"Todos os Santos fizeram o maior caso dela e preferiram perder seus bens, sua reputação e sua própria vida a descorar esta virtude."
S. João Maria
Vianney
Sermão sobre a
Pureza
“Bem-aventurados
os puros de coração, porque eles verão a Deus”. (Mt.5,8)
Nós
lemos no Evangelho, que Jesus Cristo, querendo ensinar ao povo que vinha em massa,
aprender dEle o que era preciso fazer para ter a vida eterna, senta-se e,
abrindo a boca, lhes diz: “Bem-aventurados os puros de coração, porque eles
verão a Deus.” Se nós tivéssemos um grande desejo de ver a Deus, meus irmãos,
só estas palavras não seriam acaso suficientes para nos fazer compreender
quanto a pureza nos torna agradáveis a Ele, e quanto ele nos é necessária?
Pois, segundo Jesus Cristo, sem ela, nós não o veremos jamais!
“Bem-aventurados, nos diz Jesus Cristo, os puros de coração, porque eles verão
o bom Deus”. Pode-se acaso esperar maior recompensa que a que Jesus Cristo liga
a esta bela e amável virtude, a saber, a posse das Três Pessoas da Santíssima
Trindade, por toda a eternidade? ... S. Paulo, que conhecia bem o preço desta
virtude, escrevendo aos Coríntios, lhes diz: “Glorificai a Deus, pois vós o
levais em vossos corpos; e sede fiéis em conservá-los em grande pureza.
Lembrai-vos bem, meus filhos, de que vossos membros são membros de Jesus
Cristo, e que vossos corações são templos do Espírito Santo. Tomai cuidado de
não os manchar pelo pecado, que é o adultério, a fornicação, e tudo aquilo que
pode desonrar vossos corpo e vosso coração aos olhos de Deus, que a pureza
mesma”. (I Cor, 6, 15-20) Oh! Meus irmãos, como esta virtude é bela e preciosa,
não somente aos olhos dos homens e dos anjos, mas aos olhos do próprio Deus.
Ele faz tanto caso dela que não cessa de a louvar naqueles que são tão felizes
de a conservar. Também, esta virtude inestimável constitui o mais belo adorno
da Igreja, e, por conseguinte, deveria ser a mais querida dos cristãos. Nós,
meus irmãos, que no Santo Batismo fomos rociados com o Sangue adorável de Jesus
Cristo, a pureza mesma; neste Sangue adorável que gerou tantas virgens de um e
outro sexo; nós, a quem Jesus Cristo fez participantes de sua pureza,
tornando-nos seus membros, seu templo... Mas, ai! Meus irmãos, neste infeliz
século de corrupção em que vivemos, não se conhece mais esta virtude, esta
celeste virtude que nos torna semelhantes aos anjos!... Sim, meus irmãos, a
pureza é uma virtude que nos é necessária a todos, pois que, sem ela, ninguém
verá o Bom Deus. Eu queria fazervos conceber desta virtude uma idéia digna de
Deus, e vos mostrar, 1º. quanto ela nos torna agradáveis a Seus olhos, dando um
novo grau de santidade a todas as nossas ações, e 2º. o que nós devemos fazer
para conservá-la.
