O
quinto discute-se assim. — Parece que as cerimônias usadas na
celebração deste sacramento não são
convenientes.
1.
— Pois, este sacramento pertence ao Testamento Novo, como o mostra
a sua própria forma. Ora, na vigência do Testamento Novo
não se devem observar as cerimônias do Velho, nas quais
o sacerdote e os ministros lavavam-se com água quando iam
oferecer o sacrifício. Assim, lemos na Escritura: Arão
e os seus filhos lavarão as suas mãos e os pés,
quando houverem de entrar ao altar. Logo, não é
conveniente o sacerdote lavar as mãos na solenidade da missa.
2.
Demais. — Como lemos no mesmo lugar, o Senhor mandou que o
sacerdote queimasse um incenso de suave fragrância sobre o
altar que estava diante do propiciatório. O que também
era uma das cerimônias do Testamento Velho. Logo, não
deve o sacerdote oferecer incenso, durante a missa.
3.
Demais. — As cerimônias realizadas nos sacramentos da Igreja
não devem reiterar-se. Logo, não deve o sacerdote
reiterar os sinais da cruz sobre este sacramento.
4.
Demais. — O Apóstolo diz: Sem nenhuma contradição,
o que é inferior recebe a bênção do que é
superior. Ora, Cristo, que está neste sacramento, depois
da consagração é muito maior que o sacerdote.
Logo, inconvenientemente o sacerdote benze, depois da consagração,
este sacramento, fazendo sobre ele o sinal da cruz.
5.
Demais. — Nos sacramentos da Igrea não deve haver nada que
seja ridículo. Ora é ridículo fazer
gesticulações como quando o sacerdote estende os
braços, põe as mãos, junta os dedos e se
inclina. Logo, tais coisas se não deviam fazer neste
sacramento.
6.
Demais. — Também é ridículo o sacerdote
voltar-se tantas vezes para o povo, tantas vezes saudá-lo.
Logo, nada disso devia fazer-se na celebração deste
sacramento.
7.
Demais. —- O Apóstolo diz que Cristo não deve ser
dividido. Ora, depois da consagração Cristo está
neste sacramento. Logo, o sacerdote não devia fracionar a
hóstia.
8.
Demais. — As cerimônias deste sacramento representam a paixão
de Cristo. Ora, na paixão, o corpo de Cristo foi dividido nos
lugares das cinco chagas. Logo, o corpo de Cristo devia ser dividido
antes em cinco que em três partes.
9.
Demais. — O corpo de Cristo é totalmente consagrado neste
sacramento, em separado do sangue. Logo, não se devia misturar
com o sangue uma parte dele.
10.
Demais. — Assim como o corpo de Cristo é dado neste
sacramento como comida, assim o sangue de Cristo, como bebida. Ora, à
recepção do corpo de Cristo, ao celebrar a missa, não
se lhe acrescenta nenhuma outra comida corpórea. Logo, não
devia o sacerdote, depois de ter bebido o sangue de Cristo, tomar
vinho não consagrado.
11.
Demais. — O verdadeiro deve corresponder ao figurado. Ora, do
cordeiro pascal, que foi a figura deste sacramento, a lei ordenava
que nada se conservasse para o dia seguinte. Logo, não se
deviam conservar hóstias consagradas, mas consumi-las logo.
12.
Demais. — O sacerdote fala aos ouvintes, no plural; por exemplo,
quando diz - O Senhor seja convosco(Dominus vobiscum),
e, Demos graças (Gratias agamus). Ora, não
devemos falar no plural quando nos dirigimos a um só,
sobretudo inferior. Logo, não devia o sacerdote celebrar a
missa, estando presente só um ministro. Por onde, parece que
certas práticas deste sacramento são inconvenientes.
Mas,
em contrário, o costume da Igreja, que não pode
errar, por inspirada pelo Espírito Santo.
SOLUÇÃO.
