"Não é a Doutrina de Cristo que ao homem, que vive no orgulho, inspira e impõe a humildade, origem de Glória verdadeira?"
Escutemos o Papa São Pio X, em excertos da sua encíclica “Acerbo Nimis”, promulgada em 15 de Abril
de 1905:
«Quem não fica
maravilhado ao ver hoje no mundo, não apenas entre os bárbaros, mas também em
meio às nações cristãs, o crescimento cada dia maior da corrupção dos costumes
e da depravação dos hábitos? Intimava o Apóstolo, escrevendo aos Efésios:
“Fornicação e qualquer impureza ou avareza, nem sequer se nomeiem entre vós,
como convém a santos. Nem ditos indecentes, picantes ou maliciosos” (Ef 5,3).
Mas São Paulo, para fundamentar essa santidade e pudor, que refreia as paixões,
punha a Sabedoria Sobrenatural: “Vede pois, cuidadosamente, como andais, não
como néscios, mas como sábios. Por isso não sejais insensatos, mas procurai
conhecer a vontade do Senhor.” (Ef 5, 15ss).
Isso com razão.
Afinal, a vontade humana conserva apenas alguma coisa desse amor honesto e
recto, que Deus Nosso Senhor lhe infundiu e que quase a arrastava ao bem, não
aparente, mas veraz. Depravada pela corrupção da primeira culpa, ainda que
esquecida de Deus, seu Autor, seus afectos voltaram-se quase todos ao amor do
que é vão, e na procura da falsidade. É preciso, então, dar a essa vontade,
desviada e cega pelas paixões perversas, uma guia que a escolte, para que volte
aos caminhos abandonados da Justiça. Essa guia, não escolhida livremente, mas
destinada pela natureza, é o intelecto. O qual, portanto, se falta a verdadeira
Luz, isto é, do conhecimento das coisas Divinas, será como um cego que socorre
outro cego – cairão os dois no fosso. O santo Rei David, louvando o Deus da Luz
da Verdade, por Ele reverberada sobre nossas mentes, dizia: “Senhor, levanta
sobre nós a Luz da Tua face” (Sl 4,7). A consequência dessa luz indicou qual
fosse, acrescentando: “Puseste em meu coração mais alegria”; isto é, aquela
alegria que faz dilatar o coração, FAZ COM QUE PERCORRA O CAMINHO DOS
MANDAMENTOS DIVINOS.
Que de facto seja
assim parece claro a quem reflecte um pouco. Afinal, a Doutrina Cristã nos
revela Deus e Sua Infinita perfeição com maior clareza do que o manifesta a Luz
natural do intelecto humano. Mas depois? Essa mesma Doutrina nos impõe honrar a
Deus com a Fé, obséquio da mente; com a Esperança, obséquio da vontade, com a
Caridade, obséquio do coração; ligando assim o homem todo, sujeitando-o ao seu
Supremo Autor e moderador. Sòmente a Doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo nos
manifesta a verdadeira e altíssima dignidade do homem, indicando-o como filho
do Pai que está nos Céus, feito à Sua Imagem, e destinado a viver Eternamente
com Ele.
Mas dessa mesma
dignidade, e do seu conhecimento, Cristo deduz a obrigação para os homens do
amor recíproco, como irmãos, prescreve-lhes viver como convém a Filhos da Luz:
“Não em orgias e bebedeiras, nem em devassidão e libertinagem, nem em rixas e ciúmes”(Rom
13,13); obrigando-os a depositar a solicitude em Deus, já que Ele cuida de nós;
manda estender a mão ao pobre; fazer o bem aos que nos fazem mal, ANTEPOR AS
VANTAGENS ETERNAS DA ALMA AOS BENS FUGAZES DO TEMPO”.
Não é a Doutrina de
Cristo que ao homem, que vive no orgulho, inspira e impõe a humildade, origem
de Glória verdadeira? “Aquele que se torna pequenino … esse é o maior no Reino
dos Céus” (Mt 18,4).»
