Na manhã de 30 de maio, quarta-feira após a festa da Santíssima
Trindade, por volta das sete horas da manhã, os dois dominicanos, Martin
Ladvenu e Jean Toutmouillé, vieram à prisão; eles tinham sido encarregados,
enquanto filhos da Inquisição, de informar à Joana o horrível suplício ao qual
ela deveria se preparar imediatamente. Estes dois religiosos eram muito jovens;
talvez, apesar de seu bem querer, eles não tinham toda a experiência necessária
para cumprir uma tarefa tão delicada e tão pesada. Tomando conhecimento de uma
só vez de que ela deveria morrer na mesma manhã entre as chamas, Joana teve uma
crise de verdadeira aflição. Ela soluçava dolorosamente e agarrava seus cabelos
em gestos convulsivos, os arrancando.
Quando ela se recuperou um pouco, ela exclamou:
"Infelizmente! tratam-me tão horrivelmente que meu corpo límpido, por
completo, que nunca foi corrompido, hoje será consumido e reduzido em cinzas!
Ah! ah! preferiria ser decapitada sete vezes do que ser queimada... Invoco
diante de Deus, o grande juiz, estes grandes erros e injustiças que me
fazem". Como Pierre Cauchon entrava, ela lhe diz: "Bispo, morro por
vós". Mas como pouco importava a Pierre Cauchon a morte de uma pobre moça,
ele lhe respondeu com indiferença: "Ah! Joana, tenha paciência, você morre
porque você não manteve o que tinha prometido...". - "Se o senhor
tivesse me colocado na prisão da Igreja, replicou Joana, isso não teria
acontecido, eis porque eu o cito diante de Deus"...
O apelo reiterado de Joana à justiça divina nos indica por demais que
sua angústia, por mais profunda que fosse, não era de alguma forma de
desesperança. Mas na agonia que ela atravessava, a santa deu provas mais
formais de esperança. Assim que o doutor Pierre Maurice, que tinha por várias
vezes a aconselhado e confessado, se aproximou, ela lhe perguntou: "Mestre
Pierre, onde estarei hoje, nesta mesma noite?" - "Você não tem
esperança no Senhor?" - "Sim, respondeu ela, e com a graça de Deus,
eu estarei no Paraíso".
Quando todos se retiraram, o dominicano Martin Ladvenu permaneceu junto
dela; ela se confessou longamente e minuciosamente, repassando por duas vezes
toda a sequência de suas menores faltas; depois do que, ela pediu para receber
a santa Comunhão. O irmão Martin estava completamente disposto a lha administrar,
mas ele não ousava a isso sem o consentimento do bispo de Beauvais. O oficial
Massieu, que, apesar de algumas fraquezas, sempre tivera certo interesse
pela Donzela, teve a coragem de se dirigir ao bispo. Ele obteve
além do esperado. Pierre Cauchon tinha alcançado seus fins políticos ao
conseguir condenar a Donzela; que lhe importava que ela recebesse ou não os
Sacramentos. Após ter deliberado por um instante com seus amigos, ele
respondeu: "Vá dizer ao irmão Martin para lhe dar o sacramento da Eucaristia
e tudo o que ela desejar". Mas se Joana fosse herética, relapsa e
obstinada em seus erros diabólicos, como se poderia admiti-la à Comunhão?
Contudo, fizeram isso com todas as honras devidas ao Santo Sacramento.
Com efeito, como um padre carregava a hóstia de uma maneira clandestina, sobre
a pátena, coberta somente com um véu, sem chamas e sem séquito, sem sobrepeliz
e sem estola, o irmão Martin Ladvenu, que a confissão e os sentimentos da santa
tinham por demais edificado, se indignou com esta falta e requisitou que o
pároco vizinho trouxesse o corpo de Cristo com solenidade. Logo o clero da
paróquia chegou em procissão, a cruz à frente; o oficiante, revestido com os
ornamentos sacerdotais, carregava o Santo Sacramento, um coroinha agitava o sinete
e uma multidão de fiéis seguiam munidos de tochas; um clérigo cantava no tom
monótono do dia ferial as litanias dos santos, e, em cada invocação, a multidão
respondia: "Rogai por ela. Rogai por ela". Quando o Santíssimo
Sacramento entrou na prisão, Joana caiu de joelhos; ela recebeu o corpo de seu
Senhor com lágrimas de amor e de consolação. Respeitaram por algum tempo o
fervor de sua ação de graças, depois lhe anunciaram que tinha chegado a hora de
ir ao martírio.
Até então, ao que tudo indica, Joana continuara a usar o hábito de homem
que ela tinha recuperado, o que prova que os próprios padres não acreditavam
que este fosse um crime tão grande, um sacrilégio. Antes de deixar a prisão,
vestiram-na com uma longa túnica preta de penitência, com um capuchinho ou boné
na cabeça. Um carro pesado e grosseiro espera a algum tempo no pátio do
castelo, era a charrete do carrasco. Fizeram ela subir. O padre Jean Massieu,
de batina preta, e o dominicano Martin Ladvenu, com túnica branca, entraram no
carro; o carrasco, sentado, pôs os cavalos em marcha. O governo inglês, por uma
demonstração militar completamente excepcional, assinalou a importância
política desta execução.
