“Embora sempre tenham existido ímpios, nunca se verificou antes do século
XVIII e no seio do cristianismo uma insurreição contra Deus, sobretudo nunca se
tinha visto uma conjura sacrílega de todos os talentos contra o seu Autor; ora,
foi a isto que então assistimos.”
Arai Daniele
O que Nosso Senhor revelou à Lúcia
sobre o destino de Seus ministros quanto à desgraça que seguiria o menosprezo
com que Luis XIV acolheu Seu pedido de consagração, dizem respeito às aparições
a santa Margarida Alacoque em 1689. Exatamente cem anos depois o Rei de França
perdeu todo e poder e em seguida a cabeça na guilhotina. A comparação vale para
os ministros de Nosso Senhor, isto é o Papado que até 1958 foi inadempiente de
um extremo pedido/ajuda divino. Seguiu a fatal acefalia de um Papa católico. São
fatos históricos.
Vamos revê-los brevemente para saber
que no momento em que o fermento revolucionário assumiu poder para subverter as
mentes na França, o Céu mandou uma ajuda, desatendida.
Nos fins do reinado de Luís XIV,
entre 1680 e 1715, o escritor Paul Hazard situou o fluxo sintomático de mais ou
menos todas as atitudes mentais cujo conjunto conduziria à revolução… “a crise
da consciência europeia”.
Depois da morte do rei, o movimento
subversivo desenvolveu-se com grande virulência e não há historiador objetivo
que negue a ação das sociedades secretas, que então surgiram por toda parte, no
assalto contra a ordem cristã. A conivência entre os huguenotes, os jansenistas
e os filósofos refugiados na Holanda dava seus frutos. O galicanismo, por seu
turno, não tardou a reforçar a conjura e a desempenhar um papel tanto mais
decisivo quanto se baseava no mais odioso dos equívocos.
Em poucos anos, as seitas e
sociedades anticristãs iriam se difundir e tudo invadir. Introduzida na França
de forma quase oficial desde 1721, com a instituição em Dunquerque, em 13 de
outubro, da loja “Amizade e Fraternidade”, a franco-maçonaria se desenvolveria
com grande força.
Voltaire foi recebido na
franco-maçonaria quando da sua primeira viagem à Inglaterra (1725-1728) e, de
regresso a Paris, não fez mistério do seu projeto de aniquilar o cristianismo.
A publicação da Enciclopédia foi o primeiro meio para atingir este fim. Os
conjurados fizeram dela um depósito de todos os erros, sofismas e calúnias
inventados contra a religião. Mas estava convencionado que ela ministraria o
veneno de maneira insensível. A Enciclopédia era uma obra internacional.
Bertin, encarregado da administração
real, compreendeu o perigo dessa propaganda que chegava até as classes mais
humildes da sociedade. Interrogando os vendedores dos livros, soube que estes
não custavam nada e eram entregues em pacotes de procedência ignorada para
serem vendidos em barracas a preços módicos.
Voltaire encarregou-se dos ministros,
príncipes e reis. Quando não podia aproximar-se destes, trabalhava-os
indiretamente. Por exemplo, colocou junto de Luís XV um médico, Quesnay, por
cuja direção ideológica o rei o chamava de seu pensador.
Era revolta contra Deus – Joseph de
Maistre diria: “Embora sempre tenham existido ímpios, nunca se verificou antes
do século XVIII e no seio do cristianismo uma insurreição contra Deus,
sobretudo nunca se tinha visto uma conjura sacrílega de todos os talentos
contra o seu Autor; ora, foi a isto que então assistimos.” Contudo, já em 1738,
a Igreja, pela boca do soberano pontífice, tinha avisado sobre o perigo e
desmascarado a conspiração! Em 28 de abril, Clemente XII condenou pela primeira
vez a franco-maçonaria. Em 1751, confirmou esta condenação Bento XIV, e assim
por diante. Mas, se o papado soube ver o perigo e condená-lo, os príncipes
preferiam deixar correr e mesmo auxiliá-lo.
