“Os gentios imaginaram tantos deuses, mas não
engendraram nenhum tão amoroso como o nosso Deus, que está tão perto de nós e
com tanto amor nos assiste”.
Pe. David Francisquini
Jesus Cristo, que
se imolou e se ofereceu a Deus Pai por nós no alto do Calvário, é o mesmo que
diariamente se imola em nossos altares em oferenda a Deus por nossos
pecados. A fim de comemorar a presença real de Nosso Senhor na
Eucaristia, a Igreja Católica instituiu a festa de Corpus Christi, celebrada sempre com beleza,
suntuosidade e requinte. Em decorrência deste caráter sagrado, a procissão
eucarística se reveste de elevação e nobreza.
A Eucaristia — ao mesmo tempo e sacrifício,
sinal distintivo e visível da graça — é o próprio Jesus Cristo que se dá em
alimento enquanto se imola e se oferece a Deus Pai no sacrifício da nova Lei. A
missa é o símbolo do que existe de mais alto, de mais sagrado, de mais
perfeito, pois liga Deus aos homens, o Céu à Terra. Aquele mesmo Jesus que se
encerrou no ventre materno de Maria se encerra nas nossas igrejas sob as
espécies do pão e do vinho.
Nos Evangelhos, Cristo se autodenomina maná que desceu
do céu, cordeiro que foi imolado, “o pão que darei é minha carne”. Como os judeus se escandalizavam com tais
palavras, Jesus foi além: “Se não comerdes a carne do filho do Homem, não beberdes o seu
sangue, não tereis a vida em vós. Aquele que come a minha carne e bebe o meu
sangue tem a vida eterna, e Eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha
carne é verdadeiramente comida, o meu sangue verdadeiramente bebida”.
Na consagração eucarística ficam apenas as aparências
de pão e de vinho. Pode-se fazer uma comparação com o que se passa no interior
de um ovo que se transforma em ave e, contudo, sua casca não muda, permanecendo
a mesma. As substâncias de pão e vinho se transformam em corpo e sangue pelo
mistério da transubstanciação que se opera na Consagração, permanecendo os
acidentes do pão e do vinho. Daí a razão de Cristo estar presente todo inteiro,
tanto na espécie de pão quanto na de vinho, mas o sacrifício está representado
e retratado nas duas distintamente.
Foi tal a alegria de Cristo ao instituir a Eucaristia
na última Ceia, segundo relata São Lucas, que Ele mesmo desejou comer com os
discípulos o cordeiro pascal antes de padecer. “Digo-vos, pois, que não mais o comereis até que isto se realize
no reino de Deus”. O júbilo do Divino Mestre na instituição da
Eucaristia é surpreendente e repleto de unção.
Ele fica conosco nos altares dia e noite, nimbado pela
luz de uma lamparina que Lhe faz companhia. Quem comunga a hóstia consagrada
come a carne de Jesus Cristo. Assim o Filho de Deus encarnado fundamentou esta
verdade: “O Pai que vive me enviou, eu vivo pelo Pai, assim também o que me
comer viverá por mim. Este é o pão que desceu do Céu. Não como o maná que os
vossos pais comeram e, contudo, morreram. Quem comer deste pão viverá
eternamente”.
O pão e o vinho consagrados são um dogma para os
cristãos, pois o pão se transforma em carne e o vinho em sangue. Aquilo que
contemplamos pela fé supera a natureza, como afirma Santo Tomás, pois as
espécies diferentes são apenas sinais que ocultam coisas exímias, esplêndidas,
uma realidade que é o cume do amor de Cristo para conosco, que não nos deixa
órfãos, porque está sempre conosco nesse sacramento divino.
Ao comungar, o justo e o perverso recebem vida e
morte, pois ao consumir essa realidade transcendental e real, conseguem para si
a eternidade feliz ou infeliz. Por isso São Paulo Apóstolo afirma que cada um
deve examinar a si mesmo, ao receber a Eucaristia, pois quem comunga
indignamente come ou bebe a sua própria condenação. E São Tomás continua
dizendo que ao receber a Eucaristia, “morte do mau, vida do bom”, ele vê como a mesma comida produz efeitos
contrários, isto é, vida e morte.
Ao fiel e digno comungante são reservados maravilhosos
efeitos, como o aumento da vida na alma — a graça santificante — e a eterna
bem-aventurança; purifica como o fogo; enfraquece as más inclinações como a
ira, a inveja, a avareza, a deslealdade, apaga os pecados veniais. Como o sol
que sobrepõe a aurora, a Santa Comunhão esparge luz e calor, e promove as
graças atuais. Também aos enfermos é de grande e indispensável benefício,
dando-lhes conforto, soerguimento e até a cura dos males de corpo e de alma.
Tão misteriosa é esta ação sacramental que o
sacerdote, ao pronunciar as palavras da consagração sobre o pão e o vinho,
empresta o seu aparelho fonador a Cristo, pois fala em nome de Cristo — in persona Christi,
ou seja, como se fosse o próprio Cristo que estivesse pronunciando aquelas
palavras que operam a transubstanciação. É um verdadeiro mistério de nossa
santa Fé.
O que os olhos não veem, a fé nos declara como
realidade, a presença real de Cristo, presente real e substancialmente em
nossos altares. O Céu se liga à Terra como um sol que afasta as trevas da
noite. Diz Santo Afonso: “Os gentios imaginaram tantos deuses, mas não engendraram nenhum
tão amoroso como o nosso Deus, que está tão perto de nós e com tanto amor nos
assiste”.
“Não há outra nação tão grande que tenha os seus deuses tão perto
dela, como o nosso Deus está presente a todos nós” (Det. 4, 7). A Santa Igreja aplica com razão esta
passagem do Deuteronômio à festa do Santíssimo Sacramento. “A eucaristia é um verdadeiro
sol que ilumina a vida cristã. Não há nesta terra o que encante mais e anime
tanto, nos cumule de esperança e de alegria que ter Cristo presente entre nós:
‘Eis que estarei convosco todos os dias, até à consumação dos séculos’”.
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