“Nos últimos anos temos observado
como doutrinas têm sido insinuadas no Magistério, doutrinas que não constituem
nem um esclarecimento nem uma compreensão mais profunda da Fé, mas novas
doutrinas: heréticas em seu caráter, de fato ou tendencialmente, de acordo com
a agenda mortal do Modernismo. Essas doutrinas formam, em todo o seu
conjunto, uma nova religião”
Agora, o conteúdo da fé é
imutável e infalível e, como o próprio Concílio Vaticano I ensina, só pode
desenvolver-se através dos séculos através da clareza e a profundidade de sua
expressão. Nos últimos anos, no entanto, temos observado como doutrinas têm
sido insinuadas no Magistério, doutrinas que não constituem nem um
esclarecimento nem uma compreensão mais profunda da Fé, mas novas doutrinas:
heréticas em seu caráter, de fato ou tendencialmente, de acordo com a agenda
mortal do Modernismo.
O que nós gostaríamos de
perguntar agora, no que diz respeito a essas doutrinas, é se elas representam
meras distorções ou falsificações dos respectivos artigos da Fé, ou se,
juntamente com o Novo Rito de Missa, os Novos Ritos de todos os Sacramentos, o
Novo Código de Direito Canônico, o Novo Catecismo, a Nova Evangelização, a nova
moralidade e espiritualidade vivida e pregada pelo clero, a nova e relaxada
disciplina da Igreja (nas regras das ordens religiosas e no vestuário do clero)
formam em todo o seu conjunto uma nova religião.
Em nossa discussão sobre o novo
ensino marital do Magistério da Igreja em nossa obra "A Família sob
Ataque", oferecemos uma resposta a esta pergunta em termos de Gnose. O
objetivo do presente ensaio é expor essa resposta com mais detalhes. O ensaio
se enquadra nas seguintes partes:
I Gnose no Início dos Tempos;
II Gnose na Cabala Pervertida;
III A Gnose como a Nova
Religião.
Postscript sobre a Gnose no Mundo de Hoje.
Quero agradecer a Francesca
Romana por sua bondade e esforços incansáveis na tradução deste ensaio.
I
GNOSE NO PRINCÍCIO DOS TEMPOS
O grande teólogo argentino, Dom
Julio Meinvielle, escreve: “através da história humana há apenas duas atitudes
fundamentais de pensamento e de vida: uma católica, que é a tradição recebida
de Deus por Adão, Moisés e Jesus Cristo… e a outra a gnóstica e cabalística,
que alimenta os erros de todos os povos na gentilidade e na apostasia,
primeiramente do Judaísmo e, depois, na do próprio Cristianismo”.
O primeiro desses grandes
sistemas de pensamento e de vida é a fé católica (incluindo a sua fase de
pré-cristã), e o segundo é a Gnose. O primeiro é a verdadeira fé e a verdadeira
religião. O segundo, na medida em que constitui um corpo coerente de doutrinas
e está generalizado, enquanto, sob uma análise completa é ateu e sua essência
antagônica à única religião verdadeira, podendo ser descrito como antirreligião
ou como a antirreligião por excelência.
Como poderíamos definir a
Gnose? A palavra “gnosis” vem do grego e significa “conhecimento”. Como veremos
adiante, este conhecimento é entendido como uma forma de conhecimento arcano
direcionado para a auto-deificação do homem.
A Gnose, eterna rival da fé
católica, é primeiramente manifestada entre os homens no acontecimento
conhecido como pecado original. Passemos, portanto, a meditar sobre este
acontecimento primordial no livro de Gênesis.
A serpente era o mais astuto de todos os animais
dos campos que o Senhor Deus tinha formado. Ela disse a mulher: É verdade que
Deus vos proibiu comer do fruto de toda árvore do jardim?” A mulher
respondeu-lhe: Podemos comer do fruto das árvores do jardim. Mas do fruto da
árvore que está no meio do jardim, Deus disse: Vós não comereis dele, nem o
tocareis, para que não morrais.” “Oh, não! – tornou a serpente – vós não
morrereis! Mas Deus bem sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se
abrirão, e sereis como deuses, conhecedores do bem e do mal.” A mulher, vendo
que o fruto da árvore era bom para comer, de agradável aspecto e mui apropriado
para abrir a inteligência, tomou dele, comeu, e o apresentou também ao seu
marido, que comeu igualmente. Então os seus olhos abriram-se; e, vendo que
estavam nus, tomaram folhas de figueira, ligaram-nas e fizeram cinturas para
si.
O acontecimento descrito aqui,
o pecado original, sempre foi compreendido e ensinado pela Santa Madre Igreja
como um fato real do primeiro casal humano, Adão e Eva. Foi um pecado de
orgulho e desobediência a Deus, causado pela sedução do demônio em forma de
serpente: uma ação que ao ser realizada pelos representantes de toda a
humanidade não só causou um dano a eles, mas para toda a humanidade. Este
acontecimento é, ao mesmo tempo, o paradigma da Gnose.
Em primeiro lugar, observamos
que a Gnose é baseada na negação da revelação divina, em negar a palavra de
Deus, ou seja, que a morte é uma consequência de comer o fruto proibido. Por
esta razão, pode ser descrita como herética, ainda que não seja herética no
sentido formal típico de negar um dogma de fé.
Passemos a examinar o sistema
da Gnose à luz da fé católica: primeiro em sua teologia, em seguida, no
conhecimento que pretende oferecer ao homem, e, finalmente, em sua moralidade.
1) Teologia Gnóstica
A principal característica da
teologia gnóstica é o monismo. A razão disso é simples: se o homem pode
tornar-se Deus por seus próprios esforços, ele deve compartilhar a natureza de
Deus, o homem e Deus devem ter a mesma natureza, diferindo apenas em grau e
perfeição dessa natureza.
A teologia gnóstica é monista;
a teologia católica, ao contrário, é dualista, ao ensinar que o homem e Deus
possuem duas naturezas diferentes: a natureza humana e a natureza divina. Estas
duas naturezas não se diferem somente ou essencialmente em grau de perfeição,
mas em sua diversidade ontológica.
Também observamos que a
principal característica da Gnose, o monismo, inclui uma outra característica —
a imanência — porque, se o homem e Deus possuem a mesma natureza, se não se
diferem em suas naturezas, Deus deve ser imanente ao homem.
Em vez disso, a filosofia e a
teologia católicas ensinam que Deus é transcendente ao homem, e na verdade a
todo o universo: a filosofia ensina que Ele está completamente acima e além do
universo: é absolutamente independente dele; a teologia ensina o mesmo com base
no dogma professado no Credo, que Deus é Criador e Juiz do mundo: Ele, quem
criou o mundo através de um ato de vontade completamente livre e é Mestre e
Juiz ao mesmo tempo, é necessariamente independente dele.
