunca discorreram sobre estes temas, os reduzindo aos seguintes pontos:
  • A religião;
  • O Estado;
  • A família;
  • A propriedade;
  • A educação;
  • O ensino científico;
  • A beneficência;
  • As letras e as artes;
  • Os divertimentos.
Estes são os problemas onde hoje se manifesta abertamente a oposição que existe entre o critério maçônico e o critério cristão, e dos quais a simples indicação supõe um programa de estudos que comportaria, não somente alguns curtos capítulos de uma revista popular, mas volumes e volumes. Independente de como seja, pensamos todavia que ao sublinharmos como, em cada um destes pontos, o sim maçônico é aí sempre o não cristão, e reciprocamente, esclareceremos para um grande número de nossos leitores as dúvidas que eles poderiam ter relativamente à universalidade e à preponderância do maçonismo em nossa época; e eles verão quanto é verdade o que dizíamos a pouco, a saber, que um grandiosíssimo número de pessoas que acreditam talvez de boa fé abominar cordialmente o maçonismo e a maçonaria, pensam, falam, decidem e agem maçonicamente. Eis aqui uma observação que não deixaremos jamais de repetir, e que a extrema paciência e bondade de nossos indulgentes leitores nos permitirá recordar ainda algumas vezes; pois, que eles não duvidem disso, é aí que se encontra o segredo de nossos males presentes e da formidável opressão que a tirânica maçonaria exerce sobre nós.

Dom Sarda Y Salvany. Maçonnisme et Catholicisme. P.Lethielleux, Paris, 1890.


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