30/11/2017

30 de novembro de 1969, o fim de uma era

“E já que em tais missas a iniquidade e a idolatria são manifestantes, nas quais o sacerdote sozinho faz a oblação satisfatória e a aplica pelos vivos e pleos mortos a seu bel prazer, todas essas missas papistas devem ser claramente removidas das igrejas cristãs. - Thomas Cranmer ”.

30 de novembro de 1969, primeiro domingo do Advento, Paulo VI introduz um rito novo na Igreja em substituição a Santa Missa de Sempre. Inspirada em rito protestante, essa liturgia marcou o antes e depois na Igreja Católica, separou o rebanho, destruiu altares, colaborou com o êxodo dos fiéis.
Dom Castro Mayer, um dos poucos que lutou contra os ataques ferozes à Igreja, encaminhou a Paulo VI uma carta em setembro de 1969, alertando, demonstrando e apontando os erros que há na nova liturgia.
Nesta data em que relembramos a infeliz comemoração, publicamos a carta do valente Bispo brasileiro.
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Festa de Santo André, Apóstolo

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 + Dom Antônio de Castro Mayer
Uma das primeiras reações contrárias à Missa Nova de Paulo VI, 12 de setembro de 1969. Carta inédita do Bispo Diocesano de Campos, Dom Antonio de Castro Mayer ao papa Paulo VI, antes da entrada em vigor do novo rito da Missa. Anexas à carta enviava também ao Papa "Considerações sobre o Novus Ordo Missae”. 
Campos, 12 de setembro de 1969
Beatíssimo Padre,
Tendo examinado atentamente o “Novus Ordo Missae”, a entrar em vigor no próximo dia 30 de novembro, depois de muito rezar e refletir, julguei de meu dever, como sacerdote e como bispo, apresentar a Vossa Santidade, minha angústia de consciência, e formular, com a piedade e confiança filiais que devo ao Vigário de Jesus Cristo, uma súplica.
O “Novus Ordo Missae”, pelas omissões e mutações que introduz no Ordinário da Missa, e por muitas de suas normas gerais que indicam o conceito e a natureza do novo Missal, em pontos essenciais, não exprime, como deveria, a Teologia do Santo Sacrifício da Eucaristia, estabelecida pelo Sacrossanto Concílio de Trento, na sessão XXII. Fato que a simples catequese não consegue contrabalançar. Em anexo, junto as razões que, a meu ver, justificam esta conclusão. 
Os motivos de ordem pastoral que, eventualmente, poderiam ser alegados a favor da nova estrutura da Missa, primeiro, não podem chegar ao ponto de deixar no olvido os argumentos de ordem dogmática que militam em sentido contrário; depois, não parecem procedentes. As mudanças que preparam o “Novus Ordo” não contribuíram para aumentar a Fé e a piedade dos fiéis. Pelo contrário, deixaram-nos apreensivos, apreensão que o “Novus Ordo” aumentou; porquanto, abonou a idéia de que nada há de imutável na Santa Igreja, nem mesmo o Sacrossanto Sacrifício da Missa.
Além disso, como saliento nas folhas juntas, o “Novus Ordo” não só não afervora, senão que extenua a fé nas verdades centrais da vida católica, como a presença Real de Jesus na SS. Eucaristia, a realidade do Sacrifício propiciatório, o sacerdócio hierárquico.
Cumpro, assim, um imperioso dever de consciência, suplicando, humilde e respeitosamente, a Vossa Santidade, se digne, por um ato positivo que elimine qualquer dúvida, autorizar-nos a continuar no uso do “Ordo Missae” de S. Pio V, cuja eficácia na dilatação da Santa Igreja, e no afervoramento de sacerdotes e fiéis, é lembrada, com tanta unção, por Vossa Santidade.
Estou certo que a Paterna Benevolência de Vossa Santidade não deixará de afastar as perplexidades que me angustiam o coração de sacerdote e bispo.
Prostrado aos pés de Vossa Santidade, com humilde obediência e filial piedade, imploro a Bênção Apostólica. 
a) + Antonio de Castro Mayer
Bispo de Campos (Brasil)
Considerações sobre o “Novus Ordo Missae”
Documento endereçado por Dom Antonio de Castro Mayer ao Papa Paulo VI sobre a Nova Missa, junto com a carta precedente. 
O novo “Ordo Missae” consta de normas gerais do texto do Ordinário da Missa. Umas e outro propõem uma nova Missa que não atende, suficientemente, às definições do Concílio de Trento a respeito, e constitui, por isso mesmo, grave perigo para a integridade e pureza da Fé Católica. Examinamos aqui, apenas, alguns pontos, que, nos parece, evidenciam o que afirmamos.
