"E a comunhão não somente está sendo dada de qualquer modo, mas também por qualquer pessoa e a qualquer um."
A resposta se encontra nas milhares de páginas dos inumeráveis livros que relatam a apostasia das nações católicas desde a Revolução Francesa. Encontra-se também em todos os livros, pregações, iniciativas que reagem à apostasia do clero – e consequentemente dos fiéis – desde o Concílio Vaticano II, definido pelo Cardeal Léon-Joseph Suenens como uma verdadeira “revolução de 1789 na Igreja”. O Padre Yves Congar também fala sem ambiguidades sobre o Concílio: “A Igreja fez pacificamente a sua revolução de Outubro” (Yves Congar, O.P.Le Concile au jour le jour le jour. Segunda Sessão, Paris, 1964, p. 215). Mas destaquemos dois dos fatos mais graves.
No século XX, surgiu a noção de crime contra a humanidade: essa qualificação poderia ser mais adequada a algo que não fosse o aborto? O aborto é a supressão da criança por nascer (seja qual for o nome que lhe seja dado, de acordo com o seu desenvolvimento: ovo, embrião, feto) – é, portanto, a supressão de uma vida humana inocente. É, sem dúvida, o crime mais abominável de que a humanidade é culpada – abominável devido ao número, à inocência e à fragilidade das vítimas. Nessa mesma linha, devem ser mencionadas todas as infâmias cometidas contra crianças. Tais crimes são ainda mais hediondos quando são perpetrados pelas próprias pessoas que deveriam proteger as crianças e lhes dar um modelo de virtude: pais (no sentido mais amplo), educadores e clérigos. A condenação de Nosso Senhor é implacável: “Mas, se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem em mim, melhor fora que lhe atassem ao pescoço a mó de um moinho, e o lançassem no fundo do mar….aí do homem por quem vem o escândalo”. (Matth. XVIII, 6-7)
Outro crime que tristemente caracteriza nosso tempo são as profanações eucarísticas. E também aqui não estamos falando de satanistas e de outros ímpios, mas daqueles que têm a custódia do precioso tesouro da Santa Hóstia. Sob o pontificado de Paulo VI, a comunhão na mão se tornou generalizada; tal prática é a ocasião de inúmeros sacrilégios. Se os mesmos vasos sagrados, que preservam as hóstias consagradas, devem ser cobertos com ouro, ao menos em seu interior, todos podemos constatar nesse aspecto o desrespeito que se encontra na Jornada Mundial para a Juventude, quando se distribuiu a comunhão em copos de plástico.
E a comunhão não somente está sendo dada de qualquer modo, mas também por qualquer pessoa e a qualquer um. A comunhão se tornou um rito coletivo de participação na cerimônia, sem que haja a preocupação se os comungantes estão em estado de graça, ou até mesmo se são católicos. Essa situação não é o resultado de um pequeno número de desvios na Igreja, mas de uma norma comum há décadas, em todos os países e níveis da hierarquia eclesiástica. Nosso Senhor, perfeitamente puro, inocente de qualquer crime, fez-se pequeno, frágil e discreto na Eucaristia, para permanecer entre nós em todos os momentos e em todos os lugares. Ai daqueles que abusam da sua bondade!“Portanto, todo aquele que comer este pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor… Porque todo aquele que o come e bebe indignamente, come e bebe a sua própria condenação, por não distinguir o corpo do Senhor”. (I Cor. XI, 27-29)
Então, o que nós fizemos ao Bom Deus? Parece que respondemos o suficiente. Estamos no tempo da Páscoa e a epidemia mundial que estamos vivendo assemelha-se muito a um castigo. No Antigo Testamento, a Páscoa judaica celebrava a libertação dos hebreus do Egito – e o faraó, tendo endurecido o seu coração, fez o seu povo pagar um preço elevado. Rezemos para que os faraós modernos se submetam rapidamente à vontade divina.
Padre Francisco
São Paulo, 24 de Abril de 2020
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