“O reino de Deus e sua justiça, e todo o resto nos será dado abundantemente”
Mons. Louis-Gaston de Ségur
Somos
reacionários? Não, se por reacionários entendemos os espíritos amuados, sempre
ocupados em lamentar o passado, o antigo regime, a Idade Média. “Ninguém, bem dizia
o bom Nicodemos, pode retornar ao ventre de sua
mãe para nascer novamente”; sabemo-lo muito bem, e não desejamos o
impossível.
Sim, somos
reacionários, se se entende por isso os homens de fé e de coração, católicos
antes de tudo, que não transigem nenhum princípio, não abandonam nenhuma
verdade, respeitando, em meio às blasfêmias e ruínas revolucionárias, a ordem
social estabelecida por Deus, decididos a não recuar um passo sequer diante das
exigências de um mundo pervertido, e guardando como um dever de consciência a reação anti-revolucionária.
Dizemo-lo a toda
hora, a Revolução é o grande perigo que ameaça a Igreja hoje. Seja o que digam
os mistificadores, este perigo está às nossas portas, no ar que respiramos, em
nossas ideias íntimas. À véspera de grandes catástrofes, sempre se encontram
estes incompreensíveis cegos, surdos e mudos, que querem nada ver, nada
compreender. “Está tudo bem, dizem eles; o mundo jamais foi tão esclarecido, a
fortuna pública tão próspera, o exército tão bravo, a administração melhor
organizada, a indústria mais florescente, as comunicações mais rápidas, a
pátria mais unida”. Eles não enxergam, não querem ver que esta ordem material
acoberta uma profunda desordem moral, e que a mina prestes a desabar é a base
do edifício. Mistificados e mistificadores, eles abandonam a defesa, deixam-na
aos demais e oferecem à Revolução a Igreja desarmada.
Todavia, é mais claro que o dia, a
Revolução é o anticristianismo que chama a si todas as forças inimigas da
Igreja: incredulidade, protestantismo, cesarismo, galicanismo, racionalismo,
naturalismo, falsa política, falsa ciência, falsa educação: “Tudo isto é meu, tudo é obra
minha, brada a Revolução; marchemos todos contra o inimigo comum! Não mais o
papa, nem a Igreja; enfraquecimento do julgo católico, emancipação da
humanidade!”.
Eis o terrível
adversário contra o qual cada cristão é obrigado a reagir, como nós já dizemos,
com toda a energia que dá o amor de Deus, unido ao verdadeiro patriotismo. Eis
o inimigo comum; ele vai vencer ou perder.
Como venceremos?
Primeiramente, repito, não se acobardando. Um cristão, um católico, um homem
honesto não deve temer senão a Deus. Ora, Deus está conosco, e estamos certos
de vencer cedo ou tarde. Talvez será necessário o sangue como aos primeiros
séculos, o sangue e as humilhações e sacrifícios de todo gênero; seja. Mas nós
terminaremos por vencer: “Tenham confiança, eu venci o mundo: Confidite, ego vici mundum!”.
Em segundo lugar,
devemos pôr a serviço da grande causa todas as influências, todos os meios dos
quais podemos dispor. Se, pela nossa posição social, podemos exercer uma grande
ação sobre a sociedade, seja por nossa escrita, seja por outro meio legítimo,
não faltemos ao nosso dever católico de homem público. Façamos o bem numa maior
escala possível.
Se só podemos
exercer uma ação individual e restrita, evitemos crer que esta influência está
perdida em meio a um turbilhão. O oceano é formado de gotas reunidas, e foi
convertendo os indivíduos que a Igreja teve êxito, após três séculos de uma
indubitável paciência, a converter, a transformar o mundo. Façamos o mesmo;
frente à Revolução, universal como o paganismo d´outrora, procuremos, mesmo
individualmente, “o reino de Deus e sua justiça,
e todo o resto nos será dado abundantemente”. Jovens, homens
feitos, idosos, crianças. Mulheres, meninas; ricos, pobres; padres, laicos,
quem quer que sejamos, trabalhemos com confiança, e façamos a obra de Deus; se
o mundo se enche de santos, se a maioria dos membros que compõe a sociedade
torna-se profundamente católica, a opinião pública reformará por si e sem
abalos esta sociedade que perde-se, e a Revolução desaparecerá.
Tenhamos para o
bem a energia que a Revolução emprega para o mal. Nós queremos-lo dizer a toda
hora aos filhos das trevas: “O trabalho que nós temos empreendido não é obra de um dia, nem de
um mês, nem de um ano; ele pode durar muitos anos, um século talvez; mas em
nossas posições, o soldado morre e o combate continua. Não nos acovardaremos nem
por um choque nem por um revés; é de derrota em derrota que alcançaremos a
vitória”.
