07/08/2018

FSSPX/Itália – Sobre a Mudança no Catecismo

"Com um rescrito ex audientia Sanctissimi, a Congregação para a Doutrina da Fé nos informa que outro elemento da religião católica deve ser considerado oficialmente modificado: a doutrina sobre a licitude da pena de morte".

A doutrina sobre a pena de morte, modernismo e Papa Francisco

Tradução: Carlos Wolkartt – Catolicidade.com

Com um rescrito ex audientia Sanctissimi, a Congregação para a Doutrina da Fé nos informa que outro elemento da religião católica deve ser considerado oficialmente modificado: a doutrina sobre a licitude da pena de morte.

O Catecismo publicado por João Paulo II, embora contendo as inovações conciliares, ainda admitia (embora teoricamente) que a autoridade civil podia impor a pena capital em casos de extrema gravidade. Ao invés disso, a mudança no número 2267 do catecismo mencionada acima nos informa que, ao contrário do que foi dito no passado, “a Igreja ensina, no Novo Catecismo, à luz do Evangelho, que ‘a pena de morte é inadmissível, porque atenta contra a inviolabilidade e dignidade da pessoa’, e se compromete, com determinação, em prol da sua abolição no mundo inteiro”. É especificado, seguindo a doutrina conciliar, que a dignidade humana nunca pode ser perdida, nem mesmo devido a crimes gravíssimos (Santo Tomás de Aquino fez um discurso oposto).

Essa inovação foi anunciada no discurso de 11 de outubro de 2017 aos participantes do encontro promovido pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, e comentada por nós na Convenção de Rimini no final de outubro de 2017. Por mais grave que seja a alteração da doutrina católica já num enésimo ponto, gostaríamos de sublinhar quais princípios provêm de tal possibilidade, princípios especialmente enfatizados pelo Papa Francisco no discurso aqui mencionado. De onde pode vir o conhecimento de uma doutrina diferente da transmitida? Talvez as fontes do Apocalipse tenham sido lidas com mais precisão? Talvez até agora a infalibilidade tenha cochilado? O Papa Francisco responde enunciando a típica doutrina modernista sobre a evolução do dogma, ao mesmo tempo em que faz um apelo completamente retórico ao “Evangelho”. Vamos ver o que diz o discurso mencionado acima.

O Papa Bergoglio afirma claramente, em relação ao catecismo, que “não basta encontrar uma nova linguagem para expressar a fé de sempre; é necessário e urgente também que, perante os novos desafios e perspectivas que se abrem à humanidade, a Igreja possa exprimir as novidades do Evangelho de Cristo que, embora contidas na Palavra de Deus, ainda não vieram à luz”. Não se iludam aqueles que veem no novo curso eclesial uma simples mudança de linguagem: a fé de sempre não basta, nem é suficiente encontrar uma maneira de expressá-la de forma adequada ao homem de hoje — um verdadeiro processo profético deve entrar em ação, atendendo às necessidades (“desafios”) do homem moderno como uma verdadeira fonte de revelação divina. Francisco torna-se ainda mais explícito: “conhecer Deus não é primariamente um exercício teórico da razão humana, mas um desejo inextinguível impresso no coração de cada pessoa. É o conhecimento que provém do amor, porque encontramos o Filho de Deus no nosso caminho (cf. Carta enc. Lumen fidei, 28)”. Palavras que são aparentemente fascinantes, mas que revelam o pensamento modernista sobre a fé: não há verdades reveladas para serem aceitas, mas um “desejo” do divino que está dentro do homem. Obviamente, esse desejo não está relacionado com a revelação de verdades externas ao homem (aceitas pela razão iluminada pela fé — e por isso mesmo imutáveis), mas pode ser explicado de diversas maneiras, dependendo das circunstâncias dos tempos ou lugares: assim nascem as várias religiões, e assim são infinitas as mudanças nas doutrinas, de acordo com as necessidades e sensibilidades dos tempos. Uma sociedade religiosa organizada como a Igreja Católica não poderá ignorar a mudança de sensibilidade e, no devido tempo, terá de fazer a própria experiência de seu momento histórico que, ao reler o Evangelho, descobre “coisas novas”. Aqueles que não o fizeram, indubitavelmente resistiram ao “Espírito Santo”, que seria apenas o espírito do mundo e da história. A operação, concluída com êxito, pela liberdade religiosa e ecumenismo no Concílio e pela “família” no sínodo do Papa Bergoglio, é agora estendida ao tema sensível da pena de morte.

