"Para impedir isso virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora dos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá é terão paz. Se não, ela espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja."
O presente artigo foi publicado em
português no jornal Sim Sim Não Não há mais de dez anos. Muita
coisa mudou desde então: o Papa reinante não é mais João Paulo II, a última das
videntes de Fátima, a Irmã Lúcia, morreu e o Vaticano apresentou um documento e
uma interpretação que diz corresponder à totalidade do Terceiro Segredo
revelado por N. Sra. Uma coisa, porém, permanece: o generalizado menosprezo
pela mensagem de Fátima, que levou Irmã Lúcia a dizer: "Padre,
a Santíssima Virgem está muito triste porque ninguém faz caso de Sua mensagem,
nem os bons nem os maus. Os bons continuam seu caminho, mas sem se preocupar da
mensagem. Os maus, visto que o castigo de Deus não os fere no momento,
continuam sua vida de pecado sem fazerem caso da mensagem". Que nessa
data, em que celebramos os 90 anos das aparições, possam todos sair de sua
indiferença.
QUEM SE LEMBRA DE FÁTIMA?
O esquecimento sobre as aparições
No dia 13 de maio de 1995 ocorreu o
78o. aniversário da primeira aparição da Santíssima Virgem Maria em Fátima,
Portugal, em 1917. Esse grande evento, manifestação realmente excepcional da
Misericórdia divina, é agora deixado no mais profundo esquecimento e isso,
precisamente, por culpa da hierarquia católica. Sobre o único sobrevivente dos
três pequenos videntes¹, Irmã Maria Lúcia do Coração Imaculado, mais conhecida
sob o nome de irmã Lúcia (Lúcia dos Santos), paira o silêncio há vários anos.
Enclausurada no Carmelo de Coimbra desde março de 1948, ela recebia
periodicamente visitas autorizadas das mais diversas personalidades
eclesiásticas, de cardeais a simples pesquisadores sobre as aparições, assim
como uma importante correspondência vinda de todos os cantos do mundo. Mas já a
partir de 1954 (durante os três últimos anos do reinado de Pio XII) as visitas
começaram a ser reduzidas pelas autoridades competentes, para terminar por
serem completamente suprimidas a partir de 1960. Nesse ano estava prevista a
leitura pública, pelo papa, do famoso "terceiro segredo" de Fátima,
leitura que — como se sabe — não foi feita². Ao contrário, a partir desse ano,
Irmã Lúcia não pôde mais falar com ninguém sobre as aparições, nem mesmo por
carta. Com exceção dos cardeais, aos quais não se aplicam as proibições da
clausura, dos parentes mais próximos e benfeitores conhecidos das autoridades,
ninguém pode se aproximar do parlatório do convento. As permissões de visita
são dadas pelo prefeito da Congregação pela Doutrina da Fé, mas este (o Cardeal
Ratzinger) há muitos anos não concede nenhuma.
Assim, foi imposto à Irmã Lúcia uma clausura
dentro da clausura. É um fato surpreendente que, por si só, já dá uma ideia do
ambiente no Vaticano. Aquela que, nesse século, pode testemunhar ter visto e
ouvido a Santíssima Virgem Maria (e Nosso Senhor) é mantida num isolamento
total, muito além das regras mais rígidas da clausura. Que o Vaticano tenha
adotado a orientação de apagar e de fazer esquecer Fátima, resulta também do
fato de que a obra científica fundamental e oficial sobre as aparições -- os
quatorze volumes do padre Alonso, nos quais esse pesquisador de valor recolheu,
classificou e comentou 5396 documentos -- essa obra esteja pronta desde 1976,
mas sua publicação ainda não tenha sido autorizada pelas autoridades
competentes³. Na realidade, a hierarquia parece não ter compreendido a
importância da "mensagem de Fátima". Senão os Papas teriam se
empenhado com outro ardor em satisfazer os pedidos. Começando pelos atos de
culto ordinário e extraordinário, pedidas repetidas vezes por Nossa Senhora e
por Jesus em pessoa, nas visões e nas mensagens com as quais a Irmã Lúcia foi
gratificada de 1917 à 1952 (pelo que sabemos). Nos referimos ao pedido de
instituir a Comunhão reparadora dos cinco primeiros sábados do mês em honra do
Imaculado Coração de Maria e de Lhe consagrar publicamente, explicitamente e
solenemente a Rússia, em união manifesta de todos os bispos.
