Em nome
do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
“Sabemos
que todas as criaturas gemem e estão como que em dores de parto.”
Caros
católicos, temos, na Missa de hoje, esse trecho da Epístola de São Paulo aos
Romanos que nos fala dos gemidos e da ânsia das criaturas para se libertarem da
sujeição da corrupção, e que poderíamos chamar de ecologia católica. Uma
leitura apressada poderia nos fazer crer que São Paulo é um ecologista ou
ambientalista de nossos tempos, preocupado com a natureza que sofre diante da
perspectiva de
esgotar-se, mal tratada pelo homem que se utiliza dela.
Poderíamos pensar que o Apóstolo São Paulo é daqueles que, não contentes de
estabelecer a oposição violenta da luta de classes entre ricos e pobres
(marxismo ordinário), entre homem e mulher (feminismo), entre superiores e
inferiores (entre pais e filhos, entre professores e alunos, etc.) estabelecem
também uma oposição violenta entre o homem e o resto da criação, como faz o
ecologismo ou ambientalismo de nossos dias.
Ora, é
claro que não deve existir oposição entre ricos e pobres, mas cooperação, cada
membro do corpo da sociedade exercendo a função que lhe cabe para o bem do
corpo inteiro. Não deve existir oposição entre homem e mulher, mas
complementaridade, cada um praticando bem o seu papel na família e na
sociedade, conforme a especificidade dada por Deus a cada um dos sexos. Também
é evidente que não deve haver oposição entre pais e filhos, superiores e
inferiores. Os superiores devem governar para o bem dos inferiores, para o bem
comum e os inferiores devem obedecer. Da mesma forma, não há oposição entre o
homem e o resto da natureza. Para entendermos bem essa frase de São Paulo – “sabemos
que todas as criaturas gemem como que em dores de parto” – para entendermos
o que é esse sofrimento das criaturas de que fala São Paulo, precisamos
compreender primeiramente o que é sofrer.
Se a
felicidade consiste em possuir um verdadeiro bem que desejamos, a tristeza ou o
sofrimento consiste justamente na privação desse bem desejado, ou no fato de
que o bem possuído é atacado. Por exemplo, aquele que deseja a salvação das
almas se alegra ao ver a conversão das almas, mas sofre ao ver que as almas
pecam ou que elas são atacadas pelos mais diversos inimigos. São Paulo diz que
as criaturas sofrem, gemem. Isso significa que elas estão sendo privadas do bem
delas. Ora, o bem de cada coisa é alcançar a sua finalidade e também tudo o que
pode levar a essa finalidade. Assim, o bem do homem é alcançar a vida eterna,
pois foi para isso que fomos criados, e é bom para nós tudo o que pode nos
ajudar a alcançar essa vida eterna. Como sabemos, Deus criou todas as coisas
para que as perfeições divinas fossem manifestadas pelas criaturas. A
finalidade das criaturas é dar glória a Deus, manifestando, por suas perfeições
limitadas, a perfeição infinita de Deus. A finalidade das criaturas irracionais
é manifestar a perfeição infinita divina e levar os homens a reconhecerem e
louvarem a Deus e servir aos homens para que os homens sirvam melhor Deus. Como
cantamos no Sanctus: os céus e a terra estão cheios de sua glória.
O bem das criaturas irracionais é manifestar as perfeições divinas. O bem delas
consiste mais precisamente em servir ao homem para que, por meio delas, o homem
possa conhecer melhor as perfeições divinas e para que o homem as submeta, a
fim de poder servir melhor a Deus. Por exemplo, podemos dizer que a uva alcança
de modo sublime a sua finalidade e o seu bem quando ela é utilizada para a
fabricação do vinho que servirá para a Missa. Podemos dizer que a madeira ou a
pedra alcançam seu bem perfeitamente, quando nelas se realiza o santo
sacrifício do altar. Podemos dizer que a água alcança a sua finalidade ao matar
a sede do homem, ou como meio para assegurar a limpeza, etc… Portanto, o bem
das criaturas consiste em servir ao homem para que o homem possa servir melhor
a Deus. Uma árvore sozinha no meio do mato daria pouca glória a Deus. Uma
árvore que se torna conhecida do homem e que pela sua beleza leva o homem até
Deus, dá maior glória a Deus. Uma árvore que dá ao homem o alimento para que
ele tenha forças para praticar o bem dá grande glória a Deus. Uma árvore que
fornece a madeira para o altar dá uma glória sublime a Deus. Deus disse ao
criar o homem: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus,
sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que
se arrastem sobre a terra.” (Gênesis I, 26). Reinar é governar e
ordenar as criaturas irracionais em vista do nosso bem, que são nossas
necessidades e, sobretudo, a nossa salvação.
