Capítulo Why
I am a Catholic, disponível na obra Twelve
Modern Apostles and Their Creeds (1926)
Traduzido
por Antonio Emilio Angueth de Araujo
A
dificuldade em explicar “Por que eu sou Católico” é que há dez
mil razões para isso, todas se resumindo a uma única: o catolicismo
é verdadeiro. Eu poderia preencher todo o meu espaço com sentenças
separadas, todas começando com as palavras, “É a única coisa que
...” Como, por exemplo, (1) É a única coisa que previne um pecado
de se tornar um segredo. (2) É a única coisa em que o superior não
pode ser superior; no sentido da arrogância e do desdém. (3) É a
única coisa que liberta o homem da escravidão degradante de ser
sempre criança. (4) É a única coisa que fala como se fosse a
verdade; como se
fosse um mensageiro real se recusando a alterar a
verdadeira mensagem. (5) É o único tipo de cristianismo que
realmente contém todo tipo de homem; mesmo o respeitável. (6) É a
única grande tentativa de mudar o mundo desde dentro; usando a
vontade e não as leis; etc.
Ou
posso tratar o assunto de forma pessoal e descrever minha própria
conversão; acontece que tenho uma forte impressão de que esse
método faz a coisa parecer muito menor do que realmente é. Homens
muito melhores, em muito maior número, se converteram a religiões
muito piores. Preferiria tentar dizer, aqui, coisas a respeito da
Igreja Católica que não se podem dizer mesmo sobre suas mais
respeitáveis rivais. Em resumo, diria apenas que a Igreja Católica
é católica. Preferiria tentar sugerir que ela não é somente maior
que eu, mas maior que qualquer coisa no mundo; que ela é realmente
maior que o mundo. Mas, como neste pequeno espaço, disponho apenas
de uma pequena seção, abordarei sua função como guardiã da
verdade.
Outro
dia, um conhecido escritor, muito bem informado em outros assuntos,
disse que a Igreja Católica é uma eterna inimiga das novas idéias.
Provavelmente não ocorreu a ele que sua própria observação não é
exatamente uma nova idéia. É uma daquelas noções que os católicos
têm de refutar continuamente, porque é uma idéia muito antiga. Na
realidade, aqueles que reclamam que o catolicismo não diz nada novo,
raramente pensam que seja necessário dizer alguma coisa nova sobre o
catolicismo. De fato, o estudo real da História mostrará que isso é
curiosamente contrário aos fatos. Na medida em que as idéias são
realmente idéias, e na medida em que tais idéias são novas, os
católicos têm sofrido continuamente por apoiarem-nas quando elas
são realmente novas; quando elas eram muito novas para encontrar
alguém que as apoiasse. O católico foi não só o pioneiro na área,
mas o único; e até hoje não houve ninguém que compreendesse o que
se tinha descoberto lá.
Assim,
por exemplo, quase duzentos anos antes da Declaração de
Independência e da Revolução Francesa, numa era devotada ao
orgulho e ao louvor aos príncipes, o Cardeal Bellarmine e Suarez, o
Espanhol, formularam lucidamente toda a teoria da democracia real.
Mas naquela era do Direito Divino, eles somente produziram a
impressão de serem jesuítas sofisticados e sanguinários, se
insinuando com adagas para assassinarem os reis. Então, novamente,
os casuístas das escolas católicas disseram tudo o que pode ser
dito e que constam de nossas peças e romances atuais, duzentos anos
antes de eles serem escritos. Eles disseram que há sim problemas de
conduta moral, mas eles tiveram a infelicidade de dizê-lo muito
cedo, cedo de dois séculos. Num tempo de extraordinário fanatismo e
de uma vituperação livre e fácil, eles foram simplesmente chamados
de mentirosos e trapaceiros por terem sido psicólogos antes da
psicologia se tornar moda. Seria fácil dar inúmeros outros
exemplos, e citar o caso de idéias que são ainda muito novas para
serem compreendidas. Há passagens da Encíclica do Papa Leão sobre
o trabalho [conhecida como Rerum Novarum, publicada em 1891] que
somente agora estão começando a ser usadas como sugestões para
movimentos sociais muito mais novos do que o socialismo. E quando o
Sr. Belloc escreveu a respeito do Estado Servil, ele estava
apresentando uma teoria econômica tão original que quase ninguém
ainda percebeu do que se trata. E então, quando os católicos
apresentam objeções, seu protesto será facilmente explicado pelo
conhecido fato de que católicos nunca se preocupam com idéias
novas.