Pio XI e Pio XII não fizeram a
verdadeira consagração da Rússia
Nenhum dos dois pedidos foram ouvidos.
O primeiro não foi nem mesmo tomado em consideração. Para o segundo, houve
consagrações, mas nenhuma válida, porque não estavam conformes às modalidades
expressamente pedidas pelo Céu. Os dois pedidos estão, aliás, ligados, porque
no segredo comunicado no dia 13 de julho de 1917, a Santíssima
Virgem disse: "Para impedir isso [a guerra mundial que acabava
de ser profetizada em punição pela infidelidade e malícia humanas] virei
pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora
dos primeiros sábados [do mês]. Se atenderem a meus pedidos, a
Rússia se converterá é terão paz. Se não, ela espalhará seus erros pelo mundo,
promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo
Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim, meu
Coração Imaculado triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia que se
converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz".
Essa consagração ao Imaculado Coração
de Maria foi, depois, pedida numa visão, no convento de Tuy, na Espanha, no dia
13 de junho de 1929, e o Papa reinante Pio XI, foi certamente informado antes
de agosto de 1931: "É chegado o momento em que Deus pede ao Santo Padre
de fazer, em união com todos os bispos do mundo, a consagração da Rússia ao meu
Coração Imaculado, prometendo salvá-la por esse meio".
Trata-se de uma consagração solene,
unicamente da Rússia, feita pelo Papa e simultaneamente pelos bispos de todo o
mundo, consagração cujo fruto será a conversão da Rússia ao catolicismo. A
Rússia, cismática e herética, comunista e ateia, não pode evidentemente se
converter à verdadeira Fé (e pôr seu braço poderoso ao seu serviço) senão por
uma intervenção divina explícita, na qual, entretanto, os homens (no caso o
alto escalão da Igreja Católica) são chamados a participar -- num ato solene --
com a adesão plena e corajosa da sua inteligência e vontade.
Mas esse ato de consagração não deve,
evidentemente, ser muito fácil de se fazer, pois até hoje os papas ainda não
conseguiram fazê-lo! O medo das reações da Rússia e das outras potências desse
mundo foi, até hoje, mais forte que o desejo de satisfazer ao pedido divino! E
talvez esse pedido nunca tenha sido levado a sério, isto é, com a humildade e o
zelo que a Fé exige. Depois de Pio XI, que não fez absolutamente nada, empenhado
que estava num começo de tentativa -- catastrófica -- de abertura à União
Soviética, houve de fato consagrações concernentes à Rússia, sob diversas
modalidades, mas nunca respeitando a forma prescrita pela Santíssima Virgem. No
dia 31 de outubro de 1942, Pio XII -- numa rádio-mensagem dirigida à nação
portuguesa -- consagrava a Igreja e o mundo ao Imaculado Coração de Maria, com
uma menção especial, mas muito discreta, da Rússia. Esse ato, entretanto, foi
demonstrado completamente ineficaz para a conversão dessa nação por falta
manifesta de algumas condições essenciais requeridas. A Santíssima Virgem Maria
pediu de fato, expressamente, que a consagração tenha por objeto unicamente a
Rússia, e a Irmã Lúcia, várias vezes chamou a atenção sobre esse ponto. Além
disso, a consagração deve se fazer em união explícita com todos os bispos do
mundo (e não somente com alguns). Nenhuma dessas duas condições essenciais foi
realizada na ocasião da rádio-mensagem papal.
No dia 7 de julho de 1952, Pio XII, na
sua carta apostólica Sacro vergente anno, dirigida aos povos da
Rússia, efetuava uma consagração "de todos os povos da Rússia" ao
Imaculado Coração de Maria para que, com a Sua ajuda, se realizasse "uma
paz verdadeira, a concórdia fraterna e a liberdade que é devida a cada
um". Trata-se, pois, de uma consagração feita em termos vagos, na qual não
se fala nem em reparação nem de conversão ao catolicismo, mas de paz, de
concórdia e de liberdade em termos quase leigos: ainda mais, de uma consagração
sem nenhuma solenidade. Não houve, realmente, uma ordem dada aos bispos do
mundo inteiro de se unirem explicitamente ao Papa na consagração. Esse ato
passou praticamente inadvertido e, além disso, que conversões foram produzidas?
