Com citações de obras do Pe. Manoel Bernardes.
“Quanta verdade é que a figura deste mundo sempre está passando, e nós com ela!
Dos sábios e justos diz Isaías que vêem a terra de longe. Ora vem cá, alma minha, faze por ser sábia, toma as asas da contemplação, e suspende-se nelas, e olha de longe para esta bola da terra, e verás como a sua figura sempre está passando.
Que é o que vês? Mares, rios, árvores, montes, vales, campinas, desertos, povoados... e tudo passando.” - O mundo passa.
“Que o Criador, e as criaturas todas estejam continuamente lembrando ao homem, que há de morrer; e que possa o homem esquecer-se deste desengano! Muito é para admirar, e muito mais para sentir. Se estendermos os olhos da consideração por tudo o que abraça a redondeza do Céu e da terra, acharemos que em todo o tempo, e em toda a parte nos tem Deus postos manifestos avisos, e sinais da nossa morte. Mas também acharemos, que em todo o tempo, e em toda a parte tem o homem posto os sinais do esquecimento da sua morte.” - O sermão das Cinzas.
“Logo, se eu mostrar como a nossa vida é misturada, ao menos, com três tantos de morte, provado ficará que lhe não devemos chamar, absoluta e simplesmente, vida, pois vai o seu vigor tão aguado e a sua doçura tão salgada com as propriedades da morte.” - A vida é morte.
“Sejamos alegres pela esperança, sofridos nas tribulações. Porque quem bem espera bem sofre, e quem levanta o espírito aos bens eternos sabe portar-se bem nas misérias temporais.
Sabeis que coisa é a Esperança? Uma engenhosa máquina com que o espírito se guinda desde o mundo para a eternidade; e assim não lhe carrega o peso dos males que cá embaixo leva, porque tanto furta à aflição do trabalho que padece, quanto se levanta à contemplação do descanso que espera.” - A esperança.
“Ó doçura de meu coração! Ó vida de minha alma! Ó agradável repouso de meu espírito! Abstraí-me de todas as criaturas, para que só em vós descanse.” - Suspiro da alma amante.
“Quem quiser pois medir a grandeza do corpo do pecado, olhe para a sombra que este causou no corpo de Cristo. Os altos montes medem-se pela sombra que fazem, e porque a sombra da terra chega a escurecer o firmamento, coligimos que o corpo da mesma terra é vastíssimo; logo, se a sombra do pecado chegou a escurecer o mesmo filho de Deus, quem deixará já de reconhecer a grandeza do corpo do pecado?
Santo Astério, Bispo de Amasea, disse que um homem se podia ver em outro homem como em um espelho, em razão da semelhança da natureza e obrigação da caridade. Cum vides hominem te ipsum in ipso vides. Mas se Cristo é por excelência o homem, e com este nome foi mostrado ao povo no meio de suas penas e aflições: Ecce homo, e este homem tomou sobre si a semelhança de nossas culpas representadas em suas penas, muito melhor se pode dizer que quando qualquer pecador olha para este Senhor Crucificado, asi mesmo se ve nele: Cum vides hominem te ipsum in ipso vides.” - Sermão do segundo domingo da Quaresma
“Mas esta nossa vida outra maior parte tem de morte, por ser vida limitada, finita e, enfim, mortal. Desde que nascemos, e ainda antes de nascermos, já de certo vamos caminhando para a morte.
Quantos homens há, tantos cadáveres somos; quanta carne do pecado, tanta cinza da morte. Se assim não fora, não diria Deus e a Igreja a todos nós, que somos agora em vida o mesmo pó e cinza que havemos ser na morte: Pulvis es, et in pulverem reverteris. Como quem diz: Então sereis mortos, e já agora também cinza e pó; porque se ausentou a alma da nossa vida, que era a imortalidade, e assim ficou vida morta.” - A vida é morte.
“Quem no mundo espera descanso durável, ou verdadeiro, sonha, e brevemente se acha desenganado, trocando-se-lhe os pastos pingues em duríssimo jugo, e o que imaginava gozo e repouso em dor e trabalho. Porém, quem constitui a sua esperança em bens eternos e na consolação e auxílio divino não se engana. Os seus sonhos são verdade de fé, pois as Escrituras afirmam que a tribulação bem levada gera boa prova, e a boa prova legítima esperança, com a qual ninguém fica envergonhado.
Neste mundo faz Deus dos ímpios vara com que castiga os justos; mas depois chama os justos para o Reino, e lança a vara no fogo...” - A esperança.
“Olhai o tráfego! Tudo ferve, tudo se muda por instantes. Se divertirdes os olhos, dali a nada tudo achareis virado. O rico já é pobre, o mecânico já é fidalgo, o moço já é velho, o são já é enfermo, e o homem já é cinzas. Já são outras cidades, outras ruas, outra linguagem, outros trajos, outras leis, outros homens.
... Tudo passa!” - O mundo passa.
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