Banhada pelas águas do lago Genezaré, cortada
pelas principais estradas do país, sede das casas comerciais as mais
importantes, era Cafarnaum, uma das cidades mais florescentes da
Palestina. No tempo de Jesus Cristo a Palestina era província romana, e
onerosos eram os impostos e direitos aduaneiros que pesavam sobre os judeus.
A cobrança destas contribuições obrigatórias, era feita geralmente por
rendeiros públicos, homens conhecidamente especuladores, verdadeiros
esfoladores e sanguessugas do povo, e por isto todos mal vistos e odiados. Já o
apelido de Publicano, isto é, pecador público, excomungado, que se lhes dava,
não deixava dúvida sobre a má fama de que tais homens gozavam.
Rendeiro de Cafarnaum era Levi, filho de Alfeu, que mais tarde
mudou o nome em Mateus, dom de Deus. Cafarnaum era a cidade pela qual Jesus
Cristo mostrava grande simpatia, tanto que os santos Evangelhos a chamam sua
cidade. Na sinagoga ou na praia do lago, doutrinou frequentemente e curou
muitos doentes.
Foi numa dessas ocasiões que Jesus, tendo pregado na praia, passou
perto do telonio de Levi, parou e disse a este: "Segue-me". Levi
levantou-se imediatamente, abandonou o rendoso negócio, mudou de nome e de
vida. Não é provável que esta mudança tão radical tenha sido fruto de um
entusiasmo espontâneo. É antes, de se supor, que Levi tenha tomado essa
resolução devido ao que vira e ouvira, de modo que o convite positivo do divino
Mestre lhe tenha posto termo às últimas dúvidas sobre a orientação da sua vida
futura. Diz São Jerônimo que Levi, vendo Nosso Senhor, ficou atraído pela
divina majestade que fulgurava nos olhos de Jesus Cristo. Converteu-se Levi,
diz Beda o Venerável, porque aquele que o chamou pela palavra, lhe dispôs
o coração pela graça divina.
Mateus deu em seguida um grande banquete de despedida aos amigos e
colegas, e convidou também Jesus e os discípulos. Os fariseus e escribas que,
com olhos de lince observavam todos os gestos do Mestre, vendo que este
aceitara o convite, acusaram-no dizendo: "Este homem anda com publicanos e
pecadores e banqueteia-se com eles!". Também os discípulos de Jesus
tiveram de ouvir repreensões: "Como é que o vosso Mestre se senta à mesa
com os pecadores?". Jesus, porém, respondeu-lhes: "Não
são os sãos, mas sim os doentes, que necessitam do médico. Não vim para chamar
os justos, senão os pecadores". Daí em diante Mateus foi um dos
discípulos mais dedicados ao divino Mestre, e seguiu-o por toda a parte.
Logo depois da Ascensão de Jesus Cristo e da vinda do Espírito
Santo, Mateus, junto com os outros Apóstolos, pregou o Santo Evangelho nas
províncias da Palestina e, com os demais Apóstolos, julgou-se feliz em poder
sofrer injúria por amor de Jesus. Foi São Mateus entre os Apóstolos o primeiro
que escreveu um relatório da vida e morte de Jesus Cristo, dando a este livro o
título de "Evangelho", que significa: "boa nova". Este
Evangelho era escrito em sírio-caldaico, para o uso dos primeiros cristãos da
Palestina. São Bartolomeu levou consigo uma cópia para as Índias.
Quando os Apóstolos se espalharam por todo o mundo, São Mateus
dirigiu-se para a Arábia e Pérsia, onde sofreu cruéis perseguições pelos
sacerdotes indígenas. São Clemente de Alexandria diz que São Mateus era homem
de mortificação e penitência, e alimentava-se só de ervas, raízes e frutas.
Sofreu maus tratos na cidade de Mirmene.
Os pagãos arrancaram-lhe os olhos e, preso com algemas, esperou no
cárcere o dia em que devia ser sacrificado aos deuses, por ocasião da grande
festa idólatra. Deus, porém, não abandonou seu servo; mandou-lhe um
Anjo que lhe curou a vista e o libertou da prisão. São Mateus seguiu então para
a Etiópia. Também lá o demônio quis tolher-lhe os passos. Dois
feiticeiros de grande fama opuseram-se-lhe, mas São Mateus venceu-os pela
força esmagadora dos argumentos e pelos milagres que fazia, em nome de Jesus
Cristo. Removido este obstáculo, o povo aceitou a religião de Deus
humanado.
