PRIMEIRO
CONCÍLIO ECUMÊNICO DE NICÉIA
Digressões sobre o Número de Cânones do Concílio de Nicéia I
Segundo Hefele (História dos Concílios, Vol. I. pp.355
e seguintes), podemos simplificar tudo o que de discussões houve sobre este
controvertido ponto do número dos Cânones de Nicéia I, da seguinte maneira
(partimos do testemunho dos autores Gregos e Latinos que viveram por volta do
século seguinte ao Concílio):
a.
O primeiro dentre os autores gregos a ser consultado é o
erudito Teodoreto que viveu cerca de um século após o Concílio de Nicéia. Ele
disse em sua História da
Igreja: "Depois
da condenação de Ário, os bispos, reuniram-se mais uma vez, e decretaram 20
Cânones sobre a disciplina eclesiástica".
b.
Vinte anos depois, Gelásio, Bispo de Cizico, após muita
pesquisa no documentos mais antigos, escreveu uma história do Concílio de
Nicéia. Gelásio também disse expressamente que o Concílio decretou 20 cânones
e, o que é mais importante, fizeram o texto original dos Cânones exatamente na
mesma ordem e igualdade com o teor que encontramos em outros lugares.
c.
Rufino é mais antigo do que esses dois historiadores. Nasceu
perto do tempo em que o Concílio de Nicéia foi convocado e após cerca de um
século escreveu sua célebre História da Igreja, na qual inseriu uma tradução
latina dos cânones de Nicéia. Rufino também só tomou conhecimento desses 20
Cânones, mas como dividiu o sexto e o oitavo em duas partes, apresentou 22
Cânones que são, exatamente, iguais aos 20 citados por outros historiadores.
d.
A famosa discussão entre os bispos africanos e os bispos de
Roma sobre o assunto dos apelos a Roma nos dá um testemunho muito importante
sobre o verdadeiro número dos Cânones de Nicéia. O presbítero Apiário de Siccda
da África, havendo sido deposto por muitos crimes, apelou para Roma. O Papa
Zózimo (417-418) levou em consideração o apelo, mandou legados à África e para
provar que tinha o direito de assim agir, citou um Cânon do Concílio de Nicéia
contendo estas palavras: "Quando
um bispo julga que foi deposto injustamente por seus colegas, pode apelar para
Roma, e o Bispo Romano poderá decidir o problema como 'judices in
partibus'". O Cânon citado pelo Papa não pertence ao Concílio de
Nicéia, como ele afirmou. Era o Cânon V do Concílio de Sardes (o sétimo na
versão latina). O que evidenciou o erro de Zózimo foi que, em antigas cópias,
os Cânones de Nicéia e Sardes eram escritos consecutivamente, com as mesmas
figuras, e sob o título comum de Cânones do Concílio de Nicéia. Zózimo pode, de
boa fé, ter caído em erro, que compartilhou com os autores gregos, seus
contemporâneos, que também misturaram os Cânones de Nicéia com os de Sardes. Os
bispos africanos, não encontrando o Cânon citado pelo Papa nem em suas cópias
gregas nem nas latinas, consultaram em vão também a cópia que o bispo Cecílio
(que estivera pessoalmente presente ao Concílio de Nicéia), trouxera para
Cartago. Os legados do Papa então declararam que eles não deveriam se apoiar
sobre essas cópias. Eles, então, concordaram em mandar buscar em Alexandria e
em Constantinopla dos patriarcas dessas duas cidades cópias autênticas dos
Cânones de Nicéia. Os bispos da África queriam que, por seu lado, o Papa
Bonifácio tomasse a mesma medida (enquanto isso o Papa Zózimo havia morrido, em
418), e mandasse buscar cópias dos arcebispos de Constantinopla, Alexandria e
Antioquia. Cirilo de Alexandria e Ático de Constatinopla, de fato, mandaram
cópias exatas e fiéis do Credo e Cânones de Nicéia. Igualmente dois eruditos de
Constantinopla, Teilo e Tearisto traduziram os Cânones para o Latim. A tradução
deles foi preservada até nós nas atas do VI Concílio de Cartago. Elas contêm
apenas os 20 Cânones ordinários. Pensou-se à primeira vista que continham 21
Cânones mas, numa consideração final, chegou-se à conclusão, como Arduino
provou, que o XXI artigo era nada mais do que uma nota histórica anexa aos
Cânones de Nicéia pelos Padres de Cartago. Ela está concebida nestes termos: "Depois que os bispos
decretaram estas regras de Nicéia, e depois que o santo Concílio decidiu sobre
a primitiva regra para a celebração da Páscoa, a paz e unidade de fé se
restabeleceram entre o Oriente e o Ocidente. Isso era o que os bispos africanos
tinham considerado correto acrescentar de acordo com a história da Igreja".
Os bispos da África despacharam ao Papa Bonifácio as cópias que tinham mandado
buscar em Alexandria e em Constantinopla, no mês de novembro do ano 419, e
subseqüentemente em suas cartas a Celestino (423-432), sucessor de Bonifácio,
eles apelaram para o texto desses documentos.
e.
Todas as antigas coleções dos Cânones, em Latim ou em Grego,
reunidas no séc. IV ou, certamente, no máximo, no V século concordam em dar
somente esses 20 Cânones a Nicéia. A mais antiga dessas coleções foi realizada
pela Igreja Grega, e, no decorrer do tempo, fez-se dela um grande número de
cópias. Muitas delas chegaram até nós. Nem o jesuíta Sismond nem seus
auxiliares mencionam quais os manuscritos que foram consultados para a presente
edição. Provavelmente, foram manuscritos extraídos de várias bibliotecas, e
especialmente da do Vaticano. As coleções latinas dos Cânones dos Concílios
também mostraram o mesmo resultado. Exemplo delas é a mais antiga e mais
notável de todas, a Prisca, e aquela de Dionísio, o Pequeno, que foi coligida
por volta do ano 500. O testemunho dessa última coleção é o mais importante, e
cita o número de 20 Cânones.
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