João XXIII, muito empenhado na Ostpolitik, nada fez. Paulo VI,
referindo-se aos atos de Pio XII, limitou-se em consagrar à Maria Imaculada
"toda a família humana", no seu discurso de clausura da sessão
conciliar, no dia 26 de novembro de 1964. Em relação à mensagem de Fátima, esse
papa guarda sempre um desapego cético, como alto prelado refinado, "aberto
ao mundo", que ele era. Esteve em Portugal na ocasião do Jubileu das
aparições (em 13 de maio de 67), mas limitou sua visita a um só dia, não foi no
lugar das aparições, não deu à Irmã Lúcia -- que tinha sido convocada à tribuna
papal -- a audiência privada que ela desejava. Segundo Jean Guitton, eis o seu
julgamento sobre a vidente: "... uma moça muito simples! Ela é uma
camponesa sem complicação. O povo queria vê-la e eu lhes mostrei".
João Paulo II continua pelo mesmo
caminho
O papa atual [N. da P., o autor
refere-se ao papa João Paulo II, então reinante] só mostrou um certo interesse
por Fátima depois do conhecido atentado que sofreu no dia 13 de maio de 1981.
Cerca de um mês mais tarde confiou a "família humana" inteira à
proteção da Bem-aventurada Virgem. Mas a Irmã Lúcia continuava a sustentar, nas
suas raras entrevistas com autoridades eclesiásticas, que as consagrações de
Pio XII não eram válidas do ponto de vista da conversão da Rússia (conversão da
qual não se via nenhum traço). João Paulo II fez, assim, novas consagrações,
sob a forma de um "ato de oferenda" do mundo (e mentalmente ' da
Rússia também) a Deus, por intermédio do Imaculado Coração de Maria, em união
puramente espiritual com "todos os pastores da Igreja" que, no
entanto, por seu lado, não consagraram coisa nenhuma. Esse ato foi repetido dia
16 de outubro de 1983 e, em face dos protestos dos católicos, no dia 25 de
março de 1984 em Roma. Mas esses três "atos" devem ser considerados
como totalmente inválidos no que concerne à conversão desejada da Rússia, por
causa da falta das condições pedidas pela Santíssima Virgem Maria. Com efeito,
eles deveriam referir-se somente à Rússia (que, ao contrário, nem mesmo foi
citada) e serem realizados simultaneamente por todos os bispos do mundo. Em
seguida, diante das novas tentativas de alguns especialistas em Fátima (com o
padre Caillon em primeiro lugar), de obter uma consagração da Rússia conforme
ao pedido divino, o papa e as autoridades eclesiásticas reagiram incomodados,
afirmando que já se havia feito (e mais de uma vez) o necessário. A questão
devia ser considerada como terminada. Em 1989 fizeram circular declarações e
cartas (datilografadas) atribuídas à Irmã Lúcia, nas quais se afirmava que o
ato de oferenda de 1984 correspondia ao pedido por Nossa Senhora. Mas nessas
cartas estava dito que o ato de oferenda do papa tinha satisfeito o pedido de
Nossa Senhora de lhe consagrar o "mundo", enquanto que todo mundo sabe
que a Irmã Lúcia sempre disse que a Santíssima Virgem lhe falou somente da
Rússia e nunca falou do mundo. A autenticidade dessas declarações, assim,
parece duvidosa. Procurou-se, depois, criar a opinião que os transtornos do
leste da Europa e a crise do comunismo demonstravam que o ato de oferenda de
João Paulo II produziu seus frutos: a Rússia começaria a se converter. Nossa
Senhora, no entanto, não pediu a conversão da Rússia à liberdade de consciência
ou à democracia, mas sim ao catolicismo. Ora, dessa conversão ao catolicismo (a
única que conta) não se vê sinal na Rússia de hoje que gosta de se definir como
"pós-comunista". O Vaticano afirma que a questão está encerrada. Onze
anos se passaram depois do ato de oferenda do papa; a Rússia se converteu? Categoricamente,
a resposta é: Não. O que vemos na Rússia atual? Uma desordem moral espantosa,
talvez mesmo pior que a que aflige o Ocidente há vários anos. O hedonismo e o
materialismo os mais ativos, se expandem, numa orgia de seitas e falsas
religiões, de neopaganismo bárbaro e decadente.
