"A Realeza efetiva de Nossa
Senhora Aparecida sobre o Brasil é um fato que ninguém pode negar. A propósito,
uma pergunta poder-se-ia fazer: o povo brasileiro é fiel a essa excelsa
Soberana?"
Freqüentemente Catolicismo publica
matérias relacionadas com as maravilhas operadas pela Divina Providência em
favor do povo brasileiro. Enaltecendo assim a extraordinária vocação deste País
nascido à sombra da Cruz. Entretanto, nenhuma maravilha é mais indicativa dessa
predileção celestial do que a miraculosa aparição da imagem de Nossa Senhora
nas águas do Rio Paraíba, em Aparecida do Norte.
Nada supera as abundantes graças ali dispensadas
pela Virgem Santíssima aos filhos, que a seus pés suplicam favores espirituais
e materiais. Após o miraculoso encontro da imagem aparecida, as
graças, os milagres e prodígios por Ela operados naquela cidade e pelo Brasil
afora perpetuam os sinais de sua predileção. Contudo, em meio ao dilúvio de
crises que se abate sobre o mundo, esse mesmo povo, parece por vezes d´Ela se
esquecer.
Mais do que nunca, quando parecem soçobrar todas as
nações, filialmente voltemos nossos olhares para nossa Santa Mãe, a Rainha e
Padroeira do Brasil, e n´Ela encontraremos a solução para todas as nossas
dificuldades.
* * *
Tendo em vista uma especial homenagem a tão augusta
Rainha na comemoração dos 100 anos de sua coroação, efetivada a 8 de setembro
de 1904, procuramos nos arquivos de Catolicismo as
matérias relacionadas com essa histórica data. Especialmente pesquisamos o tema
de Nossa Senhora Aparecida enquanto Rainha, com direito a exercer efetiva
realeza no Brasil. Encontramos material abundante, sobretudo da lavra de nosso
inspirador e principal colaborador, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira (1908 –
1995).
Ele foi membro titular da Academia Marial
de Aparecida, e nutria especialíssima devoção à Rainha do Brasil.
Inúmeras vezes deslocou-se até a cidade de Aparecida do Norte para depositar
suas súplicas ou seus agradecimentos aos pés da Virgem da Conceição Aparecida,
e por duas vezes recebeu a visita da verdadeira imagem por ocasião da passagem
dela pela capital paulista em 1968.
Assim sendo, iniciamos tal homenagem com a
transcrição de trechos de uma conferência de Plinio Corrêa de Oliveira,
pronunciada em 5-10-1964:
Rainha com direitos efetivos
sobre o Brasil
“Creio que não existe um só país que não tenha uma
grande devoção a alguma invocação especial de Nossa Senhora; e no qual Ela não
seja, debaixo de algum título, a Padroeira. Há também as invocações a Nossa
Senhora em cidades e em regiões, como, por exemplo, Nossa Senhora da Penha, em
São Paulo. E ainda há imagens de Nossa Senhora particularmente invocadas em
determinadas paróquias.
Ou seja, Nossa Senhora, com aquela índole materna
que é característica da missão d’Ela junto aos homens, se faz grande com os
grandes, se faz pequena com os pequenos. Ela se faz universal para as grandes
coletividades e se faz como que regional para vários grupos humanos. Desse modo
podemos admirá-la em todas as dimensões: como Rainha das grandes coletividades,
mas também como Mãe das pequenas unidades.
A variedade de invocações à
Virgem Maria
Eu até tenho visto instituições familiares com uma
devoção especial por essa ou aquela invocação de Nossa Senhora, como
representando uma relação especial d´Ela com determinada família. Assim, esse
padroado de Nossa Senhora toma um sentido ainda mais pormenorizado. Na minha
família paterna, por exemplo, há a devoção a Nossa Senhora da Piedade, que é
comum entre todos os membros da família Corrêa de Oliveira. Quer dizer, é mais
uma invocação, mais uma acomodação desse trato de Nossa Senhora com os homens. E
por vezes existe ainda uma devoção para cada um individualmente.
Há, portanto, uma espécie de refração da imagem de
Nossa Senhora, segundo várias grandezas, várias distâncias, vários sentidos,
várias dimensões, povoando o firmamento mental do homem de vários modos.
O surgimento da devoção à Virgem
Mãe Aparecida
Nessa perspectiva é que devemos considerar a
devoção a Nossa Senhora Aparecida como Rainha do Brasil. A América Latina tem
como padroeira Nossa Senhora de Guadalupe, e no Brasil nós temos Nossa Senhora
Aparecida. O que isso significa para nós?