— Como dissemos, para ser mais perfeita a significação,
tudo o que se faz nos sacramentos é significado duplamente por
palavras e por atos. Ora, certos passos da paixão de Cristo,
representados na celebração deste sacramento, são
significados por palavras. Ou ainda certas causas concernentes ao
corpo místico, que esse sacramento representa; e outras
referentes ao uso do mesmo, que deve ser com devoção e
reverência. Por isso, na celebração deste
mistério, certas práticas representam a paixão
de Cristo; ou ainda, a disposição do corpo místico;
e certas outras concernem a devoção e a reverência
devidas a este sacramento.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A ablução
das mãos se faz, na celebração da missa, pela
reverência devida a este sacramento. E isto por duas razões.
- Primeiro, por ser costume geral tocarmos em coisas preciosas com as
mãos lavadas. Por onde, faltaria à decência quem
se achegasse a tão grande sacramento com as mãos sujas,
mesmo no sentido material. Segundo, pelo significado da ablução.
-Pois, como diz Dionísio, o lavarmos as extremidades
significa a purificação, ainda dos mínimos
pecados, segundo aquilo do Evangelho: Aquele que está
lavado não tem necessidade de lavar senão os pés.
E essa purificação é necessária em quem
se achega a este sacramento. O que também é significado
pela confissão, que se faz antes do começo da missa. E
o mesmo significava a ablução dos sacerdotes da Lei
Velha, conforme o ensina Dionísio no mesmo lugar. - Mas a
Igreja não o observa como preceito cerimonial da Lei Velha,
senão como instituído por ela, e na prática em
si mesma conveniente. Por isso, não é observado do
mesmo modo por que o era antigamente. Também se omite a
ablução dos pés, conservando-se só a das
mãos, por poder fazer se mais facilmente e por bastar a
significar a perfeita purificação. Pois, sendo as
mãos o órgão dos órgãos, na
expressão de Aristóteles, todas as obras se lhes
atribuem a elas. Donde o dizer o Salmo: Lavarei as minhas mãos
entre os inocentes.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Não usamos incenar, como se fosse um
preceito cerimonial da lei, mas pelo determinar a Igreja. Por isso
não o fazemos do mesmo modo pelo qual o estatuía a Lei
Velha. - E o fazemos por duas razões. Primeiro, para
reverenciar este sacramento: para, que o bom cheiro do incenso,
expulse algum mau odor do local, que pudesse provocar repugnância.
Segundo, para representar o efeito da graça da qual, como de
bom odor, Cristo tinha a plenitude; segundo aquilo da Escritura: Eis
o cheiro de meu filho bem como o cheiro de um campo cheio. E o
qual deriva de Cristo para os fiéis, por meio dos ministros,
segundo aquilo do Apóstolo:Por nosso meio difunde o cheiro
do conhecimento de si mesmo em todo o lugar. Por isso, depois de
incensado todo o altar, que designa a Cristo, incensam-se os demais,
numa certa ordem.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — O sacerdote, na celebração da
missa, faz o sinal da cruz para exprimir a paixão de Cristo,
que na cruz se consumou. Ora, a paixão de Cristo se consumou
como que por graus. - Assim, primeiro, teve lugar a entrega de
Cristo, causada por Deus, por Judas e pelos judeus. E isso significa
a tríplice crucesignação, acompanhada das
palavras: Estes dons, estes presentes, estes santos sacrifícios
e sem mancha. - Depois foi Cristo vendido, pelos sacerdotes, escribas
e fariseus. Para o significar, o sacerdote faz de novo por três
vezes o sinal da cruz, dizendo: Bendita, aprovada, ratificada.
Ou para mostrar o preço da venda, que foram os trinta
dinheiros. E acrescenta duplo sinal da cruz, às palavras - A
fim de que para nós o corpo e o sangue, etc., a fim de
designar a pessoa de Judas, o vendedor, e o de Cristo, o vendido. -
Em terceiro lugar, na Ceia foi prenunciada a paixão de Cristo.
Para designá-lo o sacerdote faz, em terceiro lugar, o sinal da
cruz por duas vezes - uma ao consagrar o corpo; outra, ao consagrar o
sangue, dizendo em ambas as vezes -Abençoou. - Em
quarto lugar, consumou-se a paixão mesma de Cristo. E, para
representar as cinco chagas de Cristo o sacerdote faz pela quarta vez
um quintuplo sinal da cruz, dizendo: a hóstia pura, a
hóstia santa, a hóstia imaculada, o pão santo da
vida eterna e o cálice de salvação perpétua.
