“Se como união natural fora, desde o início,
instituído para a propagação do gênero humano, o Matrimônio foi depois elevado
à dignidade de Sacramento, a fim de que se gerasse e criasse um povo para o
culto e adoração do verdadeiro Deus e de Cristo Nosso Salvador”
Sensus fidei: A perene doutrina da
Igreja Católica não mudou. É a mesma que nossos pais e antepassados sempre
entenderam, praticaram e ensinaram a respeito do Sacramento do
Matrimônio e a instituição da Família, segundo o ensino perene da
Igreja Católica.
Mas, sabemos que há um poderoso ataque
orquestrado contra o núcleo da Criação divina: a Família. As pressões dos
arquitetos e ideólogos globalistas, por meio de suas engenharias sociais,
fazem-na inimiga e inconcebível dentro de seu novo modelo
civilizacional, que está substituindo a Civilização Cristã pela sua utópica e
revolucionária Nova Ordem Mundial. Portanto, para esses ideólogos, é urgente
exterminá-la, desconfigurando-a em sua própria natureza conforme planejada e
concebida pelo Criador. Ninguém está imune a essas pressões e ataques.
Nunca foi tão oportuno estudar e
conhecer a Doutrina Católica, pelo menos em seus aspectos mais básicos e
essenciais, como nos dias de hoje. Fica aqui o singelo convite e também o
nosso fraternal apelo para a divulgação desse tema. Como simples fiéis, não é
necessário nos tornarmos teólogos ou filósofos para entender a Lei de
Deus, cuja razão de ser visa unicamente a nossa própria salvação eterna. A
Lei do Senhor é simples e clara. Contudo, precisamos efetivamente
conhecê-la, conforme ensinada desde sempre, através da Revelação, da Tradição e
do Magistério perene. E praticá-la, guardando-a em nossas mentes, corações e
conduta.
Não serei então confundido, se
fixar os olhos nos vossos mandamentos. (Salmos 118, 6)
Seja perfeito meu coração na
observância de vossas leis, a fim de que eu não seja confundido. (Salmos 118,
80)
* * *
CATECISMO
ROMANO
Capítulo
VIII
Do
Sacramento do Matrimônio
I.
Importância da
1. Virgindade
1. Como
os pastores devem empenhar-se em que o povo cristão tenha uma vida feliz e
perfeita, seria muito para desejar formulassem os mesmos votos que o Apóstolo
fazia pelos Coríntios, quando lhes escreveu nestes termos: “Por mim, eu quisera
que todos os homens fossem como eu”, isto é, que todos observassem a virtude da
continência.
Realmente, nesta vida não pode
haver maior ventura para os fiéis, do que repousar o coração no exercício da
piedade e na meditação das coisas celestiais, desde que ele já não se distrai
com nenhuma preocupação mundana, e que dominou e reprimiu os maus instintos da
Carne.
2. …
o Matrimônio
Como,
todavia, o próprio Apóstolo adverte que “cada um recebe de Deus o seu dom
particular, um desta maneira, outro daquela”; como também o Matrimônio foi
enriquecido de grandes valores espirituais, pois é um Sacramento próprio e
verdadeiro, entre os demais Sacramentos da Igreja Católica; como Nosso Senhor
honrou, com Sua presença, a celebração de umas núpcias: daí se deduz, com
bastante evidência, a necessidade de tratarmos também da doutrina sobre o
Matrimônio.
3.
Doutrina de S. Pedro e S. Paulo
Isso
tanto mais, quando vemos São Pedro e S. Paulo tratarem detidamente, em várias
passagens, não só da dignidade do Matrimônio, mas também das obrigações que lhe
são inerentes. Iluminados pelo Espirito de Deus, viam, perfeitamente, quantos e
quão grandes benefícios deviam resultar para a sociedade, se os fiéis
conhecessem bem a santidade do Matrimônio, e a guardassem inviolavelmente: de
outro lado, como seriam inúmeros e gravíssimos os danos e provações que
recairiam sobre a Igreja, se não fosse reconhecida e respeitada essa mesma
santidade.
De início, pois, devemos explicar
a natureza e as propriedades do Matrimônio. Uma vez que os vícios costumam
disfarçar-se em aparências de virtude, é preciso tomar precauções, para que os
fiéis não se iludam com simulacros de casamento, e não manchem a alma com
torpezas e excessos pecaminosos. Para entrar na explicação da matéria,
começaremos pelo significado etimológico da palavra.
II.
Noção do Matrimônio
1. Nome
2.
Chama-se “Matrimônio”, porque o fim principal que a mulher deve propor-se,
quando casa, é tornar-se mãe.
Noutros termos: porque a função
própria de uma mãe é conceber, dar à luz, e criar a sua prole.
Chama-se também “conjúgio”, do
étimo latino “coniungere”, porque a legítima esposa e o marido ficam, por assim
dizer, ligados um ao outro, por meio de um jugo comum. Dá-se-lhe, afinal, o
nome de “núpcias”,1 porque no dizer
de Santo Ambrósio as donzelas costumavam cobrir-se com um véu, em sinal de
recato; ao mesmo tempo, davam assim a entender que deviam obediência e
submissão a seus maridos.” (Ambros. De Abraham I, 9.)
2.
Definição real
3. No
sentir comum dos teólogos, o Matrimônio se define da maneira seguinte:
“Matrimônio é a união conjugal do homem com a mulher, entre pessoas
canonicamente habilitadas, e que estabelece uma inseparável comunhão de vida”.
