"Contra todas essas negações do comunismo materialista, só a Igreja, somente o verdadeiro Cristianismo ou Catolicismo pode resistir eficazmente, pois só ele contém a Verdade sem erro."
Réginald Garrigou-Lagrange, O.P.
Deve-se,
desde o início, falar da necessidade de uma fé mais profunda, por causa dos
perigos provindos de erros gravíssimos, atualmente espalhados pelo mundo, e por
causa da insuficiência dos remédios a que freqüentemente recorremos contra
eles.
Os
perniciosos erros que se espalham pelo mundo, tendem à descristianização
completa dos povos. Ora, isto começa com a renovação do paganismo no
século XVI, ou seja, com a renovação da soberba e da sensualidade pagã entre
cristãos. Este declínio avançou com o protestantismo, por sua
negação do Sacrifício da Missa, do valor da absolvição sacramental e, por
conseqüência, da confissão; por sua negação da infalibilidade da Igreja, da
Tradição ou Magistério, e da necessidade de se observar os preceitos para a salvação.
Em seguida, a Revolução francesa lutou manifestamente para a
descristianização da sociedade, conforme os princípios do Deísmo e do
naturalismo — isto é: se Deus existe, não cuida das pessoas
individuais, mas somente das leis universais. O pecado, por estes princípios,
não é uma ofensa à Deus, mas apenas um ato contra a razão, que sempre evolui;
assim, considerava-se o furto como pecado enquanto se admitia o direito à
propriedade individual; porém, se a propriedade individual é, como dizem os
comunistas, contrário ao que se deve à comunidade, nesse caso, é a própria
propriedade individual que é furto.
Em
seguida, o espírito da revolução conduziu ao liberalismo que,
por sua vez, queria permanecer numa meia altitude entre a doutrina da Igreja e
os erros modernos. Ora, o liberalismo nada concluía; não afirmava, nem negava,
sempre distinguia, e sempre prolongava as discussões, pois não podia resolver
as questões que surgiam do abandono dos princípios do cristianismo. Assim, o
liberalismo não era suficiente para agir, e após ele veio o radicalismo mais
oposto aos princípios da Igreja, sob a capa de “anticlericalismo”, para não
dizer anticristianismo. Assim, os maçons. O radicalismo, então, conduziu
ao socialismo e o socialismo, ao comunismo
materialista e ateu, como agora na Rússia, e quis invadir a Espanha e
outras nações negando a religião, a propriedade privada, a família, a
pátria, e reduzindo toda a vida humana à vida econômica como se só o
corpo existisse, como se a religião, as ciências, as artes, o direito fossem
invenções daqueles que querem oprimir os outros e possuir toda propriedade
privada.
Contra
todas essas negações do comunismo materialista, só a Igreja, somente o
verdadeiro Cristianismo ou Catolicismo pode resistir eficazmente, pois só ele
contém a Verdade sem erro.
Portanto,
o nacionalismo não pode resistir eficazmente ao comunismo.
Nem, no campo religioso, o protestantismo, como na Alemanha e na
Inglaterra, pois contém graves erros, e o erro mata as
sociedades que nele se fundam, assim como a doença grave destrói o organismo; o
protestantismo é como a tuberculose ou como o câncer, é uma necrose por sua
negação da Missa, da confissão, da infalibilidade da Igreja, da necessidade de
observar os preceitos.
O
que, pois, se segue dos erros citados no que diz respeito à legislação
dos povos? Esta legislação torna-se paulatinamente atéia. Não
somente desconsidera a existência de Deus e a lei divina revelada, tanto
positiva como natural, mas formula várias leis contrárias à lei divina
revelada, por exemplo, a lei do divórcio e a lei da
escola laica, que termina por tornar-se atéia, nos três graus: escolas
primárias, liceus ou ginásios e universidades, nas quais freqüentemente
reduz-se a religião à história mais ou menos racionalista das religiões, na
qual o cristianismo somente aparece como no modernismo, como uma forma agora
mais alta da evolução de um senso religioso que sempre muda, de modo que nenhum
dogma seria imutável nem imutáveis os preceitos; por fim, vem a liberdade total
de cultos ou religiões, e da própria impiedade ou irreligião.