É interessante notar como essa devoção nasceu, que
características tomou e como foi se desenvolvendo ao longo da história do
Brasil. Sabemos que ela nasceu no Vale do Paraíba, e conhecemos o seu ponto de
partida. Em outubro de 1717, três pescadores [Domingos Garcia, João Alves e
Filipe Pedroso] estavam pescando no Rio Paraíba. De repente eles “pescam” com
suas redes um tronco de imagem, e mais adiante a cabeça da imagem. A pescaria,
que estava muito difícil até aquele momento, tornou-se abundante. Depois eles
construíram junto ao rio uma capelinha para a imagem que tinham encontrado,
substituída mais tarde por uma capela maior. Muitos anos depois, ergueu-se no
local uma Igreja [Trata-se da chamada “Basílica Velha”, ainda em nossos dias
aberta aos fiéis, que data de 1888. No ano em que Dr. Plinio pronunciou esta
conferência, a atual Basílica, “Santuário Nacional”, ainda não estava
construída., Sua inauguração ocorreu somente em 1980].
As graças ali alcançadas foram acentuadamente
numerosas. O povo começou a afluir em quantidade, recebendo graças
extraordinárias, entre as quais se conta uma que é famosa: um escravo chamado
Zacarias, perseguido por seu senhor, tendo rezado diante da Imagem Aparecida,
pediu sua libertação. Percebeu ele, de repente, que suas algemas se partiram,
ficando livre delas. E seu senhor, que iria puni-lo ferozmente, porque tinha
fugido, viu-se desarmado, e concedeu ao escravo a liberdade. As correntes e
algemas ainda se conservam na sala dos milagres na cidade de Aparecida.(1)
Nossa Senhora, Rainha do Brasil
Desde então a devoção a Nossa Senhora Aparecida se
tem generalizado. Populações daquela zona do norte do Estado de São Paulo, como
também de Minas Gerais, do Estado do Rio etc, confluem para ali; e Nossa
Senhora vai atendendo aqueles devotos, concedendo continuamente graças
extraordinárias.
Mas, ao mesmo tempo em que isto se dava, a devoção
a Nossa Senhora Aparecida foi marcando a vida da Igreja. A tal ponto que, no
pontificado de São Pio X, Ela foi coroada solenemente Rainha do Brasil, em 8 de
setembro de 1904. Coroação efetivada num ato oficial, na presença de muitos
membros do Episcopado nacional. De acordo com um decreto da Santa Sé, Nossa
Senhora Aparecida passou a ser Rainha do Brasil. Depois, em julho de 1930, Pio
XI declarou Nossa Senhora Aparecida Rainha e Padroeira do Brasil.
A Santa Sé tem o direito de constituir uma
padroeira para determinada nação, bem como o de erigir uma realeza dessa
natureza, que estabelece um vínculo especial de um determinado povo com Nossa
Senhora, e — o que é mais estupendo — da Santíssima Virgem com esse povo. O
poder de desligar e ligar na Terra e no Céu tem, entre outros, esse efeito.(2)
E Nossa Senhora, portanto, ficou sendo no Céu a
verdadeira Rainha do Brasil. Esse fato nos deve ser muito grato, porque devemos
ver nele um prenúncio do Reino de Maria.(2)
Rainha do Brasil: direitos
efetivos em nossa Pátria
Nossa Senhora aclamada Rainha do Brasil, o Reino de
Maria, juridicamente, já ficou declarado. E juridicamente, para os efeitos
celestes e para os efeitos terrestres, Nossa Senhora tem direitos sobre o
Brasil ainda maiores do que se Ela fosse Rainha apenas nesta Terra.
Devido a isto, temos uma obrigação especial de
cultuar Nossa Senhora; de dar glória a Ela; de espalhar sua devoção por toda
parte; de lutar junto aos outros povos que resistam ao culto de Nossa Senhora;
de fazer, portanto, cruzadas em nome d´Ela. Com isso, é toda uma vocação
nacional e mundial que se delineia para o Brasil, a partir precisamente dessa
devoção a Ela como nossa Rainha.
Aparecida, enquanto capital
espiritual do País
Daí decorre também outro fato: se o Brasil não
fosse oficialmente o País agnóstico e interconfessional que é, o verdadeiro
seria, para determinados efeitos, a capital autêntica do Brasil ser Aparecida.