Para melhor se compreender esta
definição em suas partes, cumpre ensinar que, num Matrimônio perfeito, deve
haver consentimento interior, contrato exterior manifestado por palavras,
compromisso e vínculo decorrentes desse contrato e união carnal dos cônjuges,
pela qual fica consumado o Matrimônio; mas que nenhum destes elementos determina,
propriamente, a natureza do Matrimônio, senão àquele dever e vínculo reciproco,
expresso pelo próprio sentido da palavra “união”.2
Acrescenta-se “conjugal”,
porquanto nenhuma relação têm, com a natureza do Matrimônio, todas as outras
espécies de contratos, que fazer possam entre si homens e mulheres, para se
auxiliarem mutuamente, por dinheiro ou por outros interesses. Seguem-se as
palavras “entre pessoas canonicamente habilitadas”, porque não podem contrair
núpcias as pessoas que forem legitimamente excluídas. Se o fizerem, são nulas
as núpcias. Por exemplo, os que estão ligados por parentesco até o quarto grau;3 os rapazes antes dos catorze anos, e as donzelas
antes dos doze4 – idade prescrita pelas leis da
Igreja – não podem contrair legítimo Matrimônio.
A última cláusula “estabelecendo
inseparável comunhão de vida” designa o caráter do vínculo indissolúvel, que
liga marido e mulher.
III.
O Matrimônio como instituição jurídica
1. Consentimento, causa
eficiente:
4. Destas
explicações concluímos que, no vinculo, está a natureza e a razão de ser do
Matrimônio. Todavia, em outras definições, vemos teólogos de grande projeção atribuírem
esse valor ao consentimento, de sorte que o Matrimônio é constituído, como eles
dizem, pelo consentimento do homem e da mulher. Isso deve entender-se que o
próprio consentimento é a causa eficiente do Matrimônio, como ensinaram os
Padres do Concilio de Florença.5 Com efeito, o
vínculo obrigatório só pode ter sua origem no mútuo consenso e contrato.
a)
expresso em palavras
de presente…
5. Mas é
absolutamente necessário exprimir o consentimento em termos que se refiram ao
tempo presente. O Matrimônio não é uma simples doação, é um contrato reciproco.
Por conseguinte, não basta o consentimento de uma só parte. Para se contrair
Matrimônio, é preciso o mútuo consentimento, dado por ambas as partes.
É claro que, para manifestar o
mútuo consentimento, se requer o uso de palavras. Se, para haver Matrimônio,
bastasse o consentimento interior, sem nenhuma manifestação externa, seguir-se-ia
necessariamente que duas pessoas, residentes em lugares muito diversos e
distantes, se consentissem interiormente em casar-se, ficariam ligadas por
verdadeiro Matrimônio indissolúvel, antes até que pudessem declarar um ao outro
as suas intenções, quer por carta, quer por mensageiro. Isto, porém, vai de
encontro ao bom-senso humano e às tradições e leis da Santa Igreja.
6. Com razão se diz que o
consentimento precisa ser expresso em palavras que designem tempo presente;6 pois as palavras que indicam tempo futuro, não
constituem o Matrimônio, mas só exprimem os esponsais.
De mais, é evidente que o futuro
ainda não existe. Ora, daquilo que não existe, pouca ou nenhuma firmeza e
duração podemos esperar. Portanto, quem promete casar com uma mulher, nem por
isso adquire sobre ela direitos matrimoniais. Porém, se não cumpriu
imediatamente o que havia prometido, deve, todavia, respeitar a palavra dada.
Se o não fizer, torna-se culpado de perjúrio.7
b) …
de caráter irrevogável
Mas quem
se liga a outra pessoa, mediante o contrato matrimonial, ainda que depois se
arrependa, já não pode mudar, nem anular ou desfazer o que está feito. Por
conseguinte, uma vez que o Matrimônio não consiste numa simples promessa, mas
numa alienação reciproca, pela qual o marido entrega realmente à mulher o poder
sobre o corpo, e a mulher faz outro tanto, com relação ao marido: é necessário
que sua celebração se faça com palavras que exprimam tempo presente. Tanto que
forem proferidas, essas palavras permanecem em vigor, e conservam marido e
mulher ligados por um vínculo Indissolúvel.
c) …
ou expresso por acenos ou sinais.
7.
Entretanto, em lugar de palavras, podem bastar para o Matrimônio não só acenos
e outros sinais que manifestem, claramente, o consentimento no íntimo do
coração, mas também o próprio silêncio, quando a donzela se cala por
acanhamento, e seus pais respondem por ela.8
3. O
vínculo matrimonial não depende, posteriormente, do comércio carnal
8. De
acordo com esta doutrina, os párocos explicarão aos fiéis que a essência e o
efeito do Matrimônio estão no vínculo e compromisso. Para haver verdadeiro
Matrimônio, só se requer o consentimento, na forma que dissemos, mas não é
necessário que haja união dos sexos.
É absolutamente certo que, antes
do pecado, nossos primeiros Pais já estavam unidos por verdadeiro Matrimônio,
muito embora não tivesse ainda havido, entre eles, nenhuma relação carnal,
conforme o testemunham os Santos Padres. Por esse motivo, afirmam os Santos
Padres que o Matrimônio não consiste no comércio carnal, mas no consentimento.
Doutrina, que vemos frequentemente afirmada por Santo Ambrósio, em seu Livro
sobre as Virgens.9
IV.
O Matrimônio, como instituição natural
9. Nesta
altura das explicações, cumpre ensinar que o Matrimônio se apresenta sob dois
aspectos. Pode ser considerado união natural, pois que o Matrimônio não é
invenção humana, mas instituição da natureza: ou como Sacramento, cuja
eficiência vai além das condições normais da natureza.
Ora, como a graça aperfeiçoa a
natureza, pois em primeiro lugar não vem “o espiritual, mas o animal, e depois
o que é espiritual” (I Cor 15, 46.): pede a sequência lógica do assunto que,
antes de tudo, se trate do Matrimônio como função e obrigação da natureza, para
depois tratar dos aspectos, que lhe são próprios, como Sacramentos.
1.
