“Este
princípio deve ter continuadamente diante dos olhos quem não quer desviar-se da
recta senda da Verdade”
Alberto Carlos
Rosa Ferreira das Neves Cabral
Escutemos o Papa Pio XI, num trecho da sua
encíclica “Quadragesimo Anno”, promulgada em 15 de
Maio de 1931:
«É certo que por muito
tempo pôde o capital arrogar-se direitos demasiados. Todos os produtos e todos
os lucros reclamava-os ele para si, deixando ao operário ùnicamente o bastante
para restaurar e reproduzir as forças. Apregoava-se que, por fatal lei económica,
pertencia aos patrões acumular todo o capital, e que a mesma lei acorrentava e
condenava os operários a perpétua pobreza e vida miserável. É bem verdade que
as obras nem sempre estavam de acordo com SEMELHANTES MONSTRUOSIDADES, dos
chamados princípios liberais de Manchester. Não se pode, contudo, negar que
para elas tendia, com passo certeiro e constante, o regime económico e social.
Por isso, não é para admirar que estas opiniões erróneas e estes postulados
falsos fossem enèrgicamente impugnados, e não só por aqueles A QUEM PRIVAVAM DO
DIREITO NATURAL DE ADQUIRIR MELHOR FORTUNA.
De facto, aos operários
assim maltratados, apresentaram-se os chamados “intelectuais”, contrapondo a
uma lei falsa um não menos falso princípio moral: “Os frutos e rendimentos,
descontado apenas o que basta para amortizar e reconstituir o capital,
pertencem todos de, direito, aos operários”. Erro mais capcioso do que o de
alguns socialistas, para os quais tudo o que é produtivo deve passar a ser
propriedade do estado, quer dizer – socializar-se; mas, por isso mesmo, erro
muito mais perigoso e próprio a seduzir os incautos; veneno suave que tragaram
àvidamente muitos, a quem o socialismo sem rebuço não pudera enganar.
A premuni-los contra
estes falsos princípios, com que a si próprios fechavam o caminho da Justiça e
da Paz, deviam bastar as palavras sapientíssimas do nosso predecessor: “Embora
seja distribuída entre os particulares, não cessa a terra de servir à
propriedade pública” (encíclica RERUM NOVARUM – 1891). O mesmo ensinamos nós,
quando declaramos que a própria natureza exige a repartição dos bens em
domínios particulares, precisamente a fim de poderem as coisas criadas servir
ao bem comum, de modo ordenado e constante. Este princípio deve ter
continuadamente diante dos olhos quem não quer desviar-se da recta senda da
Verdade.
Ora, nem toda a
distribuição dos bens ou riquezas entre os homens é apta para obter totalmente,
ou com a devida perfeição, o fim estabelecido por Deus. É necessário que as
riquezas, em contínuo incremento, com o progresso da economia social, sejam
repartidas entre os indivíduos, ou pelas classes particulares, de tal maneira
que SE SALVE SEMPRE A UTILIDADE COMUM, de que falava o Papa Leão XIII, ou por
outras palavras, que em nada se prejudique o bem geral de toda a sociedade.
Esta lei de Justiça social proíbe que uma classe seja pela outra excluída da
participação nos lucros. Violam-na, por conseguinte, tanto os ricos, que
felizes por se verem livres de cuidados, em meio da sua fortuna, têm por muito natural
embolsarem eles tudo – e os operários nada; como a classe operária, que
irritada por tantas injustiças, e demasiadamente propensa a exagerar os
próprios direitos, reclama para si tudo, porque é fruto do trabalho das suas
mãos, e combate e pretende suprimir toda a propriedade, rendas ou proventos,
qualquer que seja a sua natureza ou função social, uma vez que se obtenham e
pela simples razão de serem obtidos sem trabalho. A este propósito, cita-se às
vezes o Apóstolo onde diz:”Quem não quer trabalhar não coma”(IITess 3,10).
Citação descabida e falsa. O Apóstolo repreende os ociosos, que podendo e dever
trabalhar, não o fazem; e admoesta-nos a que aproveitemos diligentemente o
tempo e as forças do corpo e do espírito, e não queiramos servir de peso aos outros,
quando podemos bastar-nos a nós próprios. Mas o Apóstolo não ensina, nem podia
ensinar, que o trabalho seja o único título para receber o sustento ou perceber
rendimentos.»