I – Quanto a pureza nos torna agradáveis a
Deus
Seria
preciso, meus irmãos, para vos fazer compreender bem a estima que devemos ter
desta incomparável virtude, para vos fazer a descrição de sua beleza, e vos
fazer apreciar bem seu valor junto de Deus, seria preciso, não um homem mortal,
mas um anjo do céu. Ouvindo-o, vós diríeis com admiração: Como todos os homens
não estão dispostos a sacrificar tudo antes que perder uma virtude que nos une
de uma maneira íntima com Deus? Procuremos, contudo, conceber dela alguma
coisa, considerando que dita virtude vem do céu, que ela faz descer Jesus
Cristo sobre a terra, e que eleva o homem até o céu, pela semelhança que ela dá
com os anjos, e com o próprio Jesus Cristo. Dizei-me, meus irmãos, de acordo
com isto, acaso não merece ela o título de preciosa virtude? Não é ela digna de
toda nossa estima e de todos os sacrifícios necessários para conservá-la? Nos
dizemos que a pureza vem do céu, porque só havia o próprio Jesus Cristo que
fosse capaz de no-la ensinar e nos fazer sentir todo o seu valor. Ele nos
deixou o exemplo prodigioso da estima que teve desta virtude. Tendo resolvido
na grandeza de sua misericórdia, resgatar o mundo, Ele tomou um corpo mortal
como o nosso; mas Ele quis escolher uma Virgem por Mãe. Quem foi esta
incomparável criatura, meus irmãos? Foi Maria, a mais pura entre todas e por
uma graça que não foi concedida a ninguém mais, foi isenta do pecado original.
Ela consagrou sua virgindade ao Bom Deus desde a idade de três anos, e
oferecendo-lhe seu corpo, sua alma, ela lhe fez o sacrifício mais santo, o mais
puro e o mais agradável que Deus jamais recebeu de uma criatura sobre a terra.
Ela manteve este sacrifício por uma fidelidade inviolável em guardar sua pureza
e em evitar tudo aquilo que pudesse mesmo de leve empanar seu brilho. Nós vemos
que a Virgem Santa fazia tanto caso desta virtude, que Ela não queria consentir
em ser Mãe de Deus antes que o anjo lhe tivesse assegurado que Ela não a
perderia. Mas, tendo lhe dito o anjo que, tornando-se Mãe de Deus, bem longe de
perder ou empanar sua pureza de que Ela fazia tanta estima, Ela seria ainda
mais pura e mais agradável a Deus, consentiu então de bom grado, a fim de dar
um novo brilho a esta pureza virginal. Nós vemos ainda que Jesus Cristo escolhe
um pai nutrício que era pobre, é verdade; mas ele quis que sua pureza estivesse
por sobre a de todas as outras criaturas, exceto a Virgem Santa. Dentre seus
discípulos, Ele distingue um, a quem Ele testemunhou uma amizade e uma
confiança singulares, a quem Ele fez participante de seus maiores segredos, mas
Ele toma o mais puro de todos, e que estava consagrado a Deus desde sua
juventude.
Santo
Ambrósio nos diz que a pureza nos eleva até o céu e nos faz deixar a terra,
enquanto é possível a uma criatura deixá-la. Ela nos eleva por sobre a criatura
corrompida e, por seus sentimentos e seus desejos, ela nos faz viver da mesma
vida dos anjos. Segundo São João Crisóstomo, a castidade duma alma é de um
preço aos olhos de Deus maior que a dos anjos, pois que os cristãos só podem
adquirir esta virtude pelos combates, enquanto que os anjos a têm por natureza.
Os anjos não têm nada a combater para conservá-la, enquanto que um cristão é obrigado
a fazer uma guerra contínua a si mesmo. S. Cipriano acrescenta que, não somente
a castidade nos torna semelhantes aos anjos, mas nos dá ainda um caráter de
semelhança com o próprio Jesus Cristo. Sim, nos diz este grande santo, uma alma
casta é uma imagem viva de Deus sobre a terra.
Quanto
mais uma alma se desapega de si mesma pela resistência às suas paixões, mais
ela se une a Deus; e, por um feliz retorno, mais o bom Deus se une a ela; Ele a
olha, Ele a considera como sua esposa, como sua bem-amada; faz dela o objeto de
suas mais caras complacências, e fixa nela sua morada para sempre.
