Seja por sempre e em todas partes conhecido, adorado, bendito, amado, servido e glorificado o diviníssimo Coração de Jesus e o Imaculado Coração de Maria.

Nota do blog Salve Regina: “Nós aderimos de todo o coração e com toda a nossa alma à Roma católica, guardiã da fé católica e das tradições necessárias para a manutenção dessa fé, à Roma eterna, mestra de sabedoria e de verdade. Pelo contrário, negamo-nos e sempre nos temos negado a seguir a Roma de tendência neomodernista e neoprotestante que se manifestou claramente no Concílio Vaticano II, e depois do Concílio em todas as reformas que dele surgiram.” Mons. Marcel Lefebvre

Pax Domini sit semper tecum

Item 4º do Juramento Anti-modernista São PIO X: "Eu sinceramente mantenho que a Doutrina da Fé nos foi trazida desde os Apóstolos pelos Padres ortodoxos com exatamente o mesmo significado e sempre com o mesmo propósito. Assim sendo, eu rejeito inteiramente a falsa representação herética de que os dogmas evoluem e se modificam de um significado para outro diferente do que a Igreja antes manteve. Condeno também todo erro segundo o qual, no lugar do divino Depósito que foi confiado à esposa de Cristo para que ela o guardasse, há apenas uma invenção filosófica ou produto de consciência humana que foi gradualmente desenvolvida pelo esforço humano e continuará a se desenvolver indefinidamente" - JURAMENTO ANTI-MODERNISTA

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Eu conservo a MISSA TRADICIONAL, aquela que foi codificada, não fabricada, por São Pio V no século XVI, conforme um costume multissecular. Eu recuso, portanto, o ORDO MISSAE de Paulo VI”. - Declaração do Pe. Camel.

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Ao negar a celebração da Missa Tradicional ou ao obstruir e a discriminar, comportam-se como um administrador infiel e caprichoso que, contrariamente às instruções do pai da casa - tem a despensa trancada ou como uma madrasta má que dá às crianças uma dose deficiente. É possível que esses clérigos tenham medo do grande poder da verdade que irradia da celebração da Missa Tradicional. Pode comparar-se a Missa Tradicional a um leão: soltem-no e ele defender-se-á sozinho”. - D. Athanasius Schneider

"Os inimigos declarados de Deus e da Igreja devem ser difamados tanto quanto se possa (desde que não se falte à verdade), sendo obra de caridade gritar: Eis o lobo!, quando está entre o rebanho, ou em qualquer lugar onde seja encontrado".- São Francisco de Sales

“E eu lhes digo que o protestantismo não é cristianismo puro, nem cristianismo de espécie alguma; é pseudocristianismo, um cristianismo falso. Nem sequer tem os protestantes direito de se chamarem cristãos”. - Padre Amando Adriano Lochu

"MALDITOS os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável SALVADOR seja posto lado a lado com Buda e Maomé em não sei que panteão de falsos deuses". - Padre Emmanuel

“O conteúdo das publicações são de inteira responsabilidade de seus autores indicados nas matérias ou nas citações das referidas fontes de origem, não significando, pelos administradores do blog, a inteira adesão das ideias expressas.”

12/06/2012

A SEMANA CRISTÃ - CURSO DE LITURGIA PE. JOÃO BATISTA REUS, S. J.


CURSO DE LITURGIA
PE. JOÃO BATISTA REUS, S. J.
PROFESSOR DO SEMINÁRIO CENTRAL DE SÃO LEOPOLDO, R. G. S.

§ 62. A SEMANA

O DOMINGO
249. A semana cristã é a continuação da semana israelítica. Mas o sábado, como dia do culto divino, foi substituído pelo domingo.
1. Os primeiros cristãos estavam acostumados a guardar o sábado, o último dia da semana. Depois de acabar este dia (mais ou menos às 6 horas da tarde), celebravam o santo mistério da missa e comunhão no primeiro dia da semana. Assim sabemos que S. Paulo reuniu os cristãos de Trôade para partir o pão eucarístico una sabbati, "no primeiro dia depois do sábado". Em Corinto (1 Cor 16, 2) os cristãos se reuniram pela primeira vez per unam sabbati.No Apocalipse de S. João (1, 10) este dia pela primeira vez é chamado: dia do Senhor (dies dominica, domingo).
Em breve o domingo foi recebido pelo uso geral, a ponto de ficarem as seitas mais antigas, p. ex., os ebionitas, com o domingo ao lado do sábado, ao qual deram preferência. O domingo foi chamado também dies solis, o dia do sol, pois que Jesus Cristo é o verdadeiro sol de justiça e santidade.

250.2. A Igreja tem o poder de substituir o sábado pelo domingo. Pois Jesus Cristo aboliu as leis cerimoniais do antigo testamento pela sua morte. Por isso, avisa S. Paulo os cristãos perseguidos por não observarem as leis cerimoniais judaicas (Col 2, 16) que não se importassem com as festas da lua nova ou do sábado. Pois tudo isso era figura do futuro, que se achava cumprido em Jesus Cristo e por conseguinte não tinha mais força obrigatória.

251.3. Motivos para celebrar o domingo.
1) A ressurreição de Jesus Cristo no primeiro dia da semana, mistério fundamental da fé cristã. Por isso nos domingos se recita o Sl 117, que traz as palavras da antífona pascoal:"Heec dies quam fecit dominus: exsultemus et lwtemur in ea." O Senhor mesmo aplicou estas palavras à sua ressurreição (Mt 21, 42): "Nunquam legistis in scripturis: a domino factum est istud et est mirabile in oculis nostris?" São Pedro alude ao mesmo salmo. (At 4, 11; 1 Ped 2, 7.) Por isso, as antífonas das Laudes e Horas menores vêm acompanhadas de 1 ou 3 aleluias como no tempo pascal; não se jejua nem se reza de joelhos, p. ex., as antífonas marianas, o anjo do Senhor. S. Agostinho explica este costume, dizendo (Ep. 55, 28): Stantes oramus, quod est signum resurrectionis.
2) O dia da criação do mundo. Lembrança disso há nas vésperas: Lucis Creator optime.
3) O dia dá descida do Espírito Santo. Por isso o domingo era "o dia da Liturgia" e o tipo de todas as festas, que durante o ano eclesiástico se celebravam com vigília e descanso dominical. (Piacenza, Reg. p. 29.)

252.Sendo comemoradas assim as três Pessoas divinas no domingo, foi ele considerado como dedicado à SS. Trindade. Fala deste santo mistério o hino das matinas: "Primo die quo Trinitas Beata mundum condidit"; o responsório 8 com o Sanctus, Sanctus, Sanctus, o símboloQuicumque, o prefácio da SS. Trindade.
Mas o domingo não foi igualmente por toda parte considerado primeiro dia da semana. Em vários países era o último dia da semana, porquanto esta começava pela segunda-feira. Pela legislação eclesiástica e civil o domingo se tornou dia de descanso no sentido cristão desde o século IV. Assistir à missa nos domingos tornou-se obrigação para todos os adultos desde o princípio do século IV. (Sínodo de Elvira, 306.)

§ 63. DIVISÃO DOS DOMINGOS

253.1. Classes. No missal, p. ex., o primeiro domingo do advento traz a rubrica: 1 classis. Semiduplex. É uma contradição aparente. Pois os domingos são classificados segundo a dignidade (p. ex., 1 classis) e o rito (p. ex., semiduplex).
a) Quanto ao rito, todos os domingos são semiduplex com exceção de 3: Dominica paschalis, Dominica iri Albis, Dominica Pentecostes.
b) Quanto à dignidade, distinguem-se maiores e menores ou comuns (per annum).
c) Os domingos maiores dividem-se em 2 classes conforme o seu respectivo privilégio de preferência.
aa. Os domingos da primeira classe são preferidos na ocorrência (portanto não nas vésperas) a todas as festas são 10: o 1° domingo do advento, os 4 domingos da quaresma e os 4 seguintes até ao domingo da pascoela, e pentecostes. As festas incidentes devem ser transferidas.

