“Um padre cometerá o mesmo
pecado que os seculares; mas sofrerá um castigo muito maior, permanecerá mais
profundamente cego que todos os outros; será punido conforme o anúncio do
Profeta: Que vendo não o vejam, e ouvindo não compreendam!”
Por Santo
Afonso de Ligório
Consideremos
agora o castigo, que tem de ser proporcionado à gravidade do seu pecado. S.
João Crisóstomo tem por condenado o padre que no tempo do seu sacerdócio comete
um só pecado mortal: Se pecardes como particular, será menor o vosso castigo;
se pecais no sacerdócio, estais perdido. São em verdade terríveis as ameaças,
que o Senhor profere pela boca de Jeremias contra os padres que pecam: Estão
manchados o profeta e o sacerdote, e eu encontrei na minha casa a iniqüidade
deles, diz o Senhor.
Por
isso o seu caminho será como um atalho escorregadio e coberto de trevas; hão de
impeli-los e cairão. Que esperança de vida poderíeis dar a quem caminhasse à
borda dum precipício, em terreno escorregadio e às escuras, sem ver onde punha
os pés, e ao mesmo tempo impelido fortemente para o abismo por seus inimigos?
Tal é o estado desgraçado a que se encontra reduzido o padre que comete um
pecado mortal.
Lubricum in
tenebris. Pecando, o padre perde a luz e cai nas trevas. Mais lhes valera,
assegura S. Pedro, não ter conhecido o caminho da justiça, do que voltar atrás
depois de o haver conhecido. Ó, sem dúvida, mais valia para um padre que peca
ser antes um camponês ignorante, que nunca tivesse estudado coisa alguma;
porque depois de tantos conhecimentos adquiridos, — pelos livros que leu, pelos
oradores sagrados que ouviu, pelos diretores que teve — depois de tantas luzes
recebidas de Deus, o desgraçado calca aos pés todas as graças, pecando, e
merece que as luzes recebidas só sirvam para o tornar mais cego e impenitente.
A maior ciência, diz S. Crisóstomo, dá lugar a mais severo castigo; se o pastor
cometer os mesmos pecados que as suas ovelhas, não receberá o mesmo castigo,
mas uma pena muito mais dura. Um padre cometerá o mesmo pecado que os
seculares; mas sofrerá um castigo muito maior, permanecerá mais profundamente
cego que todos os outros; será punido conforme o anúncio do Profeta: Que vendo
não o vejam, e ouvindo não compreendam!
É
o que a experiência deixa ver, diz o autor da Obra imperfeita: Um secular,
depois de pecar, facilmente se arrepende. Se assiste a uma missão, se ouve um
sermão enérgico sobre alguma verdade eterna, — malícia do pecado, certeza da
morte, rigor do juízo de Deus, penas do inferno, entra facilmente em si e
volta-se para Deus; porque estas verdades, como coisas novas, tocam-no e
penetram-no de temor. Mas quando um padre há calcado aos pés a graça de Deus,
com todas as luzes e conhecimentos recebidos, — que impressão podem fazer ainda
nele as verdades eternas e as ameaças das divinas Escrituras? Tudo quanto
encerra a Escritura, continua o mesmo autor, é para ele uma coisa sediça de
pouco valor; porque as coisas mais terríveis que lá se encontram, por muito
lidas, já lhe não fazem impressão.
Donde
conclui que nada mais impossível que a emenda de quem sabe tudo e peca.
Quanto
maior é a dignidade dos padres, diz S. Jerônimo, tanto maior é a sua ruína, se
num tal estado chegam a abandonar a Deus. Quanto mais alto é o posto em que
Deus os colocou, diz S. Bernardo, tanto mais funesta será a sua queda. Quando
se cai em plano, diz Sto Ambrósio, raro se experimenta grande mal; mas cair de
alto não é só cair, é precipitar-se, e a queda será mortal.
Nós
os padres regozijamo-nos, diz S. Jerônimo, por nos vermos erguidos a tão alta
dignidade; mas seja igual o nosso temor de cair. Parece que é aos padres que
Deus fala, quando diz pela boca de Ezequiel: Coloquei-vos sobre o monte santo
de Deus… e vós pecastes; e eu vos expulsei do monte de Deus, e vos entreguei à
ruína. Vós que sois padres, diz o Senhor, eu vos estabeleci sobre a montanha
santa, para serdes os faróis do universo: Sois vós a luz do mundo. Uma cidade
assente no cimo duma montanha não pode estar escondida.
Tem
pois razão S. Lourenço Justiniano em dizer que quanto maior é graça concedida
por Deus aos padres, tanto mais digno de castigo é o seu pecado, e quanto mais
alto o seu estado, mais mortal a sua queda. Quem cai num rio, diz Pedro de
Blois, mergulha tanto mais fundo, quanto de mais alto tiver caído.
Compreende
bem, ó padre: Deus, elevando-te ao sacerdócio, ergueu-te até ao Céu, e fez de
ti, não mais um homem da terra, mas um homem celeste, pensa pois quanto te será
funesta uma queda, segundo o aviso de S. Pedro Crisólogo. A tua queda, diz S.
Bernardo, será semelhante à do raio que se precipita com impetuosidade. Quer
dizer que a tua perda será irreparável. Assim, ó desgraçado, cairá sobre ti a
ameaça que o Senhor lançou sobre Cafarnaum: E tu, ó Cafarnaum, erguida até ao
Céu, serás abatida até ao inferno.