Os católicos russo-ucranianos (os
uniatas), foram completamente abandonados, em homenagem à política do
"diálogo" com os ortodoxos e o poder político local. Em vez de se
expandir, o catolicismo na Rússia sofreu, ao contrário, uma nova perseguição!
Podemos então continuar a afirmar que os "atos de oferenda" do papa
conduzem a Rússia para a verdadeira Fé? Que foram atos conformes à vontade
divina? Os fatos demonstram que o papa não satisfez os pedidos da Santíssima
Virgem Maria.
Uma terrível advertência!
Quando o céu ordena, o homem nada pode
fazer conforme o seu parecer. Ele deve, ao contrário, seguir o exemplo de
Naaman, o Sírio, que se deixou convencer em entrar sete vezes nas águas do
Jordão para curar a lepra, obedecendo assim literalmente ao que lhe tinha
ordenado o profeta Eliseu, apesar da coisa lhe parecer, no momento, absurda,
ofensiva e mesmo ridícula (2o. Livro dos Reis). Curar-se da lepra apenas com
sete imersões consecutivas nas águas de um rio! E, no entanto, isso acontece
justamente porque a onipotência divina é capaz disso e de qualquer outra coisa.
Os papas citados acima não tiveram, evidentemente, a Fé de Naaman. Não creram
que, de um simples ato de consagração, pudesse decorrer, pela vontade divina,
um evento imenso, de porte histórico decisivo, tal como a conversão da Rússia
ao catolicismo.
Mas, então, a consagração da Rússia se
fará? Os papas continuarão a ignorar os pedidos divinos? Não. A consagração
será feita, mas tarde. E o que profetizou Nosso Senhor à vidente, repetindo o
que a Santíssima Virgem Maria tinha dito em Fátima, numa visão que remonta à
1931, em Rianjo, na Espanha, diante da atitude passiva de Pio XI: "Dê a
conhecer a meus ministros, dado que eles seguem o exemplo do Rei de França,
atrasando a execução de meu pedido, que continuarão na infelicidade. Nunca será
tarde demais para recorrer à Jesus e a Maria... Como o Rei de França, eles se
arrependerão e o farão, mas será tarde...".
A referência ao rei de França concerne
à visão de santa Margarida Maria Alacoque, que a transmitiu a Luís XIV em 1689,
de consagrar explicitamente a França ao Sagrado Coração de Jesus; mas nem o rei
de França, nem seus sucessores responderam a esse pedido, com exceção de Luís
XVI, que fez a consagração quando já era "tarde", isto é, quando a
monarquia já tinha sido abatida e ele encontrava-se prisioneiro no Templo, na
véspera da sua execução. Segundo a profecia, deveria acontecer aos papas alguma
coisa parecida, por causa da sua negligência e da sua obstinação: um papa fará
finalmente a consagração, levado pelas circunstâncias gravíssimas, situação que
se pode imaginar de extremo perigo para a Igreja. Sobre o papado flutua, ex
voce Christi, mesmo se expressa numa revelação privada, a profecia de um
castigo severo por causa da desobediência e da sua falta de Fé repetidas vezes,
profecia cuja realização pode naturalmente tornar-se inútil por uma mudança de
sentimento e de conduta dos destinatários, do momento que Deus nos deixa o uso
do nosso livre arbítrio. Profecia terrível, na qual não foi dita, no entanto,
"tarde demais", mas "tarde", deixando assim entendido que,
depois desse ato tardio, haverá para a Igreja o renascimento. Nenhum papa
depois de Pio XII pareceu inquietar-se com essa terrível advertência, talvez
porque a profecia e praticamente todo o conjunto da mensagem de Fátima sejam,
de fato, consideradas como divagações da reclusa de Coimbra.