254.bb. Os domingos da segunda classe são preferidos a todas as festas menos às de primeira classe. São 6: o 2°, 3° e 4° do advento, os três antecedentes à quaresma: setuagésima, sexagésima e qüinquagésima.

2. Privilégios. Todos os domingos têm os seguintes privilégios:
a) Neles nenhuma festa pode ser fixada para sempre. Exceções: festa da S. Família, da SS. Trindade, de Cristo Rei ou de outra festa por dispensa rara da S. C. dos Ditos.
b) Nenhuma festa pode ser transferida para um domingo.
c) Nenhum ofício de domingo se omite totalmente; quando impedido deve ser comemorado no ofício e na missa com seu prefácio próprio, ao menos por via de regra, e a missa impedida deve ser rezada na semana seguinte, conforme regras especiais.

3. Número. Nos livros litúrgicos são indicados 53 domingos e 53 ofícios de domingos. Se A é letra dominical ou (no ano bissexto) é uma delas (A g, bA), i. é, quando o 1° de janeiro cai num domingo, ou, no ano bissexto no sábado, lodos os 30 ofícios depois de pentecostes (24 mais 6 da epifania) têm o seu domingo, do contrário só 29, e um ofício antecipado no sábado com os direitos de domingo. Pois, neste caso, são só 52 domingos.

255.4. Vacantes são os domingos sem ofício e sem comemoração. Ocorrem, às vezes, entre o dia 25 de dezembro e 13 de janeiro e são ocupados por festas.
Vagos (móveis) se chamam o 3°, 4°, 5° e 6° domingo depois da epifania, porque não são fixados num lugar certo, sendo celebrados, ora depois da epifania, ora depois de pentecostes.

256.5. O primeiro domingo do mês é, na acepção civil, aquele que cai no dia primeiro do mês ou vem logo depois dele. Este cômputo é necessário, quando se trata de fixar uma festa num domingo determinado ou de ganhar indulgências concedidas para certo domingo do mês. No cômputo propriamente eclesiástico o primeiro domingo do mês é aquele que cai no dia primeiro ou que vem mais perto dele. Se o dia primeiro do mês cai numa segunda ou terça ou quarta-feira; o primeiro domingo é aquele que precede estes dias; se cai nos outros dias, é o domingo seguinte. Faz exceção o primeiro domingo do advento que é determinado em relação à festa de S. André. (30 de nov.) Este cômputo decide o princípio das lições da s. escritura no ofício divino.

§ 64. OS DIAS DA SEMANA

257.1. Nomes. O nosso domingo era chamado pelos israelitas primeiro dia depois do sábado (una = prima sabbati), os dias seguintes eram designados com o número ordinal. Este modo foi recebido pela Igreja, mas modificado quanto ao primeiro e último dia, que tomaram o nome de domingo e sábado. Além disso a Igreja acrescentou ao número ordinal o termo feria,falando da Feria secunda, Feria tertia. Quis significar que os clérigos devem deixar o cuidado das outras coisas para "feriar" só para Deus. (In festo S. Silvestri, 31 dec.)
Os pagãos falavam do dies soils, lunce, martis, mercurii, jovis, veneris et saturni,termos às vezes empregados também pelos s. padres dos primeiros séculos.

258.2. Dias principais. São os dias que, ainda hoje, no ano eclesiástico têm uma posição especial na quaresma e nas quatro têmporas: a quarta-feira, a sexta-feira e o sábado.
A sexta-feira, tanto no Oriente como no Ocidente, foi consagrada à paixão de Jesus Cristo. Foi neste dia que o Senhor foi pregado na cruz para satisfazer por nossos pecados. Em sinal de luto e penitência guardava-se nele o jejum.
A quarta-feira lembra a traição de Judas, que neste dia vendeu o divino Redentor por 30 siclos. Esta circunstância motivou o jejum de penitência na quarta-feira.
O sábado era celebrado no Ocidente do mesmo modo que no Oriente. No Ocidente encontramos pelo fim do século III o uso de jejuar no sábado. Provavelmente tem a sua origem no fervor dos cristãos que estenderam o jejum da sexta-feira até ao sábado (superponere jejunium). Nestes três dias mencionados nem em Alexandria nem em Roma havia missa. Eram dias de estação (statio), dias alitúrgicos. Provavelmente feria só é a tradução do hebraico sabbatum, descanso. Pois S. Jerônimo (Ad Gal. II, 4; ML 26 p. 378) chama a quarta-feira cristã quartam sabbati.

259.3. O sábadoao menos desde o fim do século X , é consagrado à Maria Santíssima.
Durandus (IV, c. 1, n.° 30-35) alega os motivos seguintes, que com reserva merecem ser mencionados.
1. Achava-se numa igreja de Constantinopla uma imagem da Virgem SS., diante da qual pendia uma cortina que a cobria toda. Esta cortina desaparecia na sexta-feira depois das vésperas sem alguém a tocar, só por um milagre de Deus, para que a imagem pudesse ser vista totalmente pelo povo. Depois das vésperas do sábado a cortina cobria outra vez a imagem e ficava assim até à sexta-feira seguinte. Por causa deste milagre determinou-se cantar sempre neste dia em honra da SS. Virgem.
2. Quando o Senhor estava morto e os discípulos desesperaram da ressurreição, naquele sábado só nela ficou toda a fé. Ela estava certa de que Cristo era filho de Deus e havia de ressurgir no terceiro dia.
3. O sábado é a porta do domingo, portanto a porta do céu, cujo símbolo é o domingo.Ora, Maria é a porta do céu. Por isto a festejamos no dia que precede o domingo.
4. A solenidade do filho (sexta-feira) deve seguir-se imediatamente a solenidade da mãe.
5. Convém que no sábado, em que Deus descansou da sua obra, haja alguma solenidade.
Quanto à 1ª razão é preciso notar que uma crença popular e ingênua pode ser a causa próxima de uma devoção fundada em motivos sólidos. A 2ª razão dificilmente se compõe com a promessa de que S. Pedro nunca havia de vacilar na fé. Bento XIV (de fest. c. 5, n. 8) diz:"Nem todos os teólogos defendem a sentença de que os apóstolos perderam a fé, a qual era firme só na Virgem SSma. Pois Pedro, negando a Cristo, não cometeu outra falta além de ter medo de confessar a Cristo aberta e livremente. A sua alma contudo estava isenta de qualquer erro. Nem Cristo teria encomendado sua mãe caríssima a S. João, se ele tivesse perdido a fé." (Suarez, de fide disp. 9. sect. 3.)
O mesmo papa (de fest. B. M. V. I. II c. 18 n. 2) escreve: Belarmino observa que Madalena estava abrasada de grande fogo de caridade como se vê em Jo. 19 e 20. Ora, a caridade não se pode separar da fé. Até acrescenta: Parece ser perigoso dizer que só na Virgem SSma. ficou a verdadeira Fé. Desta maneira a Igreja teria perecido. Pois uma pessoa não pode ser chamada Igreja, porquanto a Igreja é um povo e o reino de Cristo. (Bellarm. t. II.controvers. 1. '3, de eccl. mil . c. 17.)
A 4ª razão será a decisiva. Começou-se a jejuar na sexta-feira e continuou-se em honra da mãe. Stabat iuxta crucem fesu Mater eius. (Jo 19, 25.)
No Liber sacramentorurn do séc. VIII para cada dia da semana está assinalada uma missa votiva própria. Pois não havendo muitas festas de santos não era possível evitar arepetição da missa do domingo. Para aliviar a devoção pela mudança das fórmulas da missa e para achar auxílio nas necessidades por missas especiais formou-se o costume, fixado mais tarde por Pio V, de consagrar os dias da semana ao culto de Deus trino e dos santos segundo a dignidade indicada na ladainha de todos os santos: Deus, Maria, José e Apóstolos.
O domingo está consagrado à SS. Trindade, com preferência considerada na unidade da essência divina.
A segunda-feira, sendo Maria SS. venerada no sábado, dedicou-se à SS. Trindade, considerada expressamente na trindade das Pessoas divinas, a terça-feira aos anjos, que têm o terceiro lugar, a quarta-feira aos apóstolos que ocupam o quarto lugar no céu. Com o conhecimento mais profundo da dignidade de São José superior à dos apóstolos, a ele se deu o quarto lugar, logo depois dos anjos, e a sua missa votiva (1883) foi marcada também para a quarta-feira. A quinta-feira sempre esteve dedicada à SS. Eucaristia, a sexta-feira à cruz, o sábado à Maria SSma.
A missa do Espírito Santo se reservou para a quinta-feira, dia este, em que se realizou a ascensão de Jesus Cristo, de que dependia essencialmente a abertura da porta celestial e por conseguinte a descida triunfal do Espírito Santo. (lo 16, 7, Pref. de Sp. S.) A segunda-feira é o dia das almas.
O ensejo desta instituição parece ser uma suposta revelação divina em que se afirma ter outorgado Nosso Senhor aos condenados repouso de seus tormentos todos os domingos em honra de sua ressurreição. A notícia se acha no apocalipse apócrifo de São Paulo do séc. IV e tornou-se opinião muito espalhada. Com o correr dos séculos o privilégio dos condenados foi transferido para as almas do purgatório. Assim São Pedro Damião, seguindo, como ele diz, "a piedosa opinião de homens ilustres", ensina que as almas do purgatório no domingo estão livres dos sofrimentos' mas devem voltar para as penas na segunda-feira.
Por isso é mister socorrê-las neste dia. A Igreja, com a sua solicitude maternal, sem adotar esta opinião, prescreve, quando não obstam as rubricas, a oração "Fidelium" pelos defuntos e permite a missa conventual de réquie na segunda-feira. (Franz:Messe i. d. Mittel pág. 144 MI. 145 pág. 564; 427; Durand IV, 1 n. 29.) O fundamento dogmático decisivo para a Igreja é a comunhão dos santos. No domingo se comemora a Igreja triunfante, logo depois na segunda-feira a Igreja padecente, à maneira da festa de Todos os Santos e do dia de finados.

