“Uma manhã voltei a encontrar-me com essa senhora, que acabava de dar à luz. Ela me deteve, e me disse: ‘Doutor, lembra-se de mim? Vê isto? É o seu erro’”
Plinio
Maria Solimeo
Muitos ingênuos se perguntam por que os esquerdistas, quase na
totalidade, de modo geral são a favor do aborto, do pseudo “casamento
homossexual”, da Ideologia
de Gênero e de tantas outras aberrações morais
que surgem em nossos dias. Para constatá-lo basta ver as plataformas de nossos
partidos da esquerda tupiniquim, para os quais se trata pura e simplesmente de
uma questão ideológica, como o é para os verdadeiros conservadores a questão da
propriedade privada, da livre iniciativa, da teoria de que a vida se dá desde o
primeiro instante da concepção e da diferença salutar existente entre os sexos..
Nesse
sentido, o diário italiano “Corriere della Sera” publica uma interessante
entrevista com o médico Massimo Segato, com o título: “Confissão de um médico a respeito
do aborto: ‘Trabalho sujo, como numa guerra’”. E o subtítulo: “O Dr. Segato, radical, socialista,
ateu: ‘Eu o faço [o aborto] por senso cívico, por essas mulheres’” que o desejam.
Esse médico de 62 anos,
vice-diretor do hospital de Ginecologia de Valdagno, tem nas suas costas — e
deve responder por isso a Deus — milhares de abortos, ou seja, de bebês
assassinados no ventre materno.
Um fato ocorrido há 30 anos
começou a abalar sua ideia sobre o aborto e poderia tê-lo levado a deixar
inteiramente de fazê-lo. Mas questões ideológicas o impediram, por ser ele
socialista.
Efetuando um aborto naquela
ocasião, Segato cometeu uma barbeiragem qualquer e não matou o feto. Como
consequência, a criança nasceu normalmente. Em sua aludida entrevista, esse
médico abortista declarou ao jornal: “Uma
manhã voltei a encontrar-me com essa senhora, que acabava de dar à luz. Ela me
deteve, e me disse: ‘Doutor, lembra-se de mim? Vê isto? É o seu erro’”. E mostrou-lhe o menino não desejado,
são e salvo. Continua o médico: Era “um
lindo moreninho, já tinha cabelo, e tomava o peito tranquilo. Ela sorria. Foi
então quando tive minha primeira crise de consciência”, que não o fez mudar inteiramente sua
opinião a respeito do aborto. Hoje aquele menino tem 30 anos, bom trabalho, e
dois irmãos maiores. “Foi o
erro mais formoso de minha vida”, declara Segato.
Apesar
disso, como socialista convicto, Segato continuou a praticar abortos, mas
reduzindo seu número, pois “cada
vez que saía da sala de operações, tinha um sentimento de náuseas. Começava a
me perguntar se estava realmente fazendo o correto. Quantas crianças poderiam
ser como aquele pequeno?” Entretanto,
logo abafava esse movimento da consciência, acrescentando: “Mas respondia-me que sim, que
estava bem o que fazia. Pois o fazia por essas mulheres”. Quer dizer,
sufocava a voz de Deus em sua alma.
É claro que, para um ateu
materialista, continuar a assassinar crianças no ventre materno pode não ser
deleitável, mas não causa maiores problemas de consciência.
Quando se deu o caso do
referido bebê não desejado, esse médico assassino realizava 300 abortos por
ano! Quantas crianças sacrificadas! Isso evidencia a decadência moral da
outrora católica Itália. E escandalizava muitos: “As religiosas do hospital, quando
me viam, se persignavam; e o capelão dizia que, comparado comigo, Herodes era
um diletante, se bem que logo comíamos juntos, e nos tornamos amigos.
Eu, entretanto, continuava convencido de minha decisão. Considerava-a honrada e
cheia de sentido cívico, respeitosa da vida das mães destinadas a abortar
clandestinamente”. E a vida
das crianças abortadas? Não lhe causava, por certo, alguma dor de consciência,
que ele culposamente não dava atenção?
Hoje, 30 anos depois daquele
episódio, Segato prefere não fazer mais abortos. Faz intervenções
ginecológicas, partos, ecografias, mas não aborto, embora não tenha para isso
objeção de consciência: “Se
posso, o evito, e me sinto
contente”. Conclusão: se não pode evitar, o faz. E explica essa
contradição: “Sim, sei que eu
também deveria ser um objetante [de consciência para não fazer o aborto], mas
não o sou”. Qual a razão que ele dá? “Para
não desdizer-me com relação à minha decisão inicial” [de o fazer]. Quer dizer, é por
princípio ideológico que o faz.
Continua ele a descrever essa
sua atitude dúbia, de ver o erro, mas cometê-lo: “A verdade é que, quanto mais
passam os anos, mais desgosto encontro, e só intervenho em emergências. Mas se
acontece, não fico sereno”. Repete que, apesar da inquietação que sente
quando tem que fazer um aborto, não deixa de fazê-lo por causa de suas
convicções.
Para se justificar dessa
atitude dúbia, ele apela à sua ideologia: “Continuava
só por compromisso cívico, por coerência [doutrinária]. Alguém tinha de fazer o
trabalho sujo, e eu era um desses, e ainda sou. É como para um soldado ir à
guerra. Se o Estado decide que tem que ir à guerra, tem que ir”. Qual é o
“Estado” que o obriga a fazer abortos e ao qual ele tem que obedecer? Será o
Partido Socialista? Não o diz…
Ele
acrescenta uma coisa que é sabida, mas que na boca de um abortista tem seu
peso. Assim como ele não fica sereno quando tem que praticar um aborto, também “não estão [serenas] as mães que
durante tantos anos passaram por minha consulta. Jamais vi uma contente com seu aborto. Pelo contrário, muitas são
devoradas para sempre pelo sentimento de culpa”. [...] “Quando volto a vê-las,
dizem-me: ‘Doutor, ainda tenho aquela cicatriz, que eu levarei
para a sepultura’”.
Diante disso tudo, ele deveria
ser coerente e deixar de fazer os abortos e, a fim de reparar seus inúmeros
pecados, lutar contra a prática abortiva. Mas, não: “Logo raciocinas e te dizes que
para muitas delas teria sido pior não fazê-lo, e segues adiante, absolvendo-te
a ti mesmo”. Assim se embota uma consciência e se chega mesmo a negar a
verdade conhecida como tal. Foi o que ocorreu no dia 29 último no STF (vide
artigo publicado ontem neste site).
* * *
Há pouco o Papa Francisco estendeu a
todos os sacerdotes a absolvição nos casos de aborto, o que antes era reservado
aos bispos e motivo de excomunhão. Sem considerar outros aspectos muito
delicados da questão, a atitude do Pontífice tem sua contrapartida: procura-se
espalhar a impressão de que esse crime hediondo — como o é o assassinato de
seres inocentes — ficou transformado num pecado comum que pode ser absolvido
por qualquer sacerdote. O que diminui o horror que todo católico bem formado
deve ter a esse gravíssimo pecado que clama aos céus e, sobretudo, leva muitas
mulheres católicas a abortar, já com a intenção de depois se confessar com
qualquer sacerdote…
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