“Se alguém não confessar que Emmanuel é Deus em verdade e que, portanto, a Santíssima Virgem é Mãe de Deus, seja anátema”
Nota do blog Salve Regina: “Nós aderimos de todo o coração e com toda a nossa alma à Roma católica, guardiã da fé católica e das tradições necessárias para a manutenção dessa fé, à Roma eterna, mestra de sabedoria e de verdade.
Pelo contrário, negamo-nos e sempre nos temos negado a seguir a Roma de tendência neomodernista e neoprotestante que se manifestou claramente no Concílio Vaticano II, e depois do Concílio em todas as reformas que dele surgiram.” Mons. Marcel Lefebvre
Pe. Juan Carlos
Iscara, FSSPX
Há um pequeno problema quando falamos de
“Igreja primitiva” ou “cristãos primitivos”. O começo desse período histórico é
claro: a fundação da Igreja, Pentecostes; mas, quando esse período acaba?
Para responder a essa pergunta de forma mais segura, vamos nos ater às provas
da devoção a Nossa Senhora nos relativamente obscuros Séculos II e III até o
reconhecimento magisterial da maternidade divina no Concílio de Éfeso, em 431.
Nas Escrituras, Maria aparece
de forma velada nas profecias do Antigo Testamento, sendo exposta nos primeiros
capítulos do Evangelho de São Lucas; então, ela volta a uma relativa
obscuridade durante o ministério de Cristo e reaparece no Apocalipse. Esse
padrão de exposições e obscuridades, de alguma maneira, repetiu-se no
desenvolvimento da doutrina e da devoção mariana durante os primeiros séculos
da Igreja.
Os primeiros cristãos pregavam
um Deus, encarnado em Cristo, criador e redentor, ao contrário da
multiplicidade dos deuses pagãos. Nos primórdios dessa pregação, enfatizar a
pessoa da Virgem-Mãe poderia ter criado confusão, comparações infelizes ou
sincretismos com os mitos pagãos*. Mas, por outro lado, a humanidade e a
maternidade de Maria tinham que ser enfatizadas para expor a realidade da
Encarnação de Cristo como Homem-Deus, principalmente contra aquelas heresias
antigas que negavam a humanidade de Cristo.
Portanto, os Padres dos Séculos
II e III enfatizaram apenas com o passar do tempo a excepcionalidade de Maria,
sua santidade, os privilégios extraordinários que lhes foram dados por Deus
para cumprir sua missão única e universal ao lado de seu Filho. Eles tornam
claro que sua doutrina mariana não era supérflua ou uma opinião teológica, mas
necessária para preservar a integridade da fé, pois Maria está intimamente
unida ao mistério da união das naturezas humana e divina em Cristo. Portanto,
nas primeiras profissões de fé, a confissão de Cristo estava inseparavelmente
unida à confissão da excepcionalidade de Maria.
O primeiro grande teólogo,
Santo Irineu de Lyon (falecido em 202), ao traçar um paralelo entre Eva e
Maria, enfatizou essa excepcionalidade. Maria cooperou na obra de nossa
salvação: ela “se tornou causa de salvação para si mesma e para toda a raça
humana”. Como ela é “o ventre puro que regenera os homens em Deus”, ela se tornou
“a advogada de Eva” perante Cristo.
Esses temas foram melhor
desenvolvidos por Orígenes em meados do Século III, não apenas se dirigindo a
Maria como “Mãe de Deus”, mas, baseado no fato de que ela era a “nova Eva”,
também se dirigindo a ela como “mãe dos fiéis”. Sendo duplamente santificada
por uma consagração dupla (a descida do Espírito Santo em sua alma e de seu
Filho em seu ventre), ela se tornou um canal ativo do Espírito Santo para a
santificação dos homens.
Enquanto a compreensão
teológica do papel de Maria na economia da salvação se desenvolvia nesses
séculos, também a piedade mariana se desenvolvia em correspondência a ela,
gerando o recurso à sua intercessão.
A primeira prova dessa piedade
dos fiéis é encontrada na decoração e nas inscrições das catacumbas cristãs. As
mais antigas e importantes são das catacumbas romanas (Priscilla, Agnes, Coemeterium majus), dos Séculos
III e IV, representando a Virgem com seu Filho, ou a adoração dos Reis Magos,
com um homem de pé atrás da Virgem e apontando para uma estrela, ou mesmo a
Anunciação.
Essas são representações
claras, “literais” de passagens evangélicas e da Mãe e de seu Filho, apontando
diretamente para o mistério da Encarnação, pois a imagem afirma o que a heresia
nega, tanto a realidade da natureza humana de Cristo, quanto a maternidade
divina de Maria. Portanto, essas imagens não eram objetos de veneração, mas um
sinal de reconhecimento, uma profissão de fé e uma esperança e um convite aos
visitantes para rezarem por aqueles enterrados ali.
