Leo
Daniele
Se
existe — dizem alguns — um “Bem nem tão bom” e um “Mal nem
tão mau”, por que não fundi-los em uma média? Não ficaríamos
todos mais felizes?
Outros
dizem que o conveniente é “fazer
aquilo de que se gosta”. Se
alguém está fazendo aquilo de que gosta, seja ele um drogado, um
depravado ou um pequeno estelionatário, não há por que condenar
sua conduta, desde que ele não chegue ao extremo de prejudicar o
próximo, matando, assaltando bancos ou fazendo coisas do gênero.
O
Bem e o Mal, dizem, são ideias superadas que em breve poderão ir
para um museu de conceitos ultrapassados, pois são algo que não se
sustenta mais, que não combina com o nosso tempo, ao sopro da
moderníssima e “salutar” indefinição de tudo. O Bem e o Mal
seriam dois preconceitos de antigamente...
O
importante é, como se diz de maneira horrível, cada um “na sua”.
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Cópia da imagem de São Miguel Arcanjo, que se encontra na ponta da flecha do Mont Saint Michel, França |
Entretanto,
o pressuposto da moralidade é o senso da oposição entre o Bem e o
Mal. Ou seja, as coisas ou são boas ou são más, e não podem ser
uma e outra coisa ao mesmo tempo. Mas, na ânsia de integrar todas as
coisas umas nas outras, depois de termos assistido à tentativa de
integração do Belo com o Feio, da Verdade com o Erro, não causa
mais espanto a constatação de que se deseja juntar o Bem e o Mal em
um só magma, um só pirão.
Na
realidade, vai ficando cada vez mais difícil distinguir, por
exemplo, uma esposa legítima de uma concubina, por sua aparência.
E, por outro lado, avança a chamada “teoria do gênero”,
tornando superada a antiga figura do homossexual ou da lésbica.
Tudo
aponta para um fato insofismável: os limites entre o Bem e o Mal se
borraram, minando a fundo toda a instância moral. Dentro da
mentalidade pós-moderna, o mal não existe; é apenas uma
“disfunção”.
“Não
podemos ser preconceituosos em relação ao Mal e aos maus”,dizem
os que têm, conscientemente ou não, essa maneira de pensar. Assim
como não se pode, segundo eles, ser homofóbico, dentro em breve
haverá o malofóbico (o inimigo do Mal), o desordofóbico (quem não
gosta da desordem), e o malandrofóbico (quem considera “com
preconceito” a malandragem, e, portanto, não a aceita).
Integrar
o Bem e o Mal em um só pirão é visto hoje como uma manifestação
de sabedoria. Procurar manter a distinção entre o Bem e o Mal
tornou-se uma doidice reprovável.
Por
exemplo, há sobre o assunto uma nova corrente que “transcende
noções antigas”. A ela pertence David K. Marcus, psicólogo da
Universidade Estadual de Washington. Segundo essa corrente, “o
vício e a virtude, como os dois lados da letra V, podem estar
inseparavelmente ligados”.A
matéria foi publicada no jornal “The New York Times” de8-4-14
sob o título Cientistas
estudam o lado bom da maldade.
Existe
até uma espécie de execração daquele que chama de Bem ao Bem e de
Mal ao Mal.“Isso
é maniqueísmo”,
ou “você
é maniqueísta”, afirmam.
Supremo horror! Com isso se paralisam instantaneamente os
“infratores”.
Entretanto,
o maniqueísmo — uma péssima heresia do século III — nada tem a
ver com a prática de estabelecer a verdadeira e salutar distinção
entre o Bem e o Mal.
O
maniqueísmo foi uma seita herética fundada por Maniqueu, segundo a
qual o demônio não teria sido criado por Deus, mas seria ele mesmo
o princípio e a substância do mal.(1)
A
distinção entre o Bem e o Mal, como dito acima, é a base do senso
moral. Portanto, parte integrante da formação católica. Negar a
oposição entre um e outro constitui o auge da imoralidade. E
estamos nisso! É o fundamento de um erro chamado relativismo. Este,
sim, um perigo real.
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Detalhe do portal da catedral de Notre Dame de Paris. O Bem e o Mal representados e um demônio, cada um separando os que Deus salvou e os que condenou. |
Distinguir
entre o Bem o Mal sempre foi considerado uma necessidade, desde o
fundo da noite dos tempos. Muitíssimo antes, portanto, de Maniqueu.
É preceito da Lei natural, foi consignado por Deus no Decálogo,
percorreu todo o Antigo Testamento, foi objeto da divina pregação
de Nosso Senhor e faz parte do patrimônio doutrinário e moral da
Santa Igreja.
A
Sagrada Escritura a todo momento fala dessa necessidade. Lê-se, por
exemplo, nas páginas sagradas: “Contra
o Mal está o Bem, e contra a morte a vida; assim também contra o
homem justo está o pecador. Considera assim todas as obras do
Altíssimo. Serão encontradas duas a duas, e uma oposta à
outra” (Ecl.
33, 15).
Outro
não é o ensinamento dos Papas. Eles dissertaram largamente, em
termos claros, sobre a luta entre o Reino de Deus e o de Satanás, e
em particular sobre a intensificação dessa luta nos dias atuais.(2)
Seria
um não acabar mais analisar os desregramentos decorrentes do orgulho
— mais graves, mais refinados e menos aparentes que os da
sensualidade, mas intimamente a eles ligados. Os ditames da moral
tradicional, expressos nos Dez
Mandamentos,
estão sendo substituídos pelo socialismo, pelo ambientalismo, por
outros itens de sabor hedonista e individualista: “farás
apenas aquilo de que gostas, procurarás sempre uma melhor ‘qualidade
de vida’”...
Mas
desce dos Céus um brado tonitruante: Ai dos que atenuam a oposição
que deve haver entre o Bem e o Mal! Os homens serão separados dois a
dois: “A
uns [Deus]abençoou
e exaltou; a outros santificou e tomou para si; e a outros amaldiçoou
e humilhou, e expulsou-os, depois de os ter separado” (Ecl.
33, 13).
Devo
ser malofóbico, sim! Odeio e devo odiar o mal o quanto possa, com
muita paz e alegria, e para isso a Religião católica nos convida,
sem ambiguidade, com amizade, mas com severidade. Que assim Deus nos
conserve, pois isto é amar o Bem!
___________
Notas:
1.
Denzinger, nº 237.
2.
Insegnamenti di Giovanni Paolo II, Libreria Editrice Vaticana,
Basílica Vaticana, 26 de março de 1981.
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