Contudo,
o homem que fez essa observação sobre os católicos quis dizer
algo; e é justo fazê-lo compreender muito mais claramente o que ele
próprio disse. O que ele quis dizer é que, no mundo moderno, a
Igreja Católica é, de fato, uma inimiga de muitas modas influentes;
muitas delas ainda se dizem novas, apesar de algumas delas começarem
a se tornar um pouco decadentes. Em outras palavras, na medida em que
diz que a Igreja freqüentemente ataca o que o mundo, em cada era,
apóia, ele está perfeitamente certo. A Igreja sempre se coloca
contra a moda passageira do mundo; e ela tem experiência suficiente
para saber quão rapidamente as modas passam. Mas para entender
exatamente o que está envolvido, é necessário tomarmos um ponto de
vista mais amplo e considerar a natureza última das idéias em
questão, considerar, por assim dizer, a idéia da idéia.
Nove
dentre dez do que chamamos novas idéias são simplesmente erros
antigos. A Igreja Católica tem como uma de suas principais funções
prevenir que os indivíduos comentam esses velhos erros; de
cometê-los repetidamente, como eles fariam se deixados livres. A
verdade sobre a atitude católica frente à heresia, ou como alguns
diriam, frente à liberdade, pode ser mais bem expressa utilizando-se
a metáfora de um mapa. A Igreja Católica possui uma espécie de
mapa da mente que parece um labirinto, mas que é, de fato, um guia
para o labirinto. Ele foi compilado a partir de um conhecimento que,
mesmo se considerado humano, não tem nenhum paralelo humano.
Não
há nenhum outro caso de uma instituição inteligente e contínua
que tenha pensado sobre o pensamento por dois mil anos. Sua
experiência cobre naturalmente quase todas as experiências; e
especialmente quase todos os erros. O resultado é um mapa no qual
todas as ruas sem saída e as estradas ruins estão claramente
marcadas, todos os caminhos que se mostraram sem valor pela melhor de
todas as evidências: a evidência daqueles que os percorreram.
Nesse
mapa da mente, os erros são marcados como exceções. A maior parte
dele consiste de playgrounds e alegres campos de caça, onde a mente
pode ter tanta liberdade quanto queira; sem se esquecer de inúmeros
campos de batalha intelectual em que a batalha está eternamente
aberta e indefinida. Mas o mapa definitivamente se responsabiliza por
fazer certas estradas se dirigirem ao nada ou à destruição, a um
muro ou ao precipício. Assim, ele evita que os homens percam
repetidamente seu tempo ou suas vidas em caminhos sabidamente fúteis
ou desastrosos, e que podem atrair viajantes novamente no futuro. A
Igreja se faz responsável por alertar seu povo contra eles; e disso
a questão real depende. Ela dogmaticamente defende a humanidade de
seus piores inimigos, daqueles grisalhos, horríveis e devoradores
monstros dos velhos erros. Agora, todas essas falsas questões têm
uma maneira de parecer novas em folha, especialmente para uma geração
nova em folha. Suas primeiras afirmações soam inofensivas e
plausíveis. Darei apenas dois exemplos. Soa inofensivo dizer, como
muitos dos modernos dizem: “As ações só são erradas se são más
para a sociedade.” Siga essa sugestão e, cedo ou tarde, você terá
a desumanidade de uma colméia ou de uma cidade pagã, o
estabelecimento da escravidão como o meio mais barato ou mais direto
de produção, a tortura dos escravos pois, afinal, o indivíduo não
é nada para o Estado, a declaração de que um homem inocente deve
morrer pelo povo, como fizeram os assassinos de Cristo. Então,
talvez, voltaremos às definições da Igreja Católica e
descobriremos que a Igreja, ao mesmo tempo que diz que é nossa
tarefa trabalhar para a sociedade, também diz outras coisas que
proíbem a injustiça individual. Ou novamente, soa muito piedoso
dizer, “Nosso conflito moral deve terminar com a vitória do
espiritual sobre o material.” Siga essa sugestão e você terminará
com a loucura dos maniqueus, dizendo que um suicídio é bom porque é
um sacrifício, que a perversão sexual é boa porque não produz
vida, que o demônio fez o sol e a lua porque eles são materiais.
Então, você pode começar a adivinhar a razão de o cristianismo
insistir que há espíritos maus e bons; e que a matéria também
pode ser sagrada, como na Encarnação ou na Missa, no sacramento do
casamento e na ressurreição da carne.