Instituição por Deus:
10. Os fiéis
devem saber, antes de tudo, que o Matrimônio foi instituído por Deus. Está
escrito no Gênesis: ”Criou-os como homem e mulher; e Deus os abençoou, e disse:
“Crescei, c multiplicai-vos”. (Gn I, 27-28.) Logo mais: “Não é bom que o homem
esteja só. Façamos-lhe um auxiliar semelhante a ele mesmo”. (Gn 2,18) Pouco
depois: “Mas para Adão não havia auxílio que lhe fosse semelhante… Mandou,
pois, o Senhor Deus um sono profundo a Adão; quando este pegou no sono,
tirou-lhe [Deus] uma das costelas, e encheu de carne o lugar dela. E da
costela, que havia tirado de Adão, formou o Senhor Deus uma mulher, e levou-a a
Adão. E Adão exclamou: Isto agora é osso dos meus ossos, e carne de minha
carne. Ela se chamará Virago, porque do varão foi tomada. Por isso, deixará o homem
seu pai e sua mãe, e unir-se-á à sua esposa, e serão dois numa só carne”. (Gn
2, 20 ss. Cf Ef. 5, 31)
Estas palavras, como diz o
próprio Nosso Senhor, no Evangelho de São Mateus, provam que o Matrimônio é uma
instituição divina.
a)
como união indissolúvel…
11. Deus,
porém, não se limitou apenas a instituir o Matrimônio. Segundo a definição do
Sagrado Concílio de Trento10, acrescentou-lhe um
nó perpétuo e indissolúvel. Na verdade, Nosso Salvador declarou: “O que Deus
uniu, não deve o homem separá-lo”. (Mt 19, 6; Mc 10, 9.)
Se para o Matrimônio, já como
função da natureza, convém que não haja possibilidade de dissolver-se: o mesmo
se aplica, com a mais forte das razões, ao Matrimônio considerado como
Sacramento. Este caráter sacramental é que também leva ao sumo grau de
perfeição todas as propriedades, que a lei da natureza confere ao Matrimônio.
Além do mais, a dissolubilidade do
vínculo não se compadece com a boa educação da prole e com os outros bens do
Matrimônio.
b)
Importante ao gênero humano como tal, e não ao indivíduo em particular.
12.
Quando disse: “Crescei e multiplicai-vos” (Gn I, 28), Nosso Senhor queria
indicar a finalidade por que havia instituído o Matrimônio, mas não queria
impor a cada homem em particular a obrigação de contraí-lo. Hoje em dia,
propagado como já está o gênero humano, não há nenhuma lei que obrigue a pessoa
a casar-se.11 Pelo contrário, muito se
recomenda o estado de virgindade, que as Sagradas Escrituras a todos apresenta
como melhor do que o estado matrimonial, e provido de maior perfeição e
santidade. Assim o declarou Nosso Senhor e Salvador: “Quem puder compreender,
que compreenda”. (Mt 19, 12) E o Apóstolo falou: “Quanto às virgens, um
conselho, como quem do Senhor conseguiu misericórdia, para ser fiel”. (I Cor 7,
25)
Razões
de ser do Matrimônio:
a) auxílio mútuo…
13.
Agora, vamos explicar as razões por que o homem e a mulher devem unir-se em
Matrimônio. A primeira é a união dos sexos diferentes, apetecida pelo próprio
instinto da natureza, baseada na esperança de mútuo auxílio, para que uma
parte, amparada pela outra, possa mais facilmente sofrer os incômodos da vida,
e suportar a debilidade da velhice.
b)
criação da prole…
A segunda
razão é o desejo de gerar filhos, não tanto para os deixar como herdeiros de
seus bens e riquezas, quanto para os criar como seguidores da verdadeira fé e
religião. Mostram-nos, claramente, as Sagradas Escrituras que era esta a
principal aspiração dos Santos Patriarcas, quando tomavam esposas.
Por isso, ao ensinar a Tobias
como devia rebater o ataque do mau espírito, disse-lhe o Anjo: “Eu te mostrarei
quais são aqueles sobre quem o demônio tem poder. São aqueles que se casam com
tais disposições, que lançam a Deus fora de si e de seu coração, e entregam-se
aos maus apetites, à semelhança do cavalo e do macho, que não têm entendimento:
sobre eles é que o demônio tem poder”. (Tob 6, 16 ss.) Depois, acrescentou:
“Receberás a donzela no temor do Senhor, levado mais pelo desejo de ter filhos,
do que por sensualidade, a fim de conseguires nos filhos a bênção reservada à
descendência de Abraão”. (Tob 6, 22)
…
como único fim primário.
Este é
também o único fim primário, por que Deus havia desde o início instituído o
Matrimônio. Portanto, crime é gravíssimo, quando pessoas casadas impedem a
concepção ou provocam aborto, por meio de medicamentos.12 Tal
proceder equivale a uma ímpia conspiração de homicidas.13
c)
remédio da concupiscência
14. Às
outras razões acresceu uma terceira, depois da queda de nosso primeiro Pai,
quando a concupiscência começou a rebelar-se contra a reta razão, porquanto o
homem perdeu a justiça em que fora criado. Quem pois sente a sua própria
fraqueza, e não quer tomar sobre si a luta contra a carne, deve valer-se do
Matrimônio, como remédio que faz evitar os pecados da incontinência.
Nesse sentido, escreveu o
Apóstolo: “Por causa da luxúria, tenha cada um a sua mulher, e cada mulher o
seu marido”. (I Cor 7, 2) Mais adiante, depois de ensinar que, por causa da
oração, convinha de vez em quando abster-se do débito conjugal, ele acrescentou
a explicação: “Tornai, porém, a viver como de costume, para que Satanás não
venha tentar-vos, por causa de vossa incontinência”. (I Cor 7, 5)
São estas as finalidades do
casamento. Deve ter uma delas em vista quem deseja contrair núpcias, de uma
maneira santa e piedosa, como convém a filhos de Santos”. (Tob 8, 5)
Corolário:
Critérios acidentais.