A questão do terceiro segredo
A omissão, por uma recusa obstinada e
constante, perdurou em seguida de maneira mais grave em relação à divulgação do terceiro
segredo de Fátima. Por esse nome entende-se, como se sabe, a terceira
parte do segredo comunicado aos três videntes na sexta-feira, 13 de
julho de 1917, segredo divulgado depois gradualmente no decorrer dos anos
seguintes, por Irmã Lúcia (com exceção do terceiro segredo). O segredo (que
os videntes disseram ter recebido, sem no entanto nada revelar, não obstante as
pressões, intimidações ou ameaças) é, na realidade, um todo coerente. Ele
contém "três coisas": a visão do inferno; a proclamação da vontade de
Deus de estabelecer no mundo a devoção ao Imaculado Coração de Maria para
salvá-lo do castigo da II guerra mundial (profetizada com extrema clareza),
devoção cujas manifestações deveriam ser a prática da comunhão reparadora dos
cinco primeiros sábados do mês e a consagração da Rússia, a qual nos referimos
mais acima. Na segunda parte do segredo, Nossa Senhora, depois de ter dito que
a I guerra mundial acabaria em breve, parece vincular a eclosão da II guerra
mundial à falta de conversão da Rússia. Enfim, há a terceira parte ou o
"terceiro segredo", posto por escrito pela vidente em janeiro de 1944
numa página de caderno que foi enviada dentro de um envelope fechado, no dia 17
de maio de 1944, para o bispo de Leiria (que não quis ler) e transmitido a
Roma, dia 16 de abril de 1957. Pio XII também não quis lê-lo. Segundo as
indicações da Irmã Lúcia, a publicação do segredo deveria ter sido feita em
1960. A vidente sempre deu a compreender que essa parte do segredo de Fátima
não podia, por causa do seu conteúdo, ser do domínio público como as duas
outras: quanto à sua divulgação, ela a confiava às autoridades eclesiásticas
superiores e não à simples ordem do seu confessor. Os papas que leram o 3o.
segredo e que são responsáveis da sua não difusão são: João XXIII, Paulo VI e o
papa atual, João Paulo II. O terceiro segredo começa quase com certeza, com a
última frase do texto no qual Irmã Lúcia nos fez conhecer as duas outras partes
da mensagem de Fátima. E essa frase é: "em Portugal se conservará sempre o
dogma da Fé etc". A presença do "etc" demonstra que Irmã Lúcia
quis dar a entender que a frase em questão não é uma profecia isolada dirigida
exclusivamente a Portugal. (o que alguns tentaram sustentar), mas o início de
um anúncio sobre a manutenção do dogma da Fé nas nações cristãs. O terceiro
segredo concerne, segundo todas as probabilidades, à manutenção do depósito da
Fé, o que quer dizer que seu objeto específico é a Santa Igreja. É muito
provável que nele estejam sinteticamente profetizados os graves transtornos que
o catolicismo viria sofrer, por causa da hierarquia impregnada de modernismo,
"estuário de todas heresias", a partir do Concílio Vaticano II. A
traição da Fé por culpa de pastores, escravos da heresia, é certamente
antecipada no terceiro segredo: é por isso que a Igreja oficial atual, que é a
Igreja na qual esses pastores detém as alavancas do poder, evita torná-lo
público e tudo faz para deixá-lo cair no esquecimento. Não se trata pois do fim
do mundo, como se procuro insinuar, embora não se possa excluir à priori que
sejam anunciados também castigos materiais (aliás já claramente previstos na
segunda parte da mensagem de Fátima). O terceiro segredo concerne à Igreja, à
dolorosa obscuridade da Fé da qual somos testemunhas cada vez mais
horrorizadas. Podemos também deduzir que seja assim pelo que disse o papa atual
à Irmã Lúcia no seu breve encontro de 13 de maior de 1982, e que ela relatou ao
cardeal Oddi em 1985: que não era oportuno divulgar o segredo porque o mundo
"não o compreenderia". Ou, como disse o cardeal Ratzinger ao jornalista
Messori, que não era oportuno divulgá-lo porque se exporia "ao perigo de
utilizarem o seu conteúdo com sensacionalismo". Se se tratasse do fim do
mundo, o público não compreenderia? Ele compreenderia, e como! E o que poderia
haver no segredo que, não somente faça sensação, mas seja difícil de
compreender pelos fiéis, se não a revelação ex voce divina,
sancionada por um papa que clamará ao mundo quando fizer uma leitura pública do
famoso texto, que a Igreja oficial atual é uma Igreja apóstata da verdade
católica, dessa verdade proclamada e defendida durante dezenove séculos?