§ 65. DIVISÃO DAS FÉRIAS

260.1. Segundo a dignidade, as férias dividem-se em férias maiores e menores.Maiores são as férias do advento, da quaresma, das quatro têmporas de setembro, da segunda-feira das Rogações.
As férias maiores são privilegiadas ou não privilegiadas. As privilegiadas são 7: A quarta-feira das cinzas e os 6 dias da semana santa (S. R. C. 1.0 nov. 1931). São preferidas a todas as festas.
As férias maiores não privilegiadas são preferidas somente às festas simples e vigílias, mas são comemoradas nos ofícios de 9 lições.
Menores ou per annum são todas as férias fora das férias maiores. Não tem comemoração, quando se celebra outro ofício.

261.2. Ofício. A féria menor não tem I vésperas, principia, portanto, pelas matinas e termina com as vésperas e completas do dia.
Precede um simplex, as vésperas são da féria respectiva, porquanto o simplex não tem II vésperas. Segue-se urna festa, embora simplex, o ofício da féria termina com a noa, e as vésperas são da festa seguinte, sem comemoração da féria. Ocorre um simplex ou simplificado numa féria maior, as vésperas do dia anterior são da féria, como no saltério, com comemoração do simplex ou simplificado. Pois não se rezam as vésperas de um ofício, que na sua maior parte é simplificado. Pars maior trahit minorem.

262.3. Composição do ofício ferial. Invitatório, hino, os 9 salmos e antífonas (omitido o versículo do 1º, 2º noturno) e o versículo do 3º noturno da féria respectiva. Lições e responsórios do próprio do tempo; no fim da 3ª lição no tempo da páscoa — Te Deum, o qual fora deste tempo e na segunda-feira das rogações se omite. Nas laudes se rezam nas férias menores as antífonas e salmos da 1ª série; no advento, no tempo entre a setuagésima até à semana santa, nas vigílias comuns (exceto a vigília da ascensão), nas quatro têmporas, da 2ªsérie.

263.A capítula da féria respectiva. A oração, se não houver própria, é a do domingo precedente. O sufrágio, fora do advento e do tempo da paixão (no tempo pascalcommemoratio crucis), se não houver comemoração de um duplex, de uma oitava, ou de um oitavo dia simplex, item na sexta-feira depois da oitava da ascensão e na vigília de pentecostes.
As preces feriais recitam-se no advento, na quaresma até à semana santa, inclusive, nas quatro têmporas, mesmo se se fizer a comemoração de uma oitava, de um duplex ousemiduplex (A. B. VIII, 3).

264.4. A prima é rezada como está indicado no ordinário e saltério.
a) Se nas laudes se tomou a 2ª série, a prima tem além dos 3 salmos costumados um quarto salmo, a saber, o primeiro da 1ª série de laudes, que havia sido omitido e substituído pelo Miserere.
b) A capítula é: Pacem; só nos dias de domingo antecipado e do tempo pascal: Regi.
c) Se houver preces feriais nas laudes, há-os também na prima; se não, há dominicais.
5. Terça, sexta, noa como no ordinário e saltério. Preces feriais, se houver na prima.
6. Vésperas como no ordinário, saltério, e próprio do tempo. Sufrágio e preces feriais como nas laudes.
7. Completas como no ordinário e saltério. Preces como na prima.

§ 66. AS QUATRO TÊMPORAS

265.1. NomeQuatro têmporas ou só têmporas se chamam a quarta-feira, a sexta-feira e o sábado das 4 semanas seguintes: primeira da quaresma, primeira de pentecostes, terceira de setembro e terceira de dezembro; nestas semanas há jejum.
2. Origem. Influíram provavelmente vários elementos. Conforme uns autores as quatro têmporas são o vestígio da antiga semana cristã com 3 dias de jejum; conforme outros, foram instituídas para santificar o início das 4 estações do ano. Mais provável é que sejam resultado de várias reflexões.
a) A idéia de jejum algumas vezes por ano acha-se na escritura sagrada do antigo testamento. Estes textos são citados nas lições dos sábados das têmporas de setembro. O profeta Zacarias (8, 19) menciona quatro épocas de jejum para Israel. O Papa Leão Magno (Sermão 92; 79; 12) ensina que as têmporas fora da quaresma foram instituídas pelos apóstolos.