Tal
governo e ordem existiam perfeitamente quando Deus criou o homem. Quando Deus
criou o homem, ele criou o homem no que se chama estado de justiça original. No
estado de justiça original, o homem foi criado em estado de graça. Ao estado de
graça estavam vinculados outros quatro dons gratuitos, que também superam as
exigências da nossa natureza: 1) o dom da imortalidade (o homem não podia
morrer), 2) o dom da impassibilidade (o homem não podia sofrer, nem no corpo,
nem na alma), o 3) dom da ciência infusa (Deus deu a Adão toda a ciência
necessária para que ele pudesse governar bem os filhos e a natureza, sem
precisar aprender pela experiência, ao contrário de nós, que aprendemos aos
poucos e somos, no início de nossa existência, como uma tábua rasa). Falamos de
três dons. O quarto dom era o dom da integridade. Pelo dom da integridade, tudo
estava perfeitamente ordenado no homem, o inferior ao superior. Dessa forma, a
inteligência e a vontade estavam perfeitamente submetidas a Deus. As paixões,
os sentimentos, estavam perfeitamente submetidos à inteligência e à vontade.
Assim, Adão e Eva não desejavam comer mais do que o suficiente, não precisavam
de roupas, pois não tinham tentações contra a pureza, etc. Vale
lembrar que o pecado original não podia ser um pecado de concupiscência, mas
somente um pecado de orgulho, pois Adão e Eva, em virtude do dom de integridade
não podiam cometer pecados desse gênero. O pecado original foi um pecado de
orgulho, pelo desejo de ser como deuses, empregando outros meios do que os
meios dados por Deus. A inteligência e a vontade estavam submetidas a Deus. As
paixões e sentimentos à inteligência e à vontade. O corpo estava submetido à
alma. Os seres irracionais também estavam perfeitamente submetidos ao homem,
que só os utilizava bem, que reinava sobre eles, em conformidade com a lei
natural e com a lei divina. Mesmo os animais selvagens e ferozes eram submissos
ao homem, como animais domesticados. Portanto, nos estado de justiça original,
toda a criação estava perfeitamente submetida ao homem, que, por sua vez,
estava perfeitamente submetido a Deus. A criação cumpria a sua finalidade
perfeitamente: servir ao homem para que o homem servisse a Deus. O homem só
usava com virtude a criação, sempre tendo Deus por finalidade. Todavia, todos
esses dons dados por Deus estavam vinculados e eram dependentes do dom mais
importante, que era a graça santificante. Ao cometer o pecado original, Adão e
Eva perderam para si e para seus descendentes (todos os homens) não só a graça,
mas todos os outros quatro dons: perderam o dom da imortalidade, o dom da
impassibilidade, o dom da ciência, o dom da integridade. Depois do pecado, o
homem está sujeito à morte, à dor e aos sofrimentos. A inteligência e a vontade
se inclinam respectivamente para o erro e para o mal, as paixões tendem a se
revoltar contra a razão e a vontade, as criaturas só podem ser dominadas com
esforço. Depois do pecado original, podemos, pela bondade divina, recuperar a
graça, mas não temos os outros dons e não temos direito a eles, pois haviam
sido dados gratuitamente por Deus. Depois do pecado original, perdido o dom de
integridade, o homem começa a usar – muitas vezes – mal as criaturas, que foram
colocadas sob o seu domínio. Em vez de usá-las para a glória de Deus,
utiliza-as para ofendê-lo, para cometer pecados e facilitar os pecados.