Outra característica da
teologia gnóstica é a mutabilidade de Deus. De acordo com a Gnose, o homem se
faz Deus, por isso, em certo sentido, o próprio Deus está em processo de ser, o
que significa que há certo movimento e mutabilidade em Deus.
Em contrapartida, a teologia
católica e a filosofia ensinam que em Deus não há nem mutabilidade, nem
movimento, nem mudança, uma vez que Deus é o próprio ser, a totalidade do ser,
ação pura em quem tudo se atualiza.
Portanto, em conclusão, vemos
três erros na teologia gnóstica como já expressa no livro de Gênesis, o monismo
em oposição ao dualismo: a imanência absoluta em oposição à transcendência; a
mutabilidade em oposição à imutabilidade de Deus, ação pura.
Quanto ao segundo ponto,
observamos que a doutrina da imanência absoluta de Deus não tem suporte lógico.
É porque o conceito de Deus aprofundado pela reflexão teológica é o conceito de
um Ser necessariamente transcendente ao mundo. Se negamos a transcendência de
Deus postulando que Ele só é imanente ao mundo, estamos efetivamente negando a
Sua própria existência. O mesmo se aplica aos outros erros teológicos da Gnose:
o monismo entre Deus e o homem e a mutabilidade de Deus.
2) Conhecimento Gnóstico
Quanto ao tipo de conhecimento
pelo qual a Gnose diz deificar o homem, podemos fazer as seguintes afirmações:
I-) O conhecimento de que a
passagem do Gênesis se refere é de dois tipos: o primeiro tipo é o conhecimento
de como ser deificado, ou seja, o conhecimento de um meio para um fim: é o
conhecimento de uma determinada prática; o Segundo tipo de conhecimento é o fim
proposto a Adão e Eva: isto é, o Conhecimento do Bem e do Mal;
II-) O conhecimento é puramente
natural (em ambos os casos);
III-) Está desconectado da
vontade: não se dirige ao exercício da vontade nem a nenhuma ação;
IV-) É buscado para o prazer,
prazer sensual, acima de tudo: “o fruto da árvore era bom para comer, de
agradável aspecto e mui apropriado para abrir a inteligência”.
V-) É Arcano: não disponível
para todos, mas oculto, certamente intencionalmente escondido por Deus, dizem
eles, por razões inquestionáveis.
Comparemos este conhecimento
oferecido da parte do demônio a nossos primeiros pais, com o conhecimento de
Deus oferecido ao homem pela religião católica.
I-) O conhecimento de Deus
oferecido ao homem pela religião católica é também de dois tipos: o primeiro
tipo é a própria fé, que é um meio para alcançar o objetivo final do homem que
é o céu; o segundo é a visão beatífica que constitui esse objetivo final. Em
ambos os casos, o conhecimento de Deus é o conhecimento da Santíssima Trindade,
um conhecimento que é infinitamente superior ao oferecido a Adão e Eva.
II-) Este conhecimento é um
conhecimento sobrenatural: uma iluminação do intelecto através da Graça e a
Glória, respectivamente; enquanto, como já dissemos, o conhecimento oferecido a
Adão e Eva é de ordem puramente natural;
III) Além disso, o conhecimento
de Deus é direcionado para o exercício da vontade na caridade: realizar toda
ação e dirigir toda a vida por amor a Deus durante este exílio terrestre, e,
finalmente, descansar e desfrutar de Deus no céu;
IV-) O prazer não é a razão
para a busca do conhecimento, mas a consequência de agir segundo este
conhecimento levando uma vida virtuosa;
V-) Finalmente, o conhecimento
de Deus nesta vida, que é a fé, não é arcano nem está escondido por Deus, mas
revelado ao homem com o mandato de proclamá-lo a todo o mundo
Portanto, em conclusão, vemos
que o conhecimento gnóstico não é nada mais do que uma sombra tênue, um
substituto enganoso, do verdadeiro conhecimento de Deus: seu objeto não é a
Santíssima Trindade, sua forma não é sobrenatural; está apartado das boas
obras, é buscado por prazer, e falsamente apresentado como o Verdadeiro Deus.
3) Moral Gnóstica
Finalmente, examinemos a moral
gnóstica, tal como se manifesta na passagem do Gênesis, em comparação com a
teologia moral católica.
I-) Definimos a Gnose como um
sistema de auto-deificação. Como tal, está em oposição ao cristianismo que
ensina que a deificação do homem procede somente de Deus;
II-) O primeiro tipo de
deificação consiste na transformação do homem em Deus perdendo a sua
identidade; o segundo tipo, na sua participação em Deus, mas mantendo a sua
identidade;
III) No primeiro tipo, o homem
se faz Deus: sem Deus, em lugar de Deus e apesar de Deus (São Máximo, o
Confessor, referindo-se ao pecado original); no segundo, o homem é deificado ao
humilhar-se diante de Deus;
IV-) O primeiro se consegue
através de esforços naturais; o segundo através da Graça sobrenatural de Deus;
V-) O primeiro é uma forma de
autodeterminação; o segundo é uma determinação efetuada por Deus;
VI-) O primeiro se origina no
conhecimento natural e, como todo conhecimento natural, é aprendido e dominado
pelo sujeito e absorvido no mesmo; o segundo tem origem no conhecimento
sobrenatural ao qual o objeto deve sujeitar-se, sacrificando seu intelecto ante
a Verdade Absoluta;
VII-) Como dissemos, o tipo de
conhecimento gnóstico está desconectado das boas obras; o tipo de conhecimento
católico está essencialmente dirigido para elas;
VIII-) O primeiro é motivado
pelo prazer; o segundo, pelo amor;
IX-) O primeiro é acessível
apenas para uma elite; o segundo, a todos os homens.
Em síntese, o primeiro se
caracteriza pelo orgulho e o egoísmo; o segundo pela humildade e o sacrifício.
Em suma, podemos dizer que a Gnose é o egoísmo elevado ao status de
religião
A Gnose permite ao homem ser
como Deus em um sentido, ou seja, no exercício de seu livre arbítrio para fazer
tudo o que deseja, mas a custo da bem-aventurança eterna. A fé católica, no
entanto, permite ao homem ser como Deus no exercício de seu livre arbítrio, em
harmonia com a ordem estabelecida por Deus: a ordem da Verdade e o Bem
objetivos, com o propósito de conhecer e amar a Deus aqui na terra e depois no
paraíso.
No jardim do Éden há duas
árvores: a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal e a Árvore da Vida. Para
comer da primeira é necessário o orgulho, para comer da segunda, o sacrifício.
O primeiro representa a Gnose, a eterna rival da fé católica; o segundo
representa a fé: dado que a segunda é a árvore da cruz, cujos frutos são graças
e bênçãos de Deus aqui na terra e alegrias eternas no céu. No entanto, é
necessário passar pelo sofrimento e o sacrifício para alcançar a posse deles,
tomando a cruz e carregando-a em seguimento de Nosso Senhor, a Ele toda
honra e glória para todo o sempre. Amém.