Mais de setecentos soldados armados com lanças e espadas escoltaram
Joana d'Arc; parecia que era a própria França que conduziam ao suplício. A
multidão, avisada de véspera da hora da execução, estava em massa nas ruas, ao
longo dos muros, nos cruzamentos, nas portas, nas janelas das casas. Do entorno
da cidade, os próprios camponeses tinham vindo para assistir ao espetáculo. O
carro, através de todo esse mundo e apesar dos esforços, dos gritos, dos golpes
dados pelos soldados contra a população, só avançava com muito esforço. Joana,
com as mãos juntas, rezava com tantas lágrimas e fervor, que os espectadores
dela estavam profundamente comovidos. Mesmo aqueles que tinham lhe sido
mais hostis, assim que a viram, foram ganhados pela emoção contagiosa e
ficaram em silêncio. Nicolas Loyseleur, o traidor, o Judas, que tinha tão
odiosamente abusado da confiança da jovem e de sua autoridade de confessor, não
pôde suportar por muito tempo este espetáculo. Coberto por remorsos, uma
verdadeira crise de desesperança o tomou. Foi como um acesso de terror e de
loucura. Viram-no, fora de si, com gestos estranhos e gritos frenéticos,
dividir a multidão, atravessar o cinturão dos soldados, chegar até a carroça,
que ele tentou escalar, e gritar por perdão. Os soldados, entendendo o que ele
queria, caíram sobre ele e o encheram de socos; ele iria ser morto, quando Warwick
chegou, o protegeu e lhe aconselhou para deixar Rouen o mais rápido, se ele
desejasse viver.
Contudo, a pesada charrete chegou diante da praça do Velho Mercado.
Joana perguntou: "É aqui que eu devo morrer?" Os padres que a
acompanhavam não tiveram coragem de lhe responder; as disposições tomadas para
o suplício eram muito mais significativas do que as palavras. Na praça, três
estrados tinham sido levantados: um, grande e suntuosamente adornado, para o
cardeal de Winchester, o bispo de Beauvais e todos os prelados e assessores;
outro, ainda considerável, para o intendente de Rouen, seu tenente, seus
oficiais e todo o poder secular; um terceiro, mais elevado, mas menor, formava
um tipo de cátedra onde deveriam se colocar o pregador e a condenada. Diante,
se elevava a fogueira, que tinham tido o cuidado de construir mais larga e mais
elevada do que de costume, a fim de permitir que todos constatassem a realidade
do suplício e da morte da Donzela. Sobre este cadafalso de gesso tinham pregado
este epíteto em letras maiúsculas:
"Joana, que se fez nomear a Donzela, mentirosa, perniciosa,
abusadora do povo, advinha, supersticiosa, blasfemadora de Deus, presunçosa,
que não professa a fé de Jesus Cristo, vingadora, idólatra, cruel, dissoluta,
invocadora de demônios, apóstata, cismática e herética".
O cardeal de Winchester, o bispo de Beauvais, o Inquisidor e todo o
clero, o governador Warwick com os senhores ingleses, o intendente com os
vereadores, tinham ocupado seus assentos sobre seus respectivos estrados. Mil
soldados ingleses cercavam os três "andaimes". Uma multidão de mais
de dez mil pessoas se espremia na praça, nas fachadas das casas, e até nas
saídas das ruas vizinhas. Joana apareceu no topo do ambão. Ao seu lado, o
pregador tomou seu lugar e se colocou a falar. Era Nicolas Midi, da
Universidade de Paris. Ele escolheu como texto de seu discurso o versículo da
primeira epístola aos Coríntios, capítulo XII. "Sid quid patitur unum
mem brum compatiuntur alia membra. O que sofre um membro, todos os outros o
sofrerão". E ele se colocou a desenvolver este tema, se esforçando para
demonstrar como a Donzela era um membro pútrido e como ela deveria ser
arrancada da Igreja e da humanidade. Ele falou durante um longo tempo com uma
extrema veemência e terminou por estas palavras de uma caridade fingida:
"Joana, vá em paz, a Igreja não pode mais te defender e te remete às mãos
do poder secular" [...]
[...] Enfim os carrascos, armados com tochas em chamas, se aproximam da
fogueira. Joana suplica para que o irmão Martin Ladvenu permaneça junto dela;
ele faz isso, mas agarrando a grande cruz, ele a mantém "elevada, reta,
diante dos olhos de Joana, até o passo da morte". A fogueira, sendo feita,
em parte, por feixes muito cecos, o fogo aceso nos quatro cantos se colocou a
crepitar e a se elevar rapidamente. Ouviram Joana professar Deus, seus santos,
o nome de Jesus, e protestar que suas vozes não a tinham enganado. A chama
invadiu rapidamente toda a fogueira, subiu com uma única labareda até o céu,
iluminando os rostos dos carrascos e dos soldados; no meio de um silêncio
absoluto, ouviram Joana gritar profundamente: "Jesus, Jesus,
Jesus..."
Père L. H. Petitot, O.P.. Sainte Jeanne d'Arc. Gabriel Beauchesne, Paris, 1921.
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