“Bem aventurados, nos diz o Salvador, os puros de coração, porque eles verão ao
bom Deus”. Segundo S. Basílio, se encontramos a castidade numa alma,
encontramos aí todas as outras virtudes cristãs, ela as praticará com uma
grande facilidade, “porque” - nos diz ele – “para ser casto é preciso se impor
muitos sacrifícios e fazer-se uma grande violência. Mas uma vez que alcançou
tais vitórias sobre o demônio, a carne e o sangue, todo o resto lhe custa muito
pouco, pois uma alma que subjuga com autoridade a este corpo sensual, vence
facilmente todos os obstáculos que encontra no caminho da virtude”. Vemos
também, meus irmãos, que os cristãos castos são os mais perfeitos. Nós os vemos
reservados em suas palavras, modestos em todos os seus passos, sóbrios em suas
refeições, respeitosos no lugar santo e edificantes em toda sua conduta. Santo
Agostinho compara aqueles que têm a grande alegria de conservar seu coração
puro, aos lírios que se elevam diretamente ao céu e que difundem em seu redor
um odor muito agradável; só a vista deles nos faz pensar naquela preciosa
virtude. Assim a Virgem Santa inspirava a pureza a todos aqueles que a
olhavam... Bem-aventurada virtude, meus irmãos, que nos põe entre os anjos, que
parece mesmo elevar-nos por sobre eles!
II -
O amor que os Santos tinham por esta virtude
Todos os Santos
fizeram o maior caso dela e preferiram perder seus bens, sua reputação e sua
própria vida a descorar esta virtude.
Nós
temos um belo exemplo disto na pessoa de Santa Inês. Sua formosura e suas
riquezas fizeram com que, à idade de doze anos, ela fosse procurada pelo filho
do prefeito da cidade de Roma. Ela lhe fez saber que estava consagrada ao bom
Deus. Ela foi presa sob o pretexto de que era cristã, mas em realidade para que
consentisse nos desejos do rapaz. Ela estava de tal modo unida a Deus que nem
as promessas, nem as ameaças, nem a vista dos carrascos e dos instrumentos
expostos diante de si para amedrontá-la, não a fizeram mudar de sentimentos.
Não tendo conseguido nada dela, seus perseguidores a carregaram de cadeias, e
quiseram colocar uma argola e anéis em seu pescoço e em sua mãos; eles não
puderam fazê-lo, tão débeis eram suas pequenas mãos inocentes. Ela permaneceu
firme em sua resolução, no meios destes lobos enraivecidos, ela ofereceu seu
corpinho aos tormentos com uma coragem que espantou aos carrascos. Arrastam-na
aos pés dos ídolos; mas ela confessa bem alto que só reconhece por Deus a Jesus
Cristo, e que os ídolos deles não são mais que demônios. O juiz, cruel e
bárbaro, vendo que não consegue nada, crê que ela será mais sensível diante da
perda daquela pureza que ela estimava tanto. Ele ameaça expô-la num lugar
infame; mas ela responde com firmeza; “Vós podeis fazer-me morrer, mas não
podereis jamais fazer-me perder este tesouro: o próprio Jesus Cristo é zeloso
deste tesouro.” O juiz, morrendo de raiva, manda conduzi-la ao lugar das
torpezas infernais. Mas Jesus Cristo, que velava por ela duma maneira particular,
inspira um tão grande respeito aos guardas, que eles só a olhavam com uma
espécie de pavor, e manda a Seus anjos que a protejam. Os jovens que entram
naquele quarto, inflamados de um fogo impuro, vendo um anjo ao lado dela, mais
belo que o sol, saem dali abrasados do amor divino. Mas o filho do prefeito,
mais perverso e mais corrompido que os outros, penetra no quarto onde estava
santa Inês. Sem ter consideração por todas aquelas maravilhas, ele se aproxima
dela na esperança de contentar seus desejos impuros; mas o anjo que guarda a
jovem mártir fere o libertino que cai morto a seus pés. Rapidamente se espalha
em Roma o boato de que o filho do prefeito tinha sido morto por Inês. O pai,
enfurecido, vem encontrar a santa e se entrega a tudo o que seu desespero lhe
pode inspirar. Ele a chama de fúria do inferno, monstro nascido para a
desolação de sua vida, pois tinha feito morrer seu filho. Santa Inês lhe
responde tranqüilamente: “É que ele quis fazer-me violência, então o meu anjo
lhe deu a morte.” O prefeito, um pouco acalmado, lhe diz: pois bem, pede a teu
Deus para ressuscitá-lo, para que não se diga que foste tu que o mataste.” –
Sem dúvida, diz-lhe a Santa, vós não mereceis esta graça; mas para que saibais
que os cristãos nunca se vingam, mas, pelo contrário, eles pagam o mal com o
bem, saí daqui, e eu vou pedir ao bom Deus por ele.” Então Inês se põe de
joelhos, prostrada com a face em terra. Enquanto ela reza, seu anjo lhe aparece
e lhe diz: “Tenha coragem”. No mesmo instante o corpo inanimado retoma a vida.