Que terrível ironia se desprende de
documentos como esta carta de Maria Antonieta para sua irmã, rainha Maria
Cristina (26-2-1781); “Julgo que vos preocupais demasiado com a maçonaria. Aqui
toda gente o é … Recentemente, a princesa de Lamballe foi nomeada grão-mestre
duma Loja e contou-me todas as belas coisas que lhe foram ditas.” De fato, a
começar pelo primo do rei, o futuro regicida Filipe “Égalité”, que seria por
sua vez guilhotinado; esse mesmo aplicava-se a “maçonizar” o exército e
sobretudo as “guardas francesas”. Ora, sabe-se que a revolução só foi possível
graças à súbita dissolução do exército real…
O que acontecia na França se repetia
em toda a Europa. Influentes em Versalhes e em Paris, os jansenistas e
enciclopedistas uniam-se e exerciam influência também em Viena. O exemplo de
José II, imperador da Áustria, era contagioso. A revolução que os sofistas
arrastavam foi acelerada tanto pelos reis como pelos seus ministros. Existiam
marqueses de Pombal em todas as cortes.
Em 1789, mais da metade dos deputados
franceses eram franco-maçons. Eis porque o padre Baruel escreveu: “Na revolução
francesa, tudo, incluindo os crimes mais espantosos, tudo foi previsto,
meditado, combinado, resolvido, estabelecido. Luís XVI, no seu regresso de
Varennes, confessaria: ‘Por que não acreditei há onze anos? Tudo quanto
atualmente vejo tinha-me sido anunciado’.” E sobreviria a morte desde rei que
fora, sem dúvida, decidida pela seita ainda muito antes da revolução.
O papa Bento XV escreveu: “Desde os
três primeiros séculos, durante os quais a terra ficou empapada com o sangue
dos cristãos, pode-se dizer que nunca a Igreja atravessou uma crise tão grave
como aquela em que entrou no fim do século XVIII.” E também: “É sob os efeitos
da louca filosofia resultante da heresia dos Inovadores e da sua traição que os
espíritos saíram em massa dos caminhos da razão e que explodiu a Revolução,
cuja extensão foi tal que abalou as bases cristãs da sociedade, não só em
França, mas paulatinamente em todas as nações.” (A.A.S. 7/3/1917). De fato, só
a revolução, que estava para realizar-se no seu pontificado, ultrapassaria tudo
isto.
o Império revolucionário de Napoleão
O imperador Napoleão I repetiria à saciedade
que tinha sido o defensor das idéias de 1789. Auto-proclamava-se o “Messias” da
revolução: “Consagrei a Revolução, insuflei-a nas leis.” Vejamos então qual o
legado desta num escrito do bispo de Angers (monsenhor Freppel):
“Lede a Declaração dos Direitos do
Homem, quer a de 1789, quer a de 1793, vede qual a idéia que então se formou
dos poderes públicos, da família, do casamento, do ensino, da justiça e das
leis: lendo-se todos esses documentos, vendo-se todas essas instituições novas,
dir-se-ia que, para essa nação cristã desde há quatorze séculos, o cristianismo
nunca existira e que não havia lugar para ser tido em conta… Era o reinado
social de Jesus Cristo que se tratava de destruir e de apagar até o menor
vestígio. A revolução é a sociedade descristianizada; é Cristo repelido para o
fundo da consciência individual, banido de tudo quanto seja público, de tudo
quanto seja social; banido do Estado, que já não procura na Sua autoridade a
consagração da sua própria; banido das leis, das quais a Sua lei não é
soberana; banido da família, constituída fora da Sua bênção; banido da escola,
onde o Seu ensino já não é a alma da educação; banido da ciência, onde não
obtém melhor homenagem do que uma espécie de neutralidade não menos injuriosa
do que a negação; banido de toda parte, a não ser talvez de um recôndito da
alma, onde consentem deixar-lhe um resto de domicílio.”
Esta era a intenção real. Mas,
perguntar-se-á, por que razão teria Napoleão restabelecido o culto católico na
França? Por que fez uma concordata com o papa Pio VII? Por que convidou este
para a sua coroação? Algo se esclarece a esse respeito no seu Memorial de Santa
Helena: “Quando restabelecer os altares, quando proteger os ministros da
religião, como eles merecem ser tratados em todo o país, o papa fará o que lhe
pedir: acalmará os espíritos, reuni-los-á na sua mão e colocá-los-á na minha…
Além disso, o catolicismo conservar-me-á o papa, e, com sua influência e as
minhas forças na Itália, não desistirei de, cedo ou tarde, por um meio ou por outro,
acabar por ter nas minhas mãos a direção desse papa, e, desde logo, dominar
essa influência e essa alavanca de opinião sobre o mundo…” Para quê?