Após Nossa Senhora ter sido declarada Rainha do
Brasil, eu não concebo a possibilidade de que os grandes atos da vida nacional
se realizem em outro lugar que não em Aparecida: a promulgação de leis
importantes; declaração de guerra; tratados de paz; grandes solenidades das
ilustres famílias do País. Eu só concebo tais atos sendo realizadas em
Aparecida, que, pelo ato dessa coroação, ficou sendo o centro espiritual do
País.
No momento em que tanto se discute “Brasília ou
Rio”, nós esquecemos o verdadeiro pólo: Aparecida, para esses efeitos, a
verdadeira capital do País! Assim tem-se a perspectiva de como Aparecida
deveria ser considerada.
O reinado do Coração Imaculado de
Maria no Brasil
É bonito imaginar como será a Basílica de Nossa
Senhora Aparecida, quando for instaurado no Brasil o Reino de Maria [predito
por São Luís Grignion]. Que honra, que pompa, que grandeza, que nobreza, que
elevação essa basílica deveria ter!
Podemos imaginar uma grande conjunção de ordens
religiosas contemplativas que deveriam se estabelecer naquela região; grandes
confessores que fossem confessar ali, para fazer bem às almas; centros
especiais de cursos para intensificação da devoção mariana; enfim, quanta e
quanta coisa.
São desejos que não estão no reino dos sonhos.
Estão no reino dos ideais. Nós, que confiamos na Providência Divina, sabemos
bem a diferença que há entre um sonho e um ideal. Para o homem que não confia
na Providência, todo ideal não é senão um sonho; para o que confia, muita coisa
que parece sonho é um ideal realizável. Devemos esperar que Ela realize tais
fatos, e fazer tudo para apressar esse dia — dia da constituição naquela
localidade de uma ordem de coisas como deve ser, sintoma da remodelação de
todas as coisas no Brasil e no mundo, para o cumprimento da promessa de Nossa
Senhora em Fátima: “Por fim o meu Imaculado Coração triunfará”.
É para o triunfo do reinado do Coração Imaculado de
Maria — que no Brasil se apresenta sob a devoção a Nossa Senhora Aparecida —
que devemos rezar”.
* * *
Em 1972, o Brasil completava um século e meio de
sua independência. Por ocasião desse sesquicentenário, Plinio Corrêa de
Oliveira publicou, na “Folha de S. Paulo”, artigo merecedor de figurar numa
antologia. Tal a elevação de seu teor, que muitos o qualificaram como sendo uma
oração pelo Brasil dirigida à nossa Rainha e Padroeira. Ao mesmo tempo,
agradecimento, pedido de perdão e súplica: agradecimento pela
grandiosa missão concedida pela Divina Providência ao nosso País; perdão pelos
desvios nessa esplêndida missão; súplica para que, apesar de
tais desvios, a nação brasileira atinja, no mais alto grau, sua missão
histórica:
Prece do sesquicentenário
“Ó Senhora Aparecida.
Ao aproximar-se a data em que completamos um século
e meio de existência independente, nossas almas se elevam até Vós, Rainha e Mãe
do Brasil. Cento e cinqüenta anos de vida são, para um povo, o mesmo que quinze
para uma pessoa: isto é, a transição da adolescência — com sua vitalidade, suas
incertezas e suas esperanças — para a juventude, com seu idealismo, seu arrojo
e sua capacidade de realizar.
Neste limiar entre duas eras históricas, vamos
transpondo também outro marco. Pois estamos entrando no rol das nações que, por
sua importância, determinam o rumo dos acontecimentos presentes e têm em suas
mãos os fios com que se tece o futuro dos povos.
Agradecimento
Neste momento rico em esperanças e glória, ó
Senhora, vimos agradecer-Vos os benefícios que, Medianeira sempre ouvida, nos
obtivestes de Deus onipotente.
Agradecemo-Vos o território de dimensões
continentais e as riquezas que nele pusestes.
Agradecemo-Vos a unidade do povo, cuja variegada
composição racial tão bem se fundiu na grande caudal étnica de origem lusa, e
cujo ambiente cultural, inspirado pelo gênio latino, tão bem assimilou as
contribuições trazidas por habitantes de todas as latitudes.
Agradecemo-Vos a Fé católica, com a qual fomos
galardoados desde o momento bendito da Primeira Missa.
Agradecemo-Vos nossa História serena e harmoniosa,
tão mais cheia de cultura, de preces e de trabalho do que de desavenças e
guerras.