Se a tais
razões acrescerem outras, que movam o homem a casar-se, e, na escolha da
esposa, a preferir uma pessoa em lugar de outra, pelo desejo de deixar
herdeiro, por causa da riqueza, formosura, nobreza de linhagem, afinidade de
caráter: esses motivos não são em si reprováveis, porquanto não se opõem à
santidade do Matrimônio. Nas Sagradas Escrituras, não vemos que o Patriarca
Jacob merecesse repreensão, porque a Lia preferiu Raquel, por causa de sua
formosura. (Gn 29, 30)
Tais são os pontos que se devem
ensinar acerca do Matrimônio, como união baseada em a natureza.
V. O
Matrimônio como Sacramento:
1. Finalidade
15.
Considerado como Sacramento, devemos explicar que [o Matrimônio] assume um
caráter muito mais sublime, e tende a uma finalidade incomparavelmente mais
elevada.
Se como união natural fora, desde
o início, instituído para a propagação do gênero humano, o Matrimônio foi
depois elevado à dignidade de Sacramento, a fim de que se gerasse e criasse um
povo para o culto e adoração do verdadeiro Deus e de Cristo Nosso Salvador.
Querendo dar uma imagem adequada
de Sua íntima união com a Igreja, e de Seu infinito amor para conosco, Cristo
Nosso Senhor indicou a dignidade de tão grande Mistério, principalmente pela
comparação que fez com essa sagrada união entre o homem e a mulher.
Realmente, essa comparação vem
muito a propósito, porque de todas as relações entre os homens, como no será
fácil verificar, nenhuma prende de maneira mais forte do que o vínculo do
Matrimônio; e porque também marido e mulher estão ligados um ao outro pela mais
intensa caridade e benevolência. Por isso é que as Sagradas Escrituras nos
apresentam, tantas vezes, a união de Cristo com a Igreja sob a imagem de umas
núpcias. (Mt 22, 2; Apoc 21, 2-9.)
2.
Prova de caráter sacramental:
a) São Paulo…
16.
Apoiada na autoridade do Apóstolo, a Igreja sempre teve por certo e averiguado
que o Matrimônio é um Sacramento. Pois assim escreve o Apóstolo aos Efésio:
“Devem os maridos amar suas mulheres, como [amam] os seus próprios
corpos. Quem ama sua mulher, ama-se a si mesmo. Pois ninguém jamais odiou sua
própria carne; pelo contrário, nutre-a e consagra-lhe os cuidados necessário,
assim como o fez Cristo à Sua Igreja, porque somos membros do Seu Corpo, carne
de Sua Carne, osso de Seus Ossos. Por isso, deixará o homem seu pai e sua mãe,
e unir-se-á à sua esposa, e serão dois numa só carne. Este Mistério é grande;
quero, porém, dizer que em Cristo e na Igreja”. (Eph 5, 22 ss.)
Ora, quando [São Paulo] diz que
“este mistério é grande”, ninguém pode duvidar que o diga com referência ao
Matrimônio; porquanto a união do homem com a mulher, estabelecida por Deus, é
um Mistério14, quer dizer, um sinal sagrado
daquele sacratíssimo vínculo que une Cristo Nosso Senhor à Igreja.
b)
Interpretação dos SS. Padres e da Igreja.
17. Nos
comentários dessa passagem, mostram os Santos Padres que tal é o sentido
verdadeiro e próprio daquelas palavras. Assim também o declarou o Sagrado
Concílio de Trento.15
Pois, com toda evidência, quer o
Apóstolo comparar o marido a Cristo, e a esposa à Igreja; por isso, deve o
marido amar sua esposa, e de sua parte deve a esposa amar e respeitar seu
marido. Pois Cristo amou a Igreja, e entregou-Se por ela; por sua vez, como diz
o mesmo Apóstolo, a Igreja está sujeita a Cristo.16
Ora, este Sacramento significa e
confere uma graça; e nisso está principalmente o caráter sacramental. É o que
definem as seguintes palavras do Concílio: “A graça, porém, que devia
aperfeiçoar aquele amor natural, consolidar sua unidade indissolúvel,
santificar os cônjuges, o próprio Cristo no-la mereceu, Ele que é o Autor e
Consumador dos veneráveis Sacramentos”.17
Por conseguinte, devemos ensinar
que a graça deste Sacramento faz com que marido e mulher, unidos pelos laços de
mútua caridade, encontrem satisfação em seu afeto recíproco, não procurem
amores e relações estranhas e ilícitas, e que “o Matrimônio seja honesto”, em
todos os sentidos, “e o leito nupcial imaculado”. (Hb 13, 4)
3.
Excelência do Matrimônio Sacramental:
18. Fácil
será reconhecer quanta vantagem o Sacramento do Matrimônio leva sobre os
casamentos que se celebravam antes ou depois da Lei Mosaica. Apesar de que os
gentios viam no matrimônio algo de divino, e por isso mesmo consideravam
contrários à natureza e dignos de repressão as uniões livres, os estupros, os
adultérios, e outras espécies de libertinagem; todavia, seus matrimônios não
tinham verdadeiro caráter de Sacramento.
Em geral, os Judeus observavam
mais escrupulosamente as leis matrimoniais, e não se pode duvidar que suas
núpcias se revestiam de maior santidade. Como tinham recebido a promessa de que
todos os povos seriam abençoados na descendência de Abraão18, era para eles um grande dever de religião gerar filhos,
e propagar a raça do povo eleito, dentro do qual havia de nascer, como Homem,
Cristo Nosso Senhor e Salvador. Ainda assim, também suas uniões matrimoniais
não tinham o caráter de verdadeiro Sacramento.