“De fato”, escreveu monsenhor
Delassus, “onde quer que Napoleão levou seus exércitos, fazia o que tinha sido
feito em França, estabelecendo a igualdade entre os cultos, expulsando os
religiosos, impondo a partilha forçada, vendendo os bens eclesiásticos,
abolindo as corporações, destruindo as liberdades locais, derrubando as
dinastias nacionais, aniquilando, numa palavra, a antiga ordem das coisas e
esforçando-se para substituir a civilização cristã por uma civilização cujo
princípio e fundamento seriam constituídos pelos dogmas revolucionários.”
Depois da queda de Napoleão os
revolucionários não conseguiram impedir a volta de um rei católico na pessoa de
Luís XVIII, da família Bourbon. Mas conseguiram colocar junto ao soberano um
certo número de homens que pouco tinham de promotores da restauração da ordem
cristã. Tratava-se de uma equipe de prelados e padres que haviam abandonado o
seu ministério sob a revolução: Talleyrand, de Pradt, Louis, de Montesquieu.
Foi a esses quatro eclesiásticos que Luís XVIII confiou o governo da primeira
restauração. No da segunda havia o regicida Fouché. Com a polícia dominada por
ele a maçonaria pôde reorganizar-se livremente. E assim a restauração favoreceu
o catolicismo, mas também os maçons e o parlamentarismo, de modo que “a
constituição de 1814 saiu das próprias entranhas da revolução”, como diria
Thieres em 1873. O papa Pio VII manifestava ao rei, através do bispo de Tours,
sua dor e os perigos dessa constituição revolucionária. Em 1818 o cardeal
Consalvi escreveria ao príncipe de Metternich-Winneburg, da Áustria: “Julgo que
a revolução mudou de marcha e de tática. Já não ataca a mão armada tronos e
altares: limita-se a miná-los…” Mas os avisos de Roma de nada serviriam aos
monarcas de então.
Luís XVIII estava longe de ser um
católico de tempera. Havia recusado à contra-revolução da Vandéia de tomar o
poder para vencer a subversão revolucionária e o terror dos anos que se
seguiram a 1793. Seu irmão e sucessor Carlos X, embora bastante devoto, não
tinha uma formação católica sólida para enfrentar tantas insídias e acabou
sucumbindo. Pelo golpe de estado de 30 de julho de 1830 foi levado ao poder
Luís Filipe Égalité, filho do regicida Orléans.
Era o retorno da revolução com todas
as suas insídias, mas com a salvaguarda de estar sob a continuidade e
respeitabilidade monárquica. Rodeado desde o início pelos pontífices da
maçonaria — Decazes, La Fayette, Talleyrand, Teste, etc. — começou por colocar
o judaísmo no mesmo nível das confissões cristãs, reforçando o
interconfessionalismo e o clima de indiferença e liberalismo religioso. Assim,
reconciliada na França a revolução com o trono, em toda a Europa os
revolucionários ficaram livres para difundir e intensificar a guerra contra a
Igreja, como se verá na Espanha e em Portugal, mas especialmente em Roma, onde
o papa foi praticamente forçado a aceitar um projeto de anistia permanente para
os revolucionários dos estados pontifícios. Em 1832 a França orleanista chegou
a apoderar-se ameaçadoramente da cidade de Ancona, mas sem abalar a firme
prudência de Gregório XVI.
As aparições de Nossa Senhora
Poderíamos perguntar se diante de
tantos perigos e ameaças, Deus não havia dado algum sinal e ajuda à Sua Igreja.
Esta é a questão que, embora seja extremamente importante, está incrivelmente
esquecida.