O Catecismo de São Pio X inicia-se
colocando a questão mais absolutamente importante das nossas vidas, mas que
desgraçadamente é aquela que os homens menos consideram e até frequentemente
desprezam: Para que estamos nós na Terra? Quem nos criou e com que Fim?
Os Bens criados, tudo o que Deus criou,
POSSUI UMA SANTIDADE ONTOLÓGICA PRÓPRIA, pelo mesmo facto de terem saído das
mãos de Deus. Logo daqui se infere que a natureza profunda desses bens é
antecedentemente pública e consequentemente privada, porque a propriedade
privada integra, irrevogàvelmente, da forma mais estrita, a própria compreensão
filosófica e teológica do Género Humano. Assinale-se que no Paraíso Terrestre
os bens eram raros, embora menos raros que depois do pecado original; portanto
havia necessidade de trabalho, embora este não fosse penoso.
Não há naturezas más, nem acidentes, pois
que estes ordenam-se à substância e só podem ser na substância. O mal não é,
metafìsicamente, nem uma natureza, nem um acidente, mas privação qualificada de
ser, físico ou moral. Existem quatro termos cujo significado é frequentemente
confundido: Natureza, significa o princípio fundamental da existência, das
acções e da vitalidade de um ente; Substância, é essa mesma natureza enquanto
constitui princípio sustentador dos acidentes; Essência, significa o âmago, o
núcleo, metafísico, ontológico e inteligível mais profundo desse mesmo ente;
Quididade, significa esse mesmo núcleo ontológico e inteligível enquanto é
susceptível de definição, a qual constitui uma análise da compreensão.
Em Deus não há acidentes, nem
potencialidade alguma, activa ou passiva. Em Deus todas as realidades são
Eternas; o próprio mundo, passado, presente e futuro, possui uma presença
Eterna no conhecimento Divino.
Uma das grandes armadilhas de satanás, que
Deus Nosso Senhor permitiu para castigo dos nossos pecados, consistiu em
conspirar para que os homens edificassem grandes cidades artificiais e modos de
vida desenraízados da natureza, facilitando assim, enormemente a irreligião e o
ateísmo.
Deus Nosso Senhor colocou a Criação ao
serviço do homem, não apenas na Ordem Natural, mas tendo, caracterizadamente,
em linha de conta a elevação do Homem ao estado Sobrenatural. Até os Anjos,
como ministros de Deus, foram estabelecidos como Custódios dos homens e das
instituições, segundo o princípio de que o homem, como animal racional, situado
na fronteira entre dois mundos, necessita do concurso auxiliador, não apenas
das criaturas puramente materiais, mas igualmente das puramente espirituais.
Efectivamente, o homem constitui um verdadeiro microcosmo da Criação.
Certa espiritualidade, essencialmente
imatura e não tomista, pretende que as criaturas constituem formalmente um
perigo para a ascensão Sobrenatural da alma para Deus. Nada mais errado. As
criaturas, enquanto tais, na sua pureza, tal como saíram das mãos de Deus, nunca
poderiam representar um perigo para a nossa santificação. O que acontece, É QUE
A PRÓPRIA FALTA DE SANTIDADE TORNA AS ALMAS INCAPAZES DE GOVERNAREM
SOBRENATURALMENTE OS BENS CRIADOS. Aqui reside a razão mais profunda dos votos
públicos de castidade, pobreza e obediência, próprios dos religiosos.
É certo que os bens da Criação, conquanto
bons e legítimos, necessitam ser perfeitamente sobrenaturalizados para
alcançarmos a salvação; OU SEJA, TÊM DE ALGUMA FORMA DE SE ELEVAR À CONDIÇÃO DE
BENS CELESTES E ETERNOS. PORQUE SÓ SE LEVA VERDADEIRAMENTE DESTE MUNDO O QUE
PERTENCE, ETERNAMENTE, A DEUS NOSSO SENHOR.
