“a concepção tradicional conhece apenas a monogamia, ao lado da poligamia de um homem e talvez a poliandria de uma mulher”
Marcos Delson da Silveira*
O sexo é um atributo biológico. Em relação
à natureza humana temos dois sexos: um masculino e outro feminino. Quem nasce
com pênis é macho e quem nasce com vagina é fêmea. Os sexos são complementares
e possuem uma finalidade específica: a procriação¹. Se cessar a união entre o
homem e a mulher cessa a própria sociedade humana. Daí Aristóteles (1999; p.
12) afirmar que a união entre o homem e a mulher é típica da natureza e
constitui a família. Não se diz que determinado ser humano é do sexo feminino
ou masculino por convenção, mas o é pelas próprias características intrínsecas
a natureza. Os papéis sociais dos sexos realmente são construídos, mas sempre o
são em virtude de sua natureza e das condições sociais.
Perceba que o paradigma que compõe o mundo
Ocidental, em relação à sexualidade humana e a família, necessariamente, passa
pela Filosofia Clássica, o Direito Romano e a percepção judaico-cristã.
Hodiernamente, em nome do Estado Laico, excluem sorrateiramente um dos pilares
de formação do pensamento Ocidental do leque de discussões acadêmicas: a visão
judaico-cristã. O que parece muito estranho e até mesmo pragmático. O Estado
Brasileiro garante a liberdade religiosa (CF art. 5º, inc. VI), e tendo por
base que a religião cristã é a maior do País e, portanto, formadora do
pensamento ético de grande parte da Nação, cabe aqui resguardar a visão
judaico-cristã de família. A interrogação é: por que uma citação bíblica não é
fonte de conhecimento? Aos que não são religiosos basta observar a Bíblia como
um livro entre outros. Existe um verdadeiro preconceito em torno das religiões
e, em primazia, da Cristã. Posso citar todos os livros, exceto a Bíblia? O
Estado é Laico e democrático tendo como um dos fundamentos o pluralismo
político (CF art. 1º, inc. V), isto é, a existência de várias ideias e a
garantia de respeito a todas elas (JÚNIOR; NOVELINO, 2016; p. 15). E é
justamente pelo fato do Estado ser laico que uma citação bíblica deve ser
respeitada. Como garantir a liberdade religiosa sem garantir a liberdade do
pensamento religioso? Considero inadmissível, e um preconceito religioso que
deveria ser punido pelo Estado, quando um artigo é barrado por ter uma citação
bíblica ou de qualquer outro livro religioso. Portanto, em relação à família,
assim reza a Bíblia judaico-cristã: “o homem deixará sua família unindo-se a
uma mulher com o objetivo de constituir a sua própria família” (Gn 2, 24).
Retirando as peculiaridades, é tangível que essa percepção da união de sexos
opostos como família é coextensiva a de Aristóteles. Sendo assim, não é uma
visão unicamente bíblica, é empírica, histórica e fruto de reflexão filosófica.
Não obstante, na contemporaneidade, esse
conceito exclusivo de família, enquanto a união de um homem e uma mulher,
devida a ideia de gênero, sofreu grandes alterações. Essa ideia nuclear de
família, composta e teorizada por milênios, ligada a união dos sexos opostos,
está sendo substituída pela união de gênero. A família monogâmica, e hetero,
esta sendo vista como mais uma forma de família entre tantos outros modelos
possíveis de família. Essa perspectiva de outros modelos de família não é
contemporânea, é um discurso desconstrucionista que vem sendo construído há
certo tempo.
Segundo o amigo de Karl Marx (1818-1883),
Engels (1820-1895), no livro A Origem da
Família da Propriedade Privada e do Estado (2002, 31-62), “a concepção
tradicional conhece apenas a monogamia, ao lado da poligamia de um homem e
talvez a poliandria de uma mulher”, mas “o estudo da história primitiva
revela-nos, ao invés disso, um estado de coisas em que os homens praticam a
poligamia e as suas mulheres a poliandria, e em que, os filhos de uns e de
outros tinham que ser considerados comuns”. Para o filósofo, existiram vários
modelos de matrimônio, desde o grupal nos povos primitivos, passando pela
poligamia e a poliandria, até chegar à forma contemporânea que é a monogâmica,
que surge no seio da propriedade privada.