Foi por intermédio do eunuco da rainha Candace, o mesmo a quem São
Felipe batizou, que São Mateus obteve entrada no palácio real. Lá havIa grande
luto pela morte do jovem príncipe herdeiro Eufranon. São Mateus, tendo
sido chamado ao palácio, fez o defunto ressurgir, milagre este que encheu a
todos de admiração. O rei, em sinal de alegria e gratidão, mandou arautos
por todo o país deitarem pregão da seguinte ordem: "Súditos! Vinde todos à
capital ver um Deus, que apareceu entre nós, em forma humana!".
Afluíram aos milhares os súditos de todas as partes do reino, trazendo
perfumes e incenso, para serem oferecidos ao Deus que tinha aparecido.
Mateus, porém, esclareceu-os dizendo: "Eu não sou Deus,
como julgais que seja, mas servo de Jesus Cristo, Filho de Deus vivo; foi
em seu nome que fiz o filho de vosso rei ressuscitar; foi Ele que me enviou a
vós, para vos pregar sua doutrina e vos trazer sua graça e salvação".
Essas palavras tiveram bom acolhimento e a maior parte do povo
converteu-se à religião de Jesus Cristo. A Igreja da Etiópia chegou a ser
uma das mais florescentes dos tempos apostólicos. O rei Egipo e família eram
cristãos fervorosíssimos, tanto que Efigênia, a filha mais velha, fez voto de
castidade perpétua e a seu exemplo, muitas filhas das famílias mais ilustres
consagraram-se a Deus, numa vida de perfeição cristã.
Pela morte do rei subiu ao trono seu sobrinho Hírtaco, o qual,
para estabelecer o governo sobre bases mais sólidas, pediu a Efigênia em
casamento. Esta recusou, alegando o voto feito a Deus. Hírtaco, não se
conformando com esta resposta, exigiu que São Mateus fizesse valer a autoridade
de Bispo, para que se realizasse o enlace desejado. São Mateus declarou ao
príncipe não ter competência Para envolver-se no caso.
Vendo-se assim, profundamente contrariado nos seus planos, Hírtaco
deu ordem aos soldados de fazer desaparecer o Apóstolo. Esta ordem foi
executada na igreja onde São Mateus celebrava a Missa. Pondo de lado o respeito
devido ao lugar e à pessoa do santo Apóstolo, os sicários do rei mataram-no no
próprio altar.
O corpo do Santo Mártir foi por muito tempo objeto de grata
veneração do povo cristão da capital. No ano de 930, foi transportado para
Salerno, na Itália, onde São Mateus até hoje é festejado como padroeiro da
cidade e do bispado. relíquias para a cidade.
REFLEXÕES
São Mateus, dos Apóstolos talvez o mais inteligente, o mais rico, antes
de sua vocação não era santo. Pelo contrário, das acusações que os judeus
levantavam contra Nosso Senhor, era esta uma das mais graves: "Ele come
com os pecadores", aludindo ao gabeleiro. No entanto a prontidão com que
seguiu o convite, a ordem do divino Mestre, não foi menor que a dos outros
Apóstolos, que apenas deixaram umas redes velhas, quando a resolução de Mateus
exigiu o sacrifício dum bom emprego, de uma avultada fortuna. A São Mateus
devemos o belíssimo Evangelho, que tantos e tantos episódios da vida de Jesus
Cristo nos relata. A São Mateus é devida a transmissão dos mais belos discursos
do divino Mestre. São Mateus, de publicano e de Pecador, tornou-se grande
amigo, Apóstolo do Salvador, e glorioso é o trono que possui no reino de Deus.
Estes traços da vida de São Mateus são muito de molde a animar os pobres
pecadores que, conscientes de sua miséria, facilmente se entregam ao desânimo,
senão ao desespero. Deus não quer a perdição de ninguém. Também o pecador mais
monstruoso tem acesso ao trono da misericórdia divina, desde que se resolva a
quebrar as cadeias do pecado, a fazer penitência e a entregar-se a Deus. Se é
grande a maldade dos homens, maior é a Misericórdia divina, que acolhe
benignamente a todos que se lhe dirigem, tendo o coração contrito e
humilhado.
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* Referências:
Biografia e Reflexões - Na luz Perpétua, 5ª.
ed., Pe. João Batista Lehmann, Editora Lar Católico - Juiz de Fora -
Minas Gerais, 1959.
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