Filhos da luz,
tomem esta regra para vós, e apliquem-na com o zelo do amor. A Igreja é pobre:
vós sois ricos, dai-a vosso ouro; vós sois pobres: parti com ela vosso pão. A
Igreja é atacada com armas em punho: um sangue generoso corre pelas vossas
veias; oferecei vosso sangue. A Igreja é indignamente caluniada: vós possuís
uma voz, faleis; uma pena, escreveis para sua defesa. A Igreja está abandonada,
traída por aqueles que se dizem seus filhos. Sua confiança está em Deus
somente: implorai por vossas preces o auxílio do alto. Que nossa divisa para
todos seja a bela palavra de Tertuliano: “Hoje todo católico deve ser soldado: In his omnis homo miles”.
Antes de tudo, é
preciso, no século em que vivemos, se moldar com cuidado o espírito e a
inteligência; é necessário apoiar sua vida sobre os princípios puramente
católicos, a fim de não serem levados, como tantos outros, por todo alento de
doutrina. Quase todos os jovens que se assentam nas ideias liberais e
revolucionárias carecem de princípios refletidos e sérios cuja fé seja
inamovível neste ponto de partida. Uma terrível responsabilidade pesa desta
feita nos homens encarregados de instruir a juventude; há muito tempo a educação
e o ensino são o berçário secreto da Revolução.
Prestemos atenção
às nossas leituras. Há poucos livros bons, livros verdadeiramente puros em
matéria de princípios, sobretudo de princípios políticos e sociais. Quase todos
desconhecem totalmente a missão social da Igreja; ou repudiam-na, ou não se
dignam a comentá-la. Não tendo mais, como ponto de partida, que a autoridade
divina, eles são forçados a fazer tudo se basear somente no homem; sobre o
soberano, se são monarquistas, e é o absolutismo ou o cesarismo; se forem
democratas, sobre a soberania do povo, e é a Revolução propriamente dita. Duma
ou d´outra parte, erro fundamental, princípio social anticristão. Os mais
perigosos destes livros, pelo menos para os leitores honestos, não são os
panfletos explicitamente ímpios; são antes os livros de falsa doutrina
moderada, que concordam com a Igreja num certo aspecto. 1789 é mais perigoso
que 1793.
Desconfiai
sobretudo dos livros de história. Há poucos anos apenas, uma feliz reviravolta
valeu-nos algumas obras preciosas que há pouco bastaram para dissipar os
preconceitos e os erros. Há três séculos a história foi transformada pelos
ódios protestantes, e mais tarde pelo voltairianismo, numa verdadeira máquina
de guerra contra o cristianismo. Ela tornou-se, disse o conde de Maistre, “numa conspiração permanente
contra a verdade”.
O que é verdadeiro
para os livros aplica-se aos jornais, esta peste pública que envenena o mundo
inteiro. Quase todos são os campeões juramentados ou secretos da Revolução.
Nada é mais perigoso que a leitura de um jornal não-católico; repetido a cada
dia, ela insinua-se pronta e profundamente nas cabeças mais sólidas, e termina
por falsear seu julgamento. Suplico-vos, não crediteis nenhum destes folhetins,
e menos ainda a aqueles que cobrem suas más doutrinas duma máscara de
honestidade, e se pretendem conservadoras. “Não há água pior que aquela que estagna”.
Enfim, recomendo
aos jovens uma instrução religiosa muito forte e sólida. Não ouso falar-lhes da Suma de Santo
Tomás, obra-prima incomparável, resumindo, numa magnífica ordem, toda a
doutrina religiosa, toda a tradição católica; as inteligências tanto se
degradaram, desde que a fé não sustenta mais a razão, que esta não está em
condições de compreender hodiernamente o que este grande Doutor oferecia aos
estudantes da Idade Média como “leite para os iniciantes!”.
As luzes do
espírito não bastam; é necessário por outro lado a santidade do coração. Todo
homem que quer reagir seriamente contra o mal que nos devora deve viver na
verdade cristã, levar uma vida pura, inocente, distante do mundo, e animada do
espírito do Evangelho; ele deve rezar muito, comungar freqüentemente, e buscar
em suas fontes vivas a verdadeira vida cristã e católica. Os homens de fé, de
oração e caridade possuem o segredo das grandes vitórias.
Tal deve ser a
nossa reação contra a sedução dos falsos princípios e contra o arrebatamento
universal. Tal é nosso dever a todos, dever pelo qual prestaremos contas a Deus
quando aparecermos diante Dele. Este dever diz respeito antes de tudo àqueles
que direta ou indiretamente encarregam-se das almas: os pastores da Igreja, os
bispos e os padres, os doutores do povo cristão, incumbidos por Deus do cuidado
de instruir os homens de todos os seus deveres, e de proteger-lhes contra as
ciladas da mentira; os chefes de Estado, que devem, como já vimos, velar pela
salvação dos povos, facilitando à Igreja sua missão redentora; os pais e as
mães, cujo ministério consiste antes de tudo fazer de seus filhos cristãos
sólidos e homens devotados.
Que Deus bendiga
nossos esforços! e que o mundo, uma vez mais, seja salvo pelos cristãos!
Retirado
de La Révolution expliquée aux
jeunes gens, capítulo 23, 1861.
Tradução: Permanência.
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