1. Noção de Misssa. - No n. 7 o Novo “Ordo” dá uma como que definição da Missa: "Coena dominica sive Missa est sacra synaxis seu congregatio populi Dei in unum convenientis, sacerdote praeside, ad memoriale Domini celebrandum. Quare de sanctae ecclesiae locali congregatione eminenter valet promissio Christi: “Ubi sunt duo vel tres congregati in nomine meo, ibi sum in medio eorum (Mat. 18)”. [A Ceia do Senhor ou Missa é a sagrada assembléia ou reunião do povo de Deus, sob a presidência do sacerdote, para celebrar o memorial do Senhor. Por isso, a respeito desta reunião da santa igreja local vale a promessa de Cristo: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estarei no meio deles” (Mat. 18).
Nesta definição, a) Insiste-se na Missa como ceia. Aliás, esta conceituação de Missa, ocorre com freqüência, em todo o decurso das normas gerais (cfr. nº 8, 48, 55d, 56, etc.). Parece mesmo que a intenção do novo “Ordo Missae” é inculcar este aspecto da Missa. O que é feito com detrimento do outro, essencial, isto é, que a Missa é um sacrifício. De fato, b) na quase definição de Missa do nº 7, não se declara o caráter de sacrifício da Missa, como, c) não se salienta o caráter sacramental do sacerdote que o distingue dos fiéis. Além disso, d) nada diz do valor intrínseco da Missa independente da presença da assembléia. Antes, faz supor que não há Missa sem a “congregatio populi” [reunião do povo], pois é a “congregatio” que define a Missa. Enfim, e) o texto deixa uma confusão entre a Presença real e a presença espiritual, porquanto aplica à Missa o texto de S. Mateus, no qual se trata apenas da presença espiritual.
O equívoco entre a Presença real e a presença espiritual, notado no nº 7, é confirmado pelo que diz o nº 8, que divide a Missa em “mesa da palavra” e “mesa do Corpo do Senhor”, e igualmente oculta o caráter de sacrifício que é principal na Missa, pois que a ceia não passa de uma conseqüência, como se pode deduzir do cân. 3 da ses. XXII do Concílio de Trento.
Observamos que os dois textos do Vaticano II, alegados na nota, não justificam a noção de Missa proposta no texto. Observamos ainda que algumas expressões, mais ou menos incidentes, nas quais ocorrem afirmações como esta que no altar “sacrificium crucis sub signis sacramentalibus praesens efficitur” (n. 259) [Torna-se presente o sacrifício da cruz sob sinais sacramentais,] não são suficientes para dissipar um conceito equívoco, inculcado ao se descrever a Missa (n. 7) e em muitos outros lugares das normas gerais.
2. Finalidade da Missa. A Missa é sacrifício de louvor à SS. Trindade. Tal finalidade não aparece de modo explícito no Novo "Ordo". Pelo contrário, o que, na Missa de S. Pio V, salientava esse fim do Sacrifício, foi supresso no Novo "Ordo". Assim, as orações: "Suscipe, Sancta Trinitas..." do Ofertório, a final "Placeat, tibi, Sancta Trinitas..."; assim, igualmente o Prefácio da SS. Trindade deixou de ser o Prefácio do Domingo, Dia do Senhor.
Além de "Sacrificium laudis SS. Trinitatis", a Missa é Sacrifício propiciatório. Sobre esse caráter, contra os erros dos protestantes, insiste muito o Tridentino (cap. I e cân 3). Tal finalidade não aparece explícita no Novo "Ordo". Aqui e acolá ocorre uma ou outra expressão que se poderia entender como envolvendo esse conceito. Jamais ele aparece sem sombra de dúvida. E ele está ausente quando as normas declaram a finalidade da Missa (n. 54). De fato, não é suficiente para atender à Teologia da Missa estabelecida pelo Tridentino, afirmar que esta colima a "santificação". Não é claro que este conceito envolva necessariamente o outro, de propiciação. Além disso, a intenção propiciatória bem indicada na Missa de São Pio V, desaparece na nova Missa. De fato, as orações do Ofertório, "Suscipe Sancte Pater...", "Offerimus, Tibi..." e a da benção da água: "Deus qui humanae substantiae... reformasti..." foram substituídas por outras que nada dizem de propiciação. Inculcam mais o sentido de banquete espiritual "panis vitae" [pão da vida], "potus spiritualis" [bebida espiritual].
3. Essência do Sacrifício. - A essência do Sacrifício da Missa está na repetição do que fez Jesus na última ceia; não na mera narração, ainda que acompanhada de gestos. Assim, advertem os moralistas que não basta relatar historicamente o que Jesus fez. É necessário pronunciar as palavras da consagração com intenção de repetir o que Jesus realizou, porquanto o sacerdote, ao celebrar, representa Jesus Cristo, opera "in persona Christi". No novo "Ordo" não se toma em consideração semelhante precisão, no entanto, essencial. Pelo contrário, ao passo que sublinha a parte narrativa, nada diz da parte propriamente sacrifical. Assim, ao expor a Prece eucarística fala de "narratio institutionis" (n. 54 d) [narração da instituição]; de maneira que as expressões "Ecclesia memoriam ipsius