O Mistério da Predestinação ultrapassa a inteligência criada
ainda mais do que o Mistério da Santíssima Trindade. Tal não nos deve
surpreender, PORQUE SÓ A FÉ CATÓLICA POSSUI VERDADEIROS E PRÓPRIOS MISTÉRIOS,
PORQUE SÓ ELA É DIVINAMENTE REVELADA, SÓ ELA NOS FAZ, PELA GRAÇA SANTIFICANTE,
PARTICIPANTES DA NATUREZA DIVINA, DA INTELIGÊNCIA DIVINA, DA SANTIDADE DIVINA.
As Teses Molinistas, como afirma Garrigou-Lagrange,
dissolvem grande parte do Mistério, centrando no homem a decisão, não apenas
temporal, mas igualmente transcendental, sobre a sua salvação. Para este
sistema, a Graça suficiente difere extrìnsecamente da Graça eficaz, pois que o
livre arbítrio humano, a ela adere, ou não. Segundo as Teses Tomistas, a Graça
Suficiente difere intrìnsecamente da Graça Eficaz, pois a correspondência da
alma à Graça depende da natureza da própria Graça. Por essa altura foi também
desenvolvida pelos molinistas a Tese da Ciência Média, a ciência que Deus teria
dos denominados futuríveis, ou seja, de todas as alternativas e respectivas
consequências, que se colocam à operação racional livre. Mas esta “ciência
média” pouco ou nada acrescenta á distinção clássica entre “ciência de simples
saber” – na qual Deus conhece tudo o que é ser, exista ou não, e conhece o mal
pela privação desse mesmo ser – e a “ciência de visão”, pela qual Deus conhece
tudo aquilo que efectivamente existe.
Afirma São Tomás: “A criatura racional deve ser conduzida
por Deus para o fim da qual ela é capaz. A criatura é por assim dizer
transportada. A razão dessa transladação preexiste em Deus; tal como n’Ele
preexiste a razão de que todas as criaturas atinjam o seu fim.” (Suma Teológica
I, quest. 23, art.1). Neste quadro conceptual, deve sustentar-se,
veementemente, QUE A CRIATURA, O ENTE CRIADO, NÃO PODE POR SI MESMO ATINGIR O
SEU PRÓPRIO FIM TRANSCENDENTAL.
O teólogo Luís de Molina (1535-1600) não viu o absurdo que é
sustentar que Deus concede as Graças depois de previstos os méritos da
criatura. Efectivamente, DE ONDE RETIRAM A SUA ENTIDADE METAFÍSICA TAIS
MÉRITOS? DA CRIATURA? MAS A CRIATURA NÃO POSSUI A CHAVE DA SUA ESSÊNCIA, SÓ
DEUS; LOGO ESSA MESMA CRIATURA NÃO PODE ATINGIR O SEU FIM TRANSCENDENTAL A NÃO
SER CONDUZIDA POR DEUS.
Diz São Paulo: “Ora nós sabemos QUE DEUS CONCORRE EM TUDO
PARA O BEM DOS QUE O AMAM, DAQUELES QUE SEGUNDO O SEU DESÍGNIO SÃO ELEITOS.