O jovem ressuscitado pelas orações da Santa, se retira da casa, corre pelas
ruas de Roma gritando: “Não, não, meus amigos, não há outro Deus que o dos
cristãos, todos os deuses que nós adoramos não são mais que demônios que nos
enganam e nos arrastam ao inferno.” Entretanto, apesar de um tão grande
milagre, não deixaram de a condenar. Então o tenente do prefeito manda que se
acenda um grande fogo, e faz lançá-la nele. Mas as chamas entreabrindo-se, não
lhe fazem nenhum mal e queimam os idólatras que acudiram para serem
espectadores de seus combates. O tenente, vendo que o fogo a respeitava e não
lhe fazia nenhum mal, ordena que a firam com um golpe de espada na garganta,
afim de lhe tirar a vida; mas o carrasco treme como se ele mesmo estivesse
condenado à morte... Como os pais de Santa Inês chorassem a morte de sua filha,
ela lhes aparece dizendo-lhes: “Não choreis minha morte, pelo contrário,
alegrai-vos de eu Ter adquirido uma tão grande glória no Céu.”
Estais
vendo, meus irmãos, o que esta Santa sofreu para não perder sua virgindade.
Formai agora idéia da estima em que deveis ter a pureza, e como o bom Deus se
compraz em fazer milagres para se mostrar-se seu protetor e guardião. Como este
exemplo confundirá um dia estes jovens que fazem tão pouco caso desta bela
virtude! Eles jamais conheceram seu preço. O Espírito Santo tem, portanto,
razão de exclamar: “Ó, como é bela esta geração casta; sua memória é eterna, e
sua glória brilha diante dos homens e dos anjos!” É certo, meus irmãos, que cada
um ama seus semelhantes; também os anjos, que são espíritos puros, amam e
protegem duma maneira particular as almas que imitam sua pureza. Nós lemos na
Sagrada Escritura que o anjo Rafael, que acompanhou o jovem Tobias, prestou-lhe
mil serviços. Preservou-o de ser devorado por um peixe, de ser estrangulado
pelo demônio. Se este jovem não tivesse sido casto, é certíssimo que o anjo não
o teria acompanhado, nem lhe teria prestado tantos serviços. Com que gozo não
se alegra o anjo da guarda que conduz uma alma pura!