Agradecemo-Vos nossas guerras justas, iluminadas
sempre pela auréola da vitória.
Agradecemo-Vos nosso presente, tão cheio de realizações
e de esperanças de grandeza.
Agradecemo-Vos as nações deste Continente, que nos
destes por vizinhas, e que, irmanadas conosco na Fé e na raça, na tradição e
nas esperanças do porvir, percorrem ao nosso lado, numa convivência sempre mais
íntima, o mesmo caminho de ascensão e de êxito.
Agradecemo-Vos nossa índole pacífica e
desinteressada, que nos inclina a compreender que a primeira missão dos grandes
é servir, e que nossa grandeza, que desponta, nos é dada não só para nosso bem,
mas para o de todos.
Agradecemo-Vos o nos terdes feito chegar a este
estágio de nossa história no momento em que pelo mundo sopram tempestades, se
acumulam problemas, e terríveis opções espreitam, a cada passo, os indivíduos e
os povos. Pois esta é, para nós, a hora de servir ao mundo, realizando a missão
cristã das nações jovens deste hemisfério, chamadas a fazer brilhar, aos olhos
do mundo, a verdadeira luz que as trevas jamais conseguirão apagar.
Prece
Nossa oração, Senhora, não é, entretanto, a do
fariseu orgulhoso e desleal, lembrado de suas qualidades mas esquecido de suas
faltas. Pecamos. Em muitos aspectos, nosso Brasil de hoje não é o País
profundamente cristão com que sonharam Nóbrega e Anchieta. Na vida pública como
na dos indivíduos, terríveis germes de deterioração se fazem notar, que mantêm
em sobressalto todos os espíritos lúcidos e vigilantes.
Por tudo isto, Senhora, pedimo-Vos perdão.
E, além do perdão, Vos pedimos forças. Pois sem o
auxílio vindo de Vós, nem os fracos conseguem vencer suas fraquezas nem os bons
alcançam conter a violência e as tramas dos maus.
Com o perdão, ó Mãe, pedimo-Vos também a bênção.
Quanto confiamos nela!
Sabemos que a bênção da Mãe é preciosa condição
para que a prece do filho seja ouvida, sua alma seja rija e generosa, seu
trabalho seja honesto e fecundo, seu lar seja puro e feliz, suas lutas sejam
nobres e meritórias, suas venturas honradas, e seus infortúnios dignificantes.
Quanto é rica destes e de todos os outros dons
imagináveis a Vossa bênção, ó Maria, que sois a Mãe das mães, a Mãe de todos os
homens, a Mãe Virginal do Homem-Deus!
Sim, ó Maria, abençoai-nos, cumulai-nos de graças
e, mais do que todas, concedei-nos a graça das graças: ó Mãe, uni intimamente a
Vós este Vosso Brasil.
Amai-o mais e mais.
Tornai sempre mais maternal o patrocínio tão
generoso que nos outorgastes.
Tornai sempre mais largo e mais misericordioso o
perdão que sempre nos concedestes.
Aumentai vossa largueza no que diz respeito aos
bens da Terra, mas, sobretudo, elevai nossas almas no desejo dos bens do Céu.
Fazei-nos sempre mais amantes da paz e sempre mais
fortes na luta pelo Príncipe da Paz, Jesus Cristo, Filho vosso e Senhor nosso.
De sorte que, dispostos sempre a abandonar tudo
para lhe sermos fiéis, em nós se cumpra a promessa divina do cêntuplo nesta
Terra e da bem-aventurança eterna.
Ó Senhora Aparecida, Rainha do Brasil! Com que
palavras de louvor e de afeto Vos saudar no fecho desta prece de ação de graças
e súplica? Onde encontrá-las, senão nos próprios Livros Sagrados, já que sois
superior a qualquer louvor humano?
De Vós exclamava profeticamente o povo eleito,
palavras que amorosamente aqui repetimos:
— Tu gloria Jerusalem, tu laeticia Israel, tu
honorificentia populi nostri.
Sois Vós a glória, Vós a alegria, Vós a honra deste
povo que Vos ama”.(4)
* * *
Atentado sacrílego perpetrado
contra nossa Padroeira
Motivos para se pedir perdão não nos faltam. Pois é
enorme o afastamento do povo brasileiro em relação à sua grandiosa vocação —
tão manifesta na virtude e na fibra dos heróis de seu glorioso passado. Um
tufão de imoralidade varre o País de norte a sul e o faz jazer numa decadência
de costumes sem precedentes. Muitos se entregam sem luta, pois querem “gozar
a vida”; outros vacilam entre o Reino de Nossa Senhora e um reino meramente
terreno; ou, ainda pior, vacilam entre o Reino de Nossa Senhora e o reino do
demônio.