266.b) Foi em Roma que primeiro se celebravam as 3 têmporas do verão, outono e inverno. O número 3 se explica por certas festas pagas que ocorriam três vezes por ano, feriae sementinae (inverno), feriae messis (verão), feriae vindemiales (outono). As têmporas contrabalançavam os excessos dos idólatras. Assim se explica o fato, um tanto estranho, de que o Oriente não conhece as têmporas. O Líber Pontificalis diz que o papa Calisto (+ 233) instituiu estas 3 têmporas.
c) S. Leão Magno menciona pela primeira vez as quatro têmporas relacionando-as com as 4 estações do ano. Deviam ser santificadas pelo jejum.
d) O Papa (Gelásio (+ 496) acrescentou as ordenações sacerdotais que ainda hoje se fazem nestes dias. (Cân. 1006, § 2) De Roma, as têmporas se propagaram para todas as igrejas de rito romano. A sua época só foi fixada por Urbano II (1095).
Como foi costume antigo cristão jejuar antes das ordenações (At 13, 2), a Igreja, guardando este costume, conferia as ordens nos dias de jejum. Segundo Durandus (II e 1 n.34) as quatro têmporas são as primícias do tempo, porque representam cada vez o inicio de uma nova estação do ano. Os clérigos são as primícias do povo cristão, porquanto estão em lugar dos levitas, os quais Deus reservou para si em troca dos filhos primogênitos de cada família. Por isso convém, que as primícias do povo cristão sejam consagradas a Deus junto com as primícias do tempo, as quatro têmporas.

267.3. A Liturgia das têmporas tem na quarta-feira duas epístolas. A razão histórica é o antigo costume romano e de outras Liturgias de ler duas lições antes do evangelho.
Beletho (c. 90) e Durando (VI, c. 8 n. 2) explicam as duas lições com a antiga regra de que, no sábado depois de uma quarta-feira com duas lições na missa, se podem ordenar sacerdotes, e isto seis vezes por ano. Na quarta-feira os candidatos eram examinados e por isso na missa se acrescentava uma lição relativa ao sacerdócio, para significar que os ordenandos devem ser versados no antigo e novo testamento para poder instruir o povo.
Nos sábados das têmporas se lêem seis lições, mas provavelmente antes eram doze, como ainda no sábado santo, por causa do escrutínio dos catecúmenos antes do batismo. A quinta lição é sempre a chamada lectio de camino ignis do profeta Daniel. A sua significação é profunda. Como os três jovens passaram pela prova do fogo, assim os candidatos ao sacerdócio devem passar pelas provas exigidas pela Igreja, conforme a lei apostólica:Probentur primum et sic ministrent. (1 Tim 3, 10; Durando VI, c. 10, n. 3.) Depois. dela antigamente se realizavam todas as ordenações, ao passo que hoje são distribuídas pelas várias lições.

08/06/2012

EPÍSTOLAS DE SANTO INÁCIO DE ANTIÓQUIA AOS MAGNÉSIOS

 Apresentamos esta carta da forma como nos chegou: em duas versões, uma curta (mais próxima ao original, segundo os pesquisadores) e outra um  pouco mais longa. É um documento importante no estudo da Eclesiologia, pois aqui se comprova que a Hierarquia da Igreja, embasada no sacramento da Ordem, já naquela época estava estruturada em três graus como ainda é hoje: bispos, presbíteros e diáconos, sendo que ao bispo cabe a presidência e a ele todos devem estar submissos (caps. II a V).Também aqui se nota a estrita observância do Domingo pelos cristãos, ao contrário do que defendia a seita dos judaizantes: "não observamos mais o sábado, mas o Dia do Senhor" (cap. IX), de onde se conclui, pela antiguidade da fonte, que essa norma é, de fato, instituição apostólica. Inácio é enfaticamente contra os costumes judaicos: "É absurdo professar Cristo Jesus e judaizar. O Cristianismo não precisa abraçar o Judaísmo, mas o Judaísmo deve abraçar o Cristianismo" (cap. X), texto que na versão longa contém uma expressão mais contundente: "o Judaísmo agora chegou ao fim", profetiza o santo Padre.