Não
há outra virtude para conservação da qual Deus faça milagres tão numerosos como
os que ele pródiga em favor duma pessoa que conhece o preço da pureza e que se
esforça por salvaguardá-la. Vede o que Ele fez por Santa Cecília. Nascida em
Roma de pais muito ricos, ela era muito instruída na religião cristã, e
seguindo a inspiração de Deus, ela Lhe consagrou sua virgindade. Seus pais, que
não o sabiam, prometeram-na em casamento a Valeriano, filho de um senador da
Cidade. Era, segundo o mundo, um partido bem considerado. Ela pediu a seus pais
o tempo de pensá-lo. Ela passou este tempo no jejum, na oração e nas lágrimas,
para obter de Deus a graça de não perder a flor daquela virtude que ela
estimava mais que sua vida. O bom Deus lhe respondeu que não temesse nada e que
obedecesse a seus pais; pois, não somente não perderia esta virtude, mas ainda
obteria... Consentiu, pois, no matrimônio. No dia das núpcias, quando Valeriano
se apresentou, ela lhe disse: “Meu caro Valeriano, eu tenho um segredo a lhe
comunicar.” Ele lhe respondeu: “Qual é este segredo? ” – Eu consagrei minha
virgindade a Deus e jamais homem algum me tocará, pois eu tenho um anjo que
vela por minha pureza; se você atenta contra isto, você será ferido de morte”.
Valeriano ficou muito surpreso com esta linguagem, porque sendo pagão, não
compreendia nada de tudo isto. Ele respondeu: “Mostre-me este anjo que a
guarda.” A Santa replicou: “Você não pode vê-lo porque você é pagão. Vá ter com
o Papa Urbano, e peça-lhe o batismo, você em seguida verá o meu anjo”.
Imediatamente ele parte. Depois de Ter sido batizado pelo Papa, ele volta a
encontrar sua esposa. Entrando no seu quarto, vê o anjo velando com Santa
Cecília. Ele o acha tão bonito, tão brilhante de glória, que fica encantado e
tocado por sua formosura. Não somente permite à sua esposa permanecer
consagrada a Deus, mas ele mesmo faz voto de virgindade ... Em breve eles
tiveram a alegria de morrerem mártires. Estais vendo como o bom Deus toma
cuidado duma pessoa que ama esta incomparável virtude e trabalha por
conservá-la?
Nós
lemos na vida de Santo Edmundo que, estudando em Paris, ele se encontrou com
algumas pessoas que diziam tolices; ele as deixou imediatamente. Esta ação foi
tão agradável a Deus, que Ele lhe apareceu sob a forma de um belo menino e o
saudou com um ar muito gracioso, dizendo-lhe que com satisfação o tinha visto
deixar seus companheiros que mantinham conversas licenciosas; e, para
recompensá-lo, prometia que estaria sempre com ele. Além disto, Sto. Edmundo
teve a grande alegria de conservar sua inocência até a morte. Quando Santa
Luzia foi ao túmulo de Santa Águeda para pedir ao Bom Deus, por sua
intercessão, a cura de sua mãe, Santa Águeda lhe apareceu e lhe disse que ela
podia obter, por si mesma, o que ela pedia, pois que, por sua pureza, ela tinha
preparado em seu coração uma habitação muito agradável ao seu Criador. Isto nos
mostra que o bom Deus não pode recusar nada a quem tem a alegria de conservar
puros seu corpo e sua alma.
Escutai
a narração do que aconteceu a Santa Pontamiena que viveu no tempo da
perseguição de Maximiano. Esta jovem era escrava dum dissoluto e libertino, que
não cessava de a solicitar para o mal. Ela preferiu sofrer todas as sortes de
crueldades e de suplícios a consentir nas solicitações de seu senhor infame.