Nessa encruzilhada, deu-se no Brasil um fato
terrivelmente sinistro: o brutal e sacrílego atentado contra nossa Rainha e
Mãe, que reduziu sua imagem a pedaços.
Naquele trágico 16 de maio de 1978 — dia negro em
nossa história — o povo brasileiro recebeu atônito a inacreditável notícia da
quebra da bendita imagem. Ato perpetrado por um protestante que, após tê-la
arrancado de seu trono no altar, espatifou-a em quase 200 cacos jogando-a ao
chão. O Brasil inteiro ficou chocado. A comoção foi geral na opinião pública
católica. De todos os lábios afluía a indagação: “Por quê?”. Por que teria Deus
permitido tamanha afronta contra a sagrada imagem de Sua Mãe Santíssima? Um
castigo? Não teria Deus permitido o nefando atentado devido à decadência moral
de nosso povo?
Plinio Corrêa de Oliveira manifestou publicamente,
também pelas páginas da “Folha de S. Paulo”, sua consternação, sua filial
reparação e sua repulsa ao brutal ato sacrílego contra a veneranda imagem:
A Imagem que se partiu
“O Brasil, há mais de dois séculos, venera Nossa
Senhora como sua especial Padroeira. E essa veneração se dirige a Ela sob a
invocação de Imaculada Conceição Aparecida.
— Nossa Senhora Aparecida!
A exclamação acode freqüentemente ao espírito dos
brasileiros. E sobretudo nas grandes ocasiões. Pode ser o brado de uma alma
aflita que se dirige a Deus pela intercessão da Medianeira que nada recusa aos
homens, e à qual Deus, por sua vez, nada recusa. Pode igualmente ser a
exclamação de uma alma que não se contém de alegria e extravasa seu
agradecimento aos pés da Mãe, de quem nos vêm todos os benefícios.
A história da pequena imagem de terracota escura —
com o seu grande manto azul sobre o qual resplandecem pedras preciosas, e
cingindo à fronte a coroa de Rainha do Brasil — encheria livros. Esses livros,
se fossem concebidos como eu os imagino, deveriam conter não só os insignes
fatos históricos que a Ela se prendem, mas também, em apêndice, as legendas que
a piedade popular a respeito deles teceu. É da amálgama de uma coisa e outra —
história séria e incontestável, e legenda graciosa — que resulta a imagem
global da Aparecida como ela existe no coração de todos os brasileiros:
? o escravo que rezava aos pés da Senhora
concebida sem pecado original, ao mesmo tempo que dele se acercava o dono
inclemente, quando as algemas se rompem, o coração do amo que se comove, etc.;
o Príncipe Regente que saudava a imagem no decurso
do trajeto que o levava do Rio a São Paulo, onde iria proclamar a Independência
e fazer-se imperador;
o ato do novo monarca colocando oficialmente o
Brasil sob a proteção da Virgem Imaculada Aparecida;
a coroação da imagem com a riquíssima coroa de ouro
cravejada de brilhantes, oferecida anos antes pela Princesa Isabel, coroação
feita em 8 de setembro de 1904 pelos bispos da Província Meridional do Brasil e
de outros pontos do País, em razão do decreto do Cabido da Basílica Vaticana,
aprovado por São Pio X;
o velho Venceslau Brás, ex-presidente da República,
assistindo piedoso, no jubileu de prata da coroação da imagem, à missa
hieraticamente celebrada por D. Duarte Leopoldo e Silva, reluzente daquela como
que majestade episcopal tão caracteristicamente dele;
a solene proclamação do decreto do papa Pio XI, de
16 de julho de 1930, constituindo e declarando “a Beatíssima Virgem Maria,
concebida sem mácula, sob o título de Aparecida, padroeira principal de todo o
Brasil, diante de Deus”;
a apoteótica manifestação do dia 31 de maio de
1931, em que o episcopado nacional, diante da milagrosa imagem levada triunfalmente
ao Rio de Janeiro em trem-santuário, na presença das maiores autoridades civis
e militares e em união com todo o povo — mais de um milhão de pessoas! —
consagrou o País a Nossa Senhora da Conceição Aparecida.