Christi agit" [A Igreja faz a memória do próprio Cristo] e a outra do final da consagração: "Hoc facite in meam commemorationem" [fazei isto em minha memória] têm o sentido indicado pela explanação dada anteriormente nas normas gerais (n. 54 d). Observamos que a frase final da consagração, "Haec quotiescumque feceritis, in mei memoriam facietis" [todas as vezes que fizerdes isto, fazei-o em minha memória] era muito mais expressiva para dizer que, na Missa, repetia-se a ação de Jesus Cristo. - Acresce que a introdução, entre as palavras essenciais da consagração, das expressões: "Accipite et manducate ex hoc omnes" [Tomai e comei dele todos], e "Accipite et bibite ex eo omnes" [Tomai e bebei dele todos] levam a parte narrativa dentro do mesmo ato sacrifical. De maneira que, na Missa de S. Pio V, o texto e os gestos orientavam, naturalmente, o sacerdote para a ação sacrifical propiciatória, quase impunham a intenção ao sacerdote que celebrava. E assim, a "lex supplicandi" [lei da oração] se conformava perfeitamente à "lex credendi" [lei da fé]. Não se pode dizer o mesmo do novo "Ordo Missae". No entanto, dada a gravidade da ação, e mais os tempos modernos excessivamente trepidantes, e dadas ainda as condições psicológicas das novas gerações, o "Ordo Missae" deveria facilitar o celebrante a ter presente a intenção necessária para realizar válida e condignamente o ato do Santo Sacrifício.
4. Presença Real. O Sacrifício da Missa está intimamente ligado à presença real de Jesus Cristo na SS. Eucaristia. Essa é conseqüência daquela. Na transubstanciação opera-se a mudança da substância do pão e do vinho no Corpo e Sangue do Salvador, e realiza-se o sacrifício. Como conseqüência, permanece no altar a vítima perene. A Hóstia do Sacrifício, que permanece, passado o ato sacrifical. O Novo "Ordo", desde a definição da Missa (n. 7) deixa pairar uma ambigüidade sobre a presença real, mais ou menos confundida com a presença meramente espiritual, na oração de dois ou três congregados no nome de Jesus. Depois, a supressão de quase todas as genuflexões - maneira tradicional de adorar entre os latinos - a ação de graças sentado, a possibilidade de celebração sem a pedra d'ara, em simples mesa, a equiparação do manjar eucarístico com o manjar espiritual, tudo é de molde a obscurecer a fé na Presença real. - A última consideração sobre a equiparação entre o manjar eucarístico e o manjar espiritual, deixa no ar a idéia de que a Presença de Jesus na SS. Eucaristia está no uso, como acontece com a palavra de Deus. E daí a resvalar para o erro dos luteranos não é tão difícil, especialmente numa sociedade pouco dada à reflexão de ordem transcendente. Igual conclusão é favorecida pela função do altar: é ele apenas a mesa, onde não há, normalmente, lugar para o Sacrário, onde habitualmente se conserva a Vítima do Sacrifício. Também a disciplina no sentido de levar os fiéis a comungarem da mesma hóstia que o celebrante, de si, cria a idéia de que, acabado o sacrifício, não há mais lugar para a sagrada reserva. Assim, toda a disposição do Novo “Ordo Missae” não só não afervora a fé na presença real, senão que a diminui.
5. Sacerdócio hierárquico. Define o Tridentino que Jesus instituiu os apóstolos sacerdotes para que eles e outros sacerdotes, seus sucessores, oferecessem seu Corpo e Sangue (cân, 2, ses. 22). De maneira que a realização do Sacrifício da Missa é ato que exige a consagração sacerdotal. Por outro lado, o mesmo Concílio de Trento condena a tese protestante que faz de todos os cristãos sacerdotes do Novo Testamento. Vê-se, pois que, segundo a fé, só o sacerdote hierárquico é capaz de realizar o Sacrifício da Nova Lei. Esta verdade é diluída no Novo “Ordo Missae”. Neste “Ordo” a Missa é mais do povo do que do sacerdote. É também do sacerdote, porque este faz parte da multidão. Não aparece como o mediador “ex hominibus assumptus in iis quae sunt ad Deum” [tomado dentre os homens para aquelas coisas que se referem a Deus], inferior a Jesus Cristo e superior aos fiéis, como diz S. Roberto Belarmino. Ele não é o juiz que absolve. É simplesmente o irmão que preside.
Outras observações poderíamos fazer que confirmariam o que acima dizemos. Julgamos, no entanto, que as questões apontadas bastam para mostrar que o novo “Ordo Missae” não se ajusta à Teologia da Missa, estabelecida de modo definitivo pelo Concílio de Trento, e por isso, constitui um grave perigo para a pureza da Fé.
Publicado em Jornal ONTEM HOJE SEMPRE 
Campos, janeiro-março de 2000


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