Caros
católicos, quando São Paulo diz que a criação geme e está sujeita à corrupção,
é no sentido de que ela é desviada do fim para que foi criada, no sentido de
que ela é desviada pelo homem do bem dela, que é justamente servir ao homem
para que ele sirva a Deus. São Paulo não quer dizer em nenhum momento que a
natureza é uma entidade dotada de personalidade, ou que a natureza se confunde
com a divindade, ou que nós formamos junto com a natureza um todo divino e
vital. Muito se diz atualmente que devemos buscar a harmonia com a natureza.
Devemos estar plenamente de acordo com isso, pois harmonia quer dizer ordem e a
ordem natural significa sujeição do inferior ao superior. O solo é usado pelas
plantas, para a nutrição delas. As plantas pelos animais. As plantas e os
animais pelo homem. É, portanto, natural que o homem domine sobre as criaturas
irracionais. E, por isso, o Filósofo – Aristóteles – diz que a caça de animais
é justa e natural, pois pela caça o homem simplesmente reivindica o que lhe
pertence naturalmente: o animal para a sua alimentação. A harmonia com a
natureza quer dizer, então, que o homem deve dominá-la e usá-la para o seu bem,
em última instância usá-la para servir melhor a Deus. Portanto, o ecologismo ou
o ambientalismo, que eleva a natureza ao grau de divindade ou que prefere
preservar a natureza a preservar o homem – ao ponto de ser melhor abortar do
que ter mais um ser humano na terra, que irá comer plantas e carne de animais –
é uma grande desarmonia e falta de sintonia com a natureza. Respeitar a
natureza, como se ela contivesse uma partícula da divindade ou como se fosse o
próprio Deus, respeitá-la como se ela estivesse acima do homem, respeitá-la
como se ela fosse a nossa mãe – a “mãe natureza” – ou virar vegetariano por
respeito aos animais e à natureza é violar a ordem estabelecida por Deus e é
desviar as criaturas irracionais da sua finalidade: servir o homem para que ele
possa servir melhor a Deus. Os católicos podem deixar de comer carne, claro,
mas é por penitência e não por respeito aos animais.
Sem
dúvida, é preciso dominar e usar das criaturas racionais com prudência, mas não
em virtude delas mesmas, e, sim, em razão de nosso bem e do bem de nossos
descendentes. Assim, por exemplo, pode ser melhor preservar uma determinada
área florestal ou determinada espécie de animal, não por simples respeitou e
devoção a eles, mas para que pela contemplação dessas coisas possamos chegar
até o autor delas, que é a Santíssima Trindade. Em todo, caso, não devemos nos
preocupar demasiadamente com isso: “buscai primeiro o reino de Deus e tudo o
mais vos será acrescentado”. Quantas vezes falsos profetas avisaram da
escassez de alimentos e de recursos, caso a população humana continuasse
crescendo, e com isso justificaram a contracepção, a destruição da família?
Jamais faltou alimento e jamais faltará, por mais que a população cresça. Se
Deus alimenta até mesmo as aves do céu, quanto mais os homens que buscam viver
segundo a sua lei? Além disso, Deus deu ao homem a inteligência, capaz de
encontrar soluções impressionantes.
Portanto,
caros católicos, a natureza geme, em sentido figurado, porque a utilizamos mal
e não porque ela sofre como um ser vivo, ou porque ela é desrespeitada, ou
porque ela tem os mesmos direitos que nós. Não, ela sofre porque é usada contra
a finalidade para a qual foi criada, que é dar maior glória a Deus, sendo
utilizada retamente pelo homem. Devemos, então, caros católicos, utilizar as
criaturas irracionais para o nosso bem, para o bem do próximo e para a maior
glória de Deus, para que Ele seja mais conhecido e melhor servido.
Em nome
do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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