Em quinto lugar, representa a tensão do corpo, a efusão
do sangue e o fruto da paixão, um tríplice sinal da
cruz, acompanhado das palavras - recebermos o sacrosanto do corpo e o
sangue, enriquecidos de todas as bênçãos etc. -
Em sexto lugar é representada a tríplice oração
que Cristo fez na cruz. - Uma pelos seus perseguidores, quando disse:
Pai, perdoai-lhes. A segunda - para libertar-se da morte,
quando disse: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? A
terceira, para alcançar a glória, quando exclamou: Pai
em tuas mãos entrego o meu espírito. E para
significá-lo, o sacerdote faz três vezes o sinal da
cruz, dizendo: santificas, vivificas, abençoas etc. -
Em sétimo lugar, representam-se as três horas durante as
quais ficou suspenso na cruz, isto é, desde a sexta até
a nona hora. E para significá-lo, faz de novo o sacerdote por
três vezes o sinal da cruz, pronunciando as palavras - por ele,
com ele e nele. - Em oitavo lugar, representa-se a separação
entre a alma e o corpo, por duas crucesignações
subseqüentes, fora do cálice. - Enfim, em nono lugar, é
representada a ressurreição operada no terceiro dia,
por três cruzes, acompanhadas das palavras: A paz do Senhor
esteja sempre convosco. - Mas, podemos dizer, mais brevemente,
que a consagração deste sacramento e a aceitação
deste sacrifício, bem como o seu fruto, procedem da virtude da
cruz de Cristo. Por isso, sempre que o sacerdote fizer menção
de alguma dessas três coisas, faz o sinal da cruz.
RESPOSTA
À QUARTA. — O sacerdote, depois da consagração,
não faz o sinal da cruz para benzer e consagrar, mas só
para comemorar o sinal da cruz e o modo da paixão de Cristo,
como do sobredito se colhe.
RESPOSTA
À QUINTA. — Nenhum dos gestos do sacerdote, na missa,
constitui gesticulação ridícula, pois têm
o fim de representar alguma coisa. - Assim, o estender os braços
depois da consagração significa o Cristo com eles
estendidos na cruz. - Também levanta as mãos ao orar,
para significar que a sua oração se dirige a Deus, pelo
povo, segundo aquilo da Escritura - Levantemos ao Senhor os nossos
corações com as mãos para os céus. E
noutro lugar: Quando Moisés tinha as mãos levantadas
vencia Israel. - Quando põe as mãos, inclina-se,
orando súplice e humildemente, designa assim a humildade e a
obediência com que Cristo sofreu. Junta os dedos polegar e
índice, com que tocou o corpo consagrado de Cristo a fim de
que não se disperse alguma partícula que a eles se
tivesse apegado. O que constitui reverência para com o
sacramento.
RESPOSTA
À SEXTA. — O sacerdote volta-se cinco vezes para o povo,
para significar que o Senhor se manifestou cinco vezes no dia da
ressurreição, como dissemos quando tratamos da
ressurreição de Cristo. - Saúda sete vezes o
povo – isto é, cinco vezes quando se volta para ele; e duas,
em que não se volta, isto é, quando ante, do prefácio
diz - O Senhor seja convosco (Dominus vobiscum); e quando diz
- A Paz do Senhor seja sempre convosco, para designar a
septiforme graça do Espírito Santo. Quanto ao bispo,
quando celebra nos dias festivos, diz, na primeira saudação
- A paz seja convosco, o que depois da ressurreição
o Senhor o disse aos discípulos, cujas pessoas sobretudo as
representa o bispo.
RESPOSTA
À SÉTIMA. — A fração da hóstia
significa três causas. Primeiro, a divisão mesma do
corpo de Cristo, que se operou na paixão. Segundo, a distinção
do corpo místico em diversos estados. Terceiro, a distribuição
das graças procedentes da paixão de Cristo, como diz
Dionísio. Por onde, tal fração não induz
divisão de Cristo.