VERSÃO CURTA
Saudação 
Inácio, também chamado Teóforo, à [Igreja] abençoada na graça de Deus Pai, em Jesus Cristo nosso Salvador, com quem eu saúdo a Igreja que está na Magnésia, próxima ao [rio] Meandro, e desejo a ela grande alegria em Deus Pai e em Jesus Cristo.
Amor na unidade 
I. ¹Tendo sido informado sobre o vosso amor devoto e perfeito alegrei-me profundamente e resolvi comunicar-me convosco na fé em Jesus Cristo. ²Para aquele que pensa ser digno de portar o mais honrável de todos os nomes, nestas cadeias que ora carrego, louvo as igrejas, nas quais oro pela união entre o corpo e o espírito de Jesus Cristo, fonte constante da nossa vida, da fé e do amor, e para as quais nada pode ser especialmente preferível a Jesus e ao Pai; certamente encontraremos a Deus se resistirmos a todos os assaltos do príncipe deste mundo.
2. ¹Portanto, já que tive a honra de vos ver na pessoa de Damas, vosso ilustre bispo, e de vossos ilustres presbíteros, Basso e Apolônio, bem como do diácono Zótio, meu companheiro de serviço, cuja amizade espero sempre possuir - já que ele é submisso ao bispo como à graça de Deus e ao presbitério como à lei de Jesus Cristo - [passo agora a vos escrever]:
Respeito pelo bispo 
3. ¹Não deveis tratar vosso bispo com tanta familiaridade em razão de sua juventude, mas deveis tratá-lo com toda a reverência, respeitando ao poder de Deus Pai, assim como fazem os santos presbíteros - como fiquei sabendo - que não o julgaram imprudentemente, a partir de sua aparência jovem claramente manifesta, mas, sendo prudentes em Deus, submeteram-se a ele, ou melhor, não a ele, mas ao Pai de Jesus Cristo, que é o Bispo de todos nós. ²Assim, é adequado a vós, sem qualquer hipocrisia, obedecerdes [ao vosso bispo], em honra d´Aquele que nos amou tanto, já que[pela falsa conduta] não setenta enganar ao bispo visível, mas Àquele que é invisível. E, com tal conduta, não se faz referência ao homem, mas a Deus, que conhece todos os segredos.
4. ¹É adequado, então, não apenas ser chamados "cristãos", mas sê-lo também de verdade: como alguém reconhece outro com o título de bispo e depois faz todas as coisas sem ele? Tais pessoas parecem-me desprovidas de boa consciência, visto que se reúnem em desconformidade com o mandamento.
5. ¹Visto, então, que todas as coisas têm um fim, estas duas coisas são simultaneamente à nossa frente: a morte e a vida; todos encontrarão seu próprio lugar. ²É como se fossem dois tipos de moedas: a de Deus e a do mundo, cada qual com suas próprias características estampadas nelas. O descrente é deste mundo, mas o crente tem, no amor, a característica de Deus Pai, por Jesus Cristo; se não estivermos prontos para morrerem Sua Paixão, Sua vida não estará em nós.
6. ¹Nas pessoas acima mencionadas pude observar, na fé e no amor, toda a vossa comunidade; assim, exorto-vos a estudarem todas as coisas com divina harmonia, tendo vosso bispo presidindo no lugar de Deus e vossos presbíteros no lugar da assembleia dos apóstolos, junto com seus diáconos - que são muito queridos para mim -aos quais foi confiado o serviço de Jesus Cristo, que estava com o Pai antes do início dos tempos e que por fim se manifestou. ²Fazei tudo, então, imitando a mesma conduta divina, mantendo o respeito uns pelos outros, não olhando para o seu próximo segundo a carne, mas amando-o continuamente em Jesus Cristo. Que nada exista entre vós causando divisão, mas sejais unidos ao vosso bispo e àqueles que vos presidem, como um sinal evidente da vossa imortalidade.
7. ¹Assim como o Senhor nada fez sem o Pai, ainda que estivesse unido a Ele, nem por si mesmo e nem pelos apóstolos, também vós não deveis fazer nada sem o bispo e os presbíteros. Nem deveis tentar fazer com que algo pareça razoável e justo para vós mesmos; mas, reunindo-vos num mesmo lugar, orai uma única prece, fazei uma única súplica, tenham uma única mente e esperança, no amor e na alegria imaculada. Há um só Jesus Cristo e nada é melhor que Ele. ²Então, correi todos juntos ao único templo de Deus, ao único altar, ao único Jesus Cristo, que procede do único Pai, está com Ele e a Ele retornou.
Cuidado com os judaizantes 
8. ¹Não sejais enganados por doutrinas estranhas, nem por velhas fábulas, as quais são inúteis, pois se ainda vivemos segundo a Lei dos judeus, devemos reconhecer que não recebemos a graça.²Ora, os diviníssimos profetas viveram segundo Cristo Jesus e, por isso, acabaram sendo perseguidos, pois eram inspirados por Sua graça a convencerem plenamente os descrentes de que existe apenas um Deus, que Se manifestou por Jesus Cristo, Seu Filho, o qual é o Seu Verbo eterno - não procedendo do silêncio - e que em todas as coisas agradou Aquele que O enviou.
9. ¹Se, então, aqueles que eram educados na antiga ordem das coisas se apossaram da nova esperança, não mais observando o sábado, mas observando o Dia do Senhor, no qual também a nossa vida foi libertada por Ele e por Sua morte -alguns negam que por tal mistério obtemos a fé e que nele perseveramos para serem contados como discípulos de Jesus Cristo, nosso único Mestre -²como seremos capazes de viver longe Dele, cujos discípulos e os próprios profetas esperaram no Espírito para que Ele fosse o Instrutor deles? Era Ele que certamente esperavam, pois vindo, os libertou da morte.
10. ¹Assim, não sejamos insensíveis à Sua bondade. Se Ele nos recompensas se conforme as nossas obras, certamente deixaríamos de existir. Porém, por termos tornado Seus discípulos, devemos aprendera viver de acordo com os princípios do Cristianismo. Quem é chamado por outro nome além deste não é de Deus. ²Abandonando, contudo, o mal, o passado, as más influências, estais vós sendo chamados a mudar de comportamento, o qual é de Jesus Cristo. Sede temperados Nele, para que ninguém entre vós seja corrompido, já que por vosso sabor próprio seríeis condenados. ³É absurdo professar Cristo Jesus e judaizar. O Cristianismo não precisa abraçar o Judaísmo, mas o Judaísmo deve abraçar o Cristianismo, para que toda língua possa professar a companhia de Deus.
11. ¹Amados: estas coisas [que vos escrevo] - não que eu saiba algo sobre o vosso comportamento, mas por ser inferior a vós – tem por objetivo preveni-los para que não sejais fisgados pelos anzóis da vã doutrina, mas para que possais conquistar a segurança plena a respeito do nascimento, paixão e ressurreição que ocorreram na época do governo de Pôncio Pilatos, sendo verdadeiro e certo que tais eventos foram efetuados por Jesus Cristo, nossa esperança, de quem jamais possais ser afastados.
Viver na fé e na unidade 
12. ¹Que eu possa alegrar-me convosco em todas as coisas, se o merecer! Mesmo acorrentado, não sou digno de ser comparado a qualquer de vós que estais em liberdade. Sei que vós não estais inchados de orgulho. Já que possuis Jesus Cristo em vós mesmos. E tudo o mais que louvo em vós, sei que guardais com modéstia de espírito; como está escrito: "O homem justo é seu próprio acusador".
13. ¹Portanto, estudai para manter-vos na doutrina do Senhor e dos apóstolos, para que todas as coisas que fizerdes possam prosperar tanto na carne quanto no espírito, na fé e no amor, no Filho e no Pai e no Espírito, no princípio e no fim; unidos com o vosso admirável bispo, com toda a preciosa coroa espiritual do vosso presbitério e com os diáconos que estão em conformidade com Deus. Sejais submissos ao bispo e uns aos outros, como Jesus Cristo é com o Pai, segundo a carne, e os apóstolos com Cristo, o Pai e o Espírito. Que haja assim uma união entre a carne e o espírito.
Saudação Final 
14. ¹Sei que estais repletos de Deus e, por isso, exortei-vos brevemente. Lembrai-vos de mim em vossas orações, para que eu possa alcançar a Deus. E [lembrai-vos também] da Igreja que está na Síria, já que não sou digno de portá-la em meu nome. Necessito da vossa oração unida em Deus e do vosso amor, para que a Igreja da Síria seja considerada digna de ser refrescada pela vossa Igreja.
 15. ¹Os efésios que habitam em Esmirna - de onde eu vos escrevo - estão aqui para a glória de Deus, como vós também fizestes; eles me reconfortam e vos saúdam juntamente com Policarpo, bispo dos esmirnicenses. As demais igrejas, em honra de Jesus Cristo, também vos saúdam. Ficai bem na harmonia de Deus, vós que obtivestes o Espírito inseparável que é Jesus Cristo.