Porque os que de antemão conheceu, também os PREDESTINOU PARA SEREM CONFORMES À
IMAGEM DO SEU FILHO, A FIM DE QUE ESTE FOSSE O PRIMOGÉNITO DE MUITOS IRMÃOS; E
AOS QUE PREDESTINOU, TAMBÉM OS CHAMOU; E AOS QUE CHAMOU, A ESSES JUSTIFICOU; E
AOS QUE JUSTIFICOU TAMBÉM OS GLORIFICOU.” (Rom 8, 28-30). E ainda: “Bendito
seja a Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que do Alto dos Céus nos
abençoou, com toda a espécie de bençãos espirituais em Cristo. Foi assim que
n’Ele nos escolheu, antes da constituição do mundo, para sermos santos e
imaculados diante dos Seus olhos. PREDESTINOU-NOS PARA SERMOS SEUS FILHOS
ADOPTIVOS, POR MEIO DE JESUS CRISTO, POR SUA LIVRE VONTADE, PARA FAZER
RESPLANDECER A SUA MARAVILHOSA GRAÇA, PELA QUAL NOS TORNOU AGRADÁVEIS EM SEU
AMADO FILHO”. (Ef 1, 3-6)
Há que tentar projectar alguma luz, não só natural, mas
também Sobrenatural, sobre a realidade de que a relação de Deus com o mundo é
uma relação de razão, para usar a terminologia Tomista, no sentido em que todo
o ser do mundo É VIRTUALMENTE EM DEUS. Não se pode adicionar o ser do mundo ao
ser de Deus, tal como não se pode adicionar a sabedoria de um livro à do seu
autor. A relação da criatura com Deus É UMA RELAÇÃO TRANSCENDENTAL, pelo mesmo
motivo. É certo que as criaturas possuem ACTO METAFÍSICO PRÓPRIO, EXISTEM
REALMENTE, MAS SÃO TRANSCENDENTALMENTE DEPENDENTES DE DEUS, PORQUE SÒMENTE DELE
PODEM RECEBER O SEU PRINCÍPIO (CRIAÇÃO) E O SEU FIM (ESCATOLÓGICO).
A acção de Deus não se combina com a acção do homem como se
fossem dois princípios finitos, Não, quanto mais Deus age, mais capacidade
faculta à criatura para agir. A acção Divina É SEMPRE TRANSCENDENTAL. NÓS NÃO
SOMOS PREDESTINADOS POR SERMOS BONS – SOMOS (sobrenaturalmente) BONS PORQUE
SOMOS PREDESTINADOS. É Deus Quem faz os seus santos. Tudo o que há em nós de
bom, na Ordem Natural e na Ordem Sobrenatural, TUDO DEVEMOS A DEUS.
Podemos merecer a salvação Eterna? Transcendentalmente, não,
temporalmente, evidentemente que sim. O Decreto Eterno de Predestinação
TRANSCENDE-NOS, e por isso não o podemos merecer. Mas na execução temporal
desse decreto, só podemos ser livremente bons, sob a acção da Graça, e assim
merecer a Bem-Aventurança do Reino dos Céus.
Poderemos merecer o Inferno? No que concerne à ausência do
Decreto Transcendental de Predestinação, não pode haver da nossa parte, nem
mérito, nem demérito. Mas temporalmente, ao sermos real e verdadeiramente maus,
merecemos o Inferno. Mas como poderemos ser bons se nos é recusada a Graça? A
resposta a esta pergunta, a mais profunda, remete-nos para o campo da realidade
da Causa transcendental que é Deus, infinitamente acima das suas criaturas. Aos
maus não é, pura e simplesmente, recusada a Graça, simplesmente não é
concretizada uma moção Sobrenatural que eficazmente os conduza à
Bem-Aventurança; porque no conceito de mundo, que Deus efectivamente quis, o
equilíbrio, mas também a luta, entre as forças do bem e do mal, assim o
determinou, não positiva, mas negativamente. Àqueles que pretendiam refutar São
Tomás de Aquino, argumentando que se já fomos excluídos da Predestinação, nada
mais podemos fazer; São Tomás respondia: “Ama Sobrenaturalmente a Deus sobre
todas as coisas, e ao próximo por amor de Deus – E SERÁS PREDESTINADO!”
Por outro lado, se é verdade que Deus Nosso Senhor move
positivamente, através da Graça, os predestinados, até alcançarem a Eterna
Bem-Aventurança, CONSTITUI GRAVÍSSIMA HERESIA AFIRMAR QUE DEUS TAMBÉM MOVE
POSITIVAMENTE OS RÉPROBOS ATÉ À SUA CAÍDA NO INFERNO. NÃO EXISTE PREDESTINAÇÃO
AO INFERNO; EXISTE, SIM, UMA NÃO PREDESTINAÇÃO AO CÉU.