Será que os fiéis não deveriam já ter
percebido isso há muito tempo? O que eles pensam de uma Igreja que, no lugar do
culto de Deus, pratica o culto do homem e da mulher, que tirou a Santíssima
Trindade da Santa Missa, dos seus discursos e dos pensamentos dos fiéis; que
afirma crer em um "Deus único" idêntico para todas as religiões,
inclusive as mais hostis ao Cristianismo; que não fala mais do pecado original,
nem da imortalidade da alma, nem do Julgamento particular e, finalmente, nem do
Paraíso; que deixa crer que o inferno está vazio; que, quando é constrangida a
lembrar, no Novo Catecismo, as verdades tradicionais do
catolicismo, o faz apresentando-as como opiniões (subjetivas)
da tradição da Igreja e não como verdades(objetivas) em si e por
si; que instituiu um Novus Ordo Missae considerado como
aceitável pelos protestantes, quer dizer, por heréticos; que passa sempre
sob silêncio a natureza divina de Cristo, porque se a proclamasse, como é seu
dever, desapareceria rapidamente o que chamam "diálogo"; que afirma
que Jesus já salvou todo o mundo, morrendo sobre a Cruz, mesmo aqueles que não
crêem que Ele é o Filho de Deus; que não considera mais a conversão do mundo a
Cristo como seu dever fundamental, porque tentar converter seria uma violência
à "liberdade de consciência" dos adeptos das outras religiões; que
abraçou em tudo e por tudo os métodos e os conceitos e, assim, os erros da
teologia protestante; que honra os "mártires" dos heréticos e elimina
os seus próprios do calendário; que trabalha incansavelmente a unificar o
catolicismo com todas as outras religiões e seitas, dissolvendo-o, assim, no
abraço do falso ecumenismo; que fala somente, e de maneira inoportuna, dos
problemas desse mundo, políticos em particular, e nunca da vida Eterna; para a
qual no lugar do catolicismo inventou-se um humanismo deísta, parecido ao dos
maçons, o qual, em nome de um igualitarismo abstrato e verbal, fomenta o
espírito de rebelião e o ódio por toda autoridade legítima, incitando grupos
sociais inteiros a esperança messiânicas completamente anticristãs?
Poderíamos continuar. Poderíamos encher
páginas com a lista das infidelidades e traições cometidas pelos homens atuais
da Igreja. Não todos, certamente, apesar de ser verdadeiro o provérbio: Quem
cala consente. E que acabam tornando-se cúmplices, mesmo sem querer. Será que
não há, em toda a Igreja Católica, um só bispo ou cardeal, capaz de elevar-se
contra a moda dominante, para defender em alta voz o dogma da Fé? Além do mais,
a Irmã Lúcia, no que seria sua última entrevista, o seu famoso encontro com o
padre Fuentes, de 26 de dezembro de 1957, tinha já denunciado a surdez
espiritual crescente e o início da perda da Fé: "Padre, a Santíssima
Virgem está muito triste porque ninguém faz caso de Sua mensagem, nem os bons
nem os maus. Os bons continuam seu caminho, mas sem se preocupar da mensagem.
Os maus, visto que o castigo de Deus não os fere no momento, continuam sua vida
de pecado sem fazerem caso da mensagem. Mas, creia-me padre, Deus vai castigar
o mundo e o fará de uma maneira terrível [estávamos na véspera do
Concílio Vaticano II, que representou para a Igreja -- segundo Congar -- o que
os États Generaux representaram para a Revolução Francesa].
Diga-lhes [ao bispo de Leiria e a Pio XII que não quiseram ler o
terceiro segredo] que a Santíssima Virgem disse várias vezes, a meus
primos Francisco e Jacinta e a mim, que muitas nações desaparecerão da face da
terra, que a Rússia será o instrumento da punição do Céu em relação ao mundo
inteiro, se não conseguirmos obter antes, a conversão dessa pobre nação (...)
Padre, o diabo vai começar uma batalha terrível contra a Virgem, e como ele
sabe o modo de ofender mais a Deus e perverter em pouco tempo o maior número de
almas, ele faz tudo para ganhas as almas das pessoas consagradas a Deus (...).
Padre, não esperamos que venha de Roma um apelo à penitência da parte do Santo
Padre para o mundo inteiro. Nem esperemos tampouco que venha dos nossos bispos
um apelo das suas dioceses respectivas, nem das congregações religiosas. Não,
Nosso Senhor já utilizou muitas vezes esses meios e o mundo os ignorou. É por
isso que, agora, é necessário que cada um de nós comece em si mesmo a sua
própria reforma espiritual. Cada um deverá salvar não somente sua alma, mas
também todas as almas que Deus colocou no seu caminho".
E os meios para realizar a
"reforma espiritual" para nós e para os outros são os verdadeiros
instrumentos católicos para a salvação das almas, isto é, "a oração e o
sacrifício", "o santo Rosário" e a "devoção ao Imaculado
Coração de Maria".