VERSÃO LONGA
Inácio, também chamado Teóforo, à [Igreja] abençoada na graça de Deus Pai, em Jesus Cristo nosso Salvador, com quem eu saúdo a Igreja que está na Magnésia, próxima ao [rio] Meandro, e desejo a ela grande alegria em Deus Pai e em Jesus Cristo, nosso Senhor, em quem vocês poderão encontrar grande alegria.
I. ¹Tendo sido informado sobre o vosso amor devoto e perfeito, alegrei-me profundamente e resolvi comunicar-me convosco na fé em Jesus Cristo. ² Para aquele que pensa ser digno de portar um nome divino e desejável, nestas cadeias que ora carrego, louvo as igrejas, nas quais oro pela união entre o corpo e o espírito de Jesus Cristo, "que é o Salvador de todos os homens, mas especialmente daqueles que crêem, por cujo sangue vós todos fostes redimidos e por quem pudestes conhecer a Deus, isto é, fostes conhecidos por Ele; resistindo com Ele, escapareis de todos os assaltos deste mundo, pois 'Ele é fiel e não permitirá que sejais tentados acima do que puderdes resistir'".
II. ¹Portanto, já que tive a honra de vos verna pessoa de Damas, vosso ilustre bispo, e de vossos ilustres presbíteros, Basso e Apolônio, bem como do diácono Zótio, meu companheiro de serviço, cuja amizade espero sempre possuir - já que ele é submisso ao bispo como à graça de Deus e ao presbitério como à lei de Jesus Cristo - [passo agora avos escrever]:
III. Não deveis desprezar a idade do vosso bispo, mas tratá-lo com toda a reverência, conforme o desejo de Deus Pai, assim como fazem os santos presbíteros - como fiquei sabendo - não observando a sua manifesta juventude, mas o seu conhecimento sobre Deus, já que "não é o ancião [necessariamente] sábio, nem significa que o idoso possua prudência; o que  importa é o espírito dos homens". Daniel, o sábio, aos doze anos de idade, foi possuído pelo Espírito divino, e condenou os anciãos - que em vão carregavam seus cabelos grisalhos - por acusarem em falso e cobiçarem a esposa de um homem. Também Samuel, quando ainda era uma pequena criança, reprovou Eli, que tinha 90 anos de idade, por honrar mais a seus filhos do que a Deus. Da mesma maneira, também Jeremias recebeu esta mensagem de Deus: "Não diga nada. Eu sou uma criança". Também Salomão e Josias. O primeiro, sendo rei aos doze anos de idade, deu a terrível e difícil sentença no caso das duas mulheres que disputavam pela mesma criança. O último, subindo ao trono com oito anos de idade, ordenou a derrubada dos altares e templos [dos ídolos], e a queima dos bosques dedicados aos demônios e não a Deus. E ele destruiu os falsos sacerdotes, como impostores e corruptores dos homens, mas não os adoradores da Deidade. Logo, a juventude não é para ser desprezada quando é devotada a Deus. Mas deve ser desprezado aquilo que vier de uma mente malvada, ainda que a pessoa seja anciã e experimentada. Timóteo, que pregou sobre Cristo, era jovem quando ouviu seu mestre ensinar-lhe: "Não deixe nenhum homem desprezar tua juventude, mas sejas tu um exemplo entre os crentes, tanto na palavra quanto na conduta". Por isso, é coisa terrível contradizer qualquer pessoa com a mesma semelhança. [Pela conduta] não se tenta enganar aquele que é visível, mas [na realidade] zombar d'Aquele que é invisível, e que, contudo, não pode ser zombado por ninguém. E tal conduta diz respeito não ao homem, mas a Deus. Deus disse a Samuel: "Eles não zombaram de ti, mas de Mim". E Moisés declarou: "O murmúrio deles não é contra nós, mas contra o Senhor Deus". [De fato,] nenhum deles ficou sem punição, porque se levantaram contra seus superiores. Datan e Abirão não falaram contra a Lei, mas contra Moisés, e foram arremessados vivos no Hades. O mesmo ocorreu com Corá e 250 indivíduos que conspiraram com ele contra Aarão: foram destruídos pelo fogo. Ainda Absalão, que foi morto por seu irmão, foi suspenso numa árvore e seu coração mau foi atravessado por flechas. Também Abedadan foi decapitado pelo mesmo motivo. Uzias, quando ousou se opor aos sacerdotes e ao sacerdócio, foi ferido pela lepra. Saul também foi desonrado por não conduzir Samuel ao sumo-sacerdócio. Portanto, é vosso dever reverenciar os vossos superiores.
IV. É adequado, então, não apenas ser chamados "cristãos", mas sê-lo também de verdade. Não basta assim ser apenas chamado, mas é necessário sê-lo também, como se passa com um homem abençoado. Àqueles que falam do bispo, mas fazem todas as coisas sem ele, declarará Aquele que é o verdadeiro e primeiro Bispo e único Sumo Sacerdote por natureza: "Por que me chamais de 'Meu Senhor' se não fazeis oque vos digo?". Tais pessoas parecem-me desprovidas de boa consciência; são dissimuladoras e hipócritas.
V. Visto, então, que todas as coisas têm um fim, é-nos colocada diante de nós a vida, fruto da nossa observância [aos preceitos de Deus], e a morte, como resultado da desobediência; todos - conforme a escolha que fizer - encontrarão seu próprio lugar, permitindo escapar da morte e optar pela vida. Observo que duas características diferentes são encontradas nos homens: a verdadeira moeda e a espúria. O verdadeiro fiel é o tipo verdadeiro de moeda, cunhada pelo próprio Deus. O infiel, por sua vez, é uma moeda falsa, ilegal, espúria, falsificada, cunhada não por Deus, mas pelo diabo. Não estou querendo dizer que existem duas naturezas humanas diferentes; existe apenas uma única humanidade que, às vezes, pertence a Deus, e outras vezes, ao diabo. Se alguém é verdadeiramente religioso, será também homem de Deus; mas, se não for religioso, será homem do diabo, não por sua natureza, mas por sua própria escolha. O descrente possui a imagem do príncipe da maldade; o crente possui a imagem do seu Príncipe, Deus Pai e Jesus Cristo; se não estivermos prontos para morrer pela verdade em Sua Paixão, Sua vida não estará em nós.
VI. Nas pessoas acima mencionadas, pude observar, na fé e no amor, toda a vossa comunidade; assim, exorto-vos a estudarem todas as coisas com divina harmonia, tendo vosso bispo presidindo no lugar de Deus e vossos presbíteros no lugar da assembleia dos apóstolos, junto com seus diáconos que são muito queridos para mim – aos quais foi confiado o serviço de Jesus Cristo. Ele, sendo estando com o Pai antes do início dos tempos, era o Verbo, o único Filho gerado, e permanece o mesmo para sempre; e "o Seu reino não terá fim", diz o profeta Daniel. Vamos todos, então, amar uns aos outros em harmonia e que ninguém olhe para o seu próximo segundo a carne, mas em Cristo Jesus. Que nada exista entre vós causando a divisão, mas sejais unidos ao vosso bispo, e, através dele, submissos a Deus em Cristo.
VII Assim como o Senhor nada faz sem o Pai, pois Ele diz: "Por Mim mesmo nada posso fazer", também assim deveis proceder; nem o presbítero, nem o diácono, nem o leigo deve fazer algo sem o bispo. Nem mesmo deveis fazer algo recomendável sem a sua aprovação. Pois tais coisas são pecaminosas e se opõem a [o desejo] de Deus. Deveis todos juntos ir a um mesmo lugar para orar.  Deveis ser uma só súplica comum, uma só mente, uma só esperança, mantendo uma fé sólida em Cristo Jesus, pois não há nada melhor. Que vós todos sejais como um só homem, correndo juntos para o templo de Deus, para o único altar, o único Jesus Cristo, Sumo Sacerdote do Deus não gerado.