19. Acresce uma circunstância. Se
considerarmos o regime matrimonial, quer na lei da natureza, depois do pecado,
quer na Lei dada por Moisés, desde logo reconheceremos que o Matrimônio decaiu
de sua primitiva dignidade moral.
Quando ainda vigorava o regime da
lei natural, muitos houve, entre os antigos Patriarcas, dos quais temos a
certeza de haverem tomado várias mulheres ao mesmo tempo.19
Mais tarde, já na Lei de Moisés,
foi permitido dar libelo de repúdio, se houvesse motivo, e assim divorciar-se
da mulher. (Deut 24, 1 ss.) Ambas as disposições foram abolidas pela Lei do
Evangelho, e o Matrimônio tornou ao seu estado de primitiva pureza. (Mt 19, 9)
Exclui:
a) a poligamia…
Ainda que
alguns dos antigos Patriarcas não mereçam censura, pois não tomaram várias
mulheres sem permissão divina, contudo a poligamia é contrária à natureza do
Matrimônio, como o prova Cristo Nosso Senhor pelas seguintes palavras: “Por
isso, deixará o homem seu pai e sua mãe, e unir-se-á à sua esposa, e serão dois
numa só carne”. (Mt 19, 9) Depois acrescentou: “Portanto, já não serão dois,
mas uma só carne”. (Mt 19, 5 ss.) Com tais palavras, demonstrou que o
Matrimônio foi, de tal maneira, instituído por Deus, que se limita à união de
duas pessoas, e não de várias.
Noutro lugar, aliás, expõe a
mesma doutrina com toda a clareza: “Todo aquele que despedir sua mulher, e
casar com outra, comete adultério contra ela; e, se a mulher repudiar seu
marido e casar com outro, torna-se adúltera”. (Mt 19, 9; Mc 10, 11; Lc 16, 18)
Realmente, se ao homem fora
lícito tomar várias mulheres, nenhuma razão haveria para ser mais culpado de
adultério, um por tomar outra esposa, além da que já tinha em sua casa, do que
outro por se unir a uma segunda mulher, depois na qualidade de verdadeira e
legítima esposa.20
b) …
o divórcio perfeito
20. Esse
mesmo testemunho de Cristo Nosso Senhor demonstra, sem mais, que nenhum
divórcio pode dissolver o vínculo do Matrimônio. Se depois de entregue o libelo
de repúdio, a mulher ficasse realmente livre de sua obrigação para com o
marido, ser-lhe-ia lícito casar com outro homem, se incorrer em nenhum crime de
adultério. Mas Nosso Senhor advertiu expressamente: “Quem repudia sua mulher, e
casa com outra, comete adultério”. (Lc 16, 18; Mt 19, 9; Mc 10, 11)
Por conseguinte, é claro que
nada, senão a morte, pode desfazer o vínculo do Matrimônio. Em abono desta
doutrina, diz também o Apóstolo: “A mulher está ligada à lei, durante todo o
tempo que seu marido viver. Entanto, se lhe morrer o marido, fica livre da lei.
Case com quiser, uma vez que seja no Senhor”. (I Cor 7, 39; Rom 7, 2) E mais
uma feita: “Aos casados, ordeno – não eu, mas o Senhor – que a mulher se não
separe do marido. No caso, porém, de se separar, fique sem casar, ou faça as
pazes com seu marido”. (I Cor 7, 10 ss.)
A mulher que, por justo motivo,
tenha abandonado o marido, deixa, pois, o Apóstolo a escolha de ficar sem outro
casamento, ou de reconciliar-se com seu próprio marido. A Santa Igreja, por sua
vez, não permite que marido e mulher se apartem, um do outro, sem motivos de
maior gravidade.21
4.
Vantagens da indissolubilidade
21. Para
que ninguém ache dura por demais esta lei de absoluta indissolubilidade do
Matrimônio, devemos, pois, explicar as vantagens que lhe são inerentes.
Antes de tudo, faz os homens reconhecerem
que, na realização de casamentos, é preciso atender mais à virtude, à
semelhança de costumes, do que à riqueza e à formosura. Ninguém pode, com
razão, duvidar que isso garante, da melhor maneira possível, a boa harmonia na
vida comum dos casados.
Depois, se o divórcio pudesse
dissolver o casamento, jamais faltariam pretextos aos homens para se
divorciarem, pois o velho inimigo de paz e da pureza lhos haveria de sugerir
todos os dias.
Quando, porém, os fiéis ponderam
de si para consigo que, embora já não tenham convivência conjugal, continuam
todavia ligados pelo vínculo do Matrimônio, e nenhuma esperança lhes fica de
poderem casar com outra mulher: essa consideração faz com que sejam menos
propensos a cóleras e desavenças. Se por vezes de fato a divorciar-se, não
podem suportar, por mais tempo, a saudade do outro cônjuge, e reconciliam-se
facilmente, pela intervenção de pessoas amigas, e retornam à comunhão de vida
conjugal.
Corolário:
O dever de reconciliação:
22.
Entrementes, não devem os pastores omitir uma salutar advertência de Santo
Agostinho. Para mostrar que os fiéis não devem dificultar a reconciliação com
as esposas, das quais se haviam separado
por causa de adultério, desde que
elas se arrependam de seu delito, explica-se ele nos seguintes termos: “Por que
o marido fiel não há de receber outra vez a sua esposa, se a Igreja a recebe
novamente? Ou, por que não perdoará a mulher ao marido adúltero, mas penitente,
“a quem Cristo também já perdoou?”22
Quando a Escritura chama de louco
ao que “retém consigo a mulher adúltera” (Prov 18,22), refere-se. àquela
que, depois de caída, não se arrepende, nem quer largar de sua torpeza.
Assim, torna-se evidente que o
Matrimônio cristão sobrepuja aos casamentos dos pagãos e dos judeus, tanto pela
sua perfeição, como pela sua nobreza.