II – A GNOSE NA PERVERTIDA CABALA
Dissemos que a Gnose foi vista
pela primeira vez entre os homens no Pecado Original.
Antes de continuar, no entanto,
gostaríamos de observar que era manifesta mesmo antes, na queda dos anjos. Pois
desde que a essência de uma coisa é determinada por seu fim último, podemos
identificar a essência da Gnose como a tentativa por parte da criatura de
deificar-se a si mesma. Isto, no entanto, já havia ocorrido com a rebelião dos
anjos. Lúcifer e os outros anjos queriam tornar-se Deus, isto é, sem Deus: por
seus próprios esforços naturais. A consequência foi a sua queda e sua
transformação a partir de anjos em demônios.
‘Quis Ut Deus?' replicou São
Miguel Arcanjo, desde que ninguém, na verdade, é como Deus, mas esta foi
precisamente a afirmação de Lúcifer: ser como Deus, e é a mesma afirmação que
mais tarde propôs a Adão e Eva.
A Gnose volta, então, em sua
essência, aos primeiros momentos do universo, para o primeiro ato livre de
criaturas racionais. A partir daqui desenvolve-se no decorrer dos séculos,
assumindo proporções teológicas e morais cada vez mais amplas. Toma caminhos
diferentes de acordo com as religiões e as nações que ela visita: seja o
hinduísmo, budismo, judaísmo; seja a nação persa, a nação egípcia, e assim por
diante.
Vamos nos concentrar na
religião judaica, considerando, com Dom Julio Meinvielle, que esta é a forma
mais influente da Gnose no mundo moderno.
Agora, a Gnose judaica é uma
perversão da Cabala. A Cabala, antes de sua perversão, constituiu a tradição
oral do Antigo Testamento. A autêntica fé judaica, que se tornou a fé católica
com o Advento do Senhor, tinha uma dupla tradição: a tradição escrita e uma
tradição oral, precisamente como a fé católica.
A tradição oral, ou seja, a
Cabala primordial, ensinou aos homens as verdades fundamentais da natureza e da
graça necessária para a salvação; falou da natureza de Deus e de Seus
atributos, dos espíritos puros e o universo invisível; ainda continha
ensinamentos sobre a Santíssima Trindade e sobre a Encarnação de Nosso Senhor
antes de Sua vinda a este mundo.
Esta tradição sublime e
mística, no entanto, foi submetida a um processo de perversão sob a influência
da Gnose egípcia. A Gnose egípcia remonta a três mil anos antes da vinda do
Senhor, e daí, é claro, até o início dos tempos. A perversão ocorreu durante o
exílio do povo judeu no Egito, no século XIV antes de Cristo, e depois na
Babilônia, no século VI aC de uma forma ainda mais prejudicial.
Uma parte dessa influência
consistia em práticas mágicas, e uma parte em falsas doutrinas. As falsas
doutrinas eram negações da revelação divina, tal como contida na Fé Judaica
pré-Cristã, e podem assim, como observamos na primeira seção, ser consideradas
como heresias lato sensu. Esses erros insinuaram-se na tradição oral
judaica e representam um desenvolvimento das doutrinas gnósticas centrais.
As doutrinas que queremos
analisar agora são duas:
1) A transformação do homem em
Deus;
2) O Monismo entre Deus e o
homem.
Vamos olhar para estas duas
doutrinas em seus vários desenvolvimentos, primeiro, à luz da Fé, em seguida, à
luz da razão.
A. transformação do Homem em Deus
A doutrina da transformação do
homem em Deus é elaborada como um processo de evolução, e inclui os seguintes
elementos:
1) O Surgimento de Deus, o
Mundo e o Homem a partir do Nada
2) Reencarnação;
3) O Gradual Cumprimento e a
Realização de Deus e do Homem
1) O Surgimento de Deus, o
Mundo e o Homem a partir do Nada
A fé nos ensina que Deus existe
eternamente e não tem começo no tempo. Ensina-nos também que o mundo e o homem
não vieram à existência de si mesmos, mas que Deus criou e os fez a partir do
nada, ex nihilo: já não do nada como de uma substância pré-existente,
mas do nada no sentido de que não havia, de fato, nenhuma substância
pré-existente.
Além disso, a razão ensina que
nada pode advir do nada, como o nada, por definição, não existe.
2) Reencarnação
Na Carta aos Hebreus lemos
(9.27): “Está determinado que os homens morram uma só vez, e logo em seguida
vem o juízo”. A fé nos ensina, além disso, que a alma humana é capaz de um
desenvolvimento positivo, mas não por meio de reencarnações repetidas, mas pelo
trabalho de perfeição moral e santificação.
A razão ensina que a
reencarnação é impossível, pois cada alma humana é o princípio de seu próprio
corpo humano: a alma humana não pode animar um corpo não-humano, e não pode
animar um corpo humano que não o seu próprio.
3) O Cumprimento Gradual e
Realização de Deus e do Homem
A fé ensina que Deus é imutável
e não muda. São Tiago escreve (1. 16-17): “Não vos iludais, pois, irmãos meus
muito amados. Toda dádiva boa e todo dom perfeito vêm de cima: descem do Pai
das luzes, no qual não há mudança, nem mesmo aparência de instabilidade.”
A razão nos diz, além disso,
que Deus, como dissemos acima, é transcendente e imutável por definição. Se
algo muda no homem, ele não é Deus.
Nós adicionamos uma última
crítica lógica, que é válida para todas as três destas doutrinas
evolucionistas, ou seja: o maior não pode derivar do menor: a substância não
pode prosseguir a partir do nada; Deus não pode proceder do homem; a alma não
pode purificar-se por si só ao longo das vidas sucessivas.
B. Monismo
O Monismo entre Deus e o homem
é elaborado no sentido de três formas distintas de monismo:
1) Um Monismo ontológico entre
Deus e o universo, onde o universo é considerado, em certo sentido, como
divino: uma doutrina panteísta;
2) um Monismo moral, onde o bem
e o mal são considerados como partes integrantes de uma realidade maior, que
não permite que haja nenhum princípio verdadeiro de distinção entre eles. Este
monismo moral é considerado, em última análise, como o próprio Deus;
3) um Monismo lógico no qual
até mesmo a verdade e a falsidade são reconciliadas uma com a outra.
1) Monismo entre Deus e o
Universo (panteísmo).
Respondemos a esse erro como já
respondemos ao erro do Monismo entre Deus e o homem. A fé ensina que Deus é
Criador: Credo in unum Deum, creatorem coeli et terrae. Deus é,
portanto, inteiramente independente do universo, que Ele criou com um ato livre
da vontade. Ele não emana de acordo com sua natureza; Ele necessariamente não
veio à existência.