E assim por diante, sem falar das curas, aos
milhares. Quantos milhares? Cegos, aleijados, paralíticos, leprosos, cardíacos,
que direi eu mais! Multidões e multidões sem conta de devotos, vindas do Brasil
inteiro, com as mães contando às criancinhas, ao voltarem para os lares, alguma
narração piedosa sobre a santa, inventada na hora ou ouvida da avó ou da
bisavó. Bem entendido, narração enriquecida, de geração a geração, com mais
pormenores maravilhosos.
Tudo isso levava o Brasil inteiro a emocionar-se —
e com quanta razão — ante a pequena Imagem de terracota escura, vendo nela o
sinal palpável da proteção de Nossa Senhora.
E o sinal se quebrou.
Por sua vez, essa quebra não será um sinal? Sinal
de quê?
A julgar pelas narrações da imprensa, os pormenores
do fato ocorrido estão envoltos em mistério. [...] Nosso público, habitualmente
informado com inútil luxo de pormenores acerca de qualquer crime do gênero dos
que entram na triste rotina das grandes cidades contemporâneas, entretanto
pouco sabe desse sacrilégio trágico que marca a fundo a história de Aparecida,
a história religiosa do Brasil e por isto, pura e simplesmente, a história do
Brasil. [...]
Amigos meus que conversaram há dias com altíssima
personalidade eclesiástica, dela ouviram que o sacrilégio teria relação com a
aprovação do divórcio no Brasil.
A hipótese faz pensar. Talvez, entristecida a fundo
pela promulgação do divórcio, Nossa Senhora, ao permitir o crime, tenha querido
fazer ver ao povo brasileiro seu desagrado pelo fato. Seria bem isso? Sem
dúvida, a introdução do divórcio foi um gravíssimo pecado coletivo cometido
pela Nação brasileira. [...]
Há dois aspectos pelos quais a aprovação do
divórcio pode ser relacionada com o crime sacrílego. De um lado, se o divórcio
foi aprovado, é porque a resistência contra o mesmo foi insuficiente. Quando o
sr. N. Carneiro era aclamado aos brados pelo plenário do Congresso e por uma
minoria que abarrotava as galerias, logo depois da aprovação da lei, a Nação
dormitava. E essa soneira em hora tão grave exprime, por sua vez, uma flagrante
falta de zelo. Pois não nos basta não fazer uso da lei. Se não a queríamos, por
que não a impedimos?
Por outro lado, como não reconhecer nesse
censurável indiferentismo, não um estado de espírito de momento, mas uma
atitude de alma resultante de efeitos ainda muito mais profundos?
Quando a moralidade das modas decai
assustadoramente, quando os costumes sociais se degradam a todo momento e a
limitação da natalidade, praticada por meios condenados pela Igreja, vai
ganhando proporções assustadoras, prepara-se o caldo de cultura para o
comunismo. Este, embuçado em criptocomunismos, eurocomunismos, socialismos e
outros disfarces ideológicos, vai avançando. Como não reconhecer nisto um
complexo de circunstâncias nas quais se insere, com toda a naturalidade, o
divórcio?
Isto dito, como não lembrar a profecia de Nossa
Senhora, feita em Fátima pouco depois da queda do tzarismo?
Eis as palavras d’Ela: ‘Se atenderem a meus
pedidos, a Rússia se converterá e terão paz; se não, espalhará seus erros pelo
mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja; os bons serão martirizados,
o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas; por fim,
o meu Imaculado Coração triunfará’.
É impossível não perguntar se existe uma relação
entre essa trágica e materna previsão, desatendida pelo mundo ao longo dos
últimos sessenta anos, e a também trágica ocorrência de Aparecida. Não será
esta um eco daquela? Um eco destinado especialmente ao Brasil, pois que entre
nós, e contra a Imagem de nossa Padroeira, o crime se deu.
Especialmente para o Brasil, sim; exclusivamente
para o Brasil, quiçá não. Pois nosso País é o que tem hoje em dia a maior
população católica do globo. E Aparecida é, depois de Guadalupe, o santuário
mariano de maior afluxo de peregrinos em todo o orbe. Pelo que, quanto aqui
ocorra em matéria de devoção marial tem um significado para o mundo inteiro.
Muitos dirão que a ilação entre Fátima e Aparecida
não pode ser afirmada, por falta de provas cabais. Não entro aqui na análise da
questão. Pergunto simplesmente se há quem se sinta com base para negá-la...”(5)
Previsões de Fátima e atentado em Aparecida
O autor menciona a lei do divórcio, aprovada no
Brasil em 1977, como um dos motivos do entristecimento de nossa excelsa Rainha,
devido aos pecados de seu povo. Mas tal aprovação deu-se há 27 anos. O que
diria ele, se esse artigo fosse redigido nos presentes dias? Muito mais do que
naquela época, o Brasil de hoje dá motivos para entristecer sua Rainha e Mãe.