VI.
Os bens do Matrimônio:
1. A prole
23.
Agora, é preciso dizer aos fiéis que são três os bens do Matrimônio: prole,
fidelidade, Sacramento. Eles compensam e atenuam aqueles incômodos a que se
refere o Apóstolo nas seguintes palavras: “Ainda assim, sentirão as tribulações
da carne”. (I Cor 7. 28) Além disso, outorgam valor moral à união dos
corpos que, fora do Matrimônio, seria justamente condenável.
O primeiro dos bens é a prole,
quer dizer, os filhos havidos da esposa própria e legitima. O Apóstolo dava
tanto valor a esse bem, que chegou a dizer: “A mulher salvar-se-á pela geração
dos filhos”. (I Tim 2. 15.) Isto, porém, não se entende apenas da geração, mas
tamb6m da educação e preparação dos filhos para a vida de piedade. Por esse
motivo, acrescenta sem demora: “… se perseverar na fé”.
A Sagrada Escritura, de mais a
mais, adverte: “Tens filhos?
Ensina-os bem, e acostuma-os à
sujeição, desde a sua tenra infância”. (Eccli 7,25.) O Apóstolo, por sua vez,
professa os mesmos princípios (Eph 6, 4) Nas Sagradas Escrituras, Tobias, Job e
outros santos Patriarcas nos dão belíssimos exemplos dessa maneira de
educar. (Tob 4, 1 ss; Job 1, 5.)
Quais sejam, porém, os deveres
dos pais e dos filhos, Isso explicaremos mais por extenso, quando tratarmos do
Quarto Mandamento.
2.
Fidelidade e santo amor.
24. A seguir,
falaremos do Matrimônio. Não se trata daquele hábito de virtude23 que nos foi infundido na alma, quando recebemos o
Batismo, mas de uma peculiar fidelidade, pela qual marido e mulher se ligam
mutuamente, de maneira que um entrega ao outro o poder sobre seu corpo, e ambos
prometem não violar jamais a santa aliança do casamento.
Essa relação de fidelidade se
deduz, facilmente, das palavras proferidas pelo nosso primeiro Pai, ao receber
Eva como esposa, palavras que Cristo Nosso Senhor confirmou no Evangelho (Mt
19, 5; Eph 5, 31): “Por isso, deixará o homem seu pai e sua mãe, e unir-se-á à
sua esposa, e serão dois numa só carne”. (Gn 2, 24) E também desta passagem do
Apóstolo: “A mulher não tem poder sobre seu corpo, mas sim o marido; da mesma
sorte, o marido não tem poder sobre o seu corpo mas sim a esposa”. (I Cor 7, 4)
Com muita razão, pois, que o
Senhor infligia, na Antiga Lei, as mais graves penas contra os adúlteros, pelo
fato de violarem esta fidelidade própria do Matrimônio. (Lev 20, 10)
A fidelidade matrimonial exige,
ainda, que marido e mulher estejam unidos por um amor todo particular, cheio de
virtude e pureza; que se amem um ao outro, não como fazem os adúlteros, mas
como Cristo amou a Igreja. Tal é a norma que o Apóstolo estabeleceu, quando
dizia: “Maridos, amai as vossas esposas, como Cristo amou a Igreja”. (Eph 5,25)
E certamente amou Ele a Igreja com um amor sem medida, não por próprio
interesse, mas procurando apenas a utilidade de Sua Esposa.
3.
Indissolubilidade
25. O
terceiro bem se chama Sacramento, que vem a ser o vinculo indissolúvel do
Matrimônio. Pois assim disse o Apóstolo: “O Senhor ordenou que a mulher não se
aparte de seu marido. Se ela se apartar, permaneça sem outro casamento, ou faça
as pazes com seu marido. E o marido, por sua vez, não mande sua mulher embora”.
(I Cor 7, 10 ss.)
Se, pois, o Matrimônio, como
Sacramento, simboliza a união de Cristo com a Igreja, força é que a mulher, no
tocante ao vínculo matrimonial, não possa separar-se do marido, porquanto
Cristo jamais se separa da Igreja.
Mas, para que esta santa comunhão
de vida mais facilmente se mantenha, sem nenhum ressentimento, devemos agora
expor as obrigações do marido e da mulher, conforme foram indicadas por São
Paulo e São Pedro, Príncipe dos Apóstolos. (Eph 5,22 ss; I Petr 3, 1 ss)
VII.
Deveres dos cônjuges:
1. do marido
É, pois,
dever do marido tratar sua mulher com bondade e consideração. Importa-lhe
recordar que Adão chamou Eva de companheira, quando dizia: “A mulher que me
destes por companheira”. (Gn 3, 12)
Por esse motivo, como ensinaram
alguns dos Santos Padres, ela não foi formada dos pés, mas da ilharga do homem;
da mesma forma, não foi tirada da cabeça, para reconhecer que não era senhora
do marido, mas antes sua subordinada.
Depois, é preciso que o marido
tenha sempre alguma boa ocupação, não só para prover o necessário ao sustento
da família, mas também para não amolecer na ociosidade, fonte de quase todos os
vícios.
Finalmente, deve o marido
governar bem a sua família, corrigir as faltas de todos os seus membros, e
manter cada qual no cumprimento de suas obrigações.
2.
da mulher
27. De
outro lado, as obrigações da mulher são aquelas que o Príncipe dos Apóstolos
enumerou na seguinte passagem: “Sejam as mulheres submissas a seus maridos, de
sorte que, se alguns deles não acreditam na palavra, sejam ganhos pelo
procedimento de suas mulheres, sem o auxílio da palavra, quando consideram a
vossa vida santa, cheia de temor de Deus. Seu adorno não consista exteriormente
em toucados, em adereços de ouro, em requintes no trajar; mas antes [ornai] a
índole humana que se oculta dentro do coração, com a pureza de sentimentos
pacíficos e modestos, que são preciosos aos olhos de Deus. Desta forma se
ornavam, antigamente, as mulheres santas que em Deus punham sua esperança, e
viviam submissas a seus maridos, assim como Sara obedecia a Abraão (Gn 12, 13;
18, 6-12), a quem chamava de seu senhor”. (I Petr 3, 1 ss.)