Além disso, a razão nos ensina
que o conceito de Deus é um conceito de um ser essencialmente transcendente.
2) Monismo Moral
O Monismo moral em vigor é
concebido como a tese de que o Bem e o Mal são uma única coisa e que o mal
existe em Deus.
A fé ensina-nos, pelo
contrário, que o bem e o mal são princípios distintos que se opõem um ao outro;
que, aderindo ao bem o homem é salvo, e aderindo ao mal ele é amaldiçoado.
A fé ensina igualmente que Deus
é infinitamente bom, o Pai das Luzes, para citar São Tiago mais uma vez (1.13):
“Ninguém, quando for tentado, diga: É Deus quem me tenta. Deus é inacessível ao
mal e não tenta a ninguém.”
A razão, de acordo com a
doutrina de São Tomás, ensina-nos que o bem e o mal não formam uma entidade
única, na medida em que o Bem é o próprio Ser, e o mal é a privação do Bem: ou
seja, a privação de um bem que é devido a ele. O mal não está em Deus, na
medida em que Deus é infinito e necessariamente Bom. Como já mencionamos as
outras perfeições de Deus, podemos então dizer o mesmo sobre a sua bondade: se
Ele não é bom, então Ele não é Deus.
3) Monismo Lógico
O Monismo lógico afirma que o
verdadeiro e o falso, também constituem uma realidade única. A Gnose detém, por
exemplo, em seu sincretismo, a sustentação de que todas as religiões e
filosofias são iguais.
A fé nos ensina, por outro
lado, que o Verdadeiro e o Falso são opostos, e o Senhor diz (Mt 5,37): ” Dizei
somente: Sim, se é sim; não, se é não. Tudo o que passa além disto vem do
Maligno”.
A razão afirma que o falso é
uma negação da verdade. Como diz Aristóteles, é impossível uma mesma coisa, ao
mesmo tempo e da mesma forma, ser verdadeira e falsa. Este é o princípio da
não-contradição, um dos primeiros princípios do pensamento e da metafísica. Se
renunciamos a esses primeiros princípios, renunciamos à própria
racionalidade e à possibilidade de compreender e explicar todas as coisas.
Dom Julio Meinvielle sustenta
que o absurdo do monismo lógico — que o Verdadeiro e o Falso formam uma única
realidade — é a consequência da absurda tese gnóstica de que o mundo, o homem,
e Deus surgem do nada.
Diríamos, antes, que
corresponde a todos os absurdos ensinados pela Gnose: o surgimento a partir do
nada, a reencarnação, o desenvolvimento de Deus no mundo, o Panteísmo, a
chamada reconciliação entre o bem e o mal. Em última análise, o monismo lógico
é um resultado da tese fundamental da Gnose: que o homem pode tornar-se Deus. A
irracionalidade desta tese resulta da rebelião da vontade contra a Verdade. A tese
é, na verdade, nada mais do que a expressão máxima dessa rebelião.
III
GNOSE COMO A NOVA RELIGIÃO
Se realmente estamos
confrontados com uma Nova Religião, a nossa próxima pergunta deve ser,
qual é a sua natureza? Antes de examiná-lo sob a obscura luz da Gnose, podemos
simplesmente perguntar se ela é uma nova forma de Protestantismo, Humanismo ou
Ateísmo. Certamente a Fé Católica, como se apresenta hoje, tem certa semelhança
com cada um desses sistemas. Mas essa semelhança, sugerimos, não deriva de um princípio
peculiar a qualquer um desses sistemas, mas, sim, de um princípio que todos
esses sistemas compartilham, a saber, o princípio do subjetivismo.
O subjetivismo, na opinião de
vários estudiosos modernos como Romano Amerio e Paul Hacker é, com efeito, o
princípio essencial da teologia de Martinho Lutero, assim como é igualmente do
Humanismo (anti-cristão) e do Ateísmo — sob a forma de antropocentrismo. E, no
entanto, devemos admitir que o princípio do subjetivismo é ainda mais
claramente marcado na Gnose do que nesses três sistemas: pois, como já
dissemos, a Gnose não é outra coisa senão o Egoísmo elevado ao status
de Religião.
Para que a Nova Religião se
qualifique como uma forma de Gnose, não deve somente ser claramente
caracterizada pelo subjetivismo, mas deve também compartilhar um número
suficiente das qualidades do último sistema que enumeramos acima. Olhando
atentamente para a Nova Religião à luz da Gnose, podemos ver que as qualidades
que ela compartilha com a Gnose são, antes de tudo, o princípio essencial desta
última que é a autodeificação do homem; a importância central dada ao
conhecimento e à sensualidade; ao triplo Monismo; e, finalmente, ao princípio
da Evolução.
Antes de tentar mostrar isso em
detalhes, fazemos a breve observação histórica de que a Cabala pervertida sofre
maior desenvolvimento no período posterior ao nascimento do Cristianismo e,
mais tarde, na Idade Média, culminando na obra de Mosè de Leon. Entra no mundo
cristão com Ramon Lull, o abade Joachim di Fiore e Pico della Mirandola; no
mundo moderno com Leibniz, Spinoza, Fichte, Schelling, Hegel e, finalmente, com
o jesuíta apóstata, Teilhard de Chardin.
1) A Autodeificação do Homem
Esta tese é manifesta na Nova
Religião, por exemplo, na declaração de que o homem é " única criatura
sobre a terra a ser querida por Deus por si mesma" (Gaudium et Spes,
uma declaração que o Cardeal Schoenborn descreve como a chave para a
compreensão do Novo Catecismo do qual foi redator-chefe); e aquele homem (pelo
menos no matrimônio) seja amado com um amor de "total doação de si" (Familiaris
Consortio). Salientamos que a autodeificação em questão não é mais
considerada como um processo a ser realizado, mas como um ato já realizado.
A Autodeificação do Homem, em
sua mais ampla extensão, pode ser descrita como Idolatria Antropocêntrica, ou
como a preocupação que tudo consome pelo bem-estar, prazer e sensibilidades do
homem. Constitui um novo e sufocante Humanismo, onde Deus é descartado e o
homem colocado em Seu lugar. Este novo Humanismo está realmente atingindo o status
de um genuíno dogma nas bocas do clero e até mesmo da Hierarquia; é expressa
nos abusos litúrgicos onde se celebram os Mistérios Sagrados (nas palavras do
Papa Bento XVI) "como se Deus não existisse".
2) Conhecimento
O tipo de conhecimento
oferecido pela Igreja contemporânea que lembra a Gnose é o conhecimento de Deus
pela experiência. A experiência pode assumir a forma de um encontro espiritual
com Nosso Senhor Jesus Cristo, como no movimento carismático, derivado da
tradição protestante e entusiasta. Alternativamente, pode assumir a forma de um
encontro sacramental com "O Senhor Ressuscitado", considerado como a
própria essência da Santa Missa.