Este, vendo que não podia conseguir nada, em seu furor, entregou-a como cristã
nas mãos do governador, a quem prometeu uma grande recompensa se a pudesse
conquistar. O juiz mandou que a conduzissem ante seu tribunal, e vendo que
todas as ameaças não a faziam mudar de sentimentos, fez a Santa sofrer tudo o
que a raiva pôde lhe inspirar. Mas o bom Deus concedeu à jovem mártir tanta
força que ela parecia ser insensível a todos os tormentos. Aquele juiz iníquo,
não podendo vencer sua resistência, faz colocar sobre um fogo bem ardente uma
caldeira cheia de pez, e lhe diz: “Veja o que lhe preparam se você não obedece
a seu senhor.” A santa jovem responde sem se perturbar: “Eu prefiro sofrer tudo
o que vosso furor puder vos inspirar a obedecer aos infames desejos de meu
senhor; aliás, eu jamais teria acreditado que um juiz fosse tão injusto de me
fazer obedecer aos planos de um senhor dissoluto.” O tirano, irritado por esta
resposta, mandou que a lançassem na caldeira. “Ao menos mandai, diz-lhe ela, que
eu seja lançada vestida. Vós vereis a força que o Deus que nós adoramos dá aos
que sofrem por Ele.” Depois de três horas de suplício, Pontamiena entregou sua
bela alma a seu criador, e assim alcançou a dupla palma do martírio e da
virgindade.
III
- Como esta virtude é pouco conhecida e apreciada no mundo
Ai,
meus irmãos, como esta virtude é pouco conhecida no mundo, quão pouco nós a
estimamos, quão pouco cuidado nós pomos em conservá-la, quão pouco zelo temos
em pedi-la a Deus, pois que não a podemos ter de nós mesmos. Não, nós não
conhecemos esta bela e amável virtude que ganha tão facilmente o coração de
Deus, que dá um tão belo brilho a todas as nossas outras boas obras, que nos
eleva acima de nós mesmos, que nos faz viver sobre a terra como os anjos no
céu!...
Não,
meus irmãos, ela não é conhecida por este velhos infames impudicos que se
arrastam, se rolam e se submergem na lama de suas torpezas, cujo coração é
semelhante àqueles ... sobre o alto das montanhas... queimados e abrasados por
estes fogos impuros. Ai! Bem longe de procurar extingui-lo, eles não cessam de
acendê-lo e abrasá-lo por seus olhares, por seus pensamentos, seus desejos e
suas ações. Em que estado estará esta alma, quando aparecer diante de Deus, a
Pureza mesma? Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por esta
pessoa, cujos lábios não são mais que uma abertura e um tubo de que o inferno
se serve para vomitar suas impurezas sobre a terra, e que se alimenta disto
como de um pão quotidiano. Ai! A alma deles não é mais que um objeto de horror
para o céu e para a terra! Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida
por estes jovens cujos olhos e mãos estão profanados por estes olhares e ... Ó
DEUS, QUANTAS ALMAS ESTE PECADO ARRASTA PARA O INFERNO!... Não, meus irmãos, esta
bela virtude não é conhecida por estas moças mundanas e corrompidas que tomam
tantas precauções e cuidados para atraírem sobre si os olhos do mundo; que por
seus enfeites exagerados e indecentes, anunciam publicamente que são infames
instrumentos de que o inferno se serve para perder as almas; estas almas que
custaram tantos trabalhos, lágrimas e tormentos a Jesus Cristo! ... Vede estas
infelizes, e vós vereis que mil demônios circundam sua cabeça e seu coração. Ó
meu Deus, como a terra pode suportar tais sequazes do inferno? Coisa mais
espantosa ainda, como mães as suportam num estado indigno de uma cristã! Se eu
não temesse ir longe demais, eu diria a estas mães que elas valem o mesmo que
suas filhas. Ai, este infeliz coração e estes olhos impuros não são mais que
uma fonte envenenada que dá a morte a qualquer que os olha e os escuta. Como
tais monstros ousam se apresentar diante de um Deus santo e tão inimigo da
impureza! Ai! A vida deles não é mais que uma acumulação de banha que eles
estão juntando para inflamar o fogo do inferno por toda a eternidade. Mas, meus
irmãos, deixemos uma matéria tão desagradável e tão revoltante para um cristão,
cuja pureza deve imitar a de Jesus Cristo mesmo; e voltemos à nossa bela
virtude da pureza que nos eleva até o céu, que nos abre o coração adorável de
Jesus Cristo, e nos atrai todas as bênçãos espirituais e temporais.
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