Outro dever principal, para elas,
seja também educar os filhos na prática da Religião, e cuidar zelosamente das
obrigações domésticas.
De boa vontade vivam dentro de
casa. Não saiam senão por necessidade, e nunca se atrevam a fazê-lo, sem a
permissão do marido.24
Alfim, como requisito essencial
para a boa união entre casados, estejam sempre lembradas de que, abaixo de
Deus, a ninguém devem mais amor e estima do que a seus maridos; aos quais devem
também atender e obedecer, com suma alegria, em todas as coisas que não forem
contrárias à virtude cristã.
VIII.
Legislação Matrimonial:
28. Como
complemento destas explicações, devem os pastores falar agora das cerimônias
que se observam na celebração do Matrimônio.
Todavia, ninguém há de esperar
que se exponham aqui as respectivas prescrições; pois o Sagrado Concilio de
Trento as determinou, com toda a minúcia e rigor, e os pastores não podem
ignorar essa legislação.25 Por conseguinte,
será bastante exortá-los a que estudem, do Concílio de Trento, a doutrina
relativa a esta parte, e a exponham aos fiéis com a devida solicitude.26
1.
Forma legítima
29. Antes
de tudo, a fim de evitar que jovens e donzelas, na idade de maior ausência de
critério, contraiam ligações de amor impuro, iludidos por algum falso título de
casamento27, não se cansem os párocos de
ensinar, repetidas vezes, que só podem ser considerados legítimos e verdadeiros
os Matrimônios que forem contraídos em presença do pároco, ou de outro
sacerdote; com licença28 do pr6prio
pároco ou do Ordinário do lugar, e perante um determinado número de
testemunhas.29
2.
Impedimentos matrimoniais
30. Devem
também ser explicados os impedimentos matrimoniais. Nas obras que
escreveram sobre os vícios e as virtudes, a maior parte dos mais ponderados e
instruídos moralistas trataram esta matéria tão exaustivamente, que a todos
será fácil intercalar aqui a doutrina por eles ministrada, ainda mais que os
párocos quase nunca poderão deixar tais livros fora da mão.
Por conseguinte, lerão
atentamente essas prescrições, bem como os decretos do Sagrado Sínodo acerca
dos impedimentos resultantes de parentesco espiritual, de pública honestidade,
de fornicação30, e farão por esclarecer os fiéis a
esse respeito.
IX.
Preparação para o Matrimônio:
1. Pureza e piedade.
31. Da
doutrina exposta, não custa averiguar com que disposições devem os fiéis
apresentar-se, quando estão para contrair Matrimônio. Compenetrar-se-ão,
forçosamente, de que não vão tratar de um negócio puramente humano, mas de uma
Instituição divina, para a qual devem trazer invulgar pureza de sentimentos e
piedade. Assim o demonstram, claramente, os exemplos dos Patriarcas da Antiga
Aliança. Embora seus Matrimônios se não revestissem da dignidade sacramental,
nem por isso deixavam de considerá-los dignos do maior respeito e da mais santa
veneração.
2.
Obediência e respeito aos pais
32. Entre
outras recomendações, é preciso exortar seriamente, os filhos adultos a terem
tanta consideração aos pais e aos detentores do pátrio poder, que não contraiam
núpcias, sem eles o saberem, muito menos contra a sua vontade, ou não obstante
a sua oposição.31
Observa-se, no Antigo Testamento,
que os pais sempre determinavam o casamento de seus filhos. (Gn 24, 3 ss)
A grande importância que, nessa parte, se deve consagrar à vontade dos pais, o
Apóstolo parece insinuá-Ia naquelas suas palavras: “Quem casa sua filha
donzela, faz bem; quem não a casa, faz melhor”. (I Cor 7, 38)
X.
Uso do Matrimônio:
33. Como
última questão, resta-nos tratar do uso do Matrimônio. Na elucidação dessa
matéria, devem os pastores exprimir-se de tal maneira, que de sua boca não
escape nenhuma palavra suscetível de melindrar os ouvidos cristãos, de
perturbar as consciências piedosas, ou de provocar risotas maliciosas.32
Dado que as “palavras do Senhor
são castas” (Os 11, 7) é de suma necessidade que o doutrinador do povo cristão
use de uma linguagem em que transpareça uma extraordinária gravidade e nobreza
de coração.
1.
Espiritualizar a vida conjugal
Ora, duas
são as principais instruções, que se devem dar aos fiéis. Em primeiro lugar,
que ninguém se entregue à vida conjugal [só] por prazer e sensualidade, mas use
do Matrimônio dentro daquelas normas que foram prescritas por Nosso Senhor,
conforme o que acima ficou demonstrado.33
Convém lembrar, aqui, a exortação
do Apóstolo: “Os que têm mulher, vivam como se a não tivessem”. (I Cor 7, 29)
Da mesma forma, aquela opinião de São Jerônimo: “O homem sensato deve amar sua
esposa com discernimento. Não ao sabor da paixão. Regulará os impulsos da
sensualidade, e não se deixará arrastar cegamente à satisfação da carne. Nada
mais vergonhoso, do que amar alguém a sua esposa, como se ela fora uma
adúltera”.34
2.
Saber conter-se quando for útil ou necessário
34. De
outra parte, como devemos alcançar de Deus lodos os bens, por meio de santas
orações, os párocos devem ensinar aos fiéis, em segundo lugar, que se abstenham
de vez em quando das relações conjugais, por amor das orações e súplicas que
fazem a Deus.