Deus Nosso Senhor nunca pode querer positivamente o mal,
permite-o apenas, sempre com o objectivo de alcançar um MAIOR BEM SOBRENATURAL.
Deus Nosso Senhor, na Sua Eterna Sabedoria, no Seu Eterno Conselho, quis este
mundo, com tudo o que possui de bom e de mau, mas sempre para que a virtude
Sobrenatural de poucos compense, superabundantemente, a miséria moral de
muitos. O erro monstruoso do Calvinismo reside nessa dupla predestinação
positiva, mas não só, pois nega a perfeita comensurabilidade entre a Eterna
Predestinação e a sua execução temporal, ou seja: Deus poderia lançar no
Inferno pessoas virtuosas, e colocar no Céu autênticos Demónios, pois não
haveria qualquer homogeneidade entre a referida Predestinação e a qualidade
moral do predestinado. No mesmo erro terá caído Gotescalco, condenado no
concílio de Quierzy em 849.
Jamais olvidemos que segundo a nossa santíssima Fé, os
eleitos são verdadeiramente bons, e os maus verdadeiramente maus. NUNCA SE PODE
PERDER A SALVAÇÃO, PELO SIMPLES FACTO QUE SENDO A PREDESTINAÇÃO ETERNA E
TRANSCENDENTAL, A ORDEM TEMPORAL NUNCA A PODE INFIRMAR. Porque o cerne da
questão é que a acção transcendental de Deus, através da Sua Graça, nunca pode
negar a actividade própria da criatura, neste caso da criatura racional e
espiritual. A ACÇÃO DE DEUS NA EXECUCÃO DO DECRETO DA PREDESTINAÇÃO NÃO DESTRÓI
O LIVRE ARBÍTRIO, PORQUE SE EXERCE ATRAVÉS DESSE MESMO LIVRE ARBÍTRIO.
A Vontade Salvífica Universal de Deus é transcendentalmente
anterior à Predestinação, na exacta medida, em que a primeira é constitutiva do
que é a finalidade transcendental da criatura racional, a qual deve glorificar
a Deus, formalmente, mediante o conhecimento e o amor, mesmo na Ordem Natural.
Já a Predestinação envolve o género de mundo que o Eterno Conselho Divino
decidiu criar. Note-se que Deus Nosso Senhor não pode criar qualquer mundo,
POIS QUE A ACÇÃO DIVINA É CONSTITUTIVA DA CHAVE E DA VERDADE DAS ESSÊNCIAS, A
QUAL NÃO DEPENDE DA VONTADE DIVINA, MAS SIM DA SUA INTELIGÊNCIA. POIS QUE DEUS
NÃO
CONSTITUI A VERDADE, NEM É CONSTITUÍDO POR ELA – DEUS É A
VERDADE!
A Santa Madre Igreja nunca considerou o molinismo herético,
mas a verdade é que pràticamente canonizou o Tomismo. Na parte final do século
XVI eclodiram tremendas discussões teológicas entre os Dominicanos Tomistas
chefiados por Báñez e pelo Cardeal Vernerio, e os jesuítas molinistas que
tinham do seu lado o influente Cardeal Belarmino. O Papa Clemente VIII (1598)
fez transladar a questão para a Santa Sé e criou a Congregação “De Auxiliis”
com o objectivo de solucionar a apaixonada controvérsia. Havia grande
expectativa no mundo universitário. Após nove anos de discussões, em 1607, o
Papa Paulo V deu por terminada a controvérsia. Ambas as partes ficavam com
liberdade para ensinar as respectivas doutrinas, ficando proibidas de se
anatematizarem mùtuamente. Mais tarde acrescentou-se a interdição de publicar
escritos sobre estas matérias sem licença expressa da Santa Sé. Todavia, após a
quase canonização do Tomismo pelos últimos papas, a Tese molinista sofreu rudes
golpes, ficando notàvelmente debilitada.
LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO
Lisboa, 2 de Agosto de 2018
Alberto Carlos Rosa
Ferreira das Neves Cabral
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