Uma diferença entre este tipo
de conhecimento e o conhecimento gnóstico tradicional é que ele não é mais
arcano em seu caráter.
Um aspecto importante deste
conhecimento de Deus é prazer, ou alegria, lembrando a natureza prazerosa do
conhecimento gnóstico. Na verdade, o movimento carismático e a Igreja moderna
em geral (sob a influência deste movimento), colocaram ênfase considerável na
alegria. Na verdade, eles veem a vida cristã sob esta luz e acham difícil
suportá-la ou compreendê-la na ausência de alegria.
Esta alegria espiritual é
expressa em manifestações mais festivas da música moderna da Igreja, com seu
carregado conteúdo emocional, seu volume empolgante e melodias, em marcado
contraste com a solenidade e a sobriedade do canto gregoriano e do canto dos
antigos ritos orientais, e para a profundidade do antigo em sua alegria
espiritual, na ordem e harmonia que infunde nos sofrimentos do coração humano e
em sua nostalgia inefável para com a pátria Celestial.
3) Sensualidade
Voltemos a olhar para a frase
do Gênesis: "O fruto da árvore era bom para comer, de agradável aspecto e
mui apropriado para abrir a inteligência". A frase descreve os primeiros
movimentos da concupiscência por parte de Eva e refere-se não apenas ao
conhecimento prazeroso, mas também, e mais geralmente, ao prazer sensual. Além
disso, este encontro primordial entre a Mulher e o Diabo é tradicionalmente
tomado como um símbolo da impureza para a qual o encontro irá conduzir.
Sensualidade e impureza foram, com efeito, se tornando características típicas
da Gnose nos milênios a seguir.
Já observamos em nosso livro
"A Família Sob Ataque" uma mudança contemporânea na doutrina central
do amor da Igreja: do amor sobrenatural da Caridade ao amor natural dos
sentidos — para a afeição, a alegria, ao sentimentalismo e às sensibilidades.
Em relação à ética marital em particular, tentamos explicar — na última edição
(alemã) do livro — como o Magistério da Igreja apresenta, agora, a essência do
casamento como "amor sensual absolutizado".
Nos Sínodos dos Bispos sobre a
Família, membros significativos da Hierarquia estavam satisfeitos em aceitar a
coabitação extramarital e uniões antinaturais. Na subsequente encíclica papal Amoris
Laetitia, observamos, mesmo no título, uma preocupação com a alegria e, no
corpo do texto (§298 com a nota 329), um movimento para relaxar a absoluta
proibição e condenação do adultério de Nosso Senhor em favor do amor sensual.
Acompanhando de perto este documento, foram distribuídos panfletos repletos de
obscenidades e de satanismo na "Jornada Mundial da Juventude" na
Polônia, vindos da Pontifícia Comissão para a Família. Em suma, um espírito de
sensualidade entrou na mente dos modernos clérigos que lembravam os piores
excessos do catarismo.
4) O Triplo Monismo
1. a)
Monismo Ontológico
O Monismo ontológico em questão
aqui é a tese de que Deus e o homem compartilham a mesma natureza. Esta tese,
como mostramos acima, implica-se pela auto-deificação do homem por seus
próprios esforços. Observamos esta forma de monismo na Igreja de hoje no
silenciamento da doutrina da Graça, que é o único meio de unir os mundos
naturais e sobrenaturais. A graça não é mais mencionada, e a atenção é
enfocada, em vez disso, em um amor indefinido e vago como a chave para o Céu.
Um exemplo concreto é a
presunção de que Nosso Senhor Jesus Cristo se uniu a todos os homens através de
Sua Encarnação, entendida como um ato redentor. Outro exemplo é a presunção de
que existem meios de santificação fora da Santa Igreja Católica Romana.
b) Monismo Moral
O Monismo moral dentro da
Igreja hoje consiste na atitude de que qualquer tipo de ação seja moralmente
boa. A atitude manifesta-se no silenciamento da noção de pecado (sobretudo o
pecado mortal) e do inferno. Os fiéis já não são mais ensinados a confessar,
particularmente depois de cair em pecado mortal, nem de se abster de receber a
Sagrada Comunhão nesse estado. Um pecado normalmente passado em silêncio é o da
impureza[1]. Isso corresponde à predileção
gnóstica pela sensualidade e a libertinagem.
A mesma atitude (de que toda
ação é moralmente boa) manifesta-se na atitude relacionada de que todos os
homens serão salvos, uma vez que Deus é "Amor" ou infinitamente
misericordioso (com a exclusão de Sua infinita Santidade e Justiça).
c) Monismo Lógico
O Monismo lógico afirma que o
Verdadeiro e o Falso coexistem. Assumindo que as doutrinas Tradicionais são
verdadeiras e as Modernistas falsas, vemos que o Monismo Lógico obtém hoje no
seio da Santa Igreja Católica: um pároco professando doutrinas como o Inferno,
o Limbo, o Purgatório e outro que as nega; ou como vimos no Sínodo dos Bispos
sobre o Matrimônio, um Bispo sustentando doutrinas católicas sobre o casamento,
o adultério, o divórcio e a Santa Comunhão, e outro negando-as.
O monismo lógico não só se
obtém na Igreja hoje, mas é também a posição oficial da Hierarquia
contemporânea, que considera ambas as visões como válidas e ambas como
católicas. Alguns membros da Hierarquia realmente tentam harmonizar as visões
apresentando-as uma como a "continuação" da outra, mas é claro
que as posições são, na realidade, mutuamente exclusivas, e é claramente
impossível testemunhar a Verdade tornando-a Falsidade, independentemente de
quanto tempo alguém espere.
Monismo lógico implica desprezo
pela verdade objetiva. Este desprezo, no caso da Fé, é o desprezo, hoje em dia
comum, da Verdade sobrenatural, imutável, que é o Dogma.
Quanto ao Dogma, podemos
responder o seguinte:
i) Há uma realidade objetiva;
ii) Deus é essa realidade
objetiva em um sentido absoluto e definitivo;
iii) A fé é o conhecimento de
tal realidade;
iv) A fé não dá um conhecimento
perfeito de Deus, pois só Deus pode ter perfeito conhecimento de si mesmo;
v) A fé, no entanto, dá certo
conhecimento de Deus: mais seguro do que a evidência dos sentidos;
vi) A Igreja tem o mandato
divino de ensinar esta realidade, estas realidades, estas verdades, para a
salvação do homem: para a salvação de cada homem na terra;
vii) O exercício deste mandato
goza de infalibilidade;
viii) As verdades que a Igreja
ensina dessa maneira são infalíveis e são conhecidas como "Dogmas".