Assim, na monogamia, surgida pelo
aparecimento da propriedade privada, acúmulo de riquezas e o choque de classes
sociais decorrentes desses acontecimentos, o homem tem direito a poligamia e a
infidelidade casual, sendo estes direitos vetados paras as mulheres que estão
submissas a castigos cruéis em casos de infidelidade. O homem, agora detentor
de riquezas, é preponderante e precisa da mulher e da fidelidade da mesma para
ter filhos que, posteriormente, serão seus herdeiros. Perceba que para Engels
(2002, 62), a monogamia não é a reconciliação entre o homem e a mulher, ela
“surge como forma de escravidão de um sexo pelo outro, como proclamação de um
conflito entre os sexos, ignorado, até então, na pré-história”. O casamento
monogâmico é uma forma velada de o homem oprimir a mulher. E continua: “o
primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o
desenvolvimento do antagonismo entre o homem e a mulher na monogamia; e a
primeira opressão de classe, com a opressão do sexo feminino pelo masculino”.
Para alcançar a harmonia dos sexos e o fim da opressão e do antagonismo de
classes nada melhor que o gênero², o divórcio, o fim da família monogâmica, o
fim da religião, o fim da cultura vigente, da Propriedade Privada e do Estado
(MARX; ENGELS, 2010; p. 60-4). Com a ideia de gênero³ há uma subversão que
retira o sexo da ordem natural4 colocando-o na ordem cultural. Essa
visão cultural do sexo transportou o homem para a dimensão puramente histórica.
Homens e mulheres não o são por natureza definidos, mas pela cultura5.
Assim, para homens e mulheres serem idênticos basta mudar a cultura e a
história.
Hodiernamente, a consequência pela busca
do fim da opressão entre os sexos, o fim da religião, o fim da cultura vigente
e o fim do modelo de família monogâmica, é a tão divulgada Ideologia de gênero,
que assim como o Nazismo e o Socialismo, tende a construir um “novo homem”, a
tecer uma nova antropologia. Nazismo e Socialismo se impuseram pelas armas
matando quase 110 milhões de pessoas. A ideologia de gênero se impõe pela
cultura, pela manipulação da linguagem e pela propaganda. Segundo Scala (2011;
p. 12- 3), a estratégia da ideologia de gênero possui três etapas:
a) A primeira
consiste em utilizar uma palavra da linguagem comum, mudando-lhe o conteúdo de
forma sub-reptícia; b) depois a opinião pública é bombardeada através dos meios
de educação formais (a escola) e informais (os meios de comunicação de massa).
Aqui é utilizado o velho vocábulo, voltando-se, porém, progressivamente ao novo
significado; e c) as pessoas finalmente aceitam o termo antigo com o novo
conteúdo
A primeira é a manipulação linguística “de
forma sub-reptícia6”. Pega-se uma palavra de uso corrente da língua
e reorienta seu significado. Exemplo: Família. Redefine o conceito de família:
de união de dois sexos passa-se a união de gênero. Aqui entra a segunda
estratégia. Através do Plano Nacional do Livro Didático (PNLD) insere-se o novo
conteúdo para ser ensinado nas escolas. Juntamente, utilizam-se os meios de
comunicação em massa através de uma novela, um filme, um desenho, uma música
para fomentar o conceito. Com o tempo cria-se conceitos com homofobia,
preconceito de gênero, discriminação de gênero... e, assim, forçam as pessoas a
concordarem com as ideia geradas, pois se emitem uma opinião contrária serão
homofobias, preconceituosas, discriminadoras e, portanto, mal vistas diante a
sociedade e até processadas a nível de Estado7. Com o passar de
alguns anos todos concordam com a perspectiva ideológica e ela vai tomando
aparência de verdade. Assim, aos poucos, vencem sem convencer, se impõem visto
que não há aceitação social do gênero.