Só ama, Sobrenaturalmente, a Deus sobre
todas as coisas, quem foi capaz, com a Graça de Deus, de tudo comprometer e
integrar nessa mesma Caridade perfeita. Os legítimos afectos naturais
necessitam igualmente de ser sobrenaturalizados. Todavia a Ordem Sobrenatural
não deve procurar obliterar a legítima autonomia da Ordem Natural, como
fizeram, cada um à sua maneira, o protestantismo e o Jansenismo. Quando se
desconhece a analogia, bem como a profunda articulação hierárquica extrínseca
entre a Ordem Natural e a Ordem Sobrenatural, a consequência última é destruir
ambas. Essa é a história de todos os dualismos que eivaram a Cristandade, e que
quase sempre produziram as maiores aberrações contra a natureza. Os cátaros e
albingenses proibiam o matrimónio porque gerava mais entes corporais – mas
autorizavam a sodomia.
Erraram, também, profundamente, aqueles
que, como Suarez(1548-1617) e Vitória (1492-1546), procuraram conferir
uma desmedida autonomia histórica à Ordem Natural face à Ordem Sobrenatural,
chegando mesmo ao ponto de afirmar que a Soberania temporal do Romano Pontífice
era apenas acidental, contradizendo a Bula “Unam Sanctam” do Papa Bonifácio
VIII (1302).
Por outro lado, negar a Ordem Sobrenatural,
bem como a necessidade de elevar a essa Ordem todos os legítimos Bens
terrestres, conduz a ferir de morte a mesma Ordem Natural, como é perfeitamente
demonstrado pela História da Igreja, e de uma maneira especial pela História da
apostasia conciliar.
Consequentemente, operar como se a
Humanidade tivesse sido criada numa Ordem puramente natural, quando essa Ordem
nunca existiu, É O MAIOR ERRO QUE SE PODE COMETER. Todas as “utopias” radicam
aí a sua origem.
Nós não nos encontramos na Terra como um
fim em si mesmo, para gozar naturalmente a vida como se mais nada existisse.
Contudo a recusa em fruir, ordenadamente, cada um segundo o seu estado, os bens
criados, configura o pecado de insensibilidade, censurado por São Tomás.
Anàlogamente, não se pense que uma alma é
tanto mais santa quanto maiores privações materiais haja sofrido na vida. A
Santidade é uma forma que exige um equilíbrio material de operação; sòmente a
Graça Santificante e a Caridade perfeita podem ministrar o segredo desse
equilíbrio. Não há, nem pode haver, duas vidas iguais; a imitação que devemos
aos santos É UMA IMITAÇÃO FORMAL DAS SUAS VIRTUDES, NÃO IMPLICA, NEM PODE
IMPLICAR, UMA CÓPIA MATERIAL DAS SUAS ACÇÕES. Esse constitui o erro descomunal de
todos os fariseísmos e de todos os falsos espiritualismos. Gerardo Groote,
pregador do século XV, pouco faltava para condenar formalmente o matrimónio
como gerador de todos os pecados. É claro que se Gerardo fosse Tomista, logo
realizaria que não é o matrimónio, em si mesmo, que gera os vícios, quando
existam, É A TREMENDA FALTA DE VIRTUDE DOS ESPOSOS! E se a Santa Madre Igreja
sempre ensinou que o matrimónio torna bastante mais difícil, mas não
impossível, a santificação positiva da alma, tal se deve, não a um defeito do
próprio matrimónio, que foi instituído e elevado à dignidade de Sacramento por
Deus Nosso Senhor, mas à carência de virtude da mesma alma.
Consequentemente, os bens da Terra foram
providencialmente criados por Deus PARA QUE MAIS FÀCILMENTE, COM A GRAÇA DO
SENHOR, NOS ENCAMINHEMOS PARA O CÉU. Só que tal finalidade pressupõe o seu uso
perfeitamente ordenado, O QUE TAMBÉM SÓ DEUS PODE SOBRENATURALMENTE OUTORGAR.
PORQUE TUDO O QUE SOMOS, NA ORDEM NATURAL E NA ORDEM SOBRENATURAL, TUDO, ABSOLUTAMENTE
TUDO, DEVEMOS A DEUS.
LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO
Lisboa, 7 de Junho de 2017
Alberto Carlos Rosa Ferreira das Neves
Cabral
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