Aquele que nega um dogma coloca-se fora da Igreja e não é mais católico.
Evolução
O tipo de evolução gnóstica que
se encontra na Igreja de hoje se expressa na atitude de que as Verdades da Fé
podem mudar ao longo do tempo. Um exemplo é a atitude de que a Igreja era a
única Arca da Salvação no passado, mas agora já não é[2].
A maior parte da Hierarquia e do Clero, se eles não sustentam que as doutrinas
tradicionais e modernistas coexistem de alguma forma, parecem acreditar que as
Verdades da Fé são mutáveis, ou pelo menos atuam ou pregam é se fosse esse o
caso[3]. A maior parte da Hierarquia e do Clero, se eles não sustentam que a
doutrina tradicional e modernista coexistem de alguma forma, parecem acreditar
que as Verdades da Fé são mutáveis, ou, pelo menos, agem ou pregam como se
fosse esse o caso.
Observamos que esta atitude só
é defensável se a "Verdade" for considerada a par com a teoria
científica: como um esforço para expressar cada vez mais claramente uma
realidade indefinível; se é entendida em seu sentido normal e objetivo, então a
atitude é claramente absurda.
*
Observamos que os elementos
gnósticos da Autodeificação do Homem, do triplo Monismo e da tese de que a
Verdade evolui ao longo do tempo podem ser encontrados no falso ecumenismo, ou
ecumenismo não-católico. Lembramos que o ecumenismo tem dois sentidos: um
sentido católico e um não católico. O sentido católico é a iniciativa de
converter todos à fé única e verdadeira. O sentido não católico é a iniciativa
de promover algum bem espiritual ou moral, tipicamente vago e indefinido, por
meio de encontros entre católicos e membros de outras confissões cristãs ou de
outras religiões. Essa tentativa é sincretista e, como tal, típica da Gnose,
como dissemos acima.
O ecumenismo não católico busca
a união entre os participantes com base no que eles têm em comum. Por esta
razão, negligencia-se a Graça, a moralidade católica e a Verdade Católica em
sua integridade. Ao negligenciar a Graça, porém, favorece o Monismo Ontológico
(Panteísmo); ao negligenciar a moral, favorece o Monismo Moral (a tese de que o
Bem e o Mal podem coexistir); ao negligenciar a Verdade, ela favorece o Monismo
Lógico (a tese de que Verdadeiro e Falso podem coexistir). Além disso, no seu
exercício de "Diálogo", entendido como uma busca interminável pela
verdade (desprovida do princípio Iam satis est, como observa Romano
Amerio), expressa a atitude de que a verdade pode mudar ao longo do tempo.
Finalmente, ao não colocar o Uno, o Verdadeiro Deus no centro do encontro e do
Mundo, necessariamente coloca o homem neste lugar.
*
Podemos concluir que A Nova
Religião, com a qual estamos confrontados hoje, tem características suficientes
da Gnose para ser denominada "Gnóstica". Mais precisamente pode ser
denominada "Neo-Gnosticismo", pois o Gnosticismo é o nome dado a essa
mistura de doutrinas gnósticas católicas e não católicas, nas quais a fé da
Igreja primitiva se desintegrava, até ser salva pelos santos e pelos doutores
da Igreja, e o que estamos vendo hoje é simplesmente uma nova forma do mesmo
fenômeno.
Voltemos às nossas reflexões
iniciais. Há duas maneiras pelas quais o homem pode tentar se deificar: por
meio da Fé Católica ou por meio da Gnose.
A Fé Católica ensina que o
homem é divinizado nesta vida através de Nosso Senhor Jesus Cristo, ou seja,
através da Graça e dos Sacramentos, sobretudo, o Batismo e a Eucaristia; não em
virtude de práticas mágicas, e sim por uma boa vida; não tomando, mas
dando; não buscando a si mesmo, mas buscando a Deus; não pelo orgulho, mas pela
humildade; não por inflar a si mesmo, mas por auto-aniquilação; não através da
evolução, mas através do progresso moral; não através da Árvore do Conhecimento
do Bem e do Mal: um conhecimento falso, irracional e fantasmagórico, mas
através da Árvore da Vida.
A Árvore da Vida é a Árvore da
Cruz e o seu prolongamento a Santa Missa. Esta é a Árvore que nos protege do
calor deste mundo cruel sob a sua sombra doce e pacífica; que nos nutrirá com
seus sublimes frutos e a Eterna Bem-Aventurança do Céu: se tomarmos a nossa
cruz e seguirmos Nosso Senhor, como Ele nos ensina: participando de Seus
sofrimentos nesta terra, para compartilharmos Sua Glória no Céu. Amém.
Laudetur Jesus Christus. In
Aeternum. Amen.
*
* *
Postscript
GNOSE NO MUNDO DE HOJE
Na seção a seguir examinaremos
a Gnose no mundo contemporâneo à medida que ela floresce fora da Igreja,
primeiro no ateísmo e depois nas seitas esotéricas.
1. Ateísmo
Está presente no ateísmo de
três maneiras:
a) na medida em que o ateísmo,
com sua doutrina da evolução, sustenta que o homem evoluiu de algo menos do que
ele mesmo ou mesmo de nada;
b) na medida em que o ateísmo,
com a mesma doutrina, implica que este princípio, a partir do qual o homem
procede e no qual ele então se dissolve, é ao mesmo tempo uma realidade
superior;
c) na medida em que o ateísmo,
ao negar Deus, efetivamente deifica o homem.
Este tipo de Gnose, que é o
Ateísmo Positivo, é nutrida pela filosofia moderna, começando com o
antropocentrismo de Descartes e continuando com os vários sistemas modernos de
materialismo e idealismo. Ela é nutrida igualmente pelo budismo, um sistema
ateísta que sustenta que o homem procede do nada e depois se dissolve no nada,
visto, ao mesmo tempo, como uma realidade superior ('Nirvana').
2. As Seitas Esotéricas
O segundo tipo de Gnose fora da
Igreja é encontrado nas seitas esotéricas: Satanismo, Maçonaria, Teosofia,
Antroposofia e o chamado movimento Nova Era, que devem ser considerados como
herdeiros legítimos da Gnose.
a) Satanismo
O satanismo ensina doutrinas já
manifestadas na Gnose antiga: o politeísmo, e em particular na existência de
dois deuses: um bom e outro mal; a criação do mundo por um Demiurgo; a
identificação dele com o deus mau. Ao longo dos séculos, o Deus do Antigo
Testamento veio a ser identificado com este deus maligno que quer que o homem
sofra, enquanto que Satanás foi apresentado como o deus bom que quer libertar o
homem e fazê-lo feliz. O princípio moral do satanismo é: fac quod vis:
faça o que quiseres.