VIII. Não sejais enganados por doutrinas estranhas, "nem prestai atenção a fábulas e genealogias intermináveis", e em outras coisas que os judeus ostentarem. "As velhas coisas se passaram; observai, pois, todas as coisas se tornaram novas". Se vivêssemos ainda segundo a Lei dos judeus e a circuncisão da carne, teríamos que negar a graça que recebemos. Ora, os divinos profetas viveram de acordo com Jesus Cristo e, por isso, acabaram sendo perseguidos, pois eram inspirados pela graça a convencerem plenamente os descrentes de que existe apenas um Deus, o todo-poderoso, que Se manifestou por Jesus Cristo Seu Filho, que é Seu Verbo, não expressado mas essencial. Com efeito, Ele não é a voz de uma expressão articulada, mas uma substância gerada pelo poder divino, e que em todas as coisas agradou Aquele que O enviou.
IX. Se, então, aqueles que eram versados nas antigas Escrituras tiveram a esperança renovada, aguardando a vinda de Cristo, como ensina o Senhor quando nos diz: "Se acreditastes em Moises, deveríeis crer em Mim, pois foi de Mim que ele escreveu"; e novamente: "Seu pai Abraão regozijou-se para ver o Meu dia e, quando o viu, alegrou-se; pois antes de Abraão, Eu Sou". Como poderíamos ser capazes de viver sem Ele? Os profetas eram Seus servos e O previram pelo Espírito, e O esperaram como Instrutor e também como Senhor e Salvador, dizendo: "Ele virá e nos salvará". Portanto, não precisamos mais manter o sábado, como fazem os judeus, ou alegrar-se pelos dias de ociosidade, pois "aquele que não trabalha, não deve comer". Também foi dito pelos [santos] oráculos: "É pelo suor da tua face que comerás o teu pão". Mas deixe todo aquele entre vós que ainda mantém o sábado por motivo espiritual, alegrando-se na meditação da Lei e não no descanso do corpo, admirando a obra de Deus e não comendo coisas preparadas no dia anterior, não fazendo uso de bebidas mornas ou andando um certo limite prescrito, não deleitando-se por dançar e aplaudir, e outras coisas sem sentido. Porém, após a observância do sábado, deve todo amigo de Cristo observar o Dia do Senhor como festa, o dia da ressurreição, a rainha e comandante de todos os dias [da semana]. Foi sobre isto que o profeta  declarou: "Para encerrar, o oitavo dia". [Foi nesse dia] que a nossa vida renasceu e a vitória sobre a morte foi obtida em Cristo. Os filhos da perdição, os inimigos do Salvador negam isto; "o deus deles é o próprio estômago, pois só pensam nas coisas terrestres", são "amantes do prazer, e não amam a Deus; têm a forma celestial, mas negam o poder disto". Esses são mercadores de Cristo, corruptores da Sua Palavra; abrem a mão de Jesus e o põe a venda; corrompem as mulheres, cobiçam os bens de seus próximos e buscam insaciavelmente a riqueza; a estes [malfeitores] deveis pedir que sejam tocados pela misericórdia de Deus através de nosso Senhor Jesus Cristo!
X. Assim, não sejamos insensíveis à Sua bondade. Se Ele nos recompensasse conforme as nossas obras, certamente deixaríamos de existir. "Se Tu, Senhor, marcar as iniqüidades, quem poderá ficar de pé?". Devemos, portanto, provar a nós mesmos que merecemos o nome que recebemos (=cristãos). Quem é chamado por outro nome além deste não é de Deus, pois não recebeu a profecia que nos fala a respeito disso: "O povo será chamado por um novo nome, pelo qual o Senhor os chamará, e será um povo santo". Isto se cumpriu primeiramente na Síria, pois "os discípulos eram chamados de cristãos na Antioquia", quando Paulo e Pedro estabeleciam as fundações da Igreja. Abandonai, pois, a maldade, o passado, as influências viciadas e sereis transformados no novo instrumento da graça. Permanecei em Cristo e o estranho não obterá o domínio sobre vós. É absurdo professar Jesus Cristo com a língua e cultivar na mente o Judaísmo, que agora chegou ao fim. Onde está o Cristianismo não pode estar o Judaísmo. Cristo é único; toda nação que Nele crê e toda língua que O confessa é, por Ele, conduzida até Deus. E aqueles que têm coração duro devem tornar-se filhos de Abraão, o amigo de Deus; e em sua semente todos serão abençoados e receberão a vida eterna em Cristo.
XI. Amados: estas coisas [que vos escrevo] - não que eu saiba algo sobre o vosso comportamento, mas por ser inferior a vós - tem por objetivo preveni-los para que não sejais fisgados pelos anzóis da vã doutrina, mas para que possais conquistar a segurança plena em Cristo, que estava com o Pai antes de todas as eras, e que mais tarde nasceu da Virgem Maria sem qualquer intercurso com o homem. Ele também teve uma vida santa e curou todo tipo de moléstia e enfermidade que atingia o povo, e realizou sinais e maravilhas em benefício dos homens; e para aqueles que caíram no erro do politeísmo, Ele permitiu conhecer o único e verdadeiro Deus, Seu Pai, e experimentou a paixão, sofrendo na cruz em razão dos judeus assassinos, no tempo do governador Pôncio Pilatos, quando Herodes era rei. Ele morreu e ressuscitou, e ascendeu aos céus, de volta Àquele que o enviara, e sentou-se à mão direita de Deus [Pai]; e retornará no fim dos tempos, na glória de Deus Pai, para julgar os vivos e os mortos de acordo com assuas obras. Todo aquele que conhece e crê nestas coisas com total segurança, é feliz; sejais, pois, agora, amantes de Deus e de Cristo, garantia plena da nossa esperança, para que ninguém possa vos desviar.
XII.  Que eu possa alegrar-me convosco em todas as coisas, se o merecer! Mesmo acorrentado, não sou digno de ser comparado a qualquer de vós que estais em liberdade. Sei que vós não estais inchados de orgulho, já que possuis Jesus em vós mesmos. E tudo o mais que louvo em vós, sei que guardais com modéstia de espírito; como está escrito: "O homem justo é seu próprio acusador"; e novamente: "Declara primeiro as tuas iniqüidades e poderás ser justificado"; e ainda: "Quando tiverdes feito todas as coisas que são ordenadas a ti, seremos servos inúteis para aquele que aprecia entre os homens, uma abominação aos olhos do Senhor"; também diz a Escritura: "Deus seja misericordioso comigo, pecador". E Davi diz: "Quem sou eu perante Ti, ó Senhor, já que Tu me glorificaste até agora?". E Moisés, que era "o mais obediente de todos os homens", disse a Deus: "Minha voz é fraca e mal sei falar". Sejais também pobres em espírito para que sejais exaltados; pois "aquele que se humilhar será exaltado e aquele que se exaltar será humilhado".
XIII. Portanto, estudai para manter-vos na doutrina do Senhor e dos apóstolos, para que todas as coisas que fizerdes possam prosperar tanto na carne quanto no espírito, na fé e no amor, unidos com o vosso admirável bispo, com a preciosa coroa espiritual do vosso presbitério e com os diáconos que estão em conformidade com Deus. Sejais submissos ao bispo e uns aos outros, como Cristo é com o Pai, para que haja unidade entre vós, de acordo com [a vontade de] Deus.
XIV. Sei que estais repletos de tudo o que é bom e, por isso, exortei-vos brevemente no amor de Jesus Cristo. Lembrai-vos de mim em vossas orações, para que eu possa alcançar a Deus. E [lembrai-vos também] da Igreja que está na Síria, da qual não sou digno de ser chamado seu bispo. Necessito da vossa oração unida em Deus e do vosso amor para que a Igreja da Síria possa ser digna, conforme sua boa ordem, de ser edificada em Cristo.
XV. Os efésios que habitam em Esmirna - de onde eu vos escrevo - estão aqui para a glória de Deus, como vós também fizestes; eles me reconfortam e vos saúdam, assim como Policarpo. As demais igrejas, em honra de Jesus Cristo, também vos saúdam. Ficai bem em harmonia, vós que obtivestes o Espírito inseparável, em Jesus Cristo, pela vontade de Deus.




