"Foi no século II que viveu a primeira
santa a experimentar o fenômeno da incorruptibilidade. Conheça a história de
Santa Cecília e saiba como seu corpo foi encontrado preservado ainda no século
XVI."
Sua Festa celebrada aos 22 de novembro
Por Joan Carroll Cruz — A
história indica que a primeira santa a experimentar o fenômeno da incorruptibilidade foi Santa Cecília, a
padroeira dos músicos. O ano de seu nascimento é desconhecido, mas acredita-se
que ela tenha morrido por volta do ano 177 depois de Cristo.
Cecília pertencia a uma rica e
distinta família romana, que, apesar do desejo da menina de permanecer virgem,
ofereceu a sua mão em casamento a um jovem nobre chamado Valeriano. Na noite de
núpcias, Cecília conseguiu convencer o seu esposo a respeitar o seu voto de
virgindade e, depois, converteu-o à fé, quando ele foi favorecido com uma visão
do seu anjo da guarda. Valeriano e o seu irmão, Tibúrcio, também convertido por
ela, foram perseguidos e instados a renunciarem à religião cristã. Como ambos
heroicamente se recusassem a fazê-lo, foram decapitados e enterrados ao longo
da Via Ápia. Cecília foi presa por ter sepultado os seus corpos e, por esse
“crime”, teve que escolher entre sacrificar aos deuses pagãos e enfrentar a
morte. Ela prontamente afirmou a sua fé e preferiu o caminho do martírio.
Por causa de sua nobreza e
juventude, os seus algozes decidiram executá-la em segredo, para evitarem as
previsíveis críticas do povo. Cecília foi presa no banheiro de sua casa para
morrer por asfixia pelos vapores d’água. Ela permaneceu um dia e uma noite
inteiros nesse ambiente sufocante, sem que lhe acontecesse qualquer mal.
Um executor experiente, então,
foi enviado para decepar-lhe a cabeça, mas, devido à falta de coragem em matar
uma mulher tão jovem e bela, ele não conseguiu cortar a sua cabeça com os três
golpes prescritos pela lei. O carrasco acabou fugindo, deixando a santa no
pavimento de seu banheiro, viva e totalmente consciente, com a cabeça cortada
pela metade. Deitada para o lado direito, com as mãos cruzadas em oração, ela
voltou a sua cabeça para o chão e continuou rezando na mesma postura por três
dias e três noites. A posição dos seus dedos, três estendidos na mão direita e
um na esquerda, foram a sua última e silenciosa profissão de fé na Santíssima
Trindade.
Os primeiros cristãos vestiram o
corpo da mártir com uma rica túnica de seda e de ouro e colocaram-no em um
caixão de cipreste na mesma posição em que ela expirou. Aos seus pés foram
colocados os mantos e panos de linho usados para coletar o seu sangue. Ela foi
sepultada nas Catacumbas de São Calisto por um bispo de nome Urbano, que também
tinha batizado o seu marido e o seu cunhado.
No ano 822, durante o período de
restauração da igreja dedicada à sua memória, o Papa Pascoal I quis transferir
os restos da santa a um lugar de honra em sua catedral, mas não conseguia
localizar o seu túmulo. A santa apareceu-lhe em uma visão extraordinária
enquanto ele rezava e contou-lhe o lugar em que estava o seu corpo. A relíquia
foi encontrada exatamente no lugar indicado. O Papa, então, colocou o corpo,
junto com os ossos do seu marido, do seu cunhado e do mártir Máximo, logo
abaixo do altar do templo.
Setecentos e setenta e sete anos
depois, em 1599, ocorreu uma das mais documentadas exumações do corpo de um santo, quando o Cardeal Paolo Emilio Sfondrati, amigo de São Filipe Néri, ordenou a restauração de algumas
partes da basílica. No dia 20 de outubro daquele ano, enquanto se trabalhava
embaixo e perto do altar-mor, dois sarcófagos de mármore branco foram
descobertos: eles correspondiam à descrição deixada por Pascoal I das urnas que
continham as relíquias dos santos mártires. O Cardeal mandou que se abrisse o
sarcófago na presença de testemunhas de inquestionável integridade. Depois que
a cobertura de mármore foi removida, o caixão original de cipreste foi
encontrado em ótimo estado de conservação. O prelado, com compreensível emoção,
levantou a tampa, deixando à vista o tesouro que havia sido guardado pelos
papas Urbano e Pascal. Os restos mortais foram encontrados na mesma posição em
que a santa tinha morrido, quase 1500 anos antes. Através de um manto de seda que modestamente cobria o seu corpo,
era possível ver o vestido dourado da santa, a ferida mortal no seu pescoço e
as roupas manchadas de sangue. O Papa Clemente VIII foi
imediatamente informado da descoberta e enviou o Cardeal Barônio para examinar
o caso, juntamente com Antonio Bosio, explorador das catacumbas de Roma, que
nos deixaram inestimáveis documentos descrevendo essa exumação.
Olhando através do velho manto
que cobria o seu corpo, eles notaram que Cecília era de baixa estatura, e que a
sua cabeça estava voltada para baixo, mas, devido a uma “santa reverência”, não
fizeram mais nenhuma examinação. Bosio registrou a sua opinião de que a santa
foi encontrada na mesma posição em que havia expirado [1].