Para ficarmos apenas no âmbito da instituição familiar, consideremos o atual
desfazimento da família: a desagregação dos vínculos entre pais e filhos; as
modas imorais; a negação do valor da virgindade; o “amor livre” — ou a “união
livre” — que penetra na sociedade; a promiscuidade sexual; o controle
artificial da natalidade e a pílula anticonceptiva; o aborto que se pratica em
larga escala; a quebra da barreira de horror que havia no povo
brasileiro em relação ao chamado casamento homossexual.
São os erros do comunismo, previstos
por Nossa Senhora em Fátima e mencionados no artigo acima, envenenando nosso
povo. Podemos ver aí a ilação entre Fátima e o atentado sacrílego em Aparecida,
pois não se atendeu aos pedidos de Nossa Senhora, manifestados em 1917.
É devido a esse conjunto de fatores que o espaço
perdido pela Igreja Católica vem sendo preenchido por seitas protestantes,
“evangélicas” etc., atraindo os católicos com suas falsas doutrinas e
interpretando a seu modo os ensinamentos da Bíblia.
Peçamos a nossa Mãe e Rainha que tenha pena do povo
brasileiro, que Ela tanto amou. Assim como a imagem de Nossa Senhora da
Conceição Aparecida foi restaurada, imploremos que Ela restaure também em
nossas almas o amor e a íntegra fidelidade aos ensinamentos imutáveis da
Igreja. Fidelidade que consiste em amar a verdade e rejeitar inteiramente
os erros do comunismo, espalhados pelo mundo inteiro. Desse
modo, este povo poderá obter as graças para restaurar a grandeza de seu
glorioso passado e construir um futuro ainda mais esplêndido.
Nossa Senhora, Rainha destronada
Além do gravíssimo atentado sacrílego referido
acima, em nossa época outros ultrajes são perpetrados contra a Senhora
Aparecida. De passagem, citemos alguns: em 12-10-95, o pastor protestante
Sérgio Von Helder, chutou uma cópia da imagem d’Ela, perante câmaras de
televisão; em 4-4-99, o evangélico Carlos Antonio Macedo
atirou uma pedra na bendita imagem (não sendo ela danificada, porque a protegia
um vidro blindado); filmes, shows e teatros com peças blasfemas, que ridicularizam
Nossa Senhora; grupos evangélicos que, por meio de projeto de
lei, tentam destronar Nossa Senhora, arrancando-lhe o título de Rainha do
Brasil; e outros que tentam eliminar o feriado nacional de 12 de outubro, em
honra à Virgem Mãe Aparecida.
Como percebemos, Ela continua a ser virulentamente
atacada pelos inimigos e abandonada até por filhos. E nós? Nada faremos para
desagravar essa situação? Ficaremos de braços cruzados?
Em exposição pronunciada em 26-2-1966, o Prof.
Plinio narra a seguinte metáfora:
“Nossa Senhora é como uma Rainha que está sentada
no seu trono. A sala está cheia de inimigos. Os inimigos já arrancaram-lhe o
dossel, já tiraram da sua fronte veneranda a coroa de glória a que Ela tem
direito, já lhe arrancaram das mãos o cetro. Ela está amarrada para ser morta.
Dentro dessa sala cheia de gente poderosa, armada,
influente — todos diante da Rainha que não faz outra coisa senão chorar —, há
também um pugilo de fiéis, e Ela evidentemente olha para tais fiéis. Assim, ou
este olhar faz em nós o que o olhar de Jesus fez em São Pedro, ou não há mais
nada para dizer…
A Rainha vai ser arrancada do trono. Pergunta-se: o
que nós vamos fazer? Nesta hora deste olhar, isso não me interessa? Este olhar
não me sensibiliza?
Poder-se-ia então perguntar: quem sou eu? Eu sou o
homem para quem Nossa Senhora olhou!
Mas serei o homem a quem Ela terá olhado em vão?”.
* * *
Neste centenário da coroação de nossa Rainha —
ocasião propícia a especiais graças —, supliquemos a Ela a graça de não permanecermos
indiferentes a tão maternal olhar, de não ficarmos de braços cruzados perante
os ultrajes lançados contra Ela.