Ora, as repercussões destas leis em toda sociedade são enormes; tome, por
exemplo, a repercussão da lei do divórcio: qualquer que seja o ano, qualquer
que seja a nação, milhares de famílias são destruídas pelo divórcio e deixam
sem educação, sem direção, crianças que terminam por se tornar ou incapazes, ou
exaltadas, ou más, por vezes, péssimas. Do mesmo modo, saem da escola atéia,
todos os anos, muitos homens ou cidadãos sem nenhum princípio religioso. E
portanto, em lugar da fé, da esperança e da caridade cristã, têm eles a razão
desordenada, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos, o desejo de
riqueza e a soberba de vida. Todas essas coisas são erigidas em um sistema
especial materialista, sob o nome de ética laica ou independente,
sem obrigação e sanção, na qual às vezes remanesce algum vestígio do decálogo,
mas um vestígio sempre mutável. Se, porém, os efeitos dolorosíssimos
destes erros perniciosos ainda não aparecem claramente na primeira geração, na
terceira, quarta e quinta se manifestam segundo a lei da aceleração na queda. —
É como na aceleração da queda dos corpos: se numa 1a. etapa da
descida, a velocidade é como que 20, numa 5ª será como que 100. E isto se
contrapõe ao progresso da caridade, que, segundo a parábola do semeador, é por
vezes 30, 50, 100 para um.
É a
verdadeira descristianização ou apostasia das nações. E isto foi exposto
justamente na longa epístola do grande católico espanhol Donoso Cortes escrita
ao Cardeal Fornari para que a apresentasse à Pio IX; o título dela é: Sobre
o princípio generativo dos graves erros hodiernos (trinta páginas) e Discurso
sobre o estado atual da Europa (1830). Cf. Opera do
mesmo autor 5 vol. Madrid 1856: trad. Fr, 1862, t. II, p 221, ss; t. I, p 399;
trad. It. 1861. Em seguida, a mesma série de erros foi exposta no Silabo de Pio
IX, 1861 (Dz. 1701).
O
princípio destes erros é: Se Deus existe, não cuida das pessoas
individuais, mas somente, das leis universais. Daí o pecado não ser uma
ofensa contra Deus, mas somente contra a razão, que sempre evolui. Disto segue
que não existiu o pecado original, nem a Encarnação Redentora, nem a graça
regenerativa, nem os sacramentos que causam a graça, nem o sacrifício e, por
isso, não é útil o sacerdócio, nem é útil a oração.
No
fundo, o Deísmo não parece verdadeiro, pois se os homens individualmente não
precisam de Deus, porque se admitiria que Deus existe no céu? É preferível
admitir que Deus se faz na humanidade, que é a tendência mesma ao
progresso, à felicidade de todos, sobre a qual falam o socialismo e o
comunismo.
Portanto,
qual é, segundo este princípio, o modo de discernir o falso do
verdadeiro? O único modo é a livre discussão, no
parlamento ou em algum outro lugar, e esta liberdade é, portanto,
absoluta, nada pode ser subtraído à sua jurisdição, nem a questão do divórcio,
nem a necessidade da propriedade individual, nem a da família ou da religião
para os povos.
Assim,
a discussão fica libérrima, como se não existisse a Revelação divina; se se
objeta, por exemplo, que o divórcio é proibido no Evangelho, isto pouco
importa.
Destas
coisas nascem, como é patente, grandes perturbações, inúmeros abortos, crimes,
e não se encontra remédio, senão o de aumentar cada vez mais a polícia ou o
exército.
Mas,
a polícia obedece àqueles que estão no poder e não raro, depois destes, vêm
seus adversários e ordenam o contrário. De outra parte, tendo-se suprimido
a propriedade privada, suprime-se, de modo geral, o patriotismo, que é como a
alma do exército.
Donde
estes remédios não serem suficientes para conservar a ordem e evitar as graves
e intermináveis perturbações, pois não mais se admite a lei divina, e nem a lei
natural escrita por Deus em nossos corações (E tudo isso é uma demonstração per
absurdum da existência de Deus.)
Neste caso, é para se concluir com
Donoso Cortes que estas sociedades, fundadas sobre princípios
falsos ou sobre uma legislação atéia, tendem para a morte. Nelas,
com o auxílio da graça, as pessoas individuais podem ainda se salvar, mas estas
sociedades, como tais, tendem para a morte, pois o erro, sobre o
qual se fundam, mata, como a tuberculose ou o câncer que,
progressiva e infalivelmente, destrói nosso organismo. — Só a fé cristã e
católica pode resistir a estes erros, e tornar a cristianizar a sociedade, mas,
para isso, requer-se uma condição, uma fé mais profunda, conforme a
Escritura: « Esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé. »
(1 Jo 5, 4).
(De Sanctificatione Sacerdotum,
intro., tradução: PERMANÊNCIA)
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