RESPOSTA
À OITAVA. — Como diz Sérgio Papa: Triforme é
o corpo do Senhor. A parte oferecida, posta no cálice,
representa o corpo de Cristo já ressurrecto. Isto é, o
próprio Cristo e a Santa Virgem, ou outros santos já em
corpo na glória. A parte que se come significa os que ainda
vivem nesta terra; pois, os peregrinos neste mundo se unem com Cristo
pelo sacramento; e ficam alquebrados pelo sofrimento como o pão
comido é triturado pelos dentes. A parte remanescente no altar
até o fim da missa significa o corpo jacente no sepulcro;
porque até o fim dos séculos os corpos dos santos
estarão nos sepulcros; mas as almas estão no purgatório
ou no céu. Este rito porém não se observa
atualmente, isto é, o de conservar uma parte até ao fim
da missa. Mas permanece a mesma significação das
partes. O que certos exprimiram em versos, dizendo: A hóstia
se divide em partes; molhada, significa os que gozam da plena
beatitude; seca, os vivos; conservada, os sepultos. Certos porém
dizem, que a parte posta no cálice significa os viventes neste
mundo; a conservada fora do cálice significa os plenamente bem
aventurados, isto é, em corpo e alma; a parte comida significa
os outros.
RESPOSTA
À NONA. — O cálice pode ter dupla significação.
- Numa, é a paixão mesma, representada neste
sacramento. E então, a parte posta no cálice significa
os ainda participantes dos sofrimentos de Cristo. - Noutra
significação pode simbolizar o gozo dos bem
aventurados, também prefigurado neste sacramento. Por onde,
aqueles cujos corpos já gozam da plena beatitude são
simbolizados pela parte posta no cálice. - E devemos notar que
a parte posta no cálice não deve ser dada ao povo como
complemento da comunhão, porque o pão molhado Cristo
não o deu senão ao traidor Judas.
RESPOSTA
À DÉCIMA. — O vinho, em razão da sua umidade,
serve para lavar. Por isso, é tomado depois da suscepção
deste sacramento, para lavar a boca, para que nenhuma partícula
nela fique; o que constitui reverência para com este
sacramento. Por isso, uma disposição canônica
determina: O sacerdote deve sempre lavar a boca com o vinho,
depois de ter recebido completamente o sacramento da Eucaristia;
salvo se dever no mesmo dia celebrar outra missa; a fim de que o
vinho tomado para lavar a boca não impedisse celebrar outra
vez. E pela mesma razão lava com vinho os dedos, com que tocou
o corpo de Cristo.
RESPOSTA
À UNDÉCIMA. - A verdade deve, de certo modo,
corresponder à figura; porque não deve a parte da
hóstia consagrada, da qual o sacerdote e os ministros ou
também o povo comungam, ser conservada para o dia seguinte.
Por isso uma determinação do Papa Clemente estatuiu:
Tantas hóstias se ofereçam no altar, quantas bastem
para o povo. As que sobrarem não se reservem para o dia
seguinte; mas sejam consumidas pela diligência dos clérigos,
com temor e tremor. - Mas devendo este sacramento ser recebido todos
os dias, o que não se dava com o cordeiro pascal, por isso é
necessário conservar outras hóstias consagradas para os
enfermos. Por onde, na mesma legislação se dispõe:
O presbítero tenha sempre preparada a Eucaristia de modo
que quando alguém adoecer, dê-lhe logo a comunhão,
não vá morrer sem ela.
RESPOSTA
À DUODÉCIMA. - Na celebração solene da
missa, vários devem estar presentes. Donde o dizer o Papa
Sotero: Também isto foi estabelecido, que nenhum sacerdote
ouse celebrar as solenidades da missa sem dois ministros presentes,
que lhe respondam, a ele como terceiro; porque, quando diz no plural
- O Senhor seja convosco (Dominus vobiscum); e a oração
secreta - Orai por mim, é necessário evidentemente que
lhe alguém responda à saudação. Por
isso, para maior solenidade, lemos no mesmo lugar como estatuída,
que o bispo celebre, com vários ministros, a solenidade da
missa. Mas, nas missas privadas, basta haver um ministro,
representante de todo o povo católico, em nome do qual
responde no plural ao sacerdote.
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