Na noite entre 18 e 19 de julho de
1830, onze dias antes do golpe [XXX] de estado, Nossa Senhora apareceu em
Paris, na capela da “rue du Bac” das Filhas da Caridade, à jovem religiosa
Catarina Labouré. A humilde noviça, que depois se tornou santa, ouviu a Virgem
Maria, que com os olhos cheios de lágrimas, profetizava as grandes desgraças
que estavam para abater-se sobre a humanidade. Em 27 de novembro, a Virgem
Imaculada confiou a Catarina a missão de propagar a “Medalha Milagrosa” para
sustentar os fiéis e a Igreja com a invocação: — Oh Maria concebida sem pecado
rogai por nós que recorremos a Vós.
Eis, portanto, a resposta a esta
questão capital que nos deve orientar sobre a luminosa seqüência de aparições
marianas que vieram prevenir sobre os grandes perigos revolucionários modernos,
que de 1830 até hoje se sucedem numa escalada vertiginosa.
A consideração fundamental é esta: a
intervenção sobrenatural precede uma ameaça política à vida religiosa, mas a
verdadeira ameaça, invisível, está no interior da Igreja, é relativa à defesa
da fé, da doutrina, do culto, do clero, da hierarquia e do pontificado. Nossa
Senhora veio à “rue du Bac”, como a La Salette e Fátima, avisar sobre erros
políticos, mas para a defesa da Roma católica. A mensagem de ajuda é antes de
tudo para que o pontífice romano tenha um novo apoio inestimável para preservar
a fé íntegra e pura. Bastaria lembrar estas aparições de Maria Imaculada que em
Lourdes, em 1858, diz “Eu sou a Imaculada Conceição”, confirmando assim a plena
oportunidade do dogma proclamado pelo papa Pio IX em 1854.
A revolução liberal dentro da Igreja
Com esta luz podemos entender que o
verdadeiro perigo de 1830 não era tanto a revolução coroada que iria impor o
erro no mundo pelas armas, mas uma infiltração liberal que iria enfraquecer as
defesas doutrinais da Igreja pelo liberalismo. Este termo tem-se prestado a
muitas confusões, razão pela qual se impõe uma melhor elucidação deste mal,
denunciado pelo papa.
Liberalismo é, essencialmente,
atribuir à liberdade humana prioridade sobre a verdade revelada por Deus. Esta
rebeldia à verdade começou a apoderar-se dos governos e das leis com a
revolução francesa, mas era condenada e mantida fora da Igreja até que
eclesiásticos, como o padre Lamennais, ocuparam-se de acolhê-la e
“cristianizá-la”. Desde o século XIX o liberalismo religioso fez três grandes
tentativas de dominar a Igreja. A primeira, de Lamennais, consistia em
considerar o direito à liberdade um fato universal no qual se inseria o da
liberdade da Igreja, como uma espécie diante do gênero. Esta posição quanto à
liberdade religiosa tinha por conseqüência lógica a separação total da Igreja e
do Estado, da lei de Deus e da lei dos homens. Depois da revolução de 1830,
esta posição revolucionária agravou-se, por ser defendida também por
“católicos” da corrente liberal do padre Lamennais, que se apresentaram à
opinião pública como os verdadeiros defensores da liberdade da Igreja. Podia
haver ilusão nisto? [XXXI]
Essa primeira tentativa com seus
embustes e ilusões foi firme e prontamente repelida em 1832 pelo papa Gregório
XVI com a encíclica Mirari vos, que reconhecendo a entidade do perigo usou
palavras da profecia apocalíptica da abertura do poço do abismo.
A mentalidade européia tinha siso
completamente contaminada. Só faltava ver isto dentro da Igreja; um mal
insuperável, final. Por isto Nosso Senhor suscitou a Profecia de Fátima, onde a
Mensageira seria a mesma Rainha dos Profetas. Os chefes da Igreja entenderam a
urgência dessa compreensão? Mesmo Pio XII o fez só pela metade. Daí o aviso e a
datação final da terceira parte do Segredo, que seria mais claro em 1960 quando
a revolução já estava no Vaticano com o maçom e modernista João 23 em 1958.
Desde o pedido de 1929 não haviam passado cem anos. O resto é a desgraça
da tenebrosa degeneração católica de todos os dias, sem mais papa que o impeça;
antes, os anticristos que passam por papas só a acelera até a degeneração
final.
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