Somente assim seremos súditos dignos da celestial
Rainha, e o Brasil merecedor de sua augusta Padroeira. Temos tudo para realizar
as promessas de um grandioso porvir na maior nação católica da Terra, pois
temos a melhor de todas as Rainhas — uma vez que a Rainha do Brasil é a Mãe do
Rei dos reis.
Notas:
1. Vide Catolicismo,
Nº 502, outubro/1992. Ao leitor desejoso de conhecer maiores detalhes desse
milagre, e de vários outros operados por meio de Nossa Senhora da Conceição
Aparecida, aconselhamos o livro Rainha
do Brasil — A maravilhosa história e os milagres de Nossa Senhora da Conceição
Aparecida, de Gustavo Antonio Solimeo e Luiz Sérgio Solimeo (Diário
das Leis, São Paulo, 1992). Pedido pelo tel.: (11) 3331-4522
2. O autor refere-se ao Poder
das Chaves, comunicado por Jesus Cristo a São Pedro: “Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei
a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei
as chaves do Reino dos Céus; tudo o que ligares na Terra será ligado nos Céus,
e tudo o que desligares na Terra será desligado nos Céus” (Mt 16,
17-19).
3. Entende-se Reino de
Maria — previsto em Fátima e tão desejado por Plinio Corrêa de
Oliveira — no sentido empregado por São Luís Maria Grignion de Montfort (grande
missionário francês do século XVII e Doutor marial) em seus escritos,
especialmente no célebre Tratado
da verdadeira devoção à Santíssima Virgem: “Quando virá este tempo feliz em que Maria será estabelecida Senhora e
Soberana nos corações, para submetê-los plenamente ao império de seu grande e
único Jesus? [...] Que venha o Reino de Maria, para que assim venha o Vosso [de
Jesus Cristo] Reino” (São Luís Maria G. de Montfort, Tratado da verdadeira devoção à Santíssima
Virgem, Vozes, Petrópolis, 1984, 13ª ed., pp. 210-211).
4. Plinio Corrêa de Oliveira, Prece no sesquicentenário, “Folha de S. Paulo”, 16-1-1972.
5. Plinio Corrêa de Oliveira, A Imagem que se partiu, “Folha de S. Paulo”, 29-5-1978.
* * *
A coroação da Rainha do Brasil
A caminho de São Paulo, em 20 de agosto de 1822,
o então Príncipe D. Pedro subiu a ladeira que conduz à antiga Capela de Nossa
Senhora Aparecida, e lá orou para ser bem sucedido na solução dos múltiplos
problemas políticos dos quais, pouco depois, resultaria a proclamação da
Independência.
Em 1845 e 1865, segundo consta, o Imperador D.
Pedro II e a Imperatriz D. Teresa Cristina também visitaram a Capela da
Aparecida.
A Princesa Isabel lá esteve devotamente em 1868.
Após a promulgação da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, como prova de sua Fé
e de seus sentimentos cristãos, ofertou à Imagem da Senhora Aparecida uma
artística coroa de ouro 24 quilates, pesando 300 gramas e cravejada com 24
diamantes maiores e 16 menores. Seu valor histórico supera de longe seu
inegável valor material.(*)
Serviu ela para a coroação da Imagem no dia 8 de
setembro de 1904, aprovada por São Pio X e efetuada pelas mãos do então Bispo
de São Paulo, D. José de Camargo Barros, na presença do Núncio Apostólico, e
de outros 13 bispos, de grande número de sacerdotes e religiosos, bem como de
15 mil peregrinos.
No dia 16 de julho de 1930, Pio XI declarou Nossa
Senhora Aparecida Rainha e Padroeira do Brasil. A solene proclamação pública
se deu no dia 31 de maio do ano seguinte, na Esplanada do Castelo, no Rio de
Janeiro, depois de apoteótica procissão, com a participação de todos os
bispos brasileiros, do chefe de Estado, ministros e mais de um milhão de
fiéis.[...]
O Brasil terá um esplêndido porvir, se seguir o
caminho de Nossa Senhora. E é esse provir, carregado de bênçãos, de virtude e
de grandeza cristã, que imploro a Nossa Senhora Aparecida para nossa pátria.
Plinio Corrêa de Oliveira
* No dia 8 do corrente, em homenagem pelos 100 anos
da coroação, a Imagem da Padroeira receberá nova coroa. A antiga será
restaurada e guardada no Museu do Santuário, devendo ser utilizada apenas em
ocasiões especiais.
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