Não
há nenhuma outra mente institucional no mundo que está pronta a
evitar que as mentes errem. O policial chega tarde, quando ele tentar
evitar que os homens cometam erros. O médico chega tarde, pois ele
apenas chega para examinar o louco, não para aconselhar o homem são
a como não enlouquecer. E todas as outras seitas e escolas são
inadequadas a esse propósito. E isso não é porque elas possam não
conter uma verdade, mas precisamente porque cada uma delas contém
uma verdade; e estão contentes por conter uma verdade. Nenhuma delas
pretende conter a verdade. A Igreja não está simplesmente armada
contra as heresias do passado ou mesmo do presente, mas igualmente
contra aquelas do futuro, que podem estar em exata oposição com as
do presente. O catolicismo não é ritualismo; ele poderá estar
lutando, no futuro, contra algum tipo de exagero ritualístico
supersticioso e idólatra. O catolicismo não é ascetismo; ele,
repetidamente no passado, reprimiu os exageros fanáticos e cruéis
do ascetismo. O catolicismo não é mero misticismo; ele está agora
mesmo defendendo a razão humana contra o mero misticismo dos
pragmatistas. Assim, quando o mundo era puritano, no século XVII, a
Igreja era acusada de exagerar a caridade a ponto da sofisticação,
por fazer tudo fácil pela negligência confessional. Agora que o
mundo não é puritano mas pagão, é a Igreja que está protestando
contra a negligência da vestimenta e das maneiras pagãs. Ela está
fazendo o que os puritanos desejariam fazer, quando isso fosse
realmente desejável. Com toda a probabilidade, o melhor do
protestantismo somente sobreviverá no catolicismo; e, nesse sentido,
todos os católicos serão ainda puritanos quando todos os puritanos
forem pagãos.
Assim,
por exemplo, o catolicismo, num sentido pouco compreendido, fica fora
de uma briga como aquela do darwinismo em Dayton. Ele fica fora
porque permanece, em tudo, em torno dela, como uma casa que abarca
duas peças de mobília que não combinam. Não é nada sectário
dizer que ele está antes, depois e além de todas as coisas, em
todas as direções. Ele é imparcial na briga entre fundamentalistas
e a teoria da Origem das Espécies, porque ele se funda numa origem
anterior àquela Origem; porque ele é mais fundamental que o
Fundamentalismo. Ele sabe de onde veio a Bíblia. Ele também sabe
aonde vão as teorias da Evolução. Ele sabe que houve muitos outros
evangelhos além dos Quatro Evangelhos e que eles foram eliminados
somente pela autoridade da Igreja Católica. Ele sabe que há muitas
outras teorias da evolução além da de Darwin; e que a última será
muito provavelmente eliminada pela ciência mais recente. Ele não
aceita, convencionalmente, as conclusões da ciência, pela simples
razão de que a ciência ainda não chegou a uma conclusão. Concluir
é se calar; e o homem de ciência dificilmente se calará. Ele não
acredita, convencionalmente, no que a Bíblia diz, pela simples razão
de que a Bíblia não diz nada. Você não pode colocar um livro no
banco das testemunhas e perguntar o que ele quer dizer. A própria
controvérsia fundamentalista se destrói a si mesma. A Bíblia por
si mesma não pode ser a base do acordo quando ela é a causa do
desacordo; não pode ser a base comum dos cristãos quando alguns a
tomam alegoricamente e outros literalmente. O católico se refere a
algo que pode dizer alguma coisa, para a mente viva, consistente e
contínua da qual tenho falado; a mais alta consciência do homem
guiado por Deus.
Cresce
a cada momento, para nós, a necessidade moral por tal mente imortal.
Devemos ter alguma coisa que suportará os quatro cantos do mundo,
enquanto fazemos nossos experimentos sociais ou construímos nossas
Utopias. Por exemplo, devemos ter um acordo final, pelo menos em nome
do truísmo da irmandade dos homens, que resista a alguma reação da
brutalidade humana. Nada é mais provável, no momento presente, que
a corrupção do governo representativo solte os ricos de todas as
amarras e que eles pisoteiem todas as tradições com o mero orgulho
pagão. Devemos ter todos os truísmos, em todos os lugares,
reconhecidos como verdadeiros. Devemos evitar a mera reação e a
temerosa repetição de velhos erros. Devemos fazer o mundo
intelectual seguro para a democracia. Mas na condição da moderna
anarquia mental, nem um nem outro ideal está seguro. Tal como os
protestantes recorreram à Bíblia contra os padres e não perceberam
que a Bíblia também podia ser questionada, assim também os
republicanos recorreram ao povo contra os reis e não perceberam que
o povo também podia ser desafiado. Não há fim para a dissolução
das idéias, para a destruição de todos os testes da verdade,
situação tornada possível desde que os homens abandonaram a
tentativa de manter uma Verdade central e civilizada, de conter todas
as verdades e identificar e refutar todos os erros. Desde então,
cada grupo tem tomado uma verdade por vez e gastado tempo em torná-la
uma mentira. Não temos tido nada, exceto movimentos; ou em outras
palavras, monomanias. Mas a Igreja não é um movimento e sim um
lugar de encontro, um lugar de encontro para todas as verdades do
mundo.
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