Durante a votação da Lei nº 13.005 de 25
de junho de 2014 (Plano Nacional de Educação) a Câmara e o Senado rejeitaram
como proposta para a educação no Brasil a ideologia de gênero e todos os seus leitmotiv clássicos: “identidade de
gênero”, “orientação sexual8”, “discriminação de gênero”... Contudo
o Conae 2014 (Conferência Nacional de Educação) apresentou, mesmo sendo
rejeitado pela Câmara e pelo Senado, como diretriz obrigatória para o PNE
(Plano Nacional de Educação) a proposta ligada a Ideologia de gênero.
“superação das
desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial,
regional, de gênero e de orientação sexual, e na garantia de acessibilidade”
(...) “apresentado como norma legal, embora explicitamente rejeitado pelo
Congresso, o restante do documento (PNE) desenvolve nas suas mais de uma
centena de páginas como o sistema escolar deverá “promover a diversidade de
gênero” (pg. 25), “disseminar materiais pedagógicos que promovam a igualdade de
gênero, orientação sexual e identidade de gênero” (pg. 36), “desenvolver,
garantir e executar anualmente nos sistemas de ensino Fóruns de Gênero” (pg.
41), “inserir na avaliação de livros critérios eliminatórios para obras que
veiculem preconceitos ao gênero, orientação sexual e identidade de gênero” (pg.
42), “garantir condições institucionais para a promoção da diversidade de
gênero e diversidade sexual” (pg. 43), “elaborar diretrizes nacionais sobre
gênero e diversidade sexual na educação básica e superior” (pg. 45), “ampliar
os programas de formação continuada dos profissionais de educação sobre gênero,
diversidade e orientação sexual (pg. 92), apresentados como metas obrigatórias
em virtude de uma norma legal do PNE que foi, na realidade, explicitamente rejeitada
pelo Congresso” (RI Nº 565-2015, p. 02 e 21)
A conquista do processo educacional faz
parte indispensável da estratégia dos ideólogos de gênero. Por isso, a
insistência, mesmo rejeitado em votação, do Plano Nacional de Educação conter
premissas relacionadas ao gênero9. Alguns livros do Ensino Médio de
Ciências Humanas contém explícita a ideologia de gênero. Em uma rápida pesquisa
é fácil perceber inúmeras Dissertações de Mestrado e Teses de doutorado sobre a
Ideologia de gênero. Uma vez aceita na educação, todas as escolas deverão ter
conteúdos que ensinem/fomentem/desenvolvam a ideologia de gênero. Com o auxílio
da grande mídia e do Direito a imposição estará completa. Em curto espaço de
tempo, toda a população brasileira estará doutrinada.
* Licenciado em Filosofia; pós-graduado em Docência
Universitária (Católica); Filosofia do Direito (Moderna); Direitos Humanos da
Criança e do Adolescente (UFG); Filosofia Clínica (Católica) e pós-graduando em
Arte-Educação Intermidiática Digital (UFG). Possui Curso Complementar Superior
em Gestão de Segurança. e colaborador do blog Salve Regina!.
BIBLIOGRÁFIA
ARISTÓTELES. A Política. Rio de Janeiro:
Ediouro, 1999
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco 5ª ed. São
Paulo: Martin Claret, p. 13
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos
e mitos. São Paulo: Difusão europeia do livro 4ªed – tradução de Sérgio
Milliet, 1970
Bíblia Sagrada. 158ª ed. São Paulo: Ed.