Um
padre que peca merece tal castigo, por causa da sua ingratidão para com Deus, a
quem deve um reconhecimento tanto maior quanto recebeu dele os maiores
benefícios, como nota S. Gregório. Merece o ingrato ser privado de todos os
bens que recebera, como observa um sábio autor. Jesus Cristo disse: Ao que já
possui, dar-se-á, e ele estará na abundância; mas o que nada possui, ver-se-á
despojado até do que parecia ter. Quem é grato para com Deus obterá maior
abundância de graças; mas um padre que, depois de tantas luzes, depois de
tantas comunhões, volta as costas a Deus, e desprezando todos os favores
recebidos, renuncia à sua graça, — este padre será com justiça privado de tudo.
É o Senhor liberal com todas as suas criaturas, mas nunca com os ingratos. A
ingratidão, diz S. Bernardo, faz estancar a fonte da bondade divina.
Por
isso S. Jerônimo pôde dizer: Nenhuma besta há no mundo mais feroz que um mau
padre, porque esse não se quer deixar corrigir. E o autor da Obra imperfeita:
Os leigos facilmente se emendam, mas um mau eclesiástico é incorrigível.
Segundo S. Damião, é de preferência aos padres pecadores que se aplicam estas
palavras do Apóstolo: Porque os que foram alumiados, os que saborearam o dom
celeste, e receberam o Espírito Santo… depois caíram, é impossível que se
renovem pela penitência. Com efeito, quem mais que o padre recebeu de Deus
graças abundantes? Quem mais do que ele gozou dos favores do Céu e participou
dos dons do Espírito Santo? Segundo Sto. Tomás, permaneceram obstinados no
pecado os anjos rebeldes, porque pecaram em face da luz; é assim, escreve S.
Bernardo, que o padre será tratado por Deus: tornado anjo do Senhor, ou há de
ser eleito como anjo, ou réprobo como o anjo. Eis o que o Senhor revelou a Sta.
Brígida: Olho os pagãos e os judeus, mas não vejo ninguém pior que os padres: o
seu pecado é como o que precipitou Lúcifer. E notemos aqui o que diz Inocêncio
III: Muitas coisas que nos leigos são pecados veniais, nos eclesiásticos são
mortais.
É
ainda aos padres que se aplicam estas palavras de S. Paulo: Uma terra, que,
depois de muito regada pelas chuvas, só produz espinhos e silvas, está
reprovada e sujeita a maldição: acabará por ser entregue ao fogo. Que chuva de
graças não recebe de Deus continuamente o padre? E contudo, em vez de frutos,
só produz silvas e espinhos: Desgraçado! Está prestes a ser reprovado e a
receber a maldição final, para ir, depois de tantas graças, que Deus lhe
prodigalizou, arder no fogo do inferno! — Mas, que temor pode ter ainda do fogo
do inferno um padre, que voltou as costas a Deus? Os padres que pecam perdem a
luz, como levamos dito, e perdem também o temor de Deus. É o Senhor quem no-lo
declara: Se eu sou o Senhor, onde está o meu temor, vos diz o Senhor, a vós, ó
padres, que desprezais o meu nome?. Segundo S. Bernardo, os sacerdotes, caindo
da altura a que se acham elevados, de tal modo se afundam na malícia, que
perdem a lembrança de Deus, e tornam-se surdos a todas as ameaças da justiça
divina, a tal ponto que nem o perigo da sua condenação os espanta.
Mas
que haverá nisso de admirável? O padre, pecando, cai no fundo do abismo, onde
fica privada da luz e despreza tudo. Acontece então o que diz o Sábio: Caído no
fundo do abismo do pecado, o ímpio despreza. Este ímpio é o padre que peca por
malícia; um só pecado mortal o precipita no fundo das misérias, em que
cegamente permanece mergulhado. Nesse estado despreza tudo: castigos,
advertências, presença de Jesus Cristo, a quem toca no altar. Não córa de se
tornar pior que o traidor Judas, como o próprio Senhor um dia disse a Sta.
Brígida: Tais padres já não são sacerdotes meus, mas verdadeiros traidores.
Sim, tais padres são verdadeiros traidores, porque abusam da celebração da
Missa, para ultrajarem mais cruelmente a Jesus Cristo pelo sacrílego!
E
qual será, depois de tudo, o triste fim do padre mau? Ei-lo: Praticou a
iniqüidade na terra dos santos, não verá a glória do Senhor. Será, numa
palavra, o abandono de Deus, e depois o inferno. — Mas, dirá alguém, essa
linguagem é demasiado aterradora: quereis lançar-nos da desesperação? —
Respondo com Sto. Agostinho: Se vos espanto, “é que eu próprio estou
espantado”. — Assim, dirá um padre, que tiver tido a desgraça de ofender a Deus
no sacerdócio, não haverá para mim esperança de perdão? — Ó, não posso afirmar
isso; haverá esperanças, desde que haja arrependimento do mal cometido. Que
esse padre seja pois extremamente reconhecido para com o Senhor, se ainda se vê
ajudado da graça; mas é preciso que se apresse a dar-se a Deus, enquanto o
chama, conforme o aviso de Sto. Agostinho: “Abramos os ouvidos à voz de Deus,
enquanto nos chama, com receio de que se recuse a ouvir-nos, quando estiver
prestes a julgar-nos”.
Fonte:
A Selva – Sto Afonso de Ligório – págs: 18-19
Que dizer então daqueles padres e bispos que,premeditadamente,calculadamente,publicamente, lançaram, ou pretenderam lançar Nosso Senhor Jesus Cristo à sentina da História, coisa que nem Judas logrou fazer, porque não operou sobre vinte séculos de Doutrina e Santidade Sobrenatural?
ResponderExcluirAlberto Carlos Rosa Ferreira das Neves Cabral - Lisboa