Jamais exprimiremos o suficiente a
nossa admiração e gratidão pela Irmã Lúcia, essa figura exemplar de religiosa,
exemplo perfeito, pela graça de Deus, de virtude cristã, simples, humilde e
devota, que resiste e persevera até o fim, no silêncio hostil que a cerca, para
levar a seu termo a missão que Nosso Senhor lhe confiou há tantos anos.
Ela é para nós um modelo no combate que
devemos levar todos os dias contra nós mesmos e contra o mundo. Seu sofrimento,
sua luta intrépida pela defesa e o triunfo do dogma da Fé, nos são de grande
ajuda e reconforto, cercados como estamos pelas trevas que parecem se espessar
sempre mais, enquanto a tempestade se levanta na Igreja a cada dia que passa. A
carmelita de Coimbra nos lembra que, apesar das aparências, Deus não nos
abandonou, que devemos permanecer sempre sólidos na Fé porque "no fim",
depois das provas que só Deus conhece, o Imaculado Coração de Maria "triunfará".
Aemilianus
(Revista Sim Sim Não Não n°39, março de
1996)
1.
[N. da P] Irmã Lúcia faleceu no dia 13 de fevereiro de 2005, cerca de 9
anos após a publicação deste artigo.
2.
[N. da P] No dia 26 de janeiro de 2000, numa conferência de imprensa,
foi apresentado um texto que, segundo o Vaticano corresponderia à totalidade do
"terceiro segredo". Por todo mundo, uma onda de ceticismo se formou.
Leia nossos comentários nesse site.
3.
[N. da P] A obra monumental do padre Alonso, fruto de um labor de 10
anos e considerada de grande valor por quem o leu, teve sua publicação suspensa
em 1976 por ordem do bispo de Fátima, Mons. D. Alberto Cosme do Amaral. Anos
depois, 2 dos 24 volumes viriam a ser publicados, assim mesmo em edições
alteradas. Qual seria o conteúdo desses documentos e o que teria o padre Alonso
concluído das suas pesquisas? Podemos apenas adivinhar com base em alguns
trechos de artigos publicados pelo mesmo em periódicos. A citação abaixo, que
tiramos do artigo "Crônica de um Encobrimento", publicado no site da
Associação de Fátima, reforça a idéia de que o conteúdo do Terceiro Segredo se
referiria a onda de apostasia do após Concílio Vaticano II: "No período
que precede o grande triunfo do Coração Imaculado de Maria, sucederão coisas
tremendas que são objecto da terceira parte do Segredo. Que coisas serão essas?
Se 'em Portugal, se conservará sempre o dogma da Fé, ...' pode
claramente deduzir-se destas palavras que, em outros lugares da Igreja, estes
dogmas vão tornar-se obscuros ou chegarão mesmo a perder-se ...";"Seria,
então, de toda a probabilidade que, nesse período 'intermédio' a que nos
estamos a referir (depois de 1960 e antes do triunfo do Imaculado Coração de
Maria), o texto (do Terceiro Segredo) faça referências concretas à
crise da Fé na Igreja e à negligência dos Seus próprios Pastores." O
Padre Alonso fala ainda de "lutas intestinas no seio da própria Igreja e
de graves negligências pastorais por parte das altas hierarcas"
e, mesmo, de"deficiências na alta Hierarquia da Igreja..."; "Falaria
o texto original (e inédito) de circunstâncias concretas? É muito possível que
não só fale de uma verdadeira 'crise de fé' na Igreja durante este período
intermédio, mas ainda, como acontece com o segredo de La Salette, por exemplo,
que haja referências mais concretas às lutas internas dos católicos ou às
deficiências de sacerdotes e religiosos. Talvez se refira,
inclusivamente, às próprias deficiências da alta Hierarquia da Igreja."
"Por isso, nada disto é alheio a outros comunicados que a Irmã Lúcia tenha
feito sobre este assunto.". Significativamente, a Irmã Lúcia nunca
corrigiu estas conclusões do Padre Alonso - quando nunca hesitou em corrigir
outras declarações de clérigos e de vários autores sobre Fátima, sempre que
estavam enganados. Ora o Padre Alonso teve acesso tanto aos documentos como à
própria Irmã Lúcia. Assim, o seu testemunho é de importância capital.
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