Ave Maria
ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da
Propriedade Privada e do Estado. São Paulo: Centauro, 2002, p. 62
JÚNIOR, Direley da Cunha; NOVELINO,
Marcelo. Constituição Federal para Concursos: Doutrina, jurisprudência e
questões de concurso. Salvador: Ed. JusPodivn, 7ª ed., 2016
LESSA, Sérgio; TONET, Ivo. Introdução à
Filosofia de Marx 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011
SCALA, Jorge. Ideologia de gêneros: o
neototalitarismo e a morte da família. São Paulo: Katechesis, 2011
SILVEIRA, Marcos Delson da. “Brincando de
Filosofar”: sucintas reflexões. Goiânia: Kelps, 2014
NOTAS
1 Embora
o prazer seja consequência da relação sexual, não é a sua finalidade última.
2 O
gênero é o corpo conceitual que permitiria eliminar a diferença entre os sexos
(SCALA, 2011, p. 21). Com a ideia de gênero foi possível em 1990 em Pequim e,
posteriormente, Yogyakarta conferências para debater as expressões:
“discriminação de gênero”, “identidade de gênero” e “orientação sexual”.
3 A
assim chamada ‘teoria’ (‘enfoque, ‘olhar’) de ‘gênero’ é, na realidade, uma
ideologia. Provavelmente a ideologia mais radical da história, já que, se fosse
imposta, destruiria o ser humano em seu núcleo mais íntimo e simultaneamente
acabaria com a sociedade. Além disso, é a mais sutil porque não procura se
impor pela força das armas – como, por exemplo, o marxismo e o nazismo - , mas
utilizando a propaganda para mudar as mentes e os corações dos homens, sem
aparente derramamento de sangue” (SCALA, 2011, p. 11).
4 “o
único pressuposto do pensamento de Marx é o fato de que os homens, para poderem
existir, devem transformar constantemente a natureza. Esta é a base
ineliminável do mundo dos homens. Sem a sua transformação, a reprodução da
sociedade não seria possível. Essa dependência da sociedade para com a
natureza, contudo, não significa que o mundo dos homens esteja submetido às
mesmas leis e processos do mundo natural. Sem a reprodução biológica dos
indivíduos não há sociedade; mas a história dos homens é muito mais do que a
sua reprodução biológica. A luta de classes, os sentimentos humanos, ou mesmo
uma obra de arte, são alguns exemplos que demonstram que a vida social é
determinada por outros fatores que não são biológicos, mas sociais” (LESSA;
TONET, 2011, p. 17).
5 A
Cartilha de Diversidade Sexual publicada pelo Ministério da Saúde em 2010, na
pg. 53: “A identidade de gênero se estabelece a partir de um processo dinâmico
e complexo, que envolve aspectos genéticos e sociais, no qual as pessoas se
identificam com o masculino ou o feminino, não importando o seu sexo
biológico”. Na página 54: “Os papéis de gênero expressam os costumes de um dado
momento histórico e, por isso, podem sofrer mudanças.”
6
Leviana, fraudulenta
7 O
PLC 122/06, art. 3º, (que foi negado) preconizava os crimes por “orientação
sexual e identidade de gêneros,” criminalizando manifestações contra o
homossexualismo, caracterizando-as como crime de “homofobia”. Uma das
estratégias é ter o Direito a seu favor. É uma imposição ideológica.
8
Diferencia-se opção sexual de orientação sexual pelo pressuposto de que a
orientação sexual não é uma escolha racional de um sujeito, mas está vinculada
a dimensão do desejo, que não é racional. Por isso não pode ser uma opção.
Porém esquecem que a dimensão do desejo deve ser controlada pela dimensão
racional. O ser humano não deve se deixar levar pelos impulsos instintivos.
9 No Currículo Referência da Rede Estadual de Educação de Goiás consta
no conteúdo de Sociologia (pg. 294): “Diferença entre gênero, sexo e
sexualidade” e “os movimentos sociais de minorias em busca de identidade e
cidadania: Afrodescendentes, Mulheres, LGBT, Ambientalistas, MST...”.
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