FONTE: http://textosantigos.blogspot.com/

06/06/2012

A CRIAÇÃO E A QUEDA - Santo Atanásio


Esta pequena obra foi escrita por volta do ano 350 e demonstra o conhecimento exegético de Santo Atanásio sobre a criação e queda do gênero humano.

Em nosso Livro anterior tratamos suficientemente sobre alguns dos principais pontos do culto pagão dos ídolos, e como estes falsos deuses surgiram originalmente. Nós também, pela graça de Deus, indicamos brevemente que o Verbo do Pai é Ele mesmo divino, que todas as coisas que existem devem seu próprio ser à sua vontade e poder e que é através dEle que o Pai dá ordem à criação, por Ele que todas as coisas são movidas e através dEle que recebem o seu ser. Agora, Macário, verdadeiro amante de Cristo, devemos dar um passo a mais na fé de nossa sagrada religião e considerar também como o Verbo se fêz homem e surgiu entre nós.
Para tratar destes assuntos é necessário primeiro que nos lembremos do que já foi dito. Deves entender por que o Verbo do Pai, tão grande e tão elevado, se manifestou em forma corporal. Ele não assumiu um corpo como algo condizente com a sua própria natureza, mas, muito ao contrário, na medida em que Ele é Verbo, Ele é sem corpo. Manifestou-se em um corpo humano por esta única razão, por causa do amor e da bondade de seu Pai, pela salvação de nós homens. Começaremos, portanto, com a criação do mundo e com Deus seu Criador, pois o primeiro fato que deves entender é este: a renovação da Criação foi levada a efeito pelo mesmo Verbo que a criou em seu início.
Em relação à criação do Universo e à criação de todas as coisas têm havido uma diversidade de opiniões, e cada pessoa tem proposto a teoria que bem lhe apraz. Por exemplo, alguns dizem que todas as coisas são auto originadas e, por assim dizer, totalmente ao acaso. Entre estes estão os Epicúreos, os quais negam terminantemente que haja alguma Inteligência anterior ao Universo.
Outros fazem seu o ponto de vista expressado por Platão, aquele gigante entre os Gregos. Ele disse que Deus fêz todas as coisas da matéria pre-existente e incriada, assim como o carpinteiro faz as suas obras da madeira que já existe. Mas os que sustentam esta opinião não se dão conta que negar que Deus seja Ele próprio a causa da matéria significa atribuir-Lhe uma limitação, assim como é indubitavelmente uma limitação por parte do carpinteiro que ele não possa fazer nada a não ser que lhe esteja disponível a madeira.
Então, finalmente, temos a teoria dos Gnósticos, que inventaram para si mesmos um Artífice de todas as coisas, outro que não o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Estes simplesmente fecham os seus olhos para o sentido óbvio das Sagradas Escrituras.
Tais são as noções que os homens têm elaborado. Mas pelo divino ensinamento da fé cristã nós sabemos que, pelo fato de haver uma Inteligência anterior ao Universo, este não se originou a si mesmo; por ser Deus infinito, e não finito, o Universo não foi feito de uma matéria pré-existente, mas do nada e da absoluta e total não existência, de onde Deus o trouxe ao ser através do Verbo. Ele diz, neste sentido, no Gênesis:
"No início Deus criou o Céu e a Terra" [Gen. 1,1].
e novamente, através daquele valiosíssimo livro ao qual chamamos "O Pastor":
"Crêde primeiro e antes de tudo o mais que há apenas um só Deus o qual criou e ordenou a todas as coisas trazendo-as da não existência ao ser".
Paulo também indica a mesma coisa quando nos diz:
"Pela fé conhecemos que o mundo foi formado pela Palavra de Deus, de tal modo que as coisas visíveis provieram das coisas invisíveis" [Heb. 11, 3].
Pois Deus é bom, ou antes, Ele é a fonte de toda a bondade, e é impossível por isso que Ele deva algo a alguém. Não devendo a existência a ninguém, Ele criou a todas as coisas do nada mediante seu próprio Verbo, nosso Senhor Jesus Cristo, e de todas as suas criaturas terrenas ele reservou um cuidado especial para a raça humana. A eles que, como animais, eram essencialmente impermanentes, Deus concedeu uma graça de que as demais criaturas estavam privadas, isto é, a marca de sua própria Imagem, uma participação no ser racional do próprio Verbo, de tal modo que, refletindo-O, eles mesmos se tornariam racionais expressando a Inteligência de Deus tanto quanto o próprio Verbo, embora em grau limitado. Deste modo, os homens poderiam continuar para sempre na bem aventurada e única verdadeira vida dos santos no paraíso. Como a vontade do homem poderia, porém, voltar-se para vários caminhos, Deus assegurou-lhes esta graça que lhes havia concedido condicionando-a desde o início a duas coisas. Se eles guardassem a graça e retivessem o amor de sua inocência original, então a vida do paraíso seria sua, sem tristeza, dor ou cuidados, e após ela haveria a certeza da imortalidade no céu. Mas se eles se desviassem do caminho e se tornassem vis, desprezando seu direito natal à beleza, então viriam a cair sob a lei natural da morte e viveriam não mais no paraíso, mas, morrendo fora dele, continuariam na morte e na corrupção. Isto é o que a Sagrada Escritura nos ensina, ao proclamar a ordem de Deus:
"De todas as árvores que estão no jardim vós certamente comereis, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não havereis de comer, pois certamente havereis de morrer" [Gen. 2].
"Certamente havereis de morrer", isto é, não apenas morrereis, mas permanecereis no estado de morte e corrupção.
Estarás talvez a divagar por que motivo estamos discutindo a origem do homem se nos propusemos a falar sobre o Verbo que se fêz homem. O primeiro assunto é de importância para o último por este motivo: foi justamente o nosso lamentável estado que fêz com que o Verbo se rebaixasse, foi nossa transgressão que tocou o seu amor por nós. Pois Deus havia feito o homem daquela maneira e havia querido que ele permanecesse na incorrupção. Os homens, porém, tendo voltado da contemplação de Deus para o mal que eles próprios inventaram, caíram inevitavelmente sob a lei da morte. Em vez de permanecerem no estado em que Deus os havia criado, entraram em um processo de uma completa degeneração e a morte os tomou inteiramente sob o seu domínio. Pois a transgressão do mandamento os estava fazendo retornarem ao que eles eram segundo a sua natureza, e assim como no início eles haviam sido trazidos ao ser a partir da não existência, passaram a trilhar, pela degeneração, o caminho de volta para a não existência. A presença e o amor do Verbo os havia chamado ao ser; inevitavelmente, então, quando eles perderam o conhecimento de Deus, juntamente com este eles perderam também a sua existência. Pois é somente Deus que existe, o mal é o não-ser, a negação e a antítese do bem. Pela natureza, de fato, o homem é mortal, já que ele foi feito do nada; mas ele traz também consigo a Semelhança dAquele Que É, e se ele preservar esta Semelhança através da contemplação constante, então sua natureza seria despojada de seu poder e ele permaneceria indegenerescente. De fato, é isto o que vemos escrito no Livro da Sabedoria:
"A observância de Suas Leis é a garantia da imortalidade" [Sab. 6, 18].
E, incorrompido, o homem seria como Deus, conforme o diz a própria Escritura, onde afirma:
"Eu disse: `Sois deuses, e todos filhos do Altíssimo. Mas vós como homens morrereis, caireis como um príncipe qualquer'" [Sal. 81, 6].
Esta, portanto, era a condição do homem. Deus não apenas o havia feito do nada, mas também lhe tinha graciosamente concedido a Sua própria vida pela graça do Verbo. Os homens, porém, voltando-se das coisas eternas para as coisas corruptíveis, pelo conselho do demônio, se tornaram a causa de sua própria degeneração para a morte, porque, conforme dissemos antes, embora eles fossem por natureza sujeitos à corrupção, a graça de sua união com o Verbo os tornava capazes de escapar na lei natural, desde que eles retivessem a beleza da inocência com a qual haviam sido criados. Isto é o mesmo que dizer que a presença do Verbo junto a eles lhes fazia de escudo, protegendo-os até mesmo da degeneração natural, conforme também o diz o Livro da Sabedoria:
"Deus criou o homem para a imortalidade e como uma imagem de sua própria eternidade; mas pela inveja do demônio entrou no mundo a morte" [Sab. 2, 23].
Quando isto aconteceu os homens começaram a morrer e a corrupção correu solta entre eles, tomou poder sobre os mesmos até mais do que seria de se esperar pela natureza, sendo esta a penalidade sobre a qual Deus os havia avisado prevenindo-os acerca da transgressão do mandamento. Na verdade, em seus pecados os homens superaram todos os limites. No início inventaram a maldade; envolvendo-se desta maneira na morte e na corrupção, passaram a caminhar gradualmente de mal a pior, não se detendo em nenhum grau de malícia, mas, como se estivessem dominados por uma insaciável apetite, continuamente inventando novo tipos de pecados. Os adultérios e os roubos se espalharam por todos os lugares, os assassinatos e as rapinas encheram a terra, a lei foi desrespeitada para dar lugar à corrupção e à injustiça, todos os tipos de iniqüidades foram praticados por todos, tanto individualmente como em comum. Cidades fizeram guerra contra cidades, nações se levantaram contra nações, e toda a terra se viu repleta de divisões e lutas, enquanto cada um porfiava em superar o outro em malícia. Até os crimes contrários à natureza não foram desconhecidos, conforme no-lo diz o Apóstolo mártir de Cristo:
"Suas próprias mulheres mudaram o uso natural em outro uso, que é contra a natureza; e os homens também, deixando o uso natural da mulher, arderam nos seus desejos um para com o outro, cometendo atos vergonhosos com o seu próprio sexo, e recebendo em suas próprias pessoas a recompensa devida pela sua perversidade" [Rom. 1, 26-7].