O Cardeal Sfondrato quis guardar
como memorial desse tocante evento um pedaço do tecido coberto de sangue, e
distribuiu pequenas relíquias a vários cardeais em Roma. Mas após inspecionar o
último pedaço, que ele tinha reservado para si, o prelado descobriu grudado ao
tecido um pequeno fragmento do osso da santa, que tinha sido deslocado pela
espada e que um cristão primitivo tinha colhido sem perceber enquanto estancava
a ferida da santa mártir. Sfondrato preservou essa relíquia como um querido e
inestimável tesouro e colocou-a junto dos crânios de São Valeriano, São
Tibúrcio e São Máximo, em relicários separados para exposição [2].
O Cardeal também quis reter um
pequeno pedaço do vestido da santa e, enquanto o segurava, sentiu debaixo das
roupas da virgem as cordas e nós de uma camisa que ela provavelmente usava
como cilício [3].
A urna da santa foi colocada em
uma sala situada na parte de cima da nave da basílica, onde podia ser vista
através de uma janela com grades. A plataforma e a urna foram cobertas com
cortinas de seda douradas, e a sala foi esplendidamente decorada com
candelabros, belas lamparinas e flores de prata e ouro. Depois, o santuário foi inundado de um misterioso e agradável odor
de rosas que procedia do caixão [4].
Por ordem do Papa Clemente VIII,
a relíquia foi deixada exposta ali até a festa de Santa Cecília, no dia 22 de
novembro, e tão grande era a multidão de fiéis romanos que acorreram à basílica
que a Guarda Suíça foi chamada ao local para manter a ordem [5].
Após o período de um mês de
exposição, a relíquia, ainda repousando no antigo caixão de cipreste, foi
colocada em um novo caixão de prata, comissionado pelo próprio Papa como
símbolo de sua veneração pela santa mártir. Na presença de 42 cardeais e
representantes diplomáticos de vários países, o Papa celebrou uma Missa Solene
durante a qual o corpo da santa foi novamente depositado sob o altar principal.
Um escultor de talento incomum,
Stefano Maderno (1576-1636), que parecia empenhado em desempenhar o seu ofício
durante a restauração da basílica, esculpiu uma imagem da santa, que é reputada
como uma das mais celebradas e conhecidas obras de arte da Itália. Acredita-se
que Maderno tenha representado a santa na exata posição em que permaneceu o seu
corpo incorrupto. Essa estátua é encontrada imediatamente em frente ao
altar-mor em um nicho de mármore preto, que foi designado pelo artista para dar
a impressão de um sarcófago aberto. Fazendo isso, Maderno introduziu um novo
design de altar, que foi frequentemente imitado depois [6].
Acredita-se que a Basílica de
Santa Cecília tenha sido construída no local em que estava a mansão de sua
família. A segunda capela, na nave lateral à direita, é chamada de caldário (caldarium, em latim) e é o quarto onde a santa foi
condenada à morte. Aí são encontrados os restos de uma antiga banheira romana;
os dutos, que continham a água aquecida, estão preservados. A peça de mármore
sobre o altar é aquela em que se acredita que Cecília tenha sobrevivido ao
primeiro martírio por asfixia, e pode muito bem ser a laje que marcou o lugar
de sua morte.
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Por Joan Carroll Cruz | Tradução: Equipe Christo Nihil Praeponere
CRUZ, Joan Carroll. The Incorruptibles. Charlotte: TAN Books, 2012, pp.
1-4.
Referências
2. Ibid., p. 522.
4. Ibid., p. 284.
5. Pastor, op. cit., p. 523.
6. Ibid., p. 525.
Que surpreendente história, mas muito triste. Eu como músico fiquei muito comovido. Que ela esteja agora com Deus e Jesus Cristo na glória. Gostei de conhecer a sua história embora muito triste.
ResponderExcluirNa igreja de Santa Cecília, em São Paulo, havia um corpo de criança, que mesmo décadas após sua morte, estava totalmente preservado. Ele ficava à esquerda (de quando se entra na igreja), quase perto do altar, em um nicho "relicario", com visor lateral em vidro, onde viamos o corpo deitado, impressionantemente intacto e com até mesmo marcas de terra que marcaram sua pele, por ter ficado anos enterrado. Meu pai levou-me para vê-la e contou a história também triste de sua morte, mas não lembro-me como foi com precisão. Me disseram que este corpo não se encontra mais neste local. Alguém saberia dizer se é verdade que foi retirado? E se for verdade, que fim levou? Agora procurando informações sobre este corpo, deparei-me com a história da Santa, e entendi o porquê ele se encontrava em exposição nesta igreja. Sou católico, e desde esta visita, este assunto me mobiliza. Lembro-me de ter assistido a uma entrevista com Padre Quevedo, em que ele disse que apenas em locais (países) que conservavam a religião católica, este fenômeno ocorre. Que na inglaterra por exemplo, os últimos casos conhecidos, são de pessoas que morreram antes da reforma anglicana. Alguém conhece alguma(s) boa(s) literatura(s) sobre o assunto? Tanto do ponto de vista religioso quanto científico? Grato.
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