Nos tempos em que essas imagens
começaram a ser pintadas nas catacumbas romanas, isto é, pelo Século II, um
peregrino veio à Cidade, Abércio, Bispo de Hierápolis na Phrygia Salutaris (um
nome grande do que, hoje, é uma pequena cidade na atual Turquia). Sendo um
homem velho, ao retornar de sua longa jornada, ele preparou essa tumba, com uma
inscrição que, hoje, está no Museu de Latrão. A inscrição dá testemunho, em
termos velados, não apenas da difusão do Cristianismo, da preeminência da Sé de
Roma, do Batismo e da Eucaristia, mas também menciona Nossa Senhora:
A fé me levou
adiante em todos os locais, e, em todos os locais, providenciou, como meu
alimento, um Peixe de grande tamanho e perfeito, que uma Santa Virgem apanhou
com suas mãos de uma fonte, e essa fé sempre dá a seus amigos o alimento,
dispondo de um vinho de grande virtude, ministrando-lhe misturado com o pão.
A menção do “Peixe” é um
acrônimo para Iēsous
Christos, Theou Yios, Sōtēr, “Jesus Cristo, Filho de Deus,
Salvador”, como Santo Agostinho explica (De Civ. Dei,
XVIII:23), e a Virgem é a que trouxe Cristo a nós.
De quase um século mais tarde,
temos um fragmento de um papiro egípcio em grego, hoje na Biblioteca John
Rylands, Manchester, Reino Unido. Ele data de 250-280, um período de
perseguições metódicas e cada vez mais violentas (Valeriano, Décio, até
chegarmos a Diocleciano). Ele contém uma versão de uma oração que ainda
rezamos, o Sub tuum prasesidium:
Sob vossa proteção
nos refugiamos, ó Santa Mãe de Deus! Não desprezeis nossas súplicas em nossas
necessidades, mas livrai-nos do mal, puríssima e beatíssima.
Ela expressa a fé da Igreja em
Nossa Senhora de maneira simples, sucinta. Ela é a Mãe de Deus, a Theotokos, “portadora de
Deus”, Deipara, Dei Genitrix,
“a que dá nascimento a Deus”. Ela tem um poder inaudito de intercessão – embora
ainda não se lhe tenha dado o título ainda, ela é reconhecida como Mediatrix de todas as
graças. Finalmente, ela é a “única bem aventurada”, escolhida especialmente por
Deus, e “a única pura”, perpetuamente virgem.
Ao fim do Século IV, no Império
Romano do Oriente (Império Bizantino), a festa litúrgica em honra de Nossa
Senhora mais antiga de que se tem registro era celebrada no dia após o Natal.
Nos Séculos IV e V, as orações
litúrgicas em uso no Oriente ajuntavam, à moda oriental, os termos de louvor a
Maria e invocavam sua intercessão. Por exemplo, na Liturgia Antioquena dos Doze
Apóstolos:
Celebremos o
memorial da toda pura, imaculada, gloriosíssima, bem aventurada Senhora, Mãe de
Deus e sempre virgem Maria; que sejamos protegidos do mal por suas orações e
súplicas, e que a misericórdia esteja sobre nós em ambos os mundos.
Finalmente, em 22 de Junho de
431, o concílio ecumênico reunido em Éfeso declarou, solenemente: “Se alguém
não confessar que Emmanuel é Deus em verdade e que, portanto, a Santíssima
Virgem é Mãe de Deus (pois ela trouxe consigo, carnalmente, o Verbo de Deus
tornado carne), seja anátema”. A devoção do povo a Nossa Senhora era tamanha
que, quando essa frase se espalhou pela cidade, espontaneamente, uma multidão
alegre se reuniu na Igreja de Santa Maria, onde o Concílio aconteceu, e
acompanhou os padres conciliares na saída, em procissão, com tochas.
Até Éfeso, o discurso teológico
sobre Maria estava intimamente conectado à expressão de verdades cristológicas,
mas, após Éfeso, a atenção se voltou para Maria em si, e uma veneração
triunfante da Theotokos se espalhou como fogo nas Artes, na Liturgia e nas
devoções populares.
