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Representação do Concílio de Trento
"Com efeito, as palavras da Consagração, pronunciadas distintamente para o pão e para o vinho, renovam o santo sacrifício da cruz e são como que uma lâmina ou um punhal que traspassam a Vítima e A imolam misticamente".
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Padre David Francisquini
Em minha já longa
vida sacerdotal, encontro-me com colegas de vocação aqui, ali e acolá. Isso
constitui sempre ocasião para animadas conversas, em geral profundas e sérias,
a respeito da Santa Igreja e de seus ministros. Mas, se de um lado há muita
empatia, de outro há incompreensões que raiam à animosidade, sobretudo quando o
assunto versa sobre a atual crise na Igreja.
Findas as conversas,
nem por isso os temas nelas tratados, os aspectos psicológicos e as
circunstâncias que as cercaram, desaparecem da memória. Eles voltam, com
frequência com indagações sobre a natureza e a oportunidade do que se
conversou, a maior ou menor cortesia e respeito havidos então no trato, a
clareza e a lógica ou a falta delas ao expor as ideias, a coerência ou não dos
argumentos apresentados, ou seja, um retrospecto ou balanço.
Não pense o leitor
que pelo fato de se tratar de sacerdotes, tais conversas sempre convirjam
dentro de uma respeitável cordialidade para um ponto comum, que não poderia
deixar de relacionar-se com a maior glória de Deus. No entanto, dada a
relatividade de tudo em nossos dias, infelizmente isso de há muito deixou de
ocorrer.
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Representação do Concílio Vaticano |
O fato de se celebrar
a missa tridentina promulgada pelo Concílio de Trento, de se reportar ao
concílio Vaticano I e a todo o passado da Igreja visando à salvação das almas,
à glória de Deus e à luta em defesa dos princípios morais, já basta para
provocar não poucas dissensões entre as pessoas do clero. E elas tendem a
crescer quando aqueles que defendem esse passado santo e glorioso não abrem mão
do uso da batina, do barrete ou do chapéu eclesiástico, da faixa e da
manteleta, como foi sempre desejado pela Igreja.
Historicamente, a
partir da década de 1950, acentuando-se nos anos 1960, as ideias heterodoxas e
ambíguas no campo político, social e religioso começaram a grassar nos meios
católicos. Além dos costumeiros disfarces, a admissão de princípios
contraditórios, como a colocação lado a lado do erro e da verdade, não poderia
deixar de gerar confusão entre os fiéis.
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Adicionar legenda |
Mas não era só nos
fiéis. Em uma conversa que certa vez tive com um padre idoso e experiente, bem
formado intelectualmente, ele me disse que a parte essencial e mais importante
da Santa Missa era o "tomai e comei"...
Retruquei-lhe de boa
fé que tal não era o ensinamento da Igreja, pois a Consagração é a parte
essencial da Missa, quando se realiza o sacrifício incruento do Calvário, sem o
qual não haveria o "tomai e comei"... Com efeito, as palavras da
Consagração, pronunciadas distintamente para o pão e para o vinho, renovam o
santo sacrifício da cruz e são como que uma lâmina ou um punhal que traspassam
a Vítima e A imolam misticamente.
Meu interlocutor se
contrapôs, dizendo que isso remontava ao Concílio de Trento no combate aos
protestantes. Respondi-lhe que há uma missa votiva às quintas-feiras, na qual
se exalta Jesus Cristo Sumo e Eterno Sacerdote. Nela o padre lê texto da
epístola aos Hebreus, falando de Cristo que não se glorificou a Si mesmo para
se tornar pontífice, mas o fez Aquele que lhe falou: "Tu és meu Filho,
hoje te gerei".
De igual maneira,
está dito em outro lugar: “Tu és sacerdote para sempre segundo a ordem de
Melquisedec”. Lê-se ainda nas Sagradas Escrituras: “Na verdade, todo
pontífice é escolhido entre os homens e constituído a favor dos homens como
mediador nas coisas que dizem respeito a Deus, para oferecer dons e sacrifícios
pelos pecados. Sabe compadecer-se dos que estão na ignorância e no erro, porque
também ele está cercado de fraqueza. Por isso, ele deve oferecer sacrifícios
tanto pelos próprios pecados quanto pelos pecados do povo. Ninguém se apropria
desta honra, senão somente aquele que é chamado por Deus, como Arão” (Hb. 5,
1-4).
Ao texto citado, o
meu interlocutor disse que se tratava do Antigo Testamento... Respondi-lhe que
a Igreja, ao colocar uma missa votiva todas as quintas-feiras do ano, passa a
ser matéria de fé, mesmo que o texto do referido Apóstolo faça menção aos Hebreus,
pois “lex orandi lex credendi”. Insisti sobre a questão da comunhão, tendo lhe
deixado claro que a Missa não era uma ceia, mas um sacrifício propiciatório.
Outra conversa foi
com um sacerdote também idoso, já bem próximo da morte, que levantou a questão
das pessoas desajustadas na vida matrimonial, que se encontravam numa situação
insolúvel. Segundo ele, a Igreja deveria rever a parte disciplinar concernente
à matéria, a fim de resolver os casos em que as pessoas não podem receber os
últimos sacramentos. Lembro-me de ter reportado a ele uma experiência de Santo
Afonso de Ligório.
Moralista de renome,
o santo se referiu ao caso de uma jovem que, estando para morrer, deu sinais de
conversão e de mudança de vida. Ela manifestou então ao seu confessor o desejo
de ver seu cúmplice, a fim de convencê-lo a abandonar o pecado e também mudar
de vida. O confessor não se opôs e até insinuou a ela que, para se sair bem
naquele propósito, fizesse tal obra de caridade para seu antigo companheiro.
Aconteceu, porém,
que, ao se deparar com o conluiado, a jovem se esqueceu de todos os bons
propósitos e se voltou para ele com palavras carinhosas, dizendo-lhe que ia
morrer, e, portanto, iria para o inferno, que estava certa disto, mas que não
se importava em se condenar. E, assim fazendo, caiu morta. Santo Afonso conclui
que, para quem se escraviza ao vício impuro, é muito difícil emendar-se e se
converter a Deus de todo o coração.
Santo Afonso ao
pregar um retiro para sacerdotes comenta ainda o caso de um deles que levava
vida de pecado, mas que se acostumara a celebrar naquele estado, contradizendo
o ensinamento moral de que quem vive em pecado morre nesse estado – talis vita,
finis ita. Ao celebrar a Missa no dia seguinte, quando ao pé do altar
pronunciou a oração “Judica me Deus...”, ali mesmo morreu e foi julgado.
Sirvam tais lições
aos leitores de que há maneiras de ser, de comportar-se e de viver pelas quais
o próprio pecador procura justificar a sua conduta, passando com isso a
defender erros, vícios, pecados, procedimentos que vão paulatinamente
obscurecendo sua inteligência e endurecendo sua vontade, até ele passar a
defender heresias, ainda que camufladas. Lembremo-nos da máxima: Tal vida, tal
morte.
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