O satanismo exerce uma
influência importante sobre as outras seitas modernas mencionadas acima, sobre
as quais faremos agora algumas breves considerações.
b) Maçonaria
A Maçonaria é uma sociedade secreta
que professa um humanismo racionalista e tipicamente ateísta. Léon de Poncins,
em seu livro "Maçonaria nos seus Documentos Secretos" escreve:
"O grande segredo é, em certo sentido, a eminente soberania do homem. É a
afirmação da supremacia do homem diante da Revelação... O homem, diz a
Maçonaria, é um Deus possível. Uma vez que o organizamos socialmente,
internacionalmente e universalmente, ele rirá diante do Deus de nossas lendas e
pesadelos e de quem é seu perseguidor. É a libertação do Homem do Divino.
O estabelecimento de uma ordem
mundial político-religiosa de inspiração humanista é o objetivo central da
Maçonaria, através da destruição do Estado (sobretudo do Estado monárquico) e
da Igreja.
Ela visa o objetivo anterior
incitando revoluções, como a Revolução Russa; atacando a sociedade e a família,
nomeadamente através de divórcios e programas educativos imorais[3], incluindo o de "Gênero"; e
promovendo o ateísmo, explicitamente ou implicitamente por trás de um véu de panteísmo
e politeísmo.
Visa o último objetivo por
infiltração de seus próprios membros na Igreja e exercendo pressão sobre ela, a
partir de dentro, para fazê-la entrar em colapso doutrinariamente,
liturgicamente[4] e
moralmente.
O racionalismo e o ateísmo da
Maçonaria formam a base para o seu antagonismo específico para com a Igreja
Católica, com a reivindicação desta última em ensinar verdades sobrenaturais e
objetivas sob a forma de dogmas e Revelação Divina; e com sua intenção de viver
e ensinar os outros a viverem, de acordo com tais Verdades.
A maçonaria manifesta o
satanismo de três maneiras particulares: em seus ritos pervertidos, que incluem
sacrilégio e sacrifício humano; em seu objetivo de destruir a Igreja Católica;
e em sua finalidade ulterior e definitiva, que é a adoração do homem no lugar
de Deus[5].
O supremo princípio pessoal da
Maçonaria é o "Grande Arquiteto", entendido diversamente, com a
fluidez doutrinária com que se caracteriza, como Deus, Homem ou Diabo.
Desde seu nascimento no século
XVIII, a Maçonaria, um dos inimigos mais poderosos da Igreja Católica e Seus
fins, que são a glória de Deus e a salvação das almas, tem sido objeto de pelo
menos 14 condenações solenes por parte de Pontífices Romanos e do Santo Ofício.
O Concílio Vaticano II, pelo
contrário, representa um ponto de viragem na postura oficial da Igreja em
direção a ela. De acordo com o Abade Daniel Leroux em seu livro "Pietro mi
ami tu" (Edizioni Gotica, p.92): "Através do Cardeal Bea, os maçons
obtiveram o decreto sobre a liberdade religiosa e aplaudiram a vitória do falso
ecumenismo e da colegialidade". O mesmo autor cita discursos de
boas-vindas no Vaticano por parte do Papa João Paulo II aos maçons da "Trilateral"
e da seita judaica "B'nai B'rith", que apelam aos princípios
humanistas supostamente compartilhados por ambas as partes; mostra como o novo
Código de Direito Canônico (1983) deixou de excomungar membros da Maçonaria e,
de fato, nem sequer os menciona[6].
c) Teosofia
A teosofia, elaborada por Mme.
Blavatsky, sustenta que o mal é um dos princípios sustentáveis do mundo, uma
necessidade para a Evolução e o progresso. O espírito do mal, chamado
'Lúcifer', é a energia ativa do universo, uma lei que reconcilia os opostos e produz
a harmonia final. Esta lei, em sua opinião, libertará o homem da Falsidade (que
claramente se refere à Fé Católica) e obterá sua autorredenção.
d) Antroposofia
A Antroposofia de Rudolf
Steiner, por outro lado, identifica o espírito universal que harmoniza os
opostos com o "Espírito de Cristo", uma doutrina adotada
posteriormente pelo jesuíta apóstata Teilhard de Chardin. Esta harmonia de
opostos inclui a união sincretista de todas as religiões e filosofias. A
Antroposofia ensina, além disso, a reencarnação e o conhecimento
extra-sensorial do universo.
Nestes dois sistemas (c e d)
vários elementos gnósticos são repropostos; no segundo sistema eles se fundem
com o Cristianismo. Basta dizer, em relação a estas duas teorias, que os
opostos, quando são contraditórios (como no caso do Verdadeiro e do Falso, do
Bem e do Mal) são por sua própria natureza irreconciliáveis; E, portanto, falar
de "reconciliá-los" é absurdo. Além disso, o "Espírito de
Cristo", concebido como a Divindade imanente ao mundo, também é absurdo,
uma vez que, como já explicamos, Deus é por definição absolutamente
transcendente ao mundo.
d) Nova Era
O sistema da Nova Era pode ser
descrito como "Gnose Contemporânea". Deriva-se principalmente da
Teosofia, mas também contém elementos da Antroposofia e outras doutrinas
gnósticas. Pretende inaugurar uma nova era para o mundo e oferecer ao homem o
único caminho disponível para a salvação. É apresentado como científico e
místico ao mesmo tempo. Como sistema científico, adota o slogan "Pensar
globalmente", que significa olhar o mundo de forma holística como parte de
um todo, mas também de uma forma sincretista, ao conciliar opostos como
Verdadeiro e Falso, Bem e Mal. Como sistema místico, propõe o conhecimento e
práticas ocultas para experimentar "mundos superiores": OVNIs e
"espíritos", mas sobretudo o "Eu" entendido como divino:
ser desenvolvido nesta vida e em vidas subsequentes através da reencarnação. Os
defensores da Nova Era sentem mais do que entendem; é fundamentalmente
irracional e subjetivista.
Apresentaremos quatro elementos
desta Gnose contemporânea, refutando cada um à luz da Fé e da Razão.
1) A Auto-Deificação do Homem
através do Conhecimento Arcano
Este conhecimento arcano é
oferecido sob a forma de práticas destinadas a permitir que o homem experimente
'O Deus Imanente'. São ensinadas por homens que se apresentam como
"mestres espirituais". Isso recorda o prazeroso conhecimento
oferecido a Adão e Eva ao comer do fruto proibido. As práticas em questão são
de fato práticas mágicas para alcançar um estado preternatural (e não sobrenatural)
da alma. São sacramentos substitutos, propostos por mestres espirituais de
substituição, santos ou profetas, para alcançar estados de união com Deus, que
também são substitutos. São ficções inventadas pelo grande Imitador de Deus e
Inventor de todo o Engano que é o Diabo[7].