ADENDO DA PERMANÊNCIA:
Tudo o que o Pe. Iscara afirma
nesse ponto é verdadeiro; porém, apenas para ilustrar que os cristãos sempre
creram e praticaram o culto mariano desde os tempos mais remotos (e que,
portanto, essa crença é apostólica), tomamos a liberdade de reunir as seguintes
citações:
- Santo Inácio de
Antioquia (Séculos I e II): “Existe apenas um médico, carnal e espiritual,
gerado e não gerado, Deus feito carne, Filho de
Maria e Filho de Deus, vida verdadeira na morte, vida primeira
passível e agora impassível, Jesus Cristo Nosso Senhor” (Epístola aos Efésios, Capítulo 7)
“Nosso Deus, Jesus Cristo, foi,
de acordo com os desígnios de Deus, concebido no ventre de Maria, da linhagem
de Davi, mas pelo Espírito Santo” (Capítulo 18);
“A virgindade de Maria estava
escondida do príncipe deste mundo, bem como o nascimento de seu Filho e a morte
do Senhor; três mistérios concebidos em silêncio pelo Senhor”; perceba-se que
Santo Inácio compara a virgindade de Maria com a própria Paixão de Cristo
(Capítulo 19);
- Santo Aristides
de Atenas (Século II): “Os cristãos, portanto, remontam o princípio de
sua religião em Jesus, o Messias; e Ele é chamado de Filho do Deus Altíssimo. E
está dito que Deus desceu do Céu, e de uma
virgem hebraica assumiu e cobriu-se da carne [...] “(Apologia de Aristides)
- São Justino
Mártir (Século II): “[...] Jesus Cristo, o Filho de Deus, nasceu sem
pecado, de uma virgem da linhagem de Abraão” (Diálogo com Trifo, Capítulo 23)
“[...] de acordo com a vontade
do Pai, era necessário que elas [as tradições judaicas] tivessem seu fim com
Ele, que nasceu de uma virgem, da família de Abraão e da tribo de Judá
(Capítulo 43)
“Contemplai: a virgem conceberá
e terá um filho, e seu nome será Emmanuel” (Capítulo 43)
“É evidente a todos que, na
raça de Abraão, ninguém nasceu de uma virgem de acordo com a carne, nem se diz
que alguém tenha nascido de uma virgem, exceto Cristo, Nosso Senhor. Mas, como
vós e vossos professores ousais afirmar que, na profecia de Isaías, não está
dito ‘contemplai: a virgem conceberá’, mas ‘contemplai: a jovem mulher
conceberá e terá um filho’, e como vós explicais a profecia como se falasse de
Ezequias, eu me proporei a debater esse
ponto com vós em oposição a vós e a mostrar que essa passagem faz referência
Àquele que reconhecemos como Cristo (Capítulo 43); o restante
do Diálogo faz
outras referências a essa profecia de Isaías, atribuindo-a a Cristo, bem como
ao fato de que Cristo nasceu de uma virgem
- São Dionísio Areopagita (Século I):
“Que [referindo-se a Cristo), sendo concebido, formado e gerado pelo Espírito
Santo e do sangue virginal da Virgem Maria, santa mãe de Deus, era verdadeiro Homem [...] (Liturgia de São Dionísio, Bispo de Atenas);
o mesmo Santo chega a afirmar que, quando a viu, tê-la-ia tomado por uma
divindade – devido aos seus secretos atrativos e à sua beleza incomparável – se
a fé, em que estivesse bem confirmado, não lhe tivesse garantido o contrário (Tratado da Verdadeira Devoção,
São Luís Maria Grignion de Montfort);
- “[…] E ele [São Gabriel]
revelou a Maria como, nela, deveria nascer o mistério supremo divino de Deus” (Da Hierarquia Celestial, Caput
IV, Seção IV)
Fonte: http://permanencia.org.br/drupal/node/6124
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Antes de postar seu comentário sobre a postagem, leia: Todo comentário é moderado e deverá ter o nome do comentador. Comentário que não tenha a identificação do autor (anônimo), ou sua origem via link e ainda que não tenha o nome do emitente no corpo do texto, bem como qualquer tipo de identificação, poderá ser publicado se julgar pertinente o assunto. Como também poderá não ser publicado, mesmo com as identificações acima tratadas, caso o assunto for julga impertinente ou irrelevante ao assunto. Todo e qualquer comentário só será publicado se não ferir nenhuma das diretrizes do blog, o qual reserva o direito de publicar ou não qualquer comentário, bem como de excluí-los futuramente. Comentários ofensivos contra a Santa Madre Igreja não serão aceitos. Comentários de hereges, de pessoas que se dizem ateus, infiéis, de comunistas só serão aceitos se estiverem buscando a conversão e a fuga do erro. De indivíduos que defendem doutrinas contra a Verdade revelada, contra a moral católica, de apoio a grupos ou ideias que contrários aos ensinamentos da Igreja, ao catecismo do Concílio de Trento, ferem, denigrem, agridem, cometem sacrilégios a Deus Pai, Deus Filho, Deus Espírito Santo, a Mãe de Deus, seus Anjos, Santos, ao Papa, ao clero, as instituições católicas, a Tradição da Igreja, também não serão aceitos. Apoio a indivíduos contrários a tudo isso, incluindo ao clero modernista, só será publicado se tiver uma coerência e não for qualificado como ofensivo, propagador do modernismo, do sedevacantismo, do protestantismo, das ideologias socialistas, comunistas e modernistas, da maçonaria e do maçonismo, bem como qualquer outro tópico julgado impróprio, inoportuno, imoral, etc. Alguns comentários podem ser respondidos via e-mail, postagem de resposta no blog, resposta do próprio comentário ou simplesmente não respondido. Reservo o direito de publicar, não publicar e excluir os comentários que julgar pertinente. Para mensagens particulares, dúvidas, sugestões, inclusive de publicações, elogios e reclamações, pode ser usado o quadro CONTATO no corpo superior do blog versão web. Obrigado! Adm do blog.