Tal aconteça, principalmente,
pelo menos três dias antes de receberem a Sagrada Eucaristia35; mais vezes até, durante o tempo em que se observa o
santo jejum da Quaresma, de acordo com as boas e graves prescrições que os
nossos Santos Padres nos deixaram.36
Desta forma, eles verão os bens
do Matrimônio avultarem, dia a dia, com o aumento sempre maior da graça divina.
Pela fervorosa prática da piedade, não só terão, neste mundo, uma vida
tranquila e bonançosa, mas poderão também apoiar-se naquela verdadeira e sólida
esperança, que “não engana”37, de conseguirem a
vida eterna, graças à misericórdia de Deus.
(Transcrito do Catecismo Romano, Cap. VIII, Do Sacramento do
Matrimônio. Frei Leopoldo Pires Martins, O. F. M., 1951. Editora
Vozes, Petrópolis. Rio de Janeiro. )
Notas
1 Do latim: núbere = velar, cobrir com um véu.
2 Em latim: coniunctio.
3 Agora, só até o 3º grau (CIC 1076 § 6).
4 Agora, antes dos 14 e 16 anos completos, para as donzelas e os
rapazes, respectivamente (CIC can. 1067 § I),
5 Conc. Florent, decret. pro Armenis (DU 702).
6 Em linguagem forense: palavras de presente.
7 Para serem válidos, os esponsais devem ser feitos em termo
escrito, assinado pelas partes, pelo pároco ou pelo Ordinário do lugar, ou, na
falta de ambos, por duas testemunhas. (CIC can- 1017 § 1).
8 Isto, suppositis supponendis, com muita reserva, quanto à
liberdade do consentimento.
9 Ambros. De institut. Virginum 6 42.
10 Conc. Trid. XXIV de Sacram. Matrim. (DU 969).
11 Nunca houve preceito individual. A ordem de Deus foi dada ao
gênero humano.
12 O CIC fulmina excomunhão contra os que provocam aborto, sem
excluir a própria mãe abortante, se a tentativa sortir o efeito desejado (cân.
2350 § 1).
13 De fato, tal crime raramente se comete sem cúmplices.
14 No original está “Sacramentum”
15 Conc. Trid. XXIV de Matrim. doctr. et can. I (DU 969-971).
16 Acerca desta alínea, veja-se Eph5, 22.25.
17 Conc. Trid. XXIV de Matrim. can. 1 (DU 971).
18 Gn 12, 3; 22, 18.
19 Gn 4, 19; 16, 3; 21, 24; 26, 34; 28, 9; 29, 28; 30, 1-9.
20 A respeito do Privilégio Paulino, em benefício dos pagãos
recêm-convertidos, veja-se o ClC, can, 1120-1127, com os Documentos VI-VIII,
anexos ao próprio Código. No entanto, para um estudo sistemático, consultar os
autores de moral.
21 Conc. Trid. XXtV can. 5 7 8 (DU 975 977-978). Cfr. CIC can.
1128-1132.
22 Aug. De conjug. adult. II 5 8 (alias II 6 9).
23 Esta explicação tem mais cabimento no texto original, por causa da
noção de “fides”. Em latim, pode ser “fé” e “fidelidade”.
24 Levem-se em conta certas transformações sociais, do século XVI a
esta parte,sem cair nas tendências paganizantes e anticristãs de hoje.
25 Conc. Trid. XXIV de reformat. Matrim. (DU 969·982).
26 O CIC regulou novamente as proscrições acerca da forma, nos
cânones 1094-1099. Vejam-se também os cânones 1019-1033 sobre a preparação,
mormente os proclamas.
27 Não excluído. hoje em dia, o mero contrato civil, que para o
católico não estabelece a vida conjugal propriamente dita.
28 Não é uma simples licença. Trata-se pelo contrário, de uma
verdadeira delegação a um sacerdote determinado para um casamento igualmente
determinado (CIC can. 1096 § 1).
29 O CIC prescreve pelo menos duas testemunhas (cân. 1094).
30 Conc. Trid. XXIV de Reformat. Matrim. can. 2-4 (DU 972-974).
Veja-se a leglstação atual no CIC, can. 1035-1080.
31 O CIC determina que os párocos não assistam ao Matrimônio de
menores, sem prévio consentimento dos pais, ou contra a sua vontade, a não ser
que o Ordinário do lugar o tenha permitido (cân. 1034).
32 O sacerdote não deve recuar, ante a dificuldade intrínseca do
assunto. As multidões de hoje perderam o pudor de antanho, e deixam-se
doutrinar por uma literatura cínica e anticristã.
33 O CIC diz assim: “O fim primário do Matrimônio é a geração e
criação da prole; o secundário é o auxílio mútuo dos cônjuges e o remédio da
concupiscência” (cân. 1013 § 1).
34 Hieron. contra Jovinianum I 30 (alias 1 49).
35 Estes conselhos acéticos caducaram com a Comunhão frequente e
cotidiana, desconhecida no século XVI. São também posteriores aos primeiros
tempos do cristianismo, quando os fiéis assistiam à Missa, e comungavam como
participantes dos Sagrados Mistérios.
36 É assunto de exposição muito delicada. Não deve ser levado ao
púlpito. Convém omiti-lo nas instruções individuais aos noivos, porque no
Matrimônio as obrigações são bilaterais. Além disso, os tempos mudaram. Ainda
mal, as gerações de hoje não compreendem a candura e a elevação de certos
pensamentos cristãos da antiguidade.
37 Rom 5, 5. – Acerca do Matrimônio, é indispensável o estudo das
admiráveis encíclicas papais “Arcanum divinae Sapientiae”, de Leio XIII e
“Casti Connubii”, de Pio XI.
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