Efetivamente, o Papa prossegue de maneira ainda mais explícita: “Esta problemática [da pena de morte] não pode ficar reduzida a mera recordação histórica da doutrina, sem se fazer sobressair, por um lado, o progresso na doutrina operado pelos últimos Pontífices e, por outro, a renovada consciência do povo cristão, que recusa uma postura de anuência quanto a uma pena que lesa gravemente a dignidade humana. Deve afirmar-se energicamente que a condenação à pena de morte é uma medida desumana que, independentemente do modo como for realizada, humilha a dignidade pessoal”. Aqui a “renovada consciência do povo” é claramente apresentada como uma “fonte” da doutrina católica. E continua: “A Tradição é uma realidade viva; e somente uma visão parcial pode conceber o ‘depósito da fé’ como algo de estático. A Palavra de Deus não pode ser conservada em naftalina, como se se tratasse de uma velha coberta que é preciso proteger da traça! Não. A Palavra de Deus é uma realidade dinâmica, sempre viva, que progride e cresce, porque tende para uma perfeição que os homens não podem deter”. O apelo contra uma revelação permanente é claro: não se deve transmitir (seria “conservar em naftalina”), mas progredir em direção a um “cumprimento”, de modo incessante, sob pena de pecado contra o Espírito Santo, explicitamente evocado um pouco abaixo: “Não se pode conservar a doutrina sem a fazer progredir, nem se pode prendê-la a uma leitura rígida e imutável, sem humilhar a ação do Espírito Santo. Deus, que ‘muitas vezes e de muitos modos, falou aos nossos pais, nos tempos antigos’ (Heb 1, 1), ‘dialoga sem interrupção com a esposa do seu amado Filho’ (Dei Verbum, 8). E nós somos chamados a assumir esta voz com uma atitude de ‘escuta religiosa’ (ibid., 1), para permitir que a nossa existência eclesial progrida, com o mesmo entusiasmo dos primórdios, rumo aos novos horizontes que o Senhor pretende fazer-nos alcançar”.

Não se poderia esperar uma exposição mais clara da doutrina modernista sobre a evolução do dogma, embora o Papa Francisco repita várias vezes que “não se trata de uma mudança de doutrina”. Aqueles que pensam como católico e acham que a doutrina da Igreja corresponde a uma revelação concluída que deve ser transmitida, não deixará de ver a contradição irreconciliável, e é preciso perguntar se a Igreja errou até agora ou se errou o Papa Francisco; em última análise, se Cristo disse que a pena de morte é lícita ou o contrário. O modernista, por outro lado, não verá contradições: Deus não revelou uma doutrina, mas está dentro de nós, e a ideia que nos foi dada pelo “Cristo histórico” (quem sabe o que ele disse: não havia registradores…) nos faz viver uma experiência religiosa que compartilhamos na Igreja, com fórmulas acordadas entre nós. Esta é a ação “profética” do “Espírito Santo”, que nunca cessa, especialmente quando tentamos reviver “o entusiasmo dos primórdios”. Assim, harmonizemos nossas necessidades e desejos renovados em novas fórmulas, sugeridas a nós pelo espírito da história que é o próprio Deus, e ao qual não devemos resistir (e que, em qualquer caso, não pode ser “detido”). Exatamente a doutrina que São Pio X condenou na encíclica Pascendi.

No momento em que tal variação doutrinária é imposta aos fiéis de maneira oficial, é dever de todos permanecer fiel à doutrina tradicional definida pela Igreja e professá-la, na forma e nos momentos apropriados, assim como fez Mons. Lefebvre contra os erros do Concílio.

Um comentário:

  1. Bom dia Roosevelt.
    A pena capital sempre foi e será um tema espinhoso. Porém, a Igreja, por séculos, manteve se posicionamento sobre a questão, entendendo ser lícita sua aplicação em determinados casos. Sendo dever de todo fiel manter-se na linha adotada pelo Magistério.

    O problema das mudanças pós-conciliares é sua vinculação a uma nova teologia, ou, melhor dizendo, sua vinculação a uma interpretação da religião como experiência em constante progressão, dependente apenas do homem, e não como um dado revelado. Daí a evolução(sic) não só do dogma, mas da doutrina. Isto para não mencionar as mudanças na liturgia.
    Fica evidente que a visão progressista-modernista é agnóstica, ou seja, não tem mais a fé.
    Resistamos firmes na fé, pois, com a Graça de Deus Todo Poderoso, nestes tempos confusos.

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