“Abrirei os lábios,
pronunciarei sentenças, desvendarei os mistérios das origens.” (Salmo 77, 2)
Introdução:
Cristo desvenda os mistérios
É certo
que o Antigo Testamento nos revela que Deus, outrora, falou a homens escolhidos
por Ele, para que estes falassem, enquanto emissários, aquilo lhes era
necessário conhecer.
Abraão,
Moisés, Ezequiel, dentre outros, foram, nos tempos “preparatórios” e
“precedentes” da “plenitude dos tempos” os emissários escolhidos dentre um povo
que seria, futuramente, a cepa de onde viria Aquele que é, ao mesmo tempo, quem
Se revela e o próprio conteúdo da revelação: O Messias. Deus então sela a
Antiga Aliança (ou a primeira) com os patriarcas visando estabelecer com o povo
judeu as bases necessárias para a vinda d’Aquele que revogaria a Antiga
Aliança, estabelecendo a Nova, levando a Lei e os Profetas à perfeição.
O
versículo 2 do salmo 77 refere-se a Cristo: Rei, Profeta, Mensagem e Redentor.
A Verdade se revela a Si mesma na Pessoa Divina de Jesus Cristo. Ele, o Verbo,
anuncia-Se e revela-Se a Si mesmo. Ele é quem desvenda os mistérios. O caminho
a verdade e a vida capazes, com exclusão de todos os demais supostos caminhos,
de religar a criatura decaída ao seu Criador.
Foi para
isto que Jesus nasceu e viveu entre nós, segundo Sua inefável natureza humana.
Para nos revelar os mistérios escondidos desde a criação do mundo e religar o
que estava à deriva.
Conceito e etimologia da
palavra religião
O conceito
católico de religião (do latim religio), consiste no laço de piedade que cuja função
é “religar” os seres humanos a Deus. Tal marco se define já no século III por
Lactâncio, um autor destacado entre os primeiros cristãos que se tornou um
conselheiro do primeiro imperador romano Constantino I. Lactâncio,
portanto, rechaça a significação do termo religião cunhada pelo filósofo romano
pagão Cícero (106–43 a.C.), que via na religião nada mais que uma virtude
pessoal que caracterizava uma forma de fidelidade aos deuses.
Lactâcio,
descortina o verdadeiro significado da expressão, fixando sua vinculação
etimológica à palavra grega religio, o que foi chancelado posteriormente por
Santo Agostinho, na obra “De vera religione”, onde o Santo Doutor reafirma
interpretação de Lactâncio, estabelecendo em definitivo a relação existente
entre religio e religar. Nada mais, portanto, conforme à Revelação e a
Sã Doutrina.
Sendo
assim, a religião não é uma opção, mas uma necessidade intrínseca da criatura
racional, sem a qual esta não se realiza. Pelo contrário, vagueia sem propósito
e perdida seguindo em direção ao nada.
Necessidade de religar-se a
Deus Pai e Criador
Somente
pela fé, dom gratuito de Deus, é possível aquilatar e dimensionar esta
afirmação: a criatura humana tem necessidade de religar-se a seu criador.
Antes de
mais nada é preciso fazer uma distinção, diferenciando dois verbos que parecem
próximos, mas que na realidade não são: necessitar x precisar. Desse modo,
quando digo que necessito de algo, estou afirmando que não posso “viver sem
esse algo”, ao passo que, quando afirmo que preciso de alfo, estou afirmando
que “esse algo me seria agradável, porém, dispensável”. Então é isso, não posso
viver sem ter acesso aquilo que “necessito”, ao passo que, com relação ao que
“preciso”, a carência é meramente circunstancial e não substancial. Ou seja,
algo de que precisamos pode, hoje ou amanhã, ser dispensável.
Por outro
lado – e aqui é o ponto central e “necessário” da argumentação -, quando
contextualizo, no âmbito da fé e da salvação eterna das almas, a diferença de
significado entre necessidade e precisão a distância entre os termos se
agiganta. Ao afirmarmos, à luz da fé, que necessitamos religar-nos a Deus,
estamos na verdade afirmando que “não podemos viver e se realizar enquanto
criatura sem Ele”. Trata-se, portanto, de uma relação ineludível,
inquebrantável, da qual não se pode escapar. Na verdade, quando São Paulo, ao
afirmar que em Deus “nós somos, existimos e nos movemos”, descortina a verdade
necessária acerca da inefável relação que existe entre o Pai e Sua Criação.
Trata-se de uma relação, portanto, de dependência absoluta e não relativa.
Segundo o
Pe. Reginald Garrigou-Lagrange, grande teólogo tomista, Deus Nosso Senhor É o
Bem Absoluto e, por isso, detém, natural e sobrenaturalmente, Direitos Imprescritíveis,
quer dizer, Eternos, sobre nós, Suas criaturas. Ele é o único “Pão” capaz de
saciar a nossa fome no estado de termo. E foi exatamente isto que Nosso Senhor
Jesus Cristo nos revelou.
Salvar-se,
portanto, é religar-se a Deus através do Cristo e de Sua Igreja, sendo esta
nossa meta enquanto viajantes neste mundo que passa.
Jesus Cristo funda o Reino de
Deus na Terra: A Igreja Católica detentora da verdadeira religião.
Chegamos
ao ponto no qual já podemos afirmar e definir o verdadeiro e católico
significado da palavra religião, com todas as implicações práticas imagináveis
à criatura humana.
Religião é
religar-se a Deus, através de Seu Cristo, segundo as normas e as regras que,
para além de um mero conjunto de preceitos estanques no tempo, repercutem na
eternidade e, ao fim e ao cabo na plena realização das criaturas racionais.
Portanto, o Anunciante da Verdade, que não se trata de um mero emissário, mas o
próprio Rei, interessado primeiro na transmissão da mensagem, É Cristo Nosso
Senhor. Este anúncio, que se inicia com a Revelação no Antigo Testamento,
culminando, na plenitude dos tempos, com a Encarnação, a partir da qual Nosso
Senhor inaugura e estabelece, ao mesmo tempo, a Nova e Definitiva Aliança.
Então,
religar-se e imiscuir-se, por Graça de Deus, no Reino que Nosso Senhor fundou
na terra. É amar o Rei, Seu Reino e as regras que fazem parte da dinâmica desse
reino, trajando-se com as vestes certas, auxiliados pelos Sacramentos. Tudo em
conformidade com nossa natureza e sua imutabilidade, que se revela através da
Sã Doutrina, a qual, por reta razão exclui as “opiniões” humanas. Não se trata
a verdadeira religião, portanto, de meros enunciados morais estanques e sem
fundamento teológico-metafísico-racional. Aliás, o moralismo puro farisaico foi
veemente e definitivamente condenado por Nosso Senhor.
Não se
pode ir a Deus sem passar pelo Reino, em obediência ao Rei. Donde se pode
afirmar que o subjetivismo pós-conciliar é agnóstico, não conhece e não aceita
que há uma Verdade, mas antes, funda-se em experiências individuais, apartadas
da Revelação, transformando as opiniões e sentimentos, impressões e
subjetivismos em ferramental de suas temerárias especulações.
Enfim, A
Verdadeira Religião consiste na adesão total – com todo coração, entendimento,
alma, vontade e inteligência – à Sã Doutrina e aos Dogmas Imutáveis, posto que
a restauração da natureza decaída somente se dará com o retorno, in totum, dessa
mesma natureza ao projeto original de Deus Nosso Senhor, Amando-O, Conhecendo-O
e Servindo-O, em contrapartida ao ato D’aquele que primeiro nos amou.
Por Frederico Silva – Leigo
Católico.
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