Barbarie e analfabetismo eram generalizados no inicio da Idade Média na Europa
É necessário voltar sempre à mesma consideração, que é fundamental no Estudo da Idade Média.
Por isso, lembro novamente aos senhores a situação em que as invasões bárbaras e o fragoroso desabamento do Império Romano do Ocidente deixaram a Europa. Já tive ocasião de dizer aos senhores que os bárbaros eram totalmente analfabetos, e que, na generalidade, nem sequer seus reis sabiam ler e escrever.
Além de analfabetos, eram de tal maneira estranhos a qualquer idéia de civilização, que não eram capazes de compreender e de velar pelos tesouros artísticos e intelectuais que a civilização grego-romana acumulara.
Os bárbaros arrasaram a civilização. Roma
As invasões bárbaras foram grandes irrupções de analfabetismo, na Europa.
Depois de uma longa e penosa ascensão artística e intelectual a Europa, nos últimos séculos da Idade Média, se apresenta em situação diametralmente oposta a esta.
Numerosas e magníficas universidades se encontravam disseminadas por quase todos os países da Europa. Bastará citar as de Paris, Oxford, Cambridge, Salamanca, Heidelberz e Praga, para que os senhores possam ter uma idéia do desenvolvimento intelectual dos estudos superiores da Idade Média.
Grande parte, senão a quase totalidade destas universidades, ainda subsiste na Europa. E as antigas universidades medievais que ainda existem continuam a ser das mais famosas do mundo inteiro.
Deu-se com as universidades pouco mais ou menos o que se deu com as corporações. Depois de abandonadas em muitos países ‒ que as consideravam como pouco práticas ‒ começaram novamente a ser restauradas.
No Brasil, a fundação das recentes universidades entre as quais a nossa, é um índice bem expressivo de como vai conquistando terreno a idéia da formação dos grandes centros de cultura superior.
Não será ocioso que, em duas palavras, eu lhes lembre o que significa, sob o ponto de vista cultural e didático, uma universidade.
Antes da fundação da Universidade de São Paulo, que tínhamos aqui diversas escolas superiores, entre as quais a nossa Faculdade de Direito, Escola de Medicina e a Escola Politécnica.
Esses estabelecimentos de ensino superior não tinham entre si qualquer vínculo de união, vivendo cada qual sua vida própria e autônoma, sob a direção até de Poderes públicos diversos, pois que nossa Faculdade de Direito era federal e as duas demais escolas eram estaduais.
Com a criação da Universidade de São Paulo, a situação se transformou. A Faculdade de Direito foi "estadualizada", isto é, deixou de ser um órgão de ensino federal, para passar a ser estadual. E, tanto a Faculdade de Direito quanto a Escola de Medicina e a Escola Politécnica, passaram a fazer parte de um mesmo conjunto cultural, submetidas, sem prejuízo de sua autonomia, a uma alta direção comum, que é a Reitoria da Universidade.
No fundo dessa organização, há a idéia de que todos os estabelecimentos de ensino devem ter uma certa unidade de pensamento e de orientação, para que a cultura elaborada pelas escolas superiores seja homogênea nos mais diversos setores do saber humano. Essa homogeneidade é dada à Universidade pelo estudo da filosofia.
Ora esta concepção é, na sua essência, genuinamente medieval e escolástica. As grandes universidades medievais eram grandes centros de ensino superior, onde, à sombra da filosofia escolástica, e super-entendidas por ela, todas as ciências progrediam.
Como os senhores vêem, não apenas as corporações mas também as universidades entram novamente em voga. E isto atesta mais uma vez que a Idade Média não foi a época do obscurantismo e atraso que se costuma dizer...
A criação das universidades medievais foi poderosamente estimulada pelos Papas e pelos Reis. Especialmente os Papas trabalharam com afinco nessa obra, e grande número de universidades ainda hoje existentes foi fundado por decretos pontifícios.
As universidades deram à cultura medieval a magnífica unidade que a caracterizou. Em lugar de termos, como hoje, uma cultura fragmentária, em que muitos juristas elaboram suas concepções com bases filosóficas que eles repudiam no terreno de suas convicções íntimas ou pessoais, em lugar de termos princípios reputados verídicos em Direito e falsos em Medicina, poderíamos ter uma cultura única e uniforme, se uma filosofia comum reunisse os sufrágios de todas as inteligências, como a filosofia escolástica, na Idade Média, reuniu os espíritos.
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