No que se refere a ideia de um
Deus imanente, repetimos que Deus é absolutamente transcendente ao mundo; Ele
também é imanente de maneira limitada, mas apenas no sentido em que Ele está
presente ao ser de cada coisa. No entanto, isso não permite que aquela coisa,
na medida em que é consciente, como o homem é, experimente-O.
2) Conhecimento Arcano
O conceito de conhecimento
arcano é particularmente manifesto na afirmação gnóstica de que a Igreja
esconde verdades vitais para o bem ou a felicidade do homem. Como diz Santo
Irineu, os gnósticos sempre alegaram possuir um conhecimento maior e mais
profundo do que aquele que a Igreja revelou. Suas críticas à Igreja a esse
respeito recordam a dúvida que Satanás insinuou nas mentes de Adão e Eva a
respeito da boa vontade de Deus, proibindo-os de comer do fruto da Árvore.
Aqui podemos perguntar, porém,
que conhecimento que a Igreja poderia estar escondendo quando Ela revelou
ao Homem a Realidade em seu sentido definitivo: a Verdade absoluta que é a
Santíssima Trindade? — e quando Ela revelou ao homem todos os meios possíveis
para alcançá-Lo e, assim, alcançar o seu fim último, que é a Beatitude Eterna?
Que conhecimento é suposto maior ou mais profundo, mais elevado ou mais útil ao
homem?
3) Monismo Ontológico, ou
Panteísmo
Esta doutrina é expressa na
tese gnóstica difundida mesmo entre os católicos de hoje, que a alma humana é
uma centelha divina, ou a tese de que a alma e Deus são compostos de
"matéria sutil". Estas são teorias tipicamente panteístas, e, em
última análise, ateias. A Igreja, ao contrário, ensina que matéria e espírito
são dois princípios distintos, e que Deus é transcendente ao mundo.
4) Realidade Subjetiva
A tese da Realidade Subjetiva
corresponde ao desprezo pela realidade objetiva descrita acima e se
correlaciona com o Monismo Lógico: o conceito de que Verdadeiro e Falso podem
coexistir.
Em relação à tese da Realidade
Subjetiva, pode-se dizer o seguinte: o intelecto foi criado para conhecer a
realidade como o olho foi criado para ver objetos. A verdade é a
correspondência entre intellectus et res: o intelecto de um lado e do
outro o res, o objeto: a realidade objetiva. Esta correspondência
entre o intelecto e a realidade objetiva é a Verdade, a Verdade Objetiva. Tudo
o que pensamos e dizemos, pensamos e dizemos como uma expressão da realidade
objetiva. Se eu acho que estou lendo um texto, que agora eu tenho uma dor de
cabeça, eu acho que é uma realidade objetiva. Não posso negar a realidade
objetiva, a verdade objetiva sobre as coisas, sem renunciar ao meu próprio
intelecto, sem renunciar ao próprio uso da razão. Mesmo que eu diga que a
realidade é subjetiva, eu a digo como uma expressão daquilo que considero
realidade objetiva.
O conceito de realidade subjetiva
tem sentido somente na descrição de erros como os de um louco, ou falar do
mundo dos sentidos: do mundo privado das sensações, emoções e sentimentos.
Querer emprestar alguma substância ontológica ao conceito de realidade
subjetiva para substituí-lo pela realidade objetiva é pura fantasia e ilusão.
*
Aqui, portanto, estão alguns
dos erros particulares da Gnose Contemporânea. Se quiséssemos identificar os
erros gerais que ela compartilha com todos os sistemas gnósticos, nós nos
concentraríamos no Panteísmo e no Egoísmo. Observamos que os erros do
gnosticismo podem hoje ser encontrados mesmo entre os fiéis católicos, ainda
que estes erros sejam diametralmente opostos à Fé.
Talvez a maior conquista das
seitas gnósticas seja apresentar a suprema confusão como Misticismo.
Tradução para o inglês:
Colaboradora de Rorate Caeli, Francesca Romana
Notas
[1] Eu recomendo a qualquer um que tenha um
pecado de impureza em consciência (sozinho ou com outra pessoa) ou mesmo que
tenha estado envolvido em práticas esotéricas, que recorra à Confissão o mais
rapidamente possível. Porque tais pecados são de matéria grave e põem em perigo
a salvação.
[2] Podemos distinguir quatro atitudes
concernentes a esta doutrina (que se aplica mutatis mutandis à Verdade
Católica em geral): a atitude tradicional: que sempre foi verdadeira; a
Modernista: que sempre foi falsa; a Monista Lógica: que a doutrina é (em certo
sentido) tanto verdadeira como falsa ao mesmo tempo; a Evolucionista: que a
doutrina era verdadeira e se tornou falsa.
[3] Humanum Genus Leão XIII "
Com a maior unanimidade a seita dos Maçons também esforça-se para tomar a si
mesma a educação da juventude. Eles pensam que eles podem facilmente moldar às
suas opiniões aquela idade macia e maleável, e torcê-la no que quer que eles
desejem; e que nada pode ser mais adequado do que isto para permitir a eles
levar a juventude do Estado a seguir seu próprio plano”.
[4] Observamos que Monsenhor Bugnini,
arquiteto do Novus Ordo Missae, foi, de acordo com uma opinião bem
fundamentada e amplamente difundida, um Maçom.
[5] Clement XII, Open Letter, quoted in Les
Fils de la Lumière, Roger Peyrefitte (cfr. Le secret des Francmaçons,
Chiré-en-Montreuil, cap.11).
[6] O cân. 2335 do Código de 1917 tinha
declarado: "Aqueles que se juntam a uma seita maçônica ou outras
sociedades do mesmo tipo, que conspiram contra a Igreja ou contra a autoridade
civil legítima, incorrem ipso facto numa excomunhão reservada à Santa
Sé". Isto foi modificado e substituído pelo novo Canon 1374: "Uma
pessoa que se junta a uma associação que trama contra a Igreja deve ser punida
com uma pena justa — aquele que promove ou toma posse em tal associação é
punido com um interdito. "A Congregação para a Doutrina da Fé reiterou
mais tarde o "julgamento negativo da Igreja sobre as associações
maçônicas", a grave pecaminosidade dos fiéis que lhes pertencem e sua
preclusão da Santa Comunhão, mas já não os pune com a excomunhão.
[7] “Deveria eu recorrer aos anjos? E com que
orações, com que ritos? Ouvi dizer que muitos dos que se esforçam para voltar a
ti, e que não conseguiam por si mesmos, tentaram este caminho e caíram na
curiosidade de visões estranhas, recebendo por isso o justo castigo das
ilusões. Soberbos, procuravam-te com o coração inchado de sua ciência
arrogante, e sem humildade. E atraíram para si, pela semelhança de sentimentos,
os demônios do ar, que se fizeram cúmplices e aliados de sua soberba, e se
tornaram iludidos de seus poderes mágicos.” (Santo Agostinho).
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