"Portanto, a invocação de Deus (ou do Grande Arquiteto) na Constituição Federal não passa de um artifício para selar um compromisso político ou tranquilizar as consciências que ainda tenham algum sentimento religioso."
Pe. João Batista de A. Prado Ferraz
Costa
Diante do avanço da legislação anticristã no Brasil, as
lideranças dos diversos grupos religiosos estão em busca de um
entendimento para empreender uma reação comum e impedir a aprovação de leis que
agridem a consciência moral da imensa maioria da população brasileira. Em
princípio, essa atitude poderia compreensível e louvável, contanto que
observadas todas as regras da prudência para afastar qualquer perigo de um
falso ecumenismo e irenismo.
Mas há uma coisa que merece reparo nessa frente ampla das
“religiões” contra as forças maçônicas a serviço do Reino do Anticristo e da
Sinagoga de Satanás. É que no embate com o inimigo, quando este defende sua plataforma
política contra o Direito Divino e Natural e recusa uma interferência das
religiões nos debates em curso no Congresso Nacional argumentando que o Estado
brasileiro é laico, os representantes da frente ampla das religiões,
principalmente os católicos liberais, saem em defesa do Estado laico dizendo
que os verdadeiros inimigos deste são os políticos ateus ou agnósticos que se
mostram intolerantes e incapazes de manter um diálogo democrático com seus
adversários.
Dizem também os parlamentares da frente ampla das religiões que
os seus adversários estão esquecidos de que o Brasil não é um Estado ateu,
visto que no preâmbulo da Constituição Federal se diz que os representantes do
povo brasileiro promulgam a carta magna sob a proteção de Deus. E argumentam
que Estado laico significa que o Estado não sofre uma incidência direta das
instituições religiosas em sua organização.
Na minha opinião, toda essa arenga é um paralogismo, se não for,
de fato, um sofisma.
Com efeito, a invocação de Deus é anulada pelo princípio da
soberania popular consagrado nas constituições de todas as repúblicas modernas
nascidas da Revolução Francesa. Deus, nas constituições modernas, não significa
nada, ainda mais quando se sabe que, conforme o direito político moderno, o
Estado resulta de um contrato social. Soberano é o indivíduo que se põe no
lugar de Deus. Não prevalece o princípio de que Deus criou o homem como ser
naturalmente social.
Como deputados constituintes, os representantes do povo não
declaram que querem organizar o Estado conforme a lei de Deus ou da santa
religião. Portanto, a invocação de Deus (ou do Grande Arquiteto) na
Constituição Federal não passa de um artifício para selar um compromisso
político ou tranquilizar as consciências que ainda tenham algum sentimento
religioso.
Quanto à argumentação de que Estado laico significa apenas que o
Estado não sofre incidência direta das instituições religiosas em sua
organização, os erros implicados nesta afirmação são mais insidiosos e difíceis
de ser compreendidos pelas pessoas mais simples.
Neste ponto, os católicos liberais agem com manifesta má-fé.
Porque querem dizer que Estado laico se opõe a Estado teocrático, ou seja, o
Estado dominado por uma casta sacerdotal. Isto é falso. Estado laico (condenado
reiteradamente pelo magistério da Igreja e aceito pelo Vaticano II), opõe-se,
na história do ocidente, ao Estado confessional, sempre defendido pela
Igreja como o único Estado legítimo, conforme o plano de Deus que criou o homem
para viver como membro de duas sociedade perfeitas, distintas, mas em harmonia:
a sociedade civil e a sociedade eclesiástica, aquela subordinada a esta,
indiretamente, nas questões de interesse para a salvação eterna. Estado
confessional não é a mesma coisa que estado teocrático.
Ao contrário, o argumento dos católicos liberais da frente ampla
das religiões reduz a Igreja a uma instituição de direito privado que teria
direito, como qualquer outra instituição, a fazer-se ouvir no Congresso
Nacional. Será que esses católicos liberais não sabem que a lógica do Estado
laico é que a religião é assunto privado e a tal âmbito deve
restringir-se e que o Estado só cuida da esfera pública, ou seja, daquilo que é
do interesse de todos enquanto membros do Estado laico, não enquanto católicos,
evangélicos, judeus, muçulmanos, espíritas etc?
Na verdade, o que falta aos católicos liberais é a honestidade
de reconhecer que o Estado laico é uma agressão contra a sociedade civil
majoritariamente católica, porque é um ordenamento jurídico, uma estrutura
burocrática, que se sobrepõe à sociedade não para servi-la mas para oprimi-la.
Não procede o argumento o argumento de que Estado laico
significa dizer que o Estado não manda na Igreja e a Igreja não manda no
Estado, mas que tal separação não impede que haja colaboração e boa
convivência entre ambas as esferas.
Acabo de ler um artigo interessantíssimo
do The
Economist (traduzido pel’O
Estado de S. Paulo) a respeito da expansão do Islão sobre a Europa e os
vários problemas surgidos. A matéria diz que o Reino da Bélgica (que adota o
modelo de Estado laico propugnado pelos católicos liberais) subsidia o culto e
o ensino religioso nas escolas públicas e o Islão tem sido beneficiado: mais de
metade dos imãs é remunerada pelo governo e metade das crianças belgas opta por
aulas do Corão! A França, mais fiel à tradição republicana de um laicismo
radical que estabelece uma separação total entre religião e estado, vê-se
agora obrigada, pelas palavras do primeiro-ministro Manuel Valls, a promover o
estudo da religião islâmica sob a supervisão da República Francesa, a fim de
impedir que entre em seu território uma teologia islâmica incompatível com os
“valores” da sociedade secular.
Como se pode ver pela notícia acima, o
Estado laico será destruído pelas suas próprias mentiras e irresponsabilidades.
A Bélgica promove, suavemente, sua própria islamização; dentro de alguns anos
deixará de ser um reino laico ao gosto dos católicos adeptos da Dignitatis
Humanae do Vaticano II para
transformar-se em república islâmica, talvez teocrática. A França, mais
pretensiosa em sua temeridade maçônica, tenta influenciar os estudos teológicos
corânicos como o fez com a teologia católica na época da Revolução.
Tudo indica, porém, que a Bélgica e a França, como de resto toda
a União Européia, morrerão pela força do veneno que engoliram. Merecido
castigo.
Conta-se que o príncipe Filipe Von
Hessen fez mais pela causa protestante mais que milhares de livros do doutor
Martinho Lutero. Hoje, os católicos da declaração Dignitatis
Humanae, os católicos da frente ampla das religiões, fazem muito mais
pela causa secularista do que todos os escritores e panfletários da
ideologia do gênero. Fazem mais do que todos os imãs pelo avanço do Crescente
sobre toda a antiga cristandade.
Anápolis, 25 